segunda-feira, 30 de abril de 2012
Nuestros hermanos
Vicenç Navarro sobre as causas reais da crise. Quem quiser saber mais sobre a frente espanhola da crise e da austeridade e sobre as alternativas para as superar deve ler o livro Hay alternativas, que está disponível gratuitamente. De resto, e para escapar às vulgaridades quotidianas da sabedoria económica convencional em Espanha, é acompanhar os sítios de Navarro e de Torres López.
Na linha da frente da austeridade
A repórter Maria João Guimarães começou pela crianças e fez muito bem.
domingo, 29 de abril de 2012
A política com p pequenito
sábado, 28 de abril de 2012
sexta-feira, 27 de abril de 2012
Notas
Ao assistir hoje à comunicação do sociólogo Robert Fishman, lembrei-me deste vídeo, que ilustra de forma simples e muito irreverente alguns dos seus pontos sobre os elementos internos da crise do capitalismo espanhol, da financeirização à bolha imobiliária, passando pela captura de um poder político retintamente neoliberal e que só pensa em desregulamentar ainda mais as relações laborais. De resto, na linha comparativa que é a sua, Fishman destaca pela positiva o País Basco e, no quadro da importância que atribui à política do crédito, as suas “cajas”. Segundo ele, estas eram as mais controladas politicamente e as que registavam menos concorrência, estando divididas por regiões, e foram a que se comportaram de forma mais responsável e funcional, canalizando muito mais crédito para investimentos produtivos. De resto, Fishman argumentou que a desregulamentação laboral só tende a produzir resultados negativos – da maior precariedade à desigualdade, passando por menos acção colectiva a partir de baixo, num sociólogo para quem este último elemento é fundamental numa economia política funcional e que gere emprego – e que para sair da crise a Espanha precisará sempre de mais despesa pública: de investimentos no Estado social a investimentos em I&D ou em políticas industriais. Isto também exige resolver o défice democrático espanhol em que Fishman sempre insiste, a herança infeliz de uma transição para a democracia sem ruptura revolucionária. Fishman acaba sempre por valorizar a economia política do 25 de Abril. É de facto nela que nos temos de inspirar para superar a distopia da desvalorização interna.
Perguntas de indignação
Hoje, no jornal Público, o economista e investigador Domingos Ferreira termina com estas perguntas o seu artigo intitulado "A desvalorização interna":
Outro erro histórico será o de privatizar a Segurança Social e o Sistema Nacional de Saúde. Estes senhores não sabem que nos EUA milhões de americanos perderam as suas poupanças e foram lançadas na pobreza em resultado da falência de algumas companhias de seguros e de bancos? Será que não sabem que uma em cada três famílias fica insolvente em resultado das elevadíssimas despesas do sistema de saúde privado americano? Então não sabem que as despesas de saúde do tão "eficiente" sistema privado americano é duas vezes superior ao sistema de saúde público alemão ou sueco e três vezes superior ao Sistema Nacional de Saúde? Porque insistem no erro? Porque não reformam o cancro nacional que são as PPP? Onde estão as reformas fundamentais para a modernização e revitalização da economia nacional? Porque não abrem a economia fortemente oligopolizada e cartelizada à concorrência? Porque não baixam os impostos às depauperadas pequenas e médias empresas? Porque não introduzem moralidade no sistema e põem fim aos indevidos privilégios de alguns influentes? Porque são sempre os mais vulneráveis a pagar? Pois, disto nem se ouve falar.
quinta-feira, 26 de abril de 2012
Comparar crises
As consequências económicas de Cameron e Osborne
Graças à austeridade, o Reino Unido reentra em recessão, tornando a comparação com os anos trinta ainda mais esclarecedora. É bom relembrar que os raríssimos casos de austeridade expansionista ocorreram em países com soberania monetária e que puderam usar a política monetária e cambial, contando então com o decisivo impulso do resto dos parceiros comerciais em expansão. No actual contexto, tal impulso está bloqueado. Num país com soberania monetária, com Banco Central e Tesouro articulados, a austeridade é muito mais facilmente evitável, o que torna a fracassada opção pré-keynesiana do governo conservador britânico ainda mais aberrante. É claro que a política económica é sempre a expressão da correlação das forças sociais, sendo a soberania monetária condição necessária, mas não suficiente, para uma política de combate à crise. Também no Reino Unido, as fracções dominantes e bem poderosas do capital tratam de aproveitar a oportunidade oferecida pela crise e pela resposta que a aprofunda para prosseguir com renovado vigor o projecto neoliberal ainda inacabado, apesar das décadas que já leva de hegemonia.
Quem tem razão?
Excertos da imperdível crónica de Bresser-Pereira na Folha de São Paulo – A Argentina tem razão. Trata-se de um dos principais economistas do desenvolvimento do Brasil e, note-se, ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso. De resto, esta crónica sistematiza a agenda de investigação de Bresser-Pereira: a construção de um Estado neo-desenvolvimentista capaz de contribuir para o apetrechamento económico e para o desenvolvimento das capacidades colectivas da Nação. Isto traduz-se numa atenção especial a duas maldições que ameaçam o desenvolvimento – a dos recursos e a do financiamento por poupança externa – e à sua tendência para gerar uma sobreapreciação da taxa de câmbio que ameaça a indústria. O controlo de capitais é então parte de uma pragmática caixa de ferramentas, onde se inclui a política industrial, ao serviço da qual está a política cambial: funciona ou não funciona? As medíocres e subalternas elites portuguesas, sempre obcecadas com o que pensa o “exterior”, pelo menos desde Maastricht que estão longe destas preocupações...
quarta-feira, 25 de abril de 2012
A liberdade está aqui!
