terça-feira, 31 de outubro de 2017
Lançamento
Hoje, pelas 18h, terá lugar, na Almedina Estádio Cidade de Coimbra, a sessão de lançamento do livro Trabalho e Políticas de Emprego. Um Retrocesso Evitável. Este livro, coordenado por Manuel Carvalho da Silva, Pedro Hespanha e José Castro Caldas, será apresentado por João Leal Amado e João Reis, Professores da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e especialistas em Direito do Trabalho.
Foi a pensar neste livro, nas consequências do retrocesso, ainda por reverter, do tempo da troika na área que mais conta, a das relações laborais, que defendi que a nossa economia política é o trabalho. De facto, só superando as ficções politicamente influentes da economia convencional, que tudo faz para invisibilizar as mais importantes relações de poder, é possível ver o que se passa realmente, por exemplo e uma vez mais, no só aparentemente glamoroso sector do turismo: trabalhadoras do Grupo Pestana laboram 12 horas e sem condições. Aliás, algumas das declarações mais agressivas em matéria de relações laborais de que lembro do tempo da troika vieram precisamente de patrões deste sector. Quase nada acontece por acaso na economia política.
segunda-feira, 30 de outubro de 2017
Pressões há muitas
A ampla adesão à greve da passada sexta-feira é uma boa notícia para os querem que a actual solução governativa seja mais do que a paragem temporária do comboio que ruma em direcção ao abismo. É que o governo está sempre sujeito a fortes pressões de cima, por parte das instituições políticas estrangeiras, da CE ao BCE, e dos aliados nacionais destas. Além disso, há muitos dentro do governo cujo poder depende em grande medida dessas pressões.
Também por isto, por uma questão de freios e contrapesos, é necessário que haja fortes pressões sociais e políticas de baixo, que sejam levadas para dentro da solução governativa, para o parlamento. Caso contrário, a erosão dos serviços públicos e as consequências das contra-reformas laborais da troika, cuja reversão não dá sinais de avançar, continuarão a fazer-se sentir.
Na altura da frente popular francesa e do amplo e largamente espontâneo movimento grevista que estimulou, em 1936, houve quem dissesse: “é necessário saber acabar com uma greve”. O resto da frase, como sublinhou o historiador João Arsénio Nunes, é menos conhecido: “desde que se obtenha um resultado satisfatório”. Hoje, esta capacidade aplica-se também à sabedoria necessária para a iniciar, num contexto de medo e fragmentação sociais. É realmente preciso pressão social organizada de baixo para obter e consolidar ganhos. Sem medo dos eventuais recuos, antes com esperança nos eventuais avanços.
Também por isto, por uma questão de freios e contrapesos, é necessário que haja fortes pressões sociais e políticas de baixo, que sejam levadas para dentro da solução governativa, para o parlamento. Caso contrário, a erosão dos serviços públicos e as consequências das contra-reformas laborais da troika, cuja reversão não dá sinais de avançar, continuarão a fazer-se sentir.
Na altura da frente popular francesa e do amplo e largamente espontâneo movimento grevista que estimulou, em 1936, houve quem dissesse: “é necessário saber acabar com uma greve”. O resto da frase, como sublinhou o historiador João Arsénio Nunes, é menos conhecido: “desde que se obtenha um resultado satisfatório”. Hoje, esta capacidade aplica-se também à sabedoria necessária para a iniciar, num contexto de medo e fragmentação sociais. É realmente preciso pressão social organizada de baixo para obter e consolidar ganhos. Sem medo dos eventuais recuos, antes com esperança nos eventuais avanços.
domingo, 29 de outubro de 2017
sexta-feira, 27 de outubro de 2017
Ideias que fazem o seu caminho numa Europa anti-social...
Há duas ideias que tenho aqui divulgado de forma insistente, de alguma forma ligadas pela questão da soberania, e que procurei sistematizar no capítulo que escrevi para o livro do blogue, Economia com Todos (síntese do argumento nesta crónica do Público): (1) o neoliberalismo é uma forma de mobilização selectiva e pós-democrática do poder estatal para construir novos mercados, para reforçar o poder capitalista, em múltiplas áreas e escalas, mas que procura mascarar ideologicamente tal facto (na verdade, se se ler muitos autores desta tradição plural e que vem de longe, as coisas até estão lá expostas de forma relativamente transparente); (2) uma das razões intelectuais para a fraqueza das oposições políticas a esta razão ainda desgraçadamente dominante radica na impotente natureza globalista da maioria do pensamento sobre as supostas alternativas, que também desta forma nunca vêem a luz do dia.
Apesar de ainda minoritários, creio que são cada vez mais os que nas ciências sociais e humanas, incluindo a economia política crítica, têm vindo a elaborar e a popularizar ideias destas. Até numa das publicações da principal vítima ideológica do neoliberalismo, a social-democracia europeia, chamada Social Europe, estas ideias fazem o seu caminho, por exemplo pelas mãos de William Mitchell e de Thomas Fazi, num artigo excelente e que merece tradução e ampla divulgação por cá: “A guerra à soberania foi na essência uma guerra à democracia. Este processo foi levado às suas conclusões mais extremas na Europa ocidental, onde o Tratado de Maastricht incrustou o neoliberalismo no centro da mecânica da UE, proibindo as políticas ditas keynesianas que tinham sido comuns nas décadas anteriores”.
Apesar de ainda minoritários, creio que são cada vez mais os que nas ciências sociais e humanas, incluindo a economia política crítica, têm vindo a elaborar e a popularizar ideias destas. Até numa das publicações da principal vítima ideológica do neoliberalismo, a social-democracia europeia, chamada Social Europe, estas ideias fazem o seu caminho, por exemplo pelas mãos de William Mitchell e de Thomas Fazi, num artigo excelente e que merece tradução e ampla divulgação por cá: “A guerra à soberania foi na essência uma guerra à democracia. Este processo foi levado às suas conclusões mais extremas na Europa ocidental, onde o Tratado de Maastricht incrustou o neoliberalismo no centro da mecânica da UE, proibindo as políticas ditas keynesianas que tinham sido comuns nas décadas anteriores”.
Hoje e amanhã
«O mundo do trabalho é hoje marcado por transformações muito profundas, que o atravessam em múltiplas dimensões. Do impacto das políticas de austeridade à crescente precarização das relações laborais, das questões do sindicalismo às novas formas de emprego e desemprego, dos impactos da inovação tecnológica e dos desafios imensos que transportam consigo. O trabalho tem futuro? O futuro tem trabalho? Em que moldes? Qual é o lugar do trabalho no mundo que se está a desenhar à nossa frente? Como pensar, politicamente, os desafios que se nos colocam?»
Com a participação de Ana Drago, Richard Hyman, Daniel Carapau, Rebecca Gumbrell-McCormick, José Abraão, Vivalda Silva, Filipe Lamelas, Manuel Freitas, Paulo Areosa Feio, Reinhard Naumann, João Ramos de Almeida, José Luís Albuquerque, Nuno Teles, Porfírio Silva, José Soeiro, Manuel Carvalho da Silva, Tiago Barbosa Ribeiro, Diogo Martins. Moderação das sessões e dos debates a cargo de Henrique Sousa, Nuno Serra, Filipa Vala, Ricardo Paes Mamede e José Vítor Malheiros. É no auditório da Pousada da Juventude do Parque das Nações, em Lisboa. Apareçam.
quinta-feira, 26 de outubro de 2017
Fórum de Outono da Manifesto: Conferências
Conferência Inicial: «O passado, o presente e os futuros possíveis do Trabalho: estamos à altura do desafio?», por Richard Hyman (Professor Emérito de Relações Industriais na London School of Economics e fundador do European Journal of Industrial Relations e da Industrial Relations in Europe Conference, IREC).
A intervenção de abertura do fórum, que marca o início dos trabalhos, realiza-se na sexta-feira 27, a partir das 18h30, estando a cargo de Ana Drago (socióloga, investigadora de estudos urbanos e membro da direção da Fórum Manifesto). A sessão de encerramento, às 19h30 de sábado, será proferida por Diogo Martins (mestre em Economia Monetária e Financeira e consultor do Conselho Económico e Social).
A inscrição, gratuita mas obrigatória, no Fórum de Outono «O trabalho do futuro - o futuro do trabalho» pode ser feita aqui.
quarta-feira, 25 de outubro de 2017
O escorpião
Para todos aqueles que julgavam que Marcelo Rebelo de Sousa deixara, com a idade, de ser o escorpião que não resiste à sua natureza, eis que ele ressurge por entre os afectos.
Disse Marcelo nos Açores (emitido no Telejornal de hoje):
Mas para Marcelo nada disso contará. Ou tudo fará para que isso não conte.
A partir de agora, Marcelo vai passar, através das suas intervenções, a responsabilizar também os dois partidos que apoiam o Governo. E isso tem dois efeitos:
1) obrigará os dois partidos a tentar demarcar-se ainda mais do Governo para evitar os efeitos das mensagens do presidente, o que, a acontecer, fragilizará continuamente o Governo;
2) Se as coisas correrem mal a este PS que está no Governo, a direita emergirá - em bloco - como alternativa e, por sua vez, fará emergir a direita do PS para substituir Costa.
Ou seja, tudo isto tem tudo a ver com "agitação política".
Resta saber se a consciência dos portugueses socialistas, bloquistas e comunistas não irá avivar-se e começar a afirmá-lo nas sondagens de popularidade do presidente da República. Marcelo arrisca-se a muito, porque poderá ver o seu papel e o seu capital político reduzido.
E pensar que alguém vê afectos em tudo isto...
PS: as informações surgidas do dia seguinte a esta crónica, dão mostras de um PS disposto a partir a louça (até aqui) e de um Presidente que está já a perder o pé e a cair na guerrilha política.
Disse Marcelo nos Açores (emitido no Telejornal de hoje):
Por outras palavras, a estratégia do presidente da República é transformar uma moção de censura à forma como o Governo actuou nos incêndios numa espécie de cimento, em que o Bloco de Esquerda e o PCP, por muito que esperneiem, ficaram colados para sempre ao Governo. Isto apesar de tanto o Bloco como o PCP se terem demarcado do Governo - em diversas matérias e até na questão dos incêndios, vidé o que se passou na sessão parlamentar.
A clarificação efectuada no Parlamento convida-nos agora a passar a uma nova fase. E a nova fase é esperar do Governo e esperar dos partidos políticos estarem à altura da confiança parlamentar e sobretudo das expectativas altas e das exigências dos portugueses. É o que nós esperamos. Isto não tem nada de agitação política.
Mas para Marcelo nada disso contará. Ou tudo fará para que isso não conte.
A partir de agora, Marcelo vai passar, através das suas intervenções, a responsabilizar também os dois partidos que apoiam o Governo. E isso tem dois efeitos:
1) obrigará os dois partidos a tentar demarcar-se ainda mais do Governo para evitar os efeitos das mensagens do presidente, o que, a acontecer, fragilizará continuamente o Governo;
2) Se as coisas correrem mal a este PS que está no Governo, a direita emergirá - em bloco - como alternativa e, por sua vez, fará emergir a direita do PS para substituir Costa.
Ou seja, tudo isto tem tudo a ver com "agitação política".
Resta saber se a consciência dos portugueses socialistas, bloquistas e comunistas não irá avivar-se e começar a afirmá-lo nas sondagens de popularidade do presidente da República. Marcelo arrisca-se a muito, porque poderá ver o seu papel e o seu capital político reduzido.
E pensar que alguém vê afectos em tudo isto...
PS: as informações surgidas do dia seguinte a esta crónica, dão mostras de um PS disposto a partir a louça (até aqui) e de um Presidente que está já a perder o pé e a cair na guerrilha política.
Como se reconstrói um velho Estado?
As medidas e investimentos anunciados pelo governo no seguimento dos incêndios contêm elementos positivos, ainda que o diabo do regime austeritário europeu possa estar em alguns detalhes. Para lá dos naturais apoios directos às populações afectadas, que têm de ser rápidos e em força, destaco três medidas: aumenta o emprego público, com quinhentos novos sapadores florestais e cinquenta novos vigilantes da natureza; o Estado torna-se accionista, para já majoritário, da rede SIRESP; as forças armadas são valorizadas, com a força área a assumir tarefas de gestão dos meios aéreos de combate aos fogos, esperando que esta mudança possa vir a contribuir para acabar com as prebendas oferecidas ao capitalismo do fogo.
O que é que estas três medidas podem ter em comum? Em contratendência com o espírito de uma época no campo das políticas públicas já com demasiados anos, reconhece-se implicitamente que a neoliberalização do Estado falhou. Note-se que o PS foi e ainda é, por exemplo no crucial sector bancário, um dos seus executores. Numa crónica de 2009, inspirado por uma formulação de Marx, associei este processo de neoliberalização ao tempo da corrupção geral, da venalidade universal. Mal imaginava. Contra esta confusão de esferas, é necessário mais emprego público, mais propriedade pública e instituições públicas com autoridade e prestígio para desenvolver uma acção pública adequada.
É claro que para tornar este processo consistente e profundo teremos de recuperar instrumentos de política entretanto perdidos. Sim, sem soberania, a autoridade democrática é desfeita, sendo preciso não esquecer, já gora, que esta autoridade é sempre exercida num território com fronteiras, questão também de identidade e de responsabilização colectivas.
Fórum de Outono da Manifesto: Sessões
As propostas de reforma das relações de trabalho em Portugal
Sábado, 28 de outubro, 10h30: Sessão com Filipe Lamelas (Comissão do Livro Verde sobre as Relações Laborais), Manuel Freitas (FESETE), Paulo Areosa Feio (geógrafo), Reinhard Naumann (investigador). Moderação de Nuno Serra.
«Muito para lá do objetivo de consolidação orçamental, a “reforma do mercado de trabalho” tratou sobretudo de criar as condições necessárias a um modelo económico assente em baixos salários e desregulação laboral. Num quadro político de entendimentos à esquerda – mas balizado pelas metas e regras de Bruxelas – como equacionar a reversão das reformas do Governo anterior? Em que modelo de relações laborais se devem empenhar os partidos da solução governativa? Como gerir as suas divergências e as previsíveis resistências de Bruxelas? Como robustecer o valor e a dignidade do trabalho?»
Mitos, ideias feitas, conceitos e indicadores sobre o trabalho
Sábado, 28 de outubro, 14h30: Sessão com João Ramos de Almeida (economista), José Luís Albuquerque (economista). Moderação de Filipa Vala.
«As relações laborais irão marcar o debate político-partidário nos próximos anos. A asfixia económica conduziu à segregação social de 1,5 milhões de pessoas, sem trabalho ou a querer mais trabalho, desprotegidas pelos cortes na proteção ao desemprego e apoios sociais. A desarticulação da contratação coletiva e as alterações na legislação laboral do governo anterior contribuíram para o corte salarial, a aceleração de tempos de trabalho e para a concretização da possibilidade de cortar salários nominais, através da rotação contratual. Estará a recuperação económica atual a alterar a realidade criada pela “reforma laboral” do anterior governo?»
A revolução tecnológica e o trabalho
Sábado, 28 de outubro, 16h00: Sessão com Nuno Teles (economista), Porfírio Silva (filósofo). Moderação de Ricardo Paes Mamede.
«Os impactos da revolução tecnológica são questões centrais nos debates promovidos atualmente pela Organização Internacional do Trabalho ou o Fórum Económico Mundial (Davos). A robotização e a Inteligência Artificial ameaçam o emprego de forma distinta de outros momentos de impacto de inovação tecnológica na economia, porque expandem o processo de automação, substituindo crescentemente trabalho dito qualificado. Debateremos a relação entre trabalho e inovação no contexto internacional, que combina desemprego e estagnação económica (cujas causas estão longe de ser tecnológicas), a “uberização” do emprego e os desafios tecnológicos da economia internacional no contexto específico português.»
A inscrição, gratuita mas obrigatória, no Fórum de Outono «O trabalho do futuro - o futuro do trabalho» pode ser feita aqui.
terça-feira, 24 de outubro de 2017
Perto do fogo
Seriam quase oito da noite quando o Intercidades da Beira Alta ficou retido em Santa Comba, depois de deixar para trás uma coluna de fumo à saída da Guarda e de ter passado perto de Seia, onde apesar da escuridão se podiam avistar uns dez focos de incêndio distintos. Dos restantes fogos do país sabia-se pelas notícias, com destaque para os de Leiria, Aveiro e Porto. Cerca de quinhentas ignições num só dia, um dia de outono.
Saindo do comboio, do lado direito, viam-se agora três a quatro clarões, aparentemente situados por detrás da cidade. À frente outros dois, mais distantes, sugerindo que o fogo andaria também perto de Mortágua. Do lado esquerdo da estação, a uma distância maior, via-se o clarão do incêndio que - saber-se-ia mais tarde - lavrava em Penacova. O cheiro a fumo era ainda relativamente ténue e difuso, permitindo supor que bastaria esperar duas ou três horas para que o comboio retomasse o seu curso. Apesar da hora, o ar era quente e, de quando em quando, chegava em golfadas. As pessoas foram saindo das composições, preferindo vaguear na plataforma ou aproveitar para avisar alguém do atraso certo que o comboio iria ter, apesar de uma das três redes de telemóvel estar inoperacional e outra funcionar de modo intermitente.
Com o passar do tempo a informação tornou-se cada vez mais escassa, avolumando as dúvidas sobre o momento em que seria possível prosseguir viagem e se a mesma se faria de comboio ou por ligação de autocarro a outra estação mais à frente. Embora preocupadas e perplexas com os vários focos de incêndio (em particular com a linha contínua de fogo que agora se desenhava por detrás de uma Santa Comba às escuras) e a situação absolutamente anómala do país naquele 15 de outubro, numa noite que parecia de agosto, as pessoas estavam calmas. Quando falha a iluminação pública, afetando a estação e o aglomerado de casas em redor, os clarões aumentam de intensidade, tornando agora mais fácil imaginar a «cegueira» provocada pelas chamas a quem delas estivesse próximo, em combate noturno. Seriam já dez da noite quando se ouve um motor no céu e surgem as luzes de um avião a afastar-se, assinalando que a partir daqui o combate aéreo deixava de ser possível.
O ar foi ficando progressivamente mais denso, com o fumo já bem visível e a chegar por vezes em baforadas, impulsionadas por um vento quente e seco que mudava constantemente de direção e intensidade. Com esta oscilação errática, alguns dos focos de incêndio pareciam esmorecer por momentos, para depois recrudescer com redobrada força. Apesar da distância, ouvia-se de quando em quando o crepitar do fogo, intercalado por explosões, com uma intensidade maior do que à partida se poderia supor. O ar foi-se tornando cada vez menos respirável, não só pelo aumento do fumo, mas também pelo efeito de saturação. E é então que se tem melhor noção de uma segunda dificuldade do combate direto em circunstâncias como estas: para além das chamas e do calor, impulsionados pelo vento, também o fumo pode tornar impossível a aproximação a um fogo, limitando as possibilidades de o conter. Isso era cada vez mais claro: estava-se perante incêndios praticamente indomáveis, ninguém se surpreendendo no fundo que os bombeiros, distribuídos pelas múltiplas frentes de fogo e insaciavelmente escassos face a estas condições, não tivessem ainda acorrido àquele lugar.
Seriam já duas da manhã quando um dos focos de incêndio se aproxima, após atravessar o IP3 e galgar a vertente arborizada entre o rio e a estação. Muito mais perto, o fogo tornava-se agora verdadeiramente avassalador, ameaçando as primeiras casas. Perante o perigo iminente, verificou-se se ainda estaria alguém dentro delas, tendo sido possível convencer as pessoas (algumas a dormir, não se tendo apercebido do evoluir da situação), a abandoná-las. Passou tudo a desenvolver-se de uma forma demasiado rápida e cada vez mais violenta e incontrolável, tornando inútil qualquer esforço para deter as chamas. Com a aproximação do fogo, começam a cair partículas incandescentes (cascas de árvore, paus e folhas), como se de flocos de neve se tratasse, atiradas pelo vento em todas as direções. Impressionava sobretudo o facto de não se apagarem durante o seu voo incerto, caindo ainda a arder a centenas de metros. A partir daí, a génese de novos focos de incêndio era apenas uma questão de sorte, percebendo-se melhor como surgiram as cerca de quinhentas ignições desse dia e porque razão havia tantos focos de incêndio em redor. Pelas três da manhã, chega um autocarro para evacuar as pessoas, já muito assustadas, para o Centro Cultural de Santa Comba, num percurso corajosamente repetido por entre o fumo, bermas a arder e troços de estrada por vezes demasiado estreitos e sinuosos.
Assisti e participei no combate a vários incêndios que deflagravam nas proximidades da minha aldeia, com a esperada pontualidade estival (na maior parte dos casos em agosto), há muitos anos atrás. Lembrava-me ainda do calor que se sente quando nos aproximamos das chamas, da irritação causada pelo fumo inalado e da sensação de pisar chão quente. Mas nada, nada se assemelha a estes incêndios e à atmosfera que os alimenta. De facto, sugerir que «nada mudou» (Assunção Cristas), ou que «calor e vento sempre houve» (Hugo Soares), significa não ter ainda percebido nada sobre as alterações que estão a ocorrer (ou, tendo percebido, significa algo bem pior que isso).
Saindo do comboio, do lado direito, viam-se agora três a quatro clarões, aparentemente situados por detrás da cidade. À frente outros dois, mais distantes, sugerindo que o fogo andaria também perto de Mortágua. Do lado esquerdo da estação, a uma distância maior, via-se o clarão do incêndio que - saber-se-ia mais tarde - lavrava em Penacova. O cheiro a fumo era ainda relativamente ténue e difuso, permitindo supor que bastaria esperar duas ou três horas para que o comboio retomasse o seu curso. Apesar da hora, o ar era quente e, de quando em quando, chegava em golfadas. As pessoas foram saindo das composições, preferindo vaguear na plataforma ou aproveitar para avisar alguém do atraso certo que o comboio iria ter, apesar de uma das três redes de telemóvel estar inoperacional e outra funcionar de modo intermitente.
Com o passar do tempo a informação tornou-se cada vez mais escassa, avolumando as dúvidas sobre o momento em que seria possível prosseguir viagem e se a mesma se faria de comboio ou por ligação de autocarro a outra estação mais à frente. Embora preocupadas e perplexas com os vários focos de incêndio (em particular com a linha contínua de fogo que agora se desenhava por detrás de uma Santa Comba às escuras) e a situação absolutamente anómala do país naquele 15 de outubro, numa noite que parecia de agosto, as pessoas estavam calmas. Quando falha a iluminação pública, afetando a estação e o aglomerado de casas em redor, os clarões aumentam de intensidade, tornando agora mais fácil imaginar a «cegueira» provocada pelas chamas a quem delas estivesse próximo, em combate noturno. Seriam já dez da noite quando se ouve um motor no céu e surgem as luzes de um avião a afastar-se, assinalando que a partir daqui o combate aéreo deixava de ser possível.
O ar foi ficando progressivamente mais denso, com o fumo já bem visível e a chegar por vezes em baforadas, impulsionadas por um vento quente e seco que mudava constantemente de direção e intensidade. Com esta oscilação errática, alguns dos focos de incêndio pareciam esmorecer por momentos, para depois recrudescer com redobrada força. Apesar da distância, ouvia-se de quando em quando o crepitar do fogo, intercalado por explosões, com uma intensidade maior do que à partida se poderia supor. O ar foi-se tornando cada vez menos respirável, não só pelo aumento do fumo, mas também pelo efeito de saturação. E é então que se tem melhor noção de uma segunda dificuldade do combate direto em circunstâncias como estas: para além das chamas e do calor, impulsionados pelo vento, também o fumo pode tornar impossível a aproximação a um fogo, limitando as possibilidades de o conter. Isso era cada vez mais claro: estava-se perante incêndios praticamente indomáveis, ninguém se surpreendendo no fundo que os bombeiros, distribuídos pelas múltiplas frentes de fogo e insaciavelmente escassos face a estas condições, não tivessem ainda acorrido àquele lugar.
Seriam já duas da manhã quando um dos focos de incêndio se aproxima, após atravessar o IP3 e galgar a vertente arborizada entre o rio e a estação. Muito mais perto, o fogo tornava-se agora verdadeiramente avassalador, ameaçando as primeiras casas. Perante o perigo iminente, verificou-se se ainda estaria alguém dentro delas, tendo sido possível convencer as pessoas (algumas a dormir, não se tendo apercebido do evoluir da situação), a abandoná-las. Passou tudo a desenvolver-se de uma forma demasiado rápida e cada vez mais violenta e incontrolável, tornando inútil qualquer esforço para deter as chamas. Com a aproximação do fogo, começam a cair partículas incandescentes (cascas de árvore, paus e folhas), como se de flocos de neve se tratasse, atiradas pelo vento em todas as direções. Impressionava sobretudo o facto de não se apagarem durante o seu voo incerto, caindo ainda a arder a centenas de metros. A partir daí, a génese de novos focos de incêndio era apenas uma questão de sorte, percebendo-se melhor como surgiram as cerca de quinhentas ignições desse dia e porque razão havia tantos focos de incêndio em redor. Pelas três da manhã, chega um autocarro para evacuar as pessoas, já muito assustadas, para o Centro Cultural de Santa Comba, num percurso corajosamente repetido por entre o fumo, bermas a arder e troços de estrada por vezes demasiado estreitos e sinuosos.
Assisti e participei no combate a vários incêndios que deflagravam nas proximidades da minha aldeia, com a esperada pontualidade estival (na maior parte dos casos em agosto), há muitos anos atrás. Lembrava-me ainda do calor que se sente quando nos aproximamos das chamas, da irritação causada pelo fumo inalado e da sensação de pisar chão quente. Mas nada, nada se assemelha a estes incêndios e à atmosfera que os alimenta. De facto, sugerir que «nada mudou» (Assunção Cristas), ou que «calor e vento sempre houve» (Hugo Soares), significa não ter ainda percebido nada sobre as alterações que estão a ocorrer (ou, tendo percebido, significa algo bem pior que isso).
segunda-feira, 23 de outubro de 2017
Eu e o vácuo
Por três vezes, Pedro Santana Lopes disse o seu nome na apresentação da sua candidatura à presidência do PSD. Disse-o com aquele dramatismo cinematográfico norte-americano para o qual as televisões convidadas não estavam preparadas:
[Até parecia a deixa de Russell Crowe em Gladiador, de Ridley Scott, quando se descobre diante do imperador malvado Joaquin Phoenix e diz: "O meu nome é Maximus Decimus Meridius, comandante dos exércitos do Norte, general das legiões Fénix, súbdito leal do verdadeiro imperador Marcus Aurelius, pai de um filho assassinado, marido de uma mulher assassinado e terei a minha vingança nesta ou na outra vida"]
E Santana Lopes disse-o igualmente de cada vez que falava no “meu partido”, ou quando dizia “não venho negar o que disse antes, venho assumir quem sou e o que fui até hoje”, ou “quando o partido precisou de mim estive presente” ou “o partido de que me orgulho”.
Santana Lopes parece achar que o centro lhe é devido. As prolongadas alfinetadelas a críticos são uma forma igualmente de dizer que o expurgo dos impuros – Santana chamou-lhe “clarificação” - é possível e será feito consigo, para bem do “seu partido”.
“Unir, mas sem equívocos”, será o lema. E isso quer dizer o quê? O partido que Santana Lopes quer “unir depois de clarificar” deverá ir para algum lado. Mas esse destino não é claro. Frases como “a vida é feita de vitória e derrota e de vitória outra vez” ou “Somos um partido que nasceu para ganhar”, não diz absolutamente nada. O programa que traçou foi pobre. Talvez porque ainda está a ser feito, com “Telmo Faria, Teresa Morais, o Silvério Regalado, e tantos outros, com base numa plataforma colaborativa”.
Santana Lopes tentou alguns pontos:
“Chamo-me Pedro Santana Lopes e sou candidato”. Ou “Disse o meu nome, pai de cinco filhos, avô de quatro netos, divorciado, mas bem na sua vida pessoal. Orgulho-me de tudo o que fiz e com 61 anos quero trazer as camadas mais jovens de 30, de 40 anos, e fazer delas a base do trabalho que vou realizar, sempre numa perspectiva de intergeracionalidade.
[Até parecia a deixa de Russell Crowe em Gladiador, de Ridley Scott, quando se descobre diante do imperador malvado Joaquin Phoenix e diz: "O meu nome é Maximus Decimus Meridius, comandante dos exércitos do Norte, general das legiões Fénix, súbdito leal do verdadeiro imperador Marcus Aurelius, pai de um filho assassinado, marido de uma mulher assassinado e terei a minha vingança nesta ou na outra vida"]
E Santana Lopes disse-o igualmente de cada vez que falava no “meu partido”, ou quando dizia “não venho negar o que disse antes, venho assumir quem sou e o que fui até hoje”, ou “quando o partido precisou de mim estive presente” ou “o partido de que me orgulho”.
Santana Lopes parece achar que o centro lhe é devido. As prolongadas alfinetadelas a críticos são uma forma igualmente de dizer que o expurgo dos impuros – Santana chamou-lhe “clarificação” - é possível e será feito consigo, para bem do “seu partido”.
“Nunca fui para a Aula Magna fazer sessões com o BE ou Mário Soares” [Pacheco Pereira], “Nunca fui para Associação 25 de Abril ouvir elogios de Vasco Lourenço na situação em que o partido salvava o país da bancarrota [Rui Rio]. Nunca fui para a Fundação Mário Soares com audiências de outros partidos (...) para dizer - quando em Novembro, Dezembro de 2013 se estava a conseguir a saída limpa - nunca fui para essas instituições dizer "a democracia está mais difícil, estamos a caminho de uma ditadura corporativa" e "fazer coro com os grandes adversários do meu partido” [António Capucho].
“Unir, mas sem equívocos”, será o lema. E isso quer dizer o quê? O partido que Santana Lopes quer “unir depois de clarificar” deverá ir para algum lado. Mas esse destino não é claro. Frases como “a vida é feita de vitória e derrota e de vitória outra vez” ou “Somos um partido que nasceu para ganhar”, não diz absolutamente nada. O programa que traçou foi pobre. Talvez porque ainda está a ser feito, com “Telmo Faria, Teresa Morais, o Silvério Regalado, e tantos outros, com base numa plataforma colaborativa”.
Santana Lopes tentou alguns pontos:
domingo, 22 de outubro de 2017
Fórum de Outono da Manifesto: Debates
Desafios e problemas actuais da organização dos trabalhadores
Sexta, 27 de outubro, 21h30: Debate com Daniel Carapau (Precários Inflexíveis), Rebecca Gumbrell-McCormick (Departamento de Gestão, Universidade de Londres), José Abraão (Secretário-Geral da FESAP), Guadalupe Simões (dirigente do SEP) e Vivalda Silva (Presidente do STAD). Moderação de Henrique Sousa.
«Sindicatos e outras formas de organização foram forjados pelos trabalhadores no processo de resistência e combate aos mecanismos de exploração do capitalismo. Foram e são determinantes para o avanço civilizacional e democrático que a conquista de direitos políticos, laborais e sociais significa. Mas a sindicalização desce, a participação sindical é baixa, a organização dos trabalhadores está ausente de muitas empresas, a solidariedade de classe e a mobilização social são duramente postos à prova. Sindicatos e direitos sofrem hoje o desgaste da segmentação, individualização e precarização do trabalho e da globalização neoliberal. Mudanças tecnológicas afectam profundamente os empregos e o trabalho do futuro. Como enfrentar isto e renovar e fortalecer o sindicalismo e a participação solidária dos trabalhadores? Que fazer e em que direcções, naquilo que depende dos próprios trabalhadores?»
A governação na área do trabalho na actual legislatura
Sábado, 28 de outubro, 17h45: Debate com José Soeiro (deputado do BE), Manuel Carvalho da Silva (sociólogo) e Tiago Barbosa Ribeiro (deputado do PS). Moderação de José Vítor Malheiros.
«Muito mudou para melhor graças à solução política de governo. Muito falta fazer. Propomos um balanço crítico dos progressos nas políticas laborais e sociais: Onde estão as medidas para a reforma da negociação e das relações coletivas do trabalho? Quando se concretizam medidas de combate à precariedade e ao abuso dos contratos a termo no público? E no privado? Para quando a prometida revogação da imposição legal do banco de horas individual? Para quando o reforço dos meios da Autoridade para as Condições do Trabalho? As reformas laborais necessárias poderão avançar sem as alterações no Código do Trabalho que a direita e os patrões rejeitam? É possível articular o governo, o parlamento e a concertação social para as políticas públicas laborais?»
A inscrição, gratuita mas obrigatória, no Fórum de Outono «O trabalho do futuro - o futuro do trabalho» pode ser feita aqui.
sábado, 21 de outubro de 2017
Como se destrói um velho Estado?
O ataque aos serviços, investimento e emprego públicos tem sido muito bem sucedido neste país, fazendo com que, por exemplo, tenhamos hoje a mais baixa percentagem de funcionários públicos no emprego total dos países da UE (p. 17 deste estudo). E o mesmo, já agora, se passa no investimento público nacional (em percentagem do PIB). Este esvaziamento do Estado não pode ser desligado do florescimento de um parasitismo privado à sua custa, feito de parcerias público-privadas, de subcontratações e de outras engenharias ruinosas, por um lado, e da sujeição do que resta de muitos activos públicos a uma lógica de rendibilidade financeira de curto prazo, como se o património público fosse uma empresa cotada em bolsa e submetida a accionistas impacientes e míopes, por outro.
Esta síntese dos processos de austeridade e de neoliberalização permanentes é genérica? Então olhem para o que se passa concretamente na gestão das florestas, onde a presença da propriedade pública se destaca de resto pela sua natureza residual no contexto internacional, através do dramático caso do Pinhal de Leiria, bem descrito no Público de hoje:
“No caso concreto do pinhal de Leiria, no final dos anos de 1970 havia na circunscrição florestal da Marinha Grande (que se dedicava quase em exclusivo ao pinhal e tinha orçamento próprio) 5 técnicos, 200 trabalhadores rurais e 40 guardas florestais. Hoje não há circunscrições e na Marinha Grande trabalham dois técnicos e 10 trabalhadores rurais – não há, como se sabe, guardas florestais. Após duas grandes reformas nos serviços em 1993 e 1998, os serviços florestais locais e circunscrições florestais regionais (3 no centro) passaram a estar centralizados no ICNF, em Lisboa”.
No mesmo jornal, num artigo de opinião, o geólogo Micael Jorge informa que, entre 2001 e 2009, as matas do Pinhal geraram 26,2 milhões de euros de lucros, enquanto que o valor investido foi de cerca de 2,7 milhões. Os custos sociais multidimensionais de um ataque ao Estado que leva décadas são cada vez mais elevados. Mas, claro, um Estado cada vez mais fraco no campo da provisão de bens e de serviços com utilidade social e que se comporta como se fosse uma cotada é um Estado cada mais vulnerável à captura por interesses capitalistas cada vez mais parasitários e um Estado em que os cidadão menos confiam. Este é um círculo vicioso destrutivo que poucos ganham em alimentar e muitos ganham em combater.
Sem o menor aviso
Quem vê a grandeza desta mulher (entrevista aqui), não tem a menor dúvida de que a preocupação de tantos comentários com a pequenina política (a relação de forças governo-oposição) ofende a dignidade dos mortos e passa ao lado do essencial, preparar o nosso futuro comum. Mesmo que haja presenças hipócritas nas manifestações que se realizam hoje, isso não me incomoda. Sabendo que não vivo num mundo perfeito, farei o que a minha consciência me diz. Quero estar, em espírito, ao lado desta mulher.
quinta-feira, 19 de outubro de 2017
Tentações
Quando se aceleram os ritmos de trabalho na comunicação social, há coisas que ficam pelo caminho.
Uma delas é capacidade de resistir à tentação de ser ligeiro e rápido. E o risco que se corre é o de - na versão mais benigna - haver uma colagem ao sabor das ondas que passam pela comunicação social - e pelas estratégias político-partidárias - superficializando o jornal que se faz.
Títulos que se tornam autênticos editorais, opiniões que se duplicam e se complementam, na prática, numa estratégia de promoção partidária...
O dilema das Direcções Editoriais muito orientadas é que, mais dia menos dia, se tornam excessivamente presentes e acabam por colar a sua própria imagem à do jornal, até ao ponto em que os seus donos acharem que seja demasiado, porque degrada o produto. O seu destino fica então marcado com o destino do que se passa na conjuntura externa ao jornal. Ou não, mas nessa altura, tornam-se em algo completamente diferente do que aquilo para que foram criados.
quarta-feira, 18 de outubro de 2017
Marcelo defende a "nacionalização" das terras abandonadas?
Depois de cem mortos, de um desastre na gestão do combate aos incêndios, depois de uma intervenção musculada do Presidente da República que levou à demissão da ministra da Administração Interna, a dúvida que se coloca a Marcelo Rebelo de Sousa é se estará disponível para assumir a amplitude total dos seus gestos e apoiar um esforço governamental de emparcelamento da pequena propriedade privada, caso os esforços dos proprietários não sejam eficazes.
"Diz" o Relatório da Comissão Técnica Independente: (página 164/5)
A comunicação social tem sublinhado a interpretação de que Marcelo defende a adopção de todas as medidas de médio prazo que impeçam a repetição das desgraças vividas. Mas será mesmo assim?
Quem procurar nas intervenções de Marcelo Rebelo de Sousa no ano passado não encontrará, na sua página oficial, alguma referência à adopção urgente de medidas estruturais de combate aos incêndios. Encontrará visitas várias a localidades para comunicar com as populações e bombeiros, mas pouco mais. Mesmo no primeiro semestre de 2017, nada disse e nada falou sobre o assunto.
Não era urgente? Não havia uma continuação do clima de seca prolongada? Ou parecer-lhe-ia que o governo ainda estava em estado de graça e era melhor nada dizer de fundo? Todos os anos ardem milhares e milhares de hectares, todos os anos há desolação e ineficácia, há décadas que se mantêm vigentes todos os obstáculos a medidas eficazes. Onde estava Marcelo então?
Claro que nada no passado se compara ao que se verificou. E claro que o governo falhou. Mas a dúvida é se Marcelo - depois de ter conquistado os "corações" dos portugueses - não estará a cavalgar um capital social de desolação e indignação para actuar politicamente naquele fim que sempre teve: impedir um governo do PS à esquerda, nem que seja aproveitando um caso tão grave como a morte de uma centena de pessoas fruto da incapacidade e da ineficácia do aparelho do Estado.
Caso o Governo não vá até ao fim - incluindo nada fazer para pôr em causa o direito de propriedade - será que Marcelo, como disse na sua intervenção,
Estas opções de Marcelo fariam, primeiro, o governo pôr em causa acordos com os seus parceiros, o que minaria a força do governo; ou sobre a moção de censura do CDS, fazendo cair logo o Governo caso aprovada ou, evitando essa situação, colocando toda a esquerda a colar-se ao PS na assunção desta desgraça social, o que, aos olhos de Marcelo, será assim a melhor forma de se queimar no futuro... próximo.
É assim o "Presidente dos afectos".
"Diz" o Relatório da Comissão Técnica Independente: (página 164/5)
A CTI considera que são necessárias mudanças no quadro institucional e nas políticas públicas que, sem alterar a atual distribuição da propriedade, promovam de modo decidido a mobilização produtiva e a adequada gestão das terras. Dois princípios devem presidir a essas medidas: o exercício dos direitos associados à propriedade privada subordina-se e deve estar condicionado a prioridades coletivas (a começar pela segurança das pessoas); o Estado não se substitui aos proprietários que cumprarm os seus deveres, mas corresponsabiliza-os no cuidado e gestão das suas terrasA Comissão Técnica Independente defende que seja "obrigatória a integração das propriedades" que não cumpram as regras nas zonas específicas e recomenda
Implementação de medidas conducentes à perca de direitos de propriedade, em situações de interesse público, para quem não assegurar os mínimos deveres de proprietário, nomeadamente a atualização de registos nas conservatórias /finanças
A comunicação social tem sublinhado a interpretação de que Marcelo defende a adopção de todas as medidas de médio prazo que impeçam a repetição das desgraças vividas. Mas será mesmo assim?
Quem procurar nas intervenções de Marcelo Rebelo de Sousa no ano passado não encontrará, na sua página oficial, alguma referência à adopção urgente de medidas estruturais de combate aos incêndios. Encontrará visitas várias a localidades para comunicar com as populações e bombeiros, mas pouco mais. Mesmo no primeiro semestre de 2017, nada disse e nada falou sobre o assunto.
Não era urgente? Não havia uma continuação do clima de seca prolongada? Ou parecer-lhe-ia que o governo ainda estava em estado de graça e era melhor nada dizer de fundo? Todos os anos ardem milhares e milhares de hectares, todos os anos há desolação e ineficácia, há décadas que se mantêm vigentes todos os obstáculos a medidas eficazes. Onde estava Marcelo então?
Claro que nada no passado se compara ao que se verificou. E claro que o governo falhou. Mas a dúvida é se Marcelo - depois de ter conquistado os "corações" dos portugueses - não estará a cavalgar um capital social de desolação e indignação para actuar politicamente naquele fim que sempre teve: impedir um governo do PS à esquerda, nem que seja aproveitando um caso tão grave como a morte de uma centena de pessoas fruto da incapacidade e da ineficácia do aparelho do Estado.
Caso o Governo não vá até ao fim - incluindo nada fazer para pôr em causa o direito de propriedade - será que Marcelo, como disse na sua intervenção,
"exercerá todos os seus poderes para garantir que onde existiu ou existe fragilidade ela terá de deixar de existir. E que não será mais possível, ano após ano, garantir segurança para ter de reconhecer no ano seguinte que ela não foi possível de confirmar”.Na sua intervenção de ontem, Marcelo usa até formulações estranhas como colocando em alternativa as despesas dessa reforma com as "manifestações da rua"; ou mesmo afirmando "há quem no Parlamento" põe em causa a manutenção do Governo, evitando - distanciando-se... - da menção ao "CDS" e desafiando a esquerda ou a apoiar a moção de censura ou a apoiar o Governo, numa atitude que poderia ser precisamente a do CDS.
Estas opções de Marcelo fariam, primeiro, o governo pôr em causa acordos com os seus parceiros, o que minaria a força do governo; ou sobre a moção de censura do CDS, fazendo cair logo o Governo caso aprovada ou, evitando essa situação, colocando toda a esquerda a colar-se ao PS na assunção desta desgraça social, o que, aos olhos de Marcelo, será assim a melhor forma de se queimar no futuro... próximo.
É assim o "Presidente dos afectos".
terça-feira, 17 de outubro de 2017
Isto não pode ficar na mesma
Em Portugal, a comunidade científica foi seriamente ouvida quanto às implicações das alterações climáticas? Que mudanças foram feitas nas políticas de ordenamento do território nas últimas décadas? Que mudanças foram feitas pelos últimos governos na política de ataque aos incêndios e na estrutura da Protecção Civil? Há algum planeamento efectivo, organizado com peritos reconhecidamente competentes, para enfrentar um sismo de grande magnitude? As regras de construção, em regiões de risco sísmico, estão a ser mesmo fiscalizadas?
Portugal falhou dramaticamente no que toca ao chamado “problema dos incêndios”. Houve uma abordagem amadora, há negócios suspeitos, olharam para a escala local sem perceber que a prevenção e o combate aos incêndios tem uma escala supramunicipal e, o mais grave, colocaram nos postos de comando e nas estruturas do sistema muita gente que não estava qualificada para as funções que deviam desempenhar. O amiguismo e a rede partidária funcionaram bem mas o País ficou muito mal.
Em geral, os gabinetes dos ministérios e as estruturas da administração pública estão ocupadas por pessoas do partido que governa, ou são simpatizantes de longa data que fazem parte da rede de relações dos partidos, tanto no plano local como no regional e nacional. Foram nomeados sem qualquer procedimento de recrutamento que avalie as competências técnicas para o exercício das funções. O que hoje sabemos através do Relatório Independente elaborado na sequência do grande incêndio de Pedrógão Grande confirma o que já se suspeitava. A Protecção Civil e o sistema de que faz parte são um caso paradigmático da forma como o país tem sido governado. Um desastre com consequências fatais.
No resto da administração pública é igual. Pode não causar mortes nesta escala, mas pelo menos no sector da saúde também mata. Os boys ocupam o Serviço Nacional de Saúde e a sua conivência com os interesses privados, a sua incompetência, a arrogância das administrações e chefias com cobertura política garantida, desmoralizam os funcionários sensíveis ao serviço do bem-comum. Importaram o modelo neoliberal do Banco Mundial e aplicam-no como se fosse politicamente indiscutível, uma questão de gestão técnica. Não foram recrutados por concursos sérios, não são escrutinados por comissões de utentes, encobrem e negam a degradação que o sistema está a sofrer, esmagam muitos médicos e enfermeiros. Neste caso, também é impossível executar uma nova política que reabilite o SNS enquanto não mudarmos o sistema de recrutamento dos quadros da administração tornando-o independente das máquinas partidárias. Este assunto é crucial para uma estratégia de desenvolvimento do País.
Na Educação, na Segurança Social, na RTP, no Banco de Portugal, por todo o lado salta aos olhos que em Portugal há uma razão de fundo que impede a elaboração e execução de políticas fundamentadas no melhor conhecimento científico disponível, com objectivos e etapas planeadas, com os recursos adequados e com procedimentos de avaliação e responsabilização. A questão dos incêndios pôs a nu um problema que não temos querido enfrentar porque incomoda muitos. A acusação no “caso” Operação Marquês diz-nos que esse problema envolve partidos até ao mais alto nível e tem múltiplas ramificações. Muita gente fingiu que não sabia de nada e, por isso, foi conivente por omissão.
O problema é este: temos sido governados por gente que não devia ter acedido aos cargos que ocuparam ou ainda ocupam. O País tem estado aliviado com o "poucochinho" que o actual governo conseguiu, mas agora está confrontado com uma realidade nua e crua que não pode ignorar. As políticas que têm efeitos a médio e longo prazo precisam de dinheiro para o muito investimento público que Bruxelas não permite; precisam de uma administração pública purgada dos boys que a ocupam, mas os partidos que têm governado metem a cabeça debaixo da areia porque eles são isso mesmo, no essencial uma estrutura de assalto à administração pública; precisam de uma Assembleia da República repleta de deputados qualificados de onde saiam governos responsabilizados, mas os partidos colocam nas listas os carreiristas e, sabendo que estão desacreditados, lá vão disfarçando através do convite a algumas personalidades, indiscutivelmente competentes, mas sem influência política relevante.
O apodrecimento técnico, político e moral dos partidos que nos têm governado deu nisto. Não, depois deste choque de realidade, o País tem de mergulhar a fundo no debate sobre o essencial. Precisamos de organizar uma resposta aos discursos oficiais que vão passar ao lado desse essencial. Precisamos de uma mudança profunda no sistema de recrutamento para a Administração do Estado e um aprofundamento radical da nossa democracia que ponha em causa o sistema político-partidário dominado pelo "centrão". Não chega "mudar de modelo" mantendo o sistema de relações que nos conduziu até aqui. Temos mesmo de dizer basta.
Finalmente, a chuva chegou. Estou a ouvi-la cair e pergunto, fica tudo na mesma?
segunda-feira, 16 de outubro de 2017
Quando o ideólogo se veste de académico
Este economista e professor universitário é bem conhecido por todos os que estudam os sistemas de pensões. Vende a sua reputação académica às seguradoras para que os Fundos de Pensões possam alargar o seu negócio em Portugal (ver aqui).
O seu objectivo é ganhar apoio na opinião pública, e nos partidos do centrão, para a absoluta necessidade de desmantelar o actual sistema de segurança social por solidariedade entre gerações e substituí-lo por um sistema-'cada um por si' em que os Fundos de pensões alargam substancialmente o seu mercado. Esta é uma das "reformas estruturais" que a UE quer impor, apesar de ter sido um fiasco em inúmeros países. A Suécia é um caso exemplar em que o risco é totalmente transferido para os pensionistas com cortes automáticos nas pensões sem necessidade de qualquer decisão política. Os cortes estão incorporados na mecânica do sistema, tal como em Portugal no caso do chamado "factor de sustentabilidade". Entretanto, os custos da gestão dos Fundos é muitíssimo superior aos do sistema tradicional de solidariedade entre gerações enquanto os riscos não são inferiores, longe disso (para saber mais sobre estes assuntos, ver aqui).
Claro, o desemprego e a demografia são factores de risco do sistema tradicional. O que poucos percebem é que estes riscos só se tornaram reais após a institucionalização da política económica ordoliberal que, na UE, é condição de sobrevivência da "moeda única".
A subida eleitoral da extrema-direita, agora com provável acesso ao poder na Áustria, é uma consequência deste projecto europeu que insiste, usando a cegueira ideológica promovida pela finança e pelos media, na urgência desta "reforma estrutural" pró-Fundos de Pensões. Jorge Bravo está a trabalhar para os seus financiadores e o Público é o seu palco. Sem contraditório.
sábado, 14 de outubro de 2017
Capas e contracapas
A capa do Público de hoje, representando comunistas e bloquistas como ameaça orçamental, é uma vergonha, bem reveladora do processo de observadorização em curso na generalidade das linhas editoriais na comunicação social, ou seja, do domínio do estilo ideológico de um bem financiado blogue de direita. Jamais fariam uma capa destas em torno dos perversos impactos orçamentais do sector bancário, por exemplo. Enfim, as linhas editoriais dominantes são as linhas dos grupos dominantes, não se esqueçam.
Num quadro de perversos constrangimentos europeus, numa correlação de forças desfavorável nas várias escalas, as esquerdas contribuíram, com as suas propostas orçamentais, para um ligeiro aumento do poder de compra das pensões mais baixas, para algum alívio fiscal para a classe média realmente existente, para a continuação do lento processo de recuperação da dignidade salarial e profissional dos funcionários públicos, indispensável para a reconquista de confiança no Estado e nos seus serviços, naturalmente altamente intensivos em trabalho relativamente mais qualificado.
Estas modestas conquistas, ainda que num quadro em que continua a faltar um impulso forte a um investimento público duradouramente deprimido, contribuem para a confiança na procura interna, o que conjuntamente com a procura externa ainda relativamente favorável, ajuda o investimento privado. Lembremos, também contra comentadores-directores televisivos, os que monopolizam o chamado debate público, falando em nome do capitalismo monopolista, que as grandes empresas podem bem suportar neste contexto um eventual aumento da sua contribuição fiscal, que isso não afectará um investimento empresarial que depende sobretudo das expectativas de evolução das vendas (esta gente não respeita a evidência empírica recolhida desde há anos pelo INE, toldados que estão pela mais míope das ideologias).
Obviamente, a situação do país é muito frágil, dada a falta de instrumentos decentes de política e as regras europeias por esta responsáveis, num contexto de endividamento externo persistente e em que crescem os sinais de uma bolha financeira internacional por rebentar. Mas quem tem colocado de forma consequente em cima da mesa estes problemas são os mesmo que lutam orçamentalmente pelos de baixo. Para a sabedoria convencional, essa eventual crise futura seria uma oportunidade, neste contexto estrutural, para o mesmo ajuste de contas de um tempo, o da troika estrangeira, pelo qual anseiam.
Num quadro de perversos constrangimentos europeus, numa correlação de forças desfavorável nas várias escalas, as esquerdas contribuíram, com as suas propostas orçamentais, para um ligeiro aumento do poder de compra das pensões mais baixas, para algum alívio fiscal para a classe média realmente existente, para a continuação do lento processo de recuperação da dignidade salarial e profissional dos funcionários públicos, indispensável para a reconquista de confiança no Estado e nos seus serviços, naturalmente altamente intensivos em trabalho relativamente mais qualificado.
Estas modestas conquistas, ainda que num quadro em que continua a faltar um impulso forte a um investimento público duradouramente deprimido, contribuem para a confiança na procura interna, o que conjuntamente com a procura externa ainda relativamente favorável, ajuda o investimento privado. Lembremos, também contra comentadores-directores televisivos, os que monopolizam o chamado debate público, falando em nome do capitalismo monopolista, que as grandes empresas podem bem suportar neste contexto um eventual aumento da sua contribuição fiscal, que isso não afectará um investimento empresarial que depende sobretudo das expectativas de evolução das vendas (esta gente não respeita a evidência empírica recolhida desde há anos pelo INE, toldados que estão pela mais míope das ideologias).
Obviamente, a situação do país é muito frágil, dada a falta de instrumentos decentes de política e as regras europeias por esta responsáveis, num contexto de endividamento externo persistente e em que crescem os sinais de uma bolha financeira internacional por rebentar. Mas quem tem colocado de forma consequente em cima da mesa estes problemas são os mesmo que lutam orçamentalmente pelos de baixo. Para a sabedoria convencional, essa eventual crise futura seria uma oportunidade, neste contexto estrutural, para o mesmo ajuste de contas de um tempo, o da troika estrangeira, pelo qual anseiam.
Soberania, democracia e internacionalismo
A luta da região da Catalunha pelo direito à expressão da sua vontade política, quanto à integração no Estado espanhol, suscitou debates que estiveram ausentes aquando do referendo na Escócia. Tornou-se evidente que muita gente da esquerda tem ideias pouco fundamentadas sobre os conceitos de soberania, democracia, legitimidade e legalidade. Ainda por cima, os medos intrometem-se na análise, sendo frequente a conotação (às vezes vagamente implícita) entre soberanismo e nacionalismo xenófobo e belicoso.
Sobre isto, aqui deixo um breve excerto da minha intervenção no 1º Encontro Nacional da DS - Democracia Solidária, realizado no passado fim-de-semana. O título da intervenção era 'O Euro e a UE - táctica e estratégia da esquerda'.
sexta-feira, 13 de outubro de 2017
Fórum Manifesto: «O Trabalho do futuro e o futuro do Trabalho»
Dedicado às questões do trabalho, decorre nos dias 27 e 28 de Outubro, em Lisboa, o próximo Fórum de Outono da Manifesto. Para além das sessões de abertura e de encerramento (a cargo de Ana Drago e Diogo Martins, respetivamente), os trabalhos incluem uma conferência inaugural e diversas sessões e debates (clicar na imagem para ampliar):
● O passado, o presente e os futuros possíveis do Trabalho: Estamos à altura do desafio? (Conferência de Abertura por Richard Hyman)
● Desafios e problemas actuais da organização dos trabalhadores (debate com Daniel Carapau, Rebecca Gumbrell-McCormick, Sérgio Monte e Vivalda Silva)
● As propostas de reforma das relações de trabalho em Portugal (sessão com Filipe Lamelas, Paulo Areosa Feio e Reinhard Naumann)
● Sobre o trabalho: mitos, ideias feitas, conceitos e indicadores (sessão com João Ramos de Almeida e José Luís Albuquerque)
● A revolução tecnológica e o trabalho (sessão com Nuno Teles e Porfírio Silva)
● A governação na área do trabalho na actual legislatura (debate com José Soeiro, Manuel Carvalho da Silva e Tiago Barbosa Ribeiro)
O Fórum de Outono da Manifesto realiza-se na Pousada da Juventude do Parque das Nações. A entrada é livre (podendo as inscrições podem ser feitas aqui). Apareçam, estão todos convidados.
● O passado, o presente e os futuros possíveis do Trabalho: Estamos à altura do desafio? (Conferência de Abertura por Richard Hyman)
● Desafios e problemas actuais da organização dos trabalhadores (debate com Daniel Carapau, Rebecca Gumbrell-McCormick, Sérgio Monte e Vivalda Silva)
● As propostas de reforma das relações de trabalho em Portugal (sessão com Filipe Lamelas, Paulo Areosa Feio e Reinhard Naumann)
● Sobre o trabalho: mitos, ideias feitas, conceitos e indicadores (sessão com João Ramos de Almeida e José Luís Albuquerque)
● A revolução tecnológica e o trabalho (sessão com Nuno Teles e Porfírio Silva)
● A governação na área do trabalho na actual legislatura (debate com José Soeiro, Manuel Carvalho da Silva e Tiago Barbosa Ribeiro)
O Fórum de Outono da Manifesto realiza-se na Pousada da Juventude do Parque das Nações. A entrada é livre (podendo as inscrições podem ser feitas aqui). Apareçam, estão todos convidados.
quinta-feira, 12 de outubro de 2017
A economia política do Banco Central Europeu
Já sabíamos que o BCE havia lucrado, entre 2011 e 2016, €4.8 mil milhões de euros em juros da dívida pública portuguesa comprada em Mercado secundário no âmbito do SMP, o Securities Market Programme, e que estes lucros em vez de serem repatriados para o Estado Português acabaram nos bolsos do governo alemão, francês e italiano, os principais accionistas do BCE. Se considerarmos a OT 4.35% 15/Out/2017 que vence no próximo domingo, esse valor aumenta para 5.2 mil milhões de euros.
Juros pagos ao BCE no âmbito do SMP
Sabemos agora que o BCE lucrou, no âmbito do mesmo programa, 7.8 mil milhões de euros, repartidos entre juros e ganhos de capital, em dívida pública grega, conforme resposta do BCE ao Eurodeputado grego Nikolaus Chountis do passado dia 10 de Outubro.
Já sabíamos que esta operação - acumulação por expropriação - configura uma das mais predatórias práticas capitalistas de captação de rendas por parte das autoridades de cariz público e supranacional contra os cidadãos de um país. Neste caso o banco central, sob a capa de uma suposta independência, é instrumentalizado ao serviço do sistema financeiro e ao serviço dos países de origem dos credores financeiros privados, o centro europeu, contra as periferias europeias.
Para além de quantificar a apropriação indevida de recursos que deveriam pertencer às autoridades nacionais, esta carta espelha também a contradictória dialéctica intrínseca à economia política do BCE. Por um lado, invoca-se o principio da independência do banco central em linha com o artigo 130 do tratado de funcionamento da UE que salvaguarda a instrumentalização do banco central ao serviço dos governos nacionais com aspirações de se perpectuarem no poder.
Porém, logo mais adiante, quando confrontado com o facto da Grécia não estar a receber a sua proporção dos lucros do SMP em linha com a chave de capital (migalhas ao lado dos cupões pagos...), o BCE argumenta que isto já foi feito no passado mas foi suspenso e carece de nova autorização do Eurogrupo. Isto para não mencionar o facto do BCE ter adiado sine die a implementação das medidas de alívio acordadas no âmbito das negociações do seu segundo resgate, em Novembro de 2012, especificamente o mencionado repatriamento dos ganhos do SMP, e ameaçado cortar o acesso à facilidade de cedência de liquidez de emergência à banca grega quando o Eurogrupo enveredou pela coação e chantagem como forma de fazer o governo grego ceder perante a vontade referendada de um povo. Ao ceder às vontades do informal e arbitrário grupo de Ministros das Finanças, o BCE tornou-se ele próprio instrumento da hegemonia alemã.
Não sendo novas, estas práticas não deixam de chocar, causar indignação e tornar urgente um debate profundo sobre o actual enquadramento ideológico da União Europeia.
Banca e prémios de jornalismo económico
Agora que é fácil bater num gato morto, convinha lembrar que há panteras bem mais poderosas e ainda vivas.
Vem isto a propósito de um livro do jornalista da SIC José Gomes Ferreira - A vénia de Portugal ao regime dos banqueiros - no qual relata, entre outras coisas interessantes, algumas das formas de relacionamento entre a banca e os jornalistas. E onde se afirma, com base "numa fonte ligada" à organização do Prémio Excelência em Jornalismo Económico da Ordem dos Economistas, presidida por Rui Leão Martinho, então presidente da Tranquilidade e da BES-Vida, que esta iniciativa foi para
Para quem é um ingénuo jornalista que acha que estes prémios são um reconhecimento remunerado da sua qualidade profissional, fica claro que estas iniciativas não são feitas apenas para associar o nome de uma marca - é giro usar este conceito de marca em vez de interesses, não é? - a boas práticas sociais e democráticas, como o jornalismo.
Faça-se uma pesquisa sobre "prémios de jornalismo" e ver-se-á que a intenção real - pelo número de prémios que existem - é outra: no mínimo, falar-se da instituição que a promove, mas igualmente encontrar formas de condicionamento de opiniões de quem escreve na comunicação social. E se calhar, tudo isto se passa com benesses fiscais do OE (não estudei o problema). Só nos últimos meses foram criados mais três prémios de jornalismo...
Ora, o Prémio do BES apenas existiu de 2011 a 2013 e valia 30 mil euros, sem quaisquer candidaturas por parte dos jornalistas e com um júri composto por diversos ex-ministro das Finanças.
Mas todos os anos desde 2006 é sempre notícia a atribuição dos prémios do jornalismo económico, atribuídos monetariamente pelo Banco Santander e a Universidade Nova de Lisboa. Neste prémio, são os jornalistas que se candidatam.
O prémio "visa distinguir os melhores trabalhos publicados anualmente na comunicação social de imprensa escrita, nas áreas de Gestão de Empresas e Negócios, Mercados Financeiros, e Economia e Sustentabilidade." E os prémios não são maus. "O galardão engloba três prémios monetários, num montante global de 20.000€: 10.000€ para o Grande Prémio, que será igualmente o vencedor de uma das categorias, (prémio não acumulável), e 5.000€ para o melhor trabalho concorrente a cada uma das restantes categorias."
Se o marketing é o objectivo mínimo, o que diferencia a participação ilegal de jornalistas em actos de marketing é o facto de os seus trabalhos serem avaliados também por pares.
No caso do Banco Santander e Universidade Nova de Lisboa, os trabalhos são seleccionados por um júri composto ao longo dos anos nem sempre pelas mesmas pessoas, mas que reuniu: Francisco Caramelo (Diretor da FCSH/NOVA), António Granado (FCSH/NOVA), Conceição Zagalo (GRACE), Sérgio Figueiredo (Media Capital), Helena Garrido, Paulo Pinho (NOVASBE), João Costa (Director da FCSH/NOVA), José Rodrigues dos Santos (FCSH/NOVA), Francisco Sarsfield Cabral (Rádio Renascença), José Albuquerque Tavares (NOVASBE), João Sàágua (Director da FCSH/NOVA), Luís Rochartre, Ferreira Machado, José Neves Adelino, Luís Almeida Costa.
Essas jogadas de envolvência são assumidas e os jornalistas conhecem-nas e aceitam-nas. Sabem - acham - que não é isso que condiciona o seu pensamento, mas aceitam que a palavra "prémio" e o nome da marca apareça nos seus CVs, bem como o dinheiro nas contas bancárias, o que faz sempre jeito. Mas - quero eu acreditar - é mais a existência de um elemento concorrencial que os anima, embora haja quem escreva especificamente para os prémios...
Ora, neste caso, a marca Santander não é, de todo, um nome que se cheire. E os jornalistas deveriam ter algum cuidado.
Vem isto a propósito de um livro do jornalista da SIC José Gomes Ferreira - A vénia de Portugal ao regime dos banqueiros - no qual relata, entre outras coisas interessantes, algumas das formas de relacionamento entre a banca e os jornalistas. E onde se afirma, com base "numa fonte ligada" à organização do Prémio Excelência em Jornalismo Económico da Ordem dos Economistas, presidida por Rui Leão Martinho, então presidente da Tranquilidade e da BES-Vida, que esta iniciativa foi para
"preparar o amortecimento, a relativização da importância, o adiamento ou até esvaziamento de futuras notícias sobre a situação alarmante do seu grupo, assim que a verdade começasse a aparecer à tona de água".
Para quem é um ingénuo jornalista que acha que estes prémios são um reconhecimento remunerado da sua qualidade profissional, fica claro que estas iniciativas não são feitas apenas para associar o nome de uma marca - é giro usar este conceito de marca em vez de interesses, não é? - a boas práticas sociais e democráticas, como o jornalismo.
Faça-se uma pesquisa sobre "prémios de jornalismo" e ver-se-á que a intenção real - pelo número de prémios que existem - é outra: no mínimo, falar-se da instituição que a promove, mas igualmente encontrar formas de condicionamento de opiniões de quem escreve na comunicação social. E se calhar, tudo isto se passa com benesses fiscais do OE (não estudei o problema). Só nos últimos meses foram criados mais três prémios de jornalismo...
Ora, o Prémio do BES apenas existiu de 2011 a 2013 e valia 30 mil euros, sem quaisquer candidaturas por parte dos jornalistas e com um júri composto por diversos ex-ministro das Finanças.
Mas todos os anos desde 2006 é sempre notícia a atribuição dos prémios do jornalismo económico, atribuídos monetariamente pelo Banco Santander e a Universidade Nova de Lisboa. Neste prémio, são os jornalistas que se candidatam.
O prémio "visa distinguir os melhores trabalhos publicados anualmente na comunicação social de imprensa escrita, nas áreas de Gestão de Empresas e Negócios, Mercados Financeiros, e Economia e Sustentabilidade." E os prémios não são maus. "O galardão engloba três prémios monetários, num montante global de 20.000€: 10.000€ para o Grande Prémio, que será igualmente o vencedor de uma das categorias, (prémio não acumulável), e 5.000€ para o melhor trabalho concorrente a cada uma das restantes categorias."
Se o marketing é o objectivo mínimo, o que diferencia a participação ilegal de jornalistas em actos de marketing é o facto de os seus trabalhos serem avaliados também por pares.
No caso do Banco Santander e Universidade Nova de Lisboa, os trabalhos são seleccionados por um júri composto ao longo dos anos nem sempre pelas mesmas pessoas, mas que reuniu: Francisco Caramelo (Diretor da FCSH/NOVA), António Granado (FCSH/NOVA), Conceição Zagalo (GRACE), Sérgio Figueiredo (Media Capital), Helena Garrido, Paulo Pinho (NOVASBE), João Costa (Director da FCSH/NOVA), José Rodrigues dos Santos (FCSH/NOVA), Francisco Sarsfield Cabral (Rádio Renascença), José Albuquerque Tavares (NOVASBE), João Sàágua (Director da FCSH/NOVA), Luís Rochartre, Ferreira Machado, José Neves Adelino, Luís Almeida Costa.
Essas jogadas de envolvência são assumidas e os jornalistas conhecem-nas e aceitam-nas. Sabem - acham - que não é isso que condiciona o seu pensamento, mas aceitam que a palavra "prémio" e o nome da marca apareça nos seus CVs, bem como o dinheiro nas contas bancárias, o que faz sempre jeito. Mas - quero eu acreditar - é mais a existência de um elemento concorrencial que os anima, embora haja quem escreva especificamente para os prémios...
Ora, neste caso, a marca Santander não é, de todo, um nome que se cheire. E os jornalistas deveriam ter algum cuidado.
Citizen Jane
Integrado no festival de cinema da Trienal de Arquitetura, é hoje projetado às 21h30 no Fórum Lisboa (e amanhã às 19h30 no Cinema City Alvalade), um recente documentário sobre Jane Jacobs, uma das mais fascinantes pensadoras da economia das cidades, que desafiou as aproximações convencionais à teoria económica dos espaços urbanos.
O documentário desenrola-se em torno da construção de uma via rápida de acesso à baixa de Manhattan, nos termos do projeto concebido por Robert Moses em 1941 (Plano LOMEX). A sua configuração inicial pressupunha arrasar tudo e construir do zero, permitindo a implantação da malha de rodovias e erguendo um conjunto de torres nas zonas de bairros degradados que foram crescendo durante a Grande Depressão. De caminho, seriam sacrificados diversos edifícios históricos, os alojamentos de quase duas mil famílias e cerca de oitocentos estabelecimentos comerciais. A prepotência urbanística de Moses e a linearidade do seu plano esbarraram contudo na resistência das comunidades locais, incentivadas por Jacobs a «lutar pela cidade».
No confronto entre a cidade que se desenha e se impõe a partir de cima - reduzindo a pó as marcas do tempo e da estruturação do espaço - e o entrecruzar dos processos económicos, políticos, sociais e culturais que a constituem, encontra-se muito do que distingue a perspetiva de Jane Jacobs sobre a génese e evolução das cidades - assente nas múltiplas interações que as mesmas permitem e alimentam - e a propensão para quantitativismo redutor da economia urbana convencional.
quarta-feira, 11 de outubro de 2017
O direito a não aprender nada
Pedro Passos Coelho saiu já tarde, mas eis que Pedro Santana Lopes saiu a terreiro para defender... Pedro Passos Coelho.
"Não parece bem que o partido possa ser entregue a quem, numa altura tão difícil para o país, passou a vida a pôr em causa o trabalho de salvação nacional que quase era feito. Para mim, é algo absolutamente incongruente. Devo dizer: não consigo compreender que isso possa acontecer. Porque, tal como os seres humanos, não concebo que a generalidade dos militantes do PSD, que defendeu e foi solidária com o Pedro Passos Coelho, possa agora dizer: Ai Passos Coelho saiu? Então vamos agora escolher aqueles que o quiseram deitar abaixo e disseram mal o tempo todo. E por isso acho que tenho esse dever". (Na SIC, ontem à noite)
Depois de 400 mil postos de trabalho destruídos, de toda a pobreza gerada e a que as Misericórdias tiveram de dar apoio, depois de se criarem 1,5 milhões de pessoas subutilizadas, a querer trabalhar sem encontrar; depois da queda do investimento a níveis pré-históricos; depois de toda a desarticulação dos serviços públicos de que não há memória e de que a Direita agora tira proveito para se queixar da geringonça; depois do rolo compressor nos direitos laborais que deitou abaixo a contratação colectiva quase ao zero; depois de uma emigração sem paralelo de quadros qualificados formados com o dinheiro dos portugueses, Pedro Santana Lopes voltou ao seu modo de governação desajeitado e sem pensamento estratégico, tão criticado em 2004.
Ainda que estas tiradas pareçam muito uma jogada de sedução ao aparelho partidário de Passos Coelho, não deixa de ser um pouco contra-corrente. Agora que o PSD queria tanto seguir as pisadas do CDS e lavar a cara com alguém mais jovial que fizesse esquecer o maior trambolhão da sua história - enfim, dar um passo em frente -, eis que surge quem o quer prender de novo ao passado.
Bloco Central? Não. Ergamos a nossa autonomia em relação à estratégia de Marcelo Rebelo de Sousa. Antes que o CDS nos roube o eleitorado, façamos de novo uma aliança PSD/CDS que tão mau resultado teve. "Os partidos têm de ser pessoas de bem". Façamos o mesmo que fizemos no passado, queiramos ser CDS enquanto o CDS quer ser PSD e, se calhar, teremos resultados diferentes...
Haja, pois, uma direita orgulhosa do mal que fez!
terça-feira, 10 de outubro de 2017
Proposta com fotografia?
Será que a descarada proposta do CDS de
isentar de IRS o trabalho extraordinário terá a ver com o conflito latente na Autoeuropa?
A administração - que quer criar um novo turno considerando o trabalho ao sabádo como um dia normal - aceitaria a reivindicação dos trabalhadores de o considerar como trabalho extra e o Estado é que pagava a factura...
Não seria caso impossível.
Já em 2016, os centristas se fizeram porta-voz dos interesses da administração da Autoeuropa ao pedir uma atenção do Governo para as dificudades por que a empresa passava. Na nota divulgada então, diziam mesmo que tinha sido sugerido pelos representantes da unidade “que se realize uma reunião conjunta entre responsáveis da empresa, representantes dos trabalhadores e organizações governamentais, por forma a encontrar soluções para o problema que não impliquem ‘lançar trabalhadores no desemprego'”.
Há cerca de um mês, o deputado Nuno Magalhães vendia a tese da administração de que, face à reacção dos trabalhadores contra às intenções de embaratecer o custo de trabalhar ao sábado, o que estava em causa era, sim, uma guerra entre o Bloco e o PCP, na comissão de trabalhadores. Uma guerra fratricida no meu distrito entre o BE e o PCP está a acabar com a Autoeuropa, e corre o risco de acabar com milhares de postos de trabalho em todo o país. É uma vergonha", declarou. "É uma vergonha, andam a brincar com o fogo!", gritava ele.
No final, a eleição para a comissão de trabalhadores, que supostamente deveria afastar os ditos trabalhadores mais "radicais", acabou por não dar representantes às listas mais próximos da administração da Autoeuropa ou da anterior CT demissionária. Ou seja, a questão está ainda por resolver.
A ser verdade, este não seria um caso inédito. Em todos os governos se aprovaram leis ou alterações legais que, em vez de um interesse geral, tinham antes um destinatário muito concreto.
E tanbém não seria caso inédito para o CDS. O CDS - e em especial o seu grupo parlamentar composto sobretudo por formados em direito (13 a 5) - é, na verdade, um digno advogado das causas empresariais em Portugal, embora no último governo tenham dado cabo de umas dezenas de milhar delas.
A administração - que quer criar um novo turno considerando o trabalho ao sabádo como um dia normal - aceitaria a reivindicação dos trabalhadores de o considerar como trabalho extra e o Estado é que pagava a factura...
Não seria caso impossível.
Já em 2016, os centristas se fizeram porta-voz dos interesses da administração da Autoeuropa ao pedir uma atenção do Governo para as dificudades por que a empresa passava. Na nota divulgada então, diziam mesmo que tinha sido sugerido pelos representantes da unidade “que se realize uma reunião conjunta entre responsáveis da empresa, representantes dos trabalhadores e organizações governamentais, por forma a encontrar soluções para o problema que não impliquem ‘lançar trabalhadores no desemprego'”.
Há cerca de um mês, o deputado Nuno Magalhães vendia a tese da administração de que, face à reacção dos trabalhadores contra às intenções de embaratecer o custo de trabalhar ao sábado, o que estava em causa era, sim, uma guerra entre o Bloco e o PCP, na comissão de trabalhadores. Uma guerra fratricida no meu distrito entre o BE e o PCP está a acabar com a Autoeuropa, e corre o risco de acabar com milhares de postos de trabalho em todo o país. É uma vergonha", declarou. "É uma vergonha, andam a brincar com o fogo!", gritava ele.
No final, a eleição para a comissão de trabalhadores, que supostamente deveria afastar os ditos trabalhadores mais "radicais", acabou por não dar representantes às listas mais próximos da administração da Autoeuropa ou da anterior CT demissionária. Ou seja, a questão está ainda por resolver.
A ser verdade, este não seria um caso inédito. Em todos os governos se aprovaram leis ou alterações legais que, em vez de um interesse geral, tinham antes um destinatário muito concreto.
E tanbém não seria caso inédito para o CDS. O CDS - e em especial o seu grupo parlamentar composto sobretudo por formados em direito (13 a 5) - é, na verdade, um digno advogado das causas empresariais em Portugal, embora no último governo tenham dado cabo de umas dezenas de milhar delas.
Como se nada fosse
A comentadora económica da Antena 1 Helena Garrido deu um exemplo para explicar ideias do recém-nomeado Prémio do Banco Central da Suécia para as Ciências Económicas, o economista norte-americano Richard H. Thaler.
A ideia era mais ou menos esta:
Os modelos económicos dizem que se os trabalhadores aceitassem uma redução dos salários, o desemprego não subia tanto. Mas como os trabalhadores consideram que isso não é justo, não aceitam. E geram mais conflitualidade, prejudicando a vida das empresas. Por isso, é que se diz que os mercados devem ser flexíveis, para que possam gerar todos esses efeitos. Mas o pensamento das pessoas também tem um papel.
Ou seja, os trabalhadores tomam decisões irracionais - impedir que os salários desçam - porque acham que não justas. E essa decisão não seria justa porque estaria a impedir o emprego (barato!) do próximo. Por outras palavras, é apresentado aos trabalhadores um - falso - dilema, de forma a que a parte do capital no produto criado se mantenha constante...
Na cabeça da Helena Garrido nem por sombras se questiona aquilo que ela designa por modelos. Todos os modelos - simplificações da realidade usadas para tentar prever o futuro - têm subjacentes pressupostos e sistemas de ideias, algumas mesmos ideológicas. Mas chamar-lhe modelos dá-lhe uma patine de universalidade e infalibilidade que esses ditos modelos estão longe de ter. Sobretudo quando as ideias subjacentes são aquelas em que Helena Garrido foi formada (Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa).
Veja-se a conjuntura de 2010 a 2013 em Portugal.
Os modelos aplicados tinham essa ideia precisamente: corte-se nos salários, desvalorize-se a remuneração do trabalho e a economia crescerá. Porquê? Essa parte não era totalmente dita: porque esse corte salarial se traduz numa apropriação pelas empresas de valor criado, e essa apropriação poderia - poderia... - gerar mais investimento.
E a vida das pessoas que recebem salários? E a desigualdade de rendimento? E mais não seja, o papel impulsionador da procura interna gerado pelos rendimentos do trabalho? Como crescer se a procura interna for deprimida?
Perguntas básicas e essenciais. Mas a Helena Garrido estava longe de as aceitar como tal. E por isso defendeu sempre o contrário. Vejam-se alguns exemplos:
A ideia era mais ou menos esta:
Os modelos económicos dizem que se os trabalhadores aceitassem uma redução dos salários, o desemprego não subia tanto. Mas como os trabalhadores consideram que isso não é justo, não aceitam. E geram mais conflitualidade, prejudicando a vida das empresas. Por isso, é que se diz que os mercados devem ser flexíveis, para que possam gerar todos esses efeitos. Mas o pensamento das pessoas também tem um papel.
Ou seja, os trabalhadores tomam decisões irracionais - impedir que os salários desçam - porque acham que não justas. E essa decisão não seria justa porque estaria a impedir o emprego (barato!) do próximo. Por outras palavras, é apresentado aos trabalhadores um - falso - dilema, de forma a que a parte do capital no produto criado se mantenha constante...
Na cabeça da Helena Garrido nem por sombras se questiona aquilo que ela designa por modelos. Todos os modelos - simplificações da realidade usadas para tentar prever o futuro - têm subjacentes pressupostos e sistemas de ideias, algumas mesmos ideológicas. Mas chamar-lhe modelos dá-lhe uma patine de universalidade e infalibilidade que esses ditos modelos estão longe de ter. Sobretudo quando as ideias subjacentes são aquelas em que Helena Garrido foi formada (Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa).
Veja-se a conjuntura de 2010 a 2013 em Portugal.
Os modelos aplicados tinham essa ideia precisamente: corte-se nos salários, desvalorize-se a remuneração do trabalho e a economia crescerá. Porquê? Essa parte não era totalmente dita: porque esse corte salarial se traduz numa apropriação pelas empresas de valor criado, e essa apropriação poderia - poderia... - gerar mais investimento.
E a vida das pessoas que recebem salários? E a desigualdade de rendimento? E mais não seja, o papel impulsionador da procura interna gerado pelos rendimentos do trabalho? Como crescer se a procura interna for deprimida?
Perguntas básicas e essenciais. Mas a Helena Garrido estava longe de as aceitar como tal. E por isso defendeu sempre o contrário. Vejam-se alguns exemplos:
Hoje, no ISEG
A primeira sessão do Ciclo de História do Pensamento Económico, promovido pelo Coletivo Economia Plural e dedicada à «Economia Política Clássica», tem como convidado o José Castro Caldas. É na Sala 106 F1, a partir das 17h00. Apareçam.
segunda-feira, 9 de outubro de 2017
Economia para Todos no YouTube
Comecei a participar num programa de TV por canal YouTube, a TF Media. Embora ainda em fase de ensaios, aqui está o primeiro debate do programa "Economia para Todos". Isto é cidadania em movimento. Uma alternativa para os que estão fartos da falta de pluralismo nos media convencionais.
O Prémio ‘Nobel’ da Economia
Foi hoje atribuído o Prémio do Banco Central da Suécia para as Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel – vulgarmente, mas erradamente, designado por Prémio Nobel da Economia – ao economista norte-americano Richard H. Thaler. É um prémio já esperado e que reconhece o seu contributo para a economia comportamental.
A economia comportamental – o programa de investigação na área de confluência entre a Economia e a Psicologia – procura integrar resultados da psicologia, sobretudo cognitiva, no estudo da economia. Um dos seus principais contributos é a introdução de um entendimento mais realista sobre a racionalidade individual (limitada) e sobre as motivações humanas (complexas e logo não redutíveis ao egoísmo psicológico).
Embora a economia comportamental pareça tornar “a economia um pouco mais humana”, não nos iludamos. Desde logo, os prémios suecos são na generalidade conservadores, premiando áreas bem consolidadas na ciência económica. Isto confirma-se mais uma vez: a economia comportamental não altera nada de fundamental na ciência económica, mantendo o mesmo ênfase no formalismo e abstração teórica, descurando o contexto histórico e político das ações e interações humanas.
Também não altera muito do ponto vista das propostas de política, também elas utilmente postas ao serviço do neoliberalismo com nudges (empurrões). A única diferença é que os mercados são agora promovidos por via das correções dos erros humanos, reconhecido o facto de que o indivíduo não é um homo economicus.
A economia comportamental – o programa de investigação na área de confluência entre a Economia e a Psicologia – procura integrar resultados da psicologia, sobretudo cognitiva, no estudo da economia. Um dos seus principais contributos é a introdução de um entendimento mais realista sobre a racionalidade individual (limitada) e sobre as motivações humanas (complexas e logo não redutíveis ao egoísmo psicológico).
Embora a economia comportamental pareça tornar “a economia um pouco mais humana”, não nos iludamos. Desde logo, os prémios suecos são na generalidade conservadores, premiando áreas bem consolidadas na ciência económica. Isto confirma-se mais uma vez: a economia comportamental não altera nada de fundamental na ciência económica, mantendo o mesmo ênfase no formalismo e abstração teórica, descurando o contexto histórico e político das ações e interações humanas.
Também não altera muito do ponto vista das propostas de política, também elas utilmente postas ao serviço do neoliberalismo com nudges (empurrões). A única diferença é que os mercados são agora promovidos por via das correções dos erros humanos, reconhecido o facto de que o indivíduo não é um homo economicus.
O poder que nunca teriam nas urnas
«Por que é que a direita mais radical, a versão nacional da alt-right americana, que tem como órgão de expressão o Observador, não se preocupa com o CDS, mas sim com o PSD? (...) Porque instrumentalmente é o PSD que tem os votos e não o CDS, e é o PSD que pode, como se viu, prosseguir uma política agressiva que corresponda aos seus interesses e visão do mundo. (...) A nossa alt-right está para o PSD e Passos Coelho como a sua congénere americana está para Trump: não o reconhecem como sendo dos “deles”, mas têm perfeitamente consciência que foi ele que lhes deu o poder que nunca teriam nas urnas. (...) Acresce que a direita tipo do PNR não lhes serve para nada, visto que é o exercício do poder político que lhes interessa e não a ortodoxia política, nem mimetismos das “frentes nacionais” europeias. Como tiveram a sorte grande, agora não lhes basta a terminação.
(...) Começaram a construir uma rede de influência na comunicação social (o projecto do Observador é isso mesmo), nas redes sociais, nos think tanks das universidades e fundações, num establishment intelectual e de influência que conta com poderosos apoios financeiros. Tiveram uma história com algumas ambiguidades, desde a fase de “filhos do Independente”, depois ligados ao surto dos blogues, e em que cultivavam uma aliança natural, geracional, cultural com uma parte da esquerda, com troca mútua de cumprimentos e elogios, uniram-se nos programas do “engraçadismo” e partilharam algumas causas do “politicamente correcto” que agora abominam. Depois passaram para o serious business.
(...) Não é uma direita nacionalista e isolacionista, perceberam a importância que a Europa e os seus diktats económicos tinham em permitir-lhes uma tentativa de engenharia social que nunca passaria nas urnas se fosse apresentada aos eleitores. Esta foi, aliás, uma função essencial do PSD de Passos Coelho e que os levou a abandonarem as suas reservas ao federalismo e intervencionismo cosmopolita da Europa, para se tornarem europeístas. Não é por acaso que estão contra o nacionalismo catalão, não só pela sua afinidade com o espanholismo de génese falangista, mas também porque os equilíbrios do poder na Europa precisam do PP espanhol, como cá precisam do PSD.
(...) O que eles não querem é que o PSD olhe de novo, com uma visão reformista, para os problemas sociais da sociedade portuguesa, para a enorme pobreza que subsiste, para a dignidade do trabalho, para o controlo dos grupos económicos, para uma política de emigração equilibrada e justa, para uma constante preocupação com a existência de um elevador social que precisa do Estado e de impostos progressivos, que garanta direitos mínimos aos portugueses no plano da educação, habitação e da saúde. (...) Por que é que isto afronta a nossa alt-right? Porque, ao diminuir o enorme fosso que separa a riqueza da pobreza e ao dar poder “aos de baixo”, seja sob a forma de direitos sociais, de educação, de trabalho, de viver uma vida digna, põe em causa o direito que os poderosos acham que têm pelo nascimento ou pela natureza à sua liberdade.»
José Pacheco Pereira, O pavor da nossa alt-right com a possibilidade de lhes fugir o PSD
(na foto, sessão no Beato do «Compromisso Portugal», o movimento iniciado em 2004 e que, como oportunamente assinalou o João Ramos de Almeida, regressaria em 2014 sob a forma de «Observador»)
(...) Começaram a construir uma rede de influência na comunicação social (o projecto do Observador é isso mesmo), nas redes sociais, nos think tanks das universidades e fundações, num establishment intelectual e de influência que conta com poderosos apoios financeiros. Tiveram uma história com algumas ambiguidades, desde a fase de “filhos do Independente”, depois ligados ao surto dos blogues, e em que cultivavam uma aliança natural, geracional, cultural com uma parte da esquerda, com troca mútua de cumprimentos e elogios, uniram-se nos programas do “engraçadismo” e partilharam algumas causas do “politicamente correcto” que agora abominam. Depois passaram para o serious business.
(...) Não é uma direita nacionalista e isolacionista, perceberam a importância que a Europa e os seus diktats económicos tinham em permitir-lhes uma tentativa de engenharia social que nunca passaria nas urnas se fosse apresentada aos eleitores. Esta foi, aliás, uma função essencial do PSD de Passos Coelho e que os levou a abandonarem as suas reservas ao federalismo e intervencionismo cosmopolita da Europa, para se tornarem europeístas. Não é por acaso que estão contra o nacionalismo catalão, não só pela sua afinidade com o espanholismo de génese falangista, mas também porque os equilíbrios do poder na Europa precisam do PP espanhol, como cá precisam