quinta-feira, 12 de março de 2020

Dois lados


Reciclando uma metáfora com história, é caso para dizer que enquanto a maioria dos trabalhistas andou a tomar banho nas águas turvas do segundo referendo, os conservadores roubaram-lhe as roupas da soberania democrática e agora, como reconhece o insanamente eurófilo The Guardian, parece que lhe roubaram a política económica keynesiana.

Entretanto, deste lado, é preciso lembrar o que é a integração pós-democrática: segundo um estudo muito útil, entre 2011 e 2018, a Comissão Europeia deu mais de sessenta instruções aos Estados para cortarem a despesa pública em saúde e para darem mais espaço aos privados, parte de um quadro mais geral de recomendações austeritárias que fragilizaram os Estados e os seus povos.

Há sempre pelo menos dois lados…

10 comentários:

Geringonço disse...

Pois é, o europeísmo realmente existente, ou seja, liberalismo...

Como os liberais não conseguem aplicar os seus preceitos de forma democrática inventam organizações supra-nacionais e anti-democráticas (até inventam um falso Deus, um Deus chamado "Mercado-livre") para os impor aos povos.

Mas estas organizações supra-nacionais e anti-democráticas foram criadas pelos Estados, e são os Estados que têm que acabar com elas.

Jose disse...

E nunca por nunca se discute o que é mais económico (custo/benefício): criar e prestar serviço público; contratar privados.

A economia subordinada à ideologia não é ciência, é fé.

Anónimo disse...

Mas que hábito o deste de distorcer o que os autores escrevem.

Não se discute o que é mais económico? Claro que se discute e muito e a realidade o demonstra - é tão económico para os privados que, o lucro fica logo assegurado e o custo fica todo do lado do Estado.

E os serviços públicos, indispensáveis a toda a população, independentemente dos seus recursos, saqueados em conluio com os donos disto tudo, subordinados à ideologia neoliberal, é o quê? É rentismo protegido, seguro e garantido.

Jaime Santos disse...

Ai as leituras enviesadas, João Rodrigues. Do Editorial:

'The chancellor might claim the Tories are ‘the real workers’ party’ but there’s no sign the state will intervene on the side of labour or redistribute wealth'.

A política de redução de impostos de George W. Bush também era keynesiana.

A Esquerda erra ao pensar que o keynesianismo é um exclusivo da Esquerda (Keynes era um Liberal, essa coisa que você odeia, cabe lembrá-lo). É um instrumento ao serviço de objectivos políticos que podem ser de Esquerda ou de Direita.

Assim como a política da redução do deficit, que a Esquerda enjeita, mas que tem a suprema vantagem de permitir ao País recuperar a soberania financeira sem renegociar a dívida (com tudo o que isso implica) e até ter margem para investir quando é preciso...

E depois, perante a emergência presente, só quem é parvo é que não recorre ao arsenal keynesiano... Agora, e por uns tempos, precisamos mesmo de uma economia de guerra, porque temos uma guerra para travar...

Quanto à maioria dos trabalhistas terem andado a tomar banho nas águas turvas de um segundo referendo, até concordo, eu teria aceite o acordo de May, só que sucede que a triangulação do Labour, da responsabilidade de Corbyn, não convenceu ninguém, nem Remainers (a maioria ainda assim dos eleitores do Partido) nem Leavers, que votaram nos Tories.

A decisão pelo referendo pelo menos fez com que os Remainers regressassem ao Partido, que de outro modo teria levado um banho ainda maior, a julgar pelo resultado das europeias... Cabe aliás lembrar que a maioria dos eleitores votou em Dezembro em Partidos pró-referendo, só o malfadado sistema eleitoral britânico permitiu a maioria a Johnson.

E há seguramente sempre dois lados. O lado que ganha e o lado que perde, e você está sempre do lado que perde. Se as vitórias morais lhe agradam, para mim são outro nome para as derrotas. Como a de Sanders no Michigan, cortesia do eleitorado branco de classe operária, a mostrar que o socialismo é sobretudo popular entre jovens urbanos e burgueses... QED...

Anónimo disse...

Jaime Santos brinda-nos com mais uma cortina de fumo fazendo-nos crer que devido às circunstâncias agora até é keynesiano.

Isto é de uma extraordinária hipocrisia depois de anos a conbater as propostas keynesianas neste blog e quando a razão que ele invoca para a sua pseudo-conversão ser um choque pelo lado da oferta, logo um mau exemplo de aplicação da teoria keynesiana, pelo menos numa primeira abordagem.

O que a indigência intelectual de Jaime Santos pretende mascarar é que a necessidade de uma intervenção fiscal pelo lado da procura já existia antes desta emergência do coronavirus . E também que este problema pelo lado da oferta se transformará a curto prazo num enorme problema de queda da procura por via da criação de desemprego em massa. Tudo isto é por demais evidente.

Que o keynesianismo não é de esquerda nem de direita é por demais evidente. No entanto os efeitos da sua aplicação não o são, e num contexto de economia de mercado a sua aplicação seria conducente a um aplanamento das desigualdades de rendimento.

Relembra-se a análise de Mark Blyth nestes dois excelentes videos que explicam sucintamente os pontos que Jaime Santos tenta escamotear. Temos que lhe relembrar as suas disparatadas invectivas contra a inflação?

https://www.youtube.com/watch?v=8rxrjhWTdv8

https://www.youtube.com/watch?v=-K8bf6dbYt4

O maior problema que a humanidade globalmente enfrenta é a mediocridade de elites que como Jaime Santos têm a espessura intelectual de uma folha de grafeno e procuram qualquer justificação, não importa quão absurda, para sofismar as políticas públicas para o favorecimento de minorias corruptas e venais.

Anónimo disse...

Com a situação epidémica interna controlada a China passa ao ataque diplomático afirmando públicamnete aquilo que em surdina já se lia em orgãos de informação online fora do mainstream:

https://www.rt.com/news/483018-china-us-theory-coronavirus-spokesman/

Paulo Marques disse...

«Assim como a política da redução do deficit, que a Esquerda enjeita, mas que tem a suprema vantagem de permitir ao País recuperar a soberania financeira»

Ai permite? Em que ano? E uma crise em 2020 atrasa o plano em quantas décadas? A Grécia teria aquilo que chama de "soberania" (na qual não se manda em nada, mas pronto) em módicas 5 décadas de empobrecimento e destruição do país. O que é que o leva a crer que mais gerações perdidas vão resultar nalguma coisa? Onde está o investimento?
Não, Keynes não é exclusivo da esqueda, mas não existe, nem é legal, na Desunião a tentar brincar ao combate climático.
Uma economia de guerra em que se continua a desperdiçar recursos porque o capital não quer? Boa demonstração da sua segueira ideológica e histórica. Só falta ir buscar mais uma acusação de anti-semitismo para o ridículo ficar completo.

Jose disse...

«é tão económico para os privados que, o lucro fica logo assegurado e o custo fica todo do lado do Estado»

Eis uma peça central da economia planificada.
O capital não tem que ser remunerado e o lucro ofende a memória da troca directa, e não pode ser tomado como medida de eficiência.

Andaram mais de 70 anos a acarinhar tais conceitos até que deram com os burros na água.

Anónimo disse...

O desespero dá nisto: Jose foi ao fundo de um poço buscar estes disparates, a que chama conceitos.

O que este quis dizer foi que o capital, e só isto, tem de ser ainda mais remunerado e sacar muito para se mostrar eficiente.
A padaria do senhor Júlio tem tido muito sucesso e vende muito pãozinho quente, mas não se prevê que venha a ser nacionalizada.

Jose é ridículo e gosta.

Jose disse...

Confirmo que tenho o ridículo por uma referência da maior importância.

E quando vejo elaborar a partir dos conceitos que se julgavam estar esquecidos no fundo do baú como se fossem ciência nova ou como se os grandes números os regenerassem, logo me ocorre dar destaque ao ridículo conceptual.