(Imagens do livro "O 25 de Abril contado pelas crianças", 1978)
“Em Gaza ou Lampedusa senti que valia a pena ser deputado”
O Miguel viajou muito em política e fora dela. Apesar de ser deputado europeu, nunca prescindiu de ir ao fundo dos fundos, dentro e fora da Europa. Penso que foi aí que encontrou o sofrimento mais agudo, mas também a dignidade mais improvável e um antídoto contra o "cretinismo parlamentar", um dos seus maiores receios. De resto, ele era difícil de segurar. Quando tinha uma ideia, uma intuição política, um projecto, entusiasmava-se rapidamente e entrava em regime frenético.
Isto apesar de não faltar ao pé dele quem o contraditasse. Antes pelo contrário, sempre preferiu rodear-se de pessoas que o criticavam, combatiam, azucrinavam e, basicamente, lhe faziam a cabeça em água. Aparentemente, sempre preferiu pensar e agir no meio da mistura e da heterogeneidade, um luxo de quem tem segurança nas suas convicções e confiança nas suas capacidades. Não impedia, claro está, que fosse teimoso como uma mula. Também ajuda quando se luta a vida inteira...
Quem quiser saber mais e divulgar essa luta, pode ir ao Esquerda, que está a publicar várias coisas sobre ele. Ou ver e partilhar entrevistas recentes à SIC, à Antena 1, ao Expresso e ao Jornal i. Ou ler os dois livros ("No Labirinto" e "Périplo") e o documentário do segundo. Uma bela forma de aproveitar o 25 de Abril, depois da Avenida da Liberdade.
O velório do Miguel terá lugar no Palácio Galveias este sábado às 15h, no Palácio das Galveias. No domingo realiza-se uma sessão evocativa no Jardim de Inverno do Teatro S. Luiz, com início às 14h30m.
As tarefas do 25 de Abril
terça-feira, 24 de abril de 2012
Imprescindível
Miguel Portas, Sobre os caminhos da esquerda
A austeridade não funciona
Veja o filme, leia o livro
segunda-feira, 23 de abril de 2012
O começo do fim?
A elite política dos países que impuseram a austeridade a ferro e fogo às periferias endividadas está desesperada por ver o crescimento económico destes países. Como o próprio FMI já reconhece, a austeridade só podia gerar recessão, manter os défices, fazer crescer a dívida pública e gerar um desemprego insuportável. As chamadas reformas estruturais, a que o neoliberalismo atribui efeitos benéficos sobre o crescimento económico, são apenas um mito. Em vez de crescimento, a UE vai ver crescer a revolta social à medida que a classe média destes países se enterrar na pobreza. Os especuladores conhecem muito bem o custo social das metas para o défice do Estado espanhol, do português, do grego e mesmo do irlandês.
Confrontados com o desastre, muitos europeístas esperam por um milagre de última hora. Acreditam que a mudança de cor política na presidência da França vai abrir novos caminhos. Sobretudo se for seguida de uma vitória eleitoral da coligação SPD/Verdes na Alemanha, em 2013. Tornar-se-iam viáveis novas soluções para as dívidas das periferias e seria possível lançar um programa de estímulo ao crescimento económico com investimentos financiados através do Fundo Europeu de Investimento. Com nova liderança, e confrontada com os custos insuportáveis do resgate da Espanha, a que se adicionam novos pacotes financeiros para Portugal e Irlanda, a Alemanha acabaria por aceitar a emissão de obrigações europeias.
Entretanto, há que dizer que a emissão de obrigações europeias só resolve no imediato, in extremis, a questão das dívidas da periferia da zona euro. Mas deixa intacto o problema estrutural, o da impossibilidade de países com níveis de desenvolvimento muito diferentes partilharem a mesma moeda sem que os menos desenvolvidos disponham de autonomia para executar políticas económicas ajustadas às necessidades. Ainda que houvesse um orçamento comunitário, com transferências do centro para as periferias, tal seria manifestamente insuficiente para promover o desenvolvimento. É isso que nos diz a história dos países que se desenvolveram.
Porém, mesmo a criação de obrigações europeias é altamente improvável. Tal significaria o primeiro passo para a criação de uma política orçamental federal na UE, em complemento da política monetária única. Diversos observadores, incluindo alemães europeístas, reconhecem que a Alemanha e os restantes países excedentários rejeitam o caminho em direcção a um Estado europeu federal. Este só poderia ser democrático, legitimado por eleições europeias, e ninguém admite que a Alemanha, ela própria um estado federal, esteja disposta a transformar-se num estado federado. Como bem argumentou José Gil num artigo na “Visão” (22 Dez. 2011), o Estado europeu é impossível.
O que nos resta então? Muito provavelmente, a ruptura da zona euro. Se, em vez de abandonar o euro, um ou mais países da periferia decidissem financiar-se directamente junto dos respectivos bancos centrais, isso poderia empurrar a Alemanha para a criação de uma nova zona monetária. A ideia vai fazer o seu caminho.
(O meu artigo da semana passada no jornal i)
Quem pode?
domingo, 22 de abril de 2012
Até ao fim
Jean Luc Mélenchon déterminé à "tourner la page... por LCP
O fim do romance europeu
(Reproduzo aqui o texto que esteve na base da intervenção que fiz no jantar "Em Abril, esperanças mil" realizado na passada 6ª feira em Lisboa)
Há quem diga que "alguns casamentos acabam bem… outros duram a vida toda". A cada dia que passa, esta parece ser a história da participação de Portugal no projecto de integração europeia.
Tal como acontece em muitos casamentos, a relação entre Portugal e a UE passou por um período de romance. A Europa era o espaço onde nos sentíamos bem, sentíamo-nos melhor do que nunca e acreditávamos que seríamos felizes para sempre.
Tal como em muitos romances, havia boas razões para o encantamento dos portugueses. A entrada na CEE foi seguida de um rápido desenvolvimento económico, depois das crises severas dos anos anteriores. O investimento estrangeiro afluía em força, tal como os fundos europeus – os quais permitiram melhorar infraestruturas, alargar o sistema de ensino e formação, melhorar as condições ambientais, etc. Ao longo da década de 90, à medida que caminhávamos para o euro, a forte descida das taxas de juro e um ambiente internacional favorável permitiam aumentar os níveis de consumo, aumentar os apoios sociais e reforçar os serviços públicos.
A Expo 98 foi o momento máximo de orgulho nacional. Nas vésperas de integrarmos o núcleo fundador da moeda única, grande parte dos portugueses sentia-se cada vez mais auto-confiante e cada vez mais europeia.
***
Depois do ano 2000 as coisas começaram a correr menos bem. O crescimento económico quase desapareceu, as pressões do défice orçamental tornaram-se uma constante e o desemprego foi aumentando paulatinamente.
A pouco e pouco íamo-nos apercebendo que neste casamento não havia só rosas – e o romance europeu começou a ficar abalado.
Quando a crise internacional rebentou em 2007-2008, o papel da UE foi-se revelando cada vez menos romântico. A Europa demorou a reagir à crise e, quando o fez, não tratou de garantir que o esforço de combate à crise fosse repartido da forma mais adequada.
Quando a crise financeira e económica se transformou numa crise das dívidas soberanas – depois de os Estados assumirem os custos da folia do sector financeiro - a reacção da UE revelou-se verdadeiramente desastrosa:
(i) os desentendimentos entre líderes europeus e as declarações despropositadas de alguns responsáveis destacados fomentaram um clima de incerteza, o qual alimentou ataques especulativos aos títulos das dívidas soberanas, tornando o financiamento dos Estados crescentemente inviável;
(ii) as respostas europeias chegaram sempre a reboque dos acontecimentos, agindo-se depois dos problemas se tornarem intratáveis - e revelando-se sempre ineficazes;
(iii) e as soluções encontradas desde então têm passado pela imposição de uma austeridade generalizada (e que promete ser prolongada), a qual não só corrói as sociedades e as instituições democráticas, como se revela incapaz de atingir o próprio objectivo que afirma prosseguir - a sustentabilidade das finanças públicas.
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A moeda única europeia falhou, assim, redondamente na criação estabilidade económica e financeira na Europa, revelando-se incapaz de evitar que as crises assumam proporções dramáticas.
Pior, nas circunstâncias actuais, verifica-se que alguns dos países que assumem um papel central nas decisões tomadas ao nível da UE saem a ganhar desta crise – e não é pouco:
(i) de acordo com as contas do Diário Económico, a Alemanha poupou em 2010 e 2011 mais de 13 mil milhões de euros em juros pela emissão de obrigações de curto a longo prazo, face ao que pagava em 2009, antes do pico da crise (isto porque a incerteza criada nas economias periféricas, em boa medida graças às atitudes dos líderes alemães, levou à fuga de capitais para os países do centro da UE);
(ii) entretanto, com as taxas de juro das obrigações das economias periféricas a atingir valores sem precedentes, a crise tornou-se uma oportunidade única de investimento de elevado retorno para os grandes grupos financeiros - tanto mais que não têm dificuldade em financiar-se a taxas de juro mínimas junto do BCE (que recusa o mesmo tratamento aos Estados em dificuldades);
(iii) além disso, a descapitalização das economias periféricas dá a estes grandes grupos financeiros a oportunidade para adquirirem activos (empresas públicas e privadas, bens imobiliários, etc.) a preços de saldo.
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Em suma, o problema da UE não é apenas estar mal apetrechada para lidar com crises. O problema é que o agravamento e o prolongamento das crises constituem uma oportunidade de negócio para grupos económicos que têm grande poder de influência sobre os governos de países da UE que ditam o nosso futuro colectivo - levando-nos a questionar se a incapacidade de estancar a crise resulta de mera incompetência de quem comanda os destinos da Europa.
Em uniões monetárias funcionais, quando um país entra em crise existem mecanismos de transferência de recursos das economias mais saudáveis para as mais problemáticas, para atenuar os efeitos da crise. Na UE dá-se o inverso: as crises são momentos de transferência massiva de rendimentos e riqueza dos mais pobres para os mais ricos.
Este processo de transferência de riqueza dos países mais pobres para os mais ricos - e de quem vive do seu salário para os grandes grupos económicos e financeiros - ainda não acabou. Com o novo tratado orçamental, os poderes que ditam as regras na UE procuram constitucionalizar uma profunda reconfiguração das sociedades europeias, levando ainda mais longe o processo que teve início há 20 anos com a aprovação do Tratado de Maastricht.
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Mas não foi só durante esta crise que a UE revelou ser um arranjo institucional que distribui assimetricamente as vantagens e desvantagens da integração. Agora que o romance acabou, vemos com mais clareza que o nosso contrato de casamento contém desde o início elementos que nos são muito pouco favoráveis.
Hoje tentam convencer-nos que os problemas económicos das periferias se devem aos erros cometidos pelos governos nacionais ao longo dos anos. Muitos erros foram feitos, é certo - mas esta é só parte da história.
A outra parte da história respeita aos impactos negativos do próprio processo de integração no desempenho das economias periféricas - antes e depois da criação do euro:
Antes da entrada em vigor do euro:
(i) a prioridade absoluta atribuída à então chamada ‘convergência nominal’, que antecedeu a entrada na moeda única, implicou uma apreciação acentuada da taxa de câmbio real efectiva, o que levou a uma perda de competitividade - e à consequente destruição de uma parte significativa da indústria e da agricultura portuguesas;
(ii) a necessidade de chegar a 1999 cumprindo os critérios de Maastricht, associado à forte descida das taxas de juro nas periferias da UE, induziram os Estados com economias menos fortes a adoptar políticas de estímulo às economias com base no recurso crédito, tendo favorecido o endividamento excessivo das famílias, empresas e Estado;
(iii) as metas para a dívida pública levaram a um processo de privatizações precipitado e em muitos casos pouco fundamentado;
(iv) os três factores referidos - perda de competitividade por efeito cambial, descida das taxas de juro, privatizações de empresas públicas rentáveis – conjugaram-se, levando o investimento em Portugal a focalizar-se em sectores pouco promissores (construção, imobiliário, distribuição, serviços financeiros, indústrias de rede e outros sectores rentistas, que vivem fundamentalmente do mercado interno e que contribuem negativamente para o défice externo), em detrimento de actividades viradas para os mercados internacionais.
Após a entrada em vigor do euro:
(i) os acordos comerciais com a China e outras economias emergentes - que tanto beneficiaram as economias da UE com capacidade para investir nesses países e com uma especialização produtiva assente em bens de equipamento muito procurados por países em processo de industrialização acelerada (como é o caso da Alemanha) - revelaram-se desastrosos para as economias dos Estados Membros (como é o caso de Portugal) cujo perfil de especialização está mais exposto à concorrência (em larga medida desleal) dos ‘emergentes’;
(ii) da mesma forma, o alargamento a Leste favoreceu as economias centrais da UE, penalizando os países mais expostos à concorrência do Leste (como Portugal) e beneficiando as economias com melhores condições para explorar esses mercados e deslocalizar para lá as produções (tirando partido de mão de obra barata e qualificada, e da grande proximidade geográfica ao centro económico da Europa);
(iii) a forte valorização do euro face ao dólar registada desde 2002 foi favorável às economias com um sector financeiro forte, com grandes investimentos fora da zona euro e especializadas na produção de bens sofisticados cuja competitividade é pouco afectada pelos preços (como é, mais uma vez, o caso da Alemanha); pelo contrário, a valorização do euro revelou-se desastrosa para economias como a portuguesa, em que grande parte da capacidade exportadora continua a residir em bens cuja competitividade depende muito do factor preço.
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Em suma, boa parte da explicação para a crise que enfrentam as periferias da UE encontra-se numa UE que foi concebida para favorecer as economias mais fortes.
Uma UE que, pela sua arquitectura institucional, não deixa alternativa aos Estados Membros que não seja a austeridade permanente, com tudo o que isto implica em termos de desemprego, desigualdade social, perda de direitos, destruição do Estado Social e potencial de desenvolvimento futuro.
Uma UE onde não existem mecanismos para que os eleitores possam pronunciar-se democraticamente sobre as opções políticas que vão sendo tomadas ao longo dos anos pelas instituições europeias.
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Uma das consequências de um ano de intervenção da Troika foi ter-se tornado mais claro para muitos portugueses e para muitos europeus que a União Europeia hoje é mais parte do problema do que parte da solução.
A UE, tal como existe actualmente, é uma instituição anti-democrática, que condena muitos dos seus Estados Membros ao sub-desenvolvimento e que põe em causa e auto-determinação dos povos da Europa.
Democracia, Desenvolvimento e Descolonização. Estas são as palavras que caracterizam a Revolução dos Cravos. Vai sendo altura de nos preparamos para um novo 25 de Abril, desta vez à escala europeia, em nome dos mesmo 3 D’s (ainda que hoje os colonizados sejamos nós).
Os desafios que temos pela frente vão exigir muito pensamento, muita mobilização e muita generosidade. De resto, o mesmo que foi necessário para se chegar a uma madrugada de Abril há quase 38 anos atrás.
A Es.Col.A e o preconceito
Imagine-se também que um grupo de cidadãos, interessados pela cidade em que vivem, pretende fazer trabalho comunitário, junto de pessoas que podem beneficiar do seu apoio. Alguns são empregados dos serviços, outros são professores e outros são gestores. O grupo é ainda composto por reformados, que decidiram preencher o tempo de que agora dispõem ao serviço da comunidade. Tencionam ajudar as crianças nos trabalhos escolares e promover diversas actividades com os moradores do bairro.
Perante o estado de abandono da escola, lembram-se de utilizar o pátio. É aí que se começam a encontrar com os mais novos e a reunir-se com os moradores, definindo em conjunto o que se pode começar a fazer. Há quem queira aprender a jogar xadrez. Há quem queira aulas de dança e sessões de ioga. Há até quem gostasse de saber utilizar um computador.
A pouco e pouco, as salas da escola abandonada vão acolhendo as diferentes actividades. Para as despertar da letargia em que se encontravam fazem-se pequenas obras. Substituem-se vidros partidos e colocam-se telhas novas nos sítios onde chove. Pintam-se paredes e arranjam-se algumas portas. A dado momento, pode já começar-se a pensar em criar uma pequena biblioteca, projectar filmes e abrir um espaço com computadores. As reuniões com os moradores começam a ter lugar entre muros, no edifício revitalizado.
A autarquia constata, entretanto, que a escola desocupada deixara de o estar. Apercebe-se das actividades que aí têm lugar e descobre uma coisa rara: essas actividades não são o menu definido por «técnicos sociais» encartados, tantas vezes especialistas em saber de antemão o que as pessoas precisam, mas sim o fruto de decisões colectivas e participadas. O ponto de encontro entre as competências dos voluntários e os interesses da comunidade.
Surgem, naturalmente, problemas jurídicos: é necessário que a «ocupação da desocupação» esteja dentro da lei. O grupo de voluntários – e a própria população do bairro – compreendem isso. É preciso que se constitua uma associação e, por força das leis vigentes, que a cedência do espaço pela autarquia implique o pagamento de uma verba simbólica. Tal como importa, também, que se celebre um contrato entre as partes, de modo a formalizar – afinal – tudo o que até aí foi sendo concebido e materializado de modo espontâneo, democrático e informal.
A autarquia, longe de equacionar o cenário de despejo (e muito menos o de um despejo coercivo), quer facilitar todo o processo. Porque – coincidência das coincidências – estava justamente em estudo, nos gabinetes da câmara, a possibilidade de reconverter o edifício da antiga escola num centro comunitário. Até já havia uma dotação prevista no orçamento, com uma parte destinada a obras de recuperação e outra parte destinada a remunerar a associação que ali se quisesse instalar, com o compromisso de desenvolver o projecto concebido para o bairro, no período de tempo previsto. Bastava acertar agulhas e ultrapassar as questões legais.
(Esta não é a história da Es.Col.A do Bairro da Fontinha. E não o é, essencialmente, por duas razões: porque na história da Es.Col.A do Bairro da Fontinha – que ainda não terminou – alguns dos seus protagonistas diferem do perfil aqui descrito. E porque, por isso, o preconceito e o atavismo – que nada devem à inteligência – contaminam o modo como o executivo de Rui Rio continua a encarar a Es.Col.A. O discurso que tece loas à iniciativa da «sociedade civil» e ao «empreendedorismo social» é uma retórica selectiva: não se aplica a todos).
Adenda: Não deixem de ler o relato, pessoal e felizmente transmissível, da Gui Castro Felga sobre a «operação» de despejo da Es.Col.A da Fontinha.
sábado, 21 de abril de 2012
Tragédia grega, hoje, em debate da ATTAC
Repetir
sexta-feira, 20 de abril de 2012
Da «equidade na austeridade»
Estaria o ministro Vítor Gaspar a pensar nisto e nisto (entre outros possíveis exemplos), quando produziu anteontem, com total despudor, esta inacreditável declaração?
Quem tem medo da desglobalização?
Contribuindo para a reflexão dos leitores, traduzi a última secção de um texto de Frédéric Lordon intitulada "É a política, estúpido!":
[…] Sim, a ultrapassagem das actuais nações, e a reconstituição de nações – quer dizer de povos soberanos – em escalas superiores é uma possibilidade histórica.
Mas não, isso não acontecerá nas condições da Europa actual – porque foi iniciada sob as piores modalidades, orientadas para a fazer fracassar à força de tanto maltratar os povos de que se queria fazer um povo.
A alternativa é pois a seguinte:
— Ou, prolongando as suas tendências recentes, ela [a integração supranacional] fracassará completamente e produzirá o seu radical contrário, tornando impossível por longo tempo o seu relançamento. Poderemos lamentar, mas não há que fazer disso um drama. A experiência histórica recente, a do fordismo, mostrou claramente que uma ordem económica de nações soberanas é possível, pelo que só um discurso particularmente inepto pode vir dizer que elas cairão na autarcia norte-coreana se não se entregarem de corpo e alma à globalização. Podemos pensar uma economia internacional que não tome a forma da globalização.
— Ou decidimos parar o processo enquanto é tempo, sabendo que a explosão financeira que se anuncia com as bancarrotas públicas bem poderia trazer consigo as suas «soluções»: constatação da impossibilidade de uma zona euro regida pelos princípios «alemães» de política económica, fractura em sub-blocos com formação de um grupo não-alemão onde a revisão profunda do quadro económico, monetário, financeiro e bancário, a que se seguiria a atenuação das tensões internas, permitiria encetar em melhores condições o caminho para a formação de uma entidade politicamente integrada, ou seja, o caminho para a afirmação autêntica de uma soberania regional que, na realidade, se converteria numa soberania nacional, mas de uma nova nação constituída com base nas antigas.
Este novo povo soberano constituir-se-ia na base de uma organização económica que, de facto, teria posto fim à globalização financeira e, através de um proteccionismo selectivo, às desigualdades do livre-comércio generalizado. Esta seria outra forma de dizer que ele teria desglobalizado e que a ultrapassagem das velhas nações não é de todo incompatível com a desglobalização (a qual, inversamente, não condena necessariamente a um «fechamento nacional»). Na realidade, é exactamente ao contrário! A desglobalização poderia muito bem ser a condição necessária à retoma de um projecto supra-nacional razoável, quer dizer regional, e sempre sob condição de uma delimitação bem pensada (porque não se faz uma comunidade política com qualquer um). A menos que a esquerda crítica comece a ter medo das palavras, ser-lhe-á necessário reconhecer que a «desglobalização» é a palavra identificadora do recomeço do jogo, quer este conduza à re-exploração das possibilidades de soberania das actuais nações (no caso de mais nenhuma solução ser praticável) ou à persistência da ideia de um projecto supranacional, mas desta vez prosseguindo um objectivo fundamentalmente político por vias políticas – porque produzir o político através do económico, isso não funciona. E, em qualquer dos casos, se verdadeiramente não há questão mais fundamental que a da soberania, sendo o seu esquecimento a garantia das piores catástrofes, então é tempo de virar ao contrário a frase que se diz ter dado a vitória eleitoral a Bill Clinton, aliás um globalizador encartado e um artífice notório do mundo em derrocada dos nossos dias: é a política, estúpido!
Em Abril, esperanças mil
É esta 6ª feira, na Cantina Velha da Cidade Universitária, em Lisboa (mais informações aqui). Pediram-me para falar de economia. Quase que me apetece cantar o "E depois do adeus". Para já falarei apenas do fim de um romance - e no que vem depois.
quinta-feira, 19 de abril de 2012
Que sirva de exemplo
De resto, acompanho Guerreiro: que a decisão argentina de renacionalizar, o prefixo re é relevante, a YPF sirva de exemplo, pelo menos nas periferias europeias, já que é uma decisão alinhada com as tendências regionais e internacionais de incremento do controlo público das empresas que exploram recursos estratégicos para a vida económica de um país, deixando a Argentina de ser excepção no campo petrolífero. Uma decisão também consistente, como sublinha Weisbrot, com o notável percurso argentino depois da ruptura, há dez anos, com as desastrosas políticas neoliberais que agora estão sendo replicadas na periferia europeia.
Aqui é preciso começar por notar que ¾ da quebra económica argentina, num total de mais de 20% de quebra do PIB, ocorreram antes da ruptura, simbolizada pelo incumprimento da dívida, com as políticas neoliberais. Na altura os Financial Times e as The Economist, diziam que ia ser um desastre. Foi o que se viu…
Só superando a arrogância desinformada de que Guerreiro dá mostras ao longo de todo artigo – de “a Argentina está a sair de uma intervenção traumática do FMI, iniciada em 2001, quando um país rico ficou subitamente pobre” a um notável conceito de bolha salarial no Brasil sem respeito pelos dados - é que podemos aprender com quem encetou um caminho que, no caso argentino passou pelo incumprimento, pela desvalorização cambial e por uma política de recuperação do mercado interno, ainda mais importante do que a recuperação do mercado externo, e onde as políticas sociais desempenharam um papel relevante. Um caminho que reverteu parcialmente decisões desastrosas como a da privatização da segurança social e que pouco a pouco está reconstruindo as bases de um Estado estratego que tem de ter algum controlo sobre os fluxos económicos e assegurar investimentos (coisa que a Repsol não estava inclinada a fazer...).
Reconstruir as bases materiais mínimas da soberania democrática tem riscos? Claro que sim. Mas a política da troika apoiada por Guerreiro só nos dá certezas: depressão e saque. Como nos diz Larry Elliot, editor de Economia do The Guardian: “A não ser que os dirigentes politicos na Europa consigam oferecer aos seus cidadãos algo mais mobilizador do que a austeridade permanente, um passeio pela avenida Buenos Aires tornar-se-á cada vez mais atraente.”
Testemunhos
Do comentário que o leitor António Nunes deixou aqui, a propósito da decisão governamental de encerramento da Maternidade Alfredo da Costa.
quarta-feira, 18 de abril de 2012
O ouro e os bandidos II
Segundo o Jornal de Negócios o IGCP, Instituto de Gestão do Crédito Público (instituição que gere a dívida portuguesa), tem um novo director. As duas linhas de currículo falam por si:
"João Moreira Rato é director executivo do Morgan Stanley em Londres e sócio de um "hegde fund". Antes esteve no Goldman Sachs."
Sobre a Morgan Stanley e os seus negócios com dívida soberana vejam o meu post sobre a Itália mais abaixo.
O ouro e os bandidos
«Enquanto não se livraram do fundo de pensões dos seus funcionários, os bancos não descansaram. Agora, que provaram ser incapazes de gerir convenientemente a reforma de alguns milhares de trabalhadores, o governo quer entregar-lhes a gestão parcial da reforma da generalidade dos cidadãos. Faz sentido, não faz?»
Pedro Sales (via facebook).
(Ver também este post do Sérgio Lavos, que inclui a opinião de um insuspeito José Gomes Ferreira sobre a intenção do governo em avançar com o plafonamento das pensões).
terça-feira, 17 de abril de 2012
Decapitar a excelência?
«A maternidade Alfredo da Costa é a que maior número de partos realiza e a de maior diferenciação técnica e tecnológica nas complexas áreas da gravidez de alto risco e dos cuidados neonatais. Não se percebe que se destrua uma unidade tão valiosa e permaneçam em funcionamento maternidades com menos partos, recursos e diferenciação. (...) Desmembrá-la, destruí-la, será sempre um prejuízo de enormes dimensões para o SNS, por mais poupanças que as contas mesquinhas e medíocres destes governantes possam fazer e anunciar.»
João Semedo (Esquerda.net)
«No reino da austeridade nunca há cortes cegos. Os seus ideólogos têm sempre uma retórica de justificação preparada que serve acima de tudo para dar uma aparência técnica a decisões que não são senão escolhas políticas. (…) A decisão de encerrar a Maternidade Alfredo da Costa em Lisboa é um caso paradigmático. (…) O desempenho daquela unidade do Serviço Nacional de Saúde é conhecido de todos. (…) Ao que é quantificável acresce o muito que não se pode quantificar: uma cultura de interdisciplinaridade que permite potenciar o bom tratamento e o sucesso no acompanhamento das suas utentes.»
José Manuel Pureza (Diário de Notícias)
Não é preciso ter tido alguma vez contacto directo com os serviços da Maternidade Alfredo da Costa para perceber que se está perante uma unidade pública de saúde de excelência. Numa passagem pela MAC (e sobretudo se esta permitir observar a qualidade de funcionamento dos diferentes serviços e a amadurecida articulação que existe entre eles), a constatação torna-se plena: à capacidade técnica e profissional irrepreensíveis alia-se um cuidado humano inexcedível. E de ambos beneficiam, sem qualquer espécie de diferenciação social ou económica, todas as mulheres e crianças que a maternidade acolhe. A MAC é, a todos os títulos, um modelo de como deve funcionar uma unidade que presta cuidados de saúde.
Mas tendo o privilégio de passar pela MAC, constata-se ainda outra evidência: esta maternidade recebe e resolve com sucesso a maior parte dos casos de complicações (que muitas vezes colocam em risco a vida das mães e dos bebés) provenientes de maternidades do sector privado. Como em tantos outros domínios, quando algo começa a correr mal no privado (ou quando este não tem, manifestamente, capacidade para resolver situações mais complexas), é ao sistema público que se recorre. Em diversos serviços da Maternidade Alfredo da Costa existem placards onde são afixadas fotografias e cartas de agradecimento. Escritas por pais e crianças cujas vidas foram salvas, muitas vezes in extremis, pela MAC, depois de intervenções mal sucedidas no privado.
Não existe, de facto, nenhuma razão válida para encerrar a Maternidade Alfredo da Costa. Como demonstra, aliás, a sucessão incongruente de justificações que o ministro Paulo Macedo procurou adiantar: do supostamente escasso número de partos (entretanto desmentido pela própria realidade), a uma discutível orientação científica que recomendaria a integração das maternidades em hospitais, passando pela desculpa intencionalmente distorcida de que a decisão de encerrar a MAC remonta ao anterior governo (ou mesmo a tentativa de criar, literalmente, uma cortina de fumo, com o anúncio da intenção de proibir fumar em automóveis com crianças, que não passa de uma ficção assente num «não-problema», mas suficientemente polémica para tentar desviar as atenções).
Todas as suspeitas sobre os verdadeiros motivos que estão por detrás da decisão de encerramento da MAC têm, por isso, fundamento: da intenção de venda do edifício, localizado numa apetitosa zona do centro de Lisboa, à pretensão de extinguir as unidades de excelência do SNS, de modo a facilitar a concorrência aos privados e alimentar o mito (cada vez mais evidentemente falso) da falta de qualidade dos serviços públicos.
Adenda: Quando Henrique Raposo refere que tudo é bom na MAC excepto o edifício (sem cuidar de deduzir o que pensam os profissionais da maternidade a esse respeito), não só invoca um argumento que o ministro não adiantou como esquece certamente todas as obras de requalificação entretanto realizadas (nas quais o Estado, e muito bem, investiu) e todas as melhorias que ainda podem ser feitas. E esquece ainda (e sobretudo) o mais importante: que é preferível ter excelentes cuidados de saúde em instalações modestas, do que cuidados de saúde modestos em instalações de luxo.
segunda-feira, 16 de abril de 2012
Pressões
Se há país que ilustra na perfeição a natureza cíclica da posição das finanças públicas numa economia capitalista é a Espanha. Os excedentes orçamentais e a dívida pública baixa, que chegou a uns 30% do PIB, foram a tradução da economia do tijolo alimentada pelo endividamento privado e pelos fluxos de capitais europeus. Os défices, a partir de 2008, e a duplicação da dívida pública, foram a inevitável tradução do rebentamento da bolha imobiliária, da fragilidade financeira e do esforço dos privados para reequilibrarem os seus balanços, gerando quebras das receitas fiscais. Uma crise que foi responsável por um desemprego que mais do que duplicou, ultrapassando os 20%. Uma crise que, estruturalmente, revela bem os resultados da financeirização das economias. Assistimos à passagem da dívida privada para a dívida pública e à confirmação da sua imbricação mesmo num país que perdeu a sua soberania monetária e cujos dirigentes teriam, também por isso, de desafiar o arranjo europeu, em vez de se limitarem a obedecer e a encenar um patético “não somos Portugal”. A Espanha e a Itália juntas ultrapassam a Alemanha em termos económicos. Os PIIGS unidos poderiam forçar uma solução para crise com escala europeia. Mas não se passa nada.
Argentina II
Para um breve peça sobre o desempenho económico argentino, vale a pena ler o artigo de John Weeks, publicado hoje pelo Centre for Development Policy and Research, da SOAS.
Argentina I
Fernando Solanas, realizador do documentário, foi baleado depois de ter denunciado publicamente o processo de privatização.
Hoje
A partir das 17.30h, no Auditório do Centro de Informação Urbana de Lisboa (Picoas Plaza), sessão de apresentação pública do Observatório sobre Crises e Alternativas, criado no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Intervenções de Boaventura de Sousa Santos, Carvalho da Silva e Raymond Torres (Director do Instituto para os Estudos Laborais da Organização Internacional do Trabalho).
domingo, 15 de abril de 2012
Anatomia de Gray
Economia crítica
"No entanto, a recuperação está longe de ser uma realidade. O ajustamento à euforia financeira dos anos noventa está por fazer e o enorme fardo da dívida que pesa sobre a economia norte-americana não permite antever um futuro sorridente. A instabilidade financeira, como já analisámos, está inscrita neste novo período do capitalismo. O futuro parece sombrio. No caso europeu, a situação é ainda mais complexa (…) sem capacidade orçamental para contrariar a recessão, ao contrario dos EUA. Com o endurecimento do pacto de estabilidade, a economia europeia parece destinada à euroesclerose de que se falava nos anos noventa." [minha tradução]
Para além de dois artigos em livros colectivos, da vasta obra de Plihon, julgo que está apenas editado em português o seu livro O Novo Capitalismo, em 2004 pela Campo da Comunicação, que tive o prazer de traduzir. Júlio Mota, Luís Lopes e Margarida Antunes, co-autores, entre outros, deste artigo sobre a crise, estão de parabéns por mais esta iniciativa.
sábado, 14 de abril de 2012
Naufrágios
Um século mais tarde, não é difícil ver na Europa a repetição sinistra e metafórica de um Titanic que se afunda. Após décadas em que se deram passos condignos com os ideais que o inspiraram (paz, prosperidade e solidariedade entre os povos), o projecto europeu tranformar-se-ia (sobretudo a partir de Maastricht e com a criação da Zona Euro), numa ardilosa obra da engenharia neoliberal, que rompe com a visão de futuro que Monnet e Schumman projectaram, no pós-guerra, para o velho continente.
Uma arquitectura institucional assimétrica e um modelo de governação económica europeia disfuncional (que tratou, por exemplo, de esboroar eficazmente os mecanismos de controlo público dos sistemas bancário e financeiro e de amputar o BCE das competências inerentes a um verdadeiro banco central), a par de uma moeda que se revelaria implacável para com as economias do Sul, fariam com que a Europa estremecesse, logo ao primeiro embate, com a crise financeira de 2007, iniciada nos Estados Unidos com o colapso do subprime.
Tal como no Titanic, em que muitos dos viajantes de primeira classe davam como certo conseguir escapar ao naufrágio – reservando assim o infortúnio aos passageiros dos andares inferiores – também nos dias que correm os líderes dos países do centro europeu parecem supor que, enquanto o barco se afunda, apenas as periferias ficarão eventualmente para trás.
Talvez também por isso, mas sobretudo pela crença fanática nos sortilégios salvíficos da austeridade, os actuais líderes europeus se assemelhem a uma perigosa orquestra, medíocre e obstinada, que insiste em tocar (ou simplesmente deixar que continue a ser tocada) a melodia responsável pelo afundamento do navio. Por mais que se somem os sinais e as evidências do suicídio que resulta das suas opções e da recusa em não fazer o que há muito deveria estar a ser feito. Longe, muito longe, da sobriedade digna e corajosa dos membros da orquestra do Titanic.
sexta-feira, 13 de abril de 2012
Este texto não é sobre Mélenchon
É sobre o artigo do Público sobre o candidato às presidenciais francesas. Bem sei que os jornais estão a viver duramente a crise e que não há dinheiro para correspondentes estrangeiros. Sei também que não há dinheiro para pagar decentemente peças aos jornalistas em "free-lance" que vivem em França. O Público era aquele jornal que tinha uma excelente correspondente em Paris nos anos noventa, Ana Navarro Pedro, mas que agora cobre as eleições pela internet.
Mas o problema nem chega a ser esse. O problema é ter um artigo de uma página sobre Mélenchon em que lemos: 1- "o trotskista Melenchon"; 2- "a esta tendência (do PSF, liderada por Mélenchon) foram assacadas culpas pelo desastre de 2002 - quando Jospin não passou à segunda volta das presidenciais, batido por Jean-Marie Le Pen, então líder da FN." ; 3- "Mélenchon e os seus comícios que o jornal Figaro (tendência próxima do Eliseu) descreve como "semelhantes às grandes missas tele-evangélicas" dos EUA." 4- "Por causa da campanha de Mélenchon pelo não em 2005, não pôde candidatar-se à presidência em 2007 (Hollande liderava então o PS)."
Ou seja, temos um artigo sobre um candidato com um conjunto de mentiras, e leituras, no mínimo, enviesadas - não por acaso, os três jornais citados (Le Parisien, La Croix, Le Figaro) são os jornais mais à direita de França. De resto, pouco explica o dinamismo da campanha: o artigo enuncia três propostas do programa e dá conta dos dotes oratórios do candidato. Até na Internet se faz melhor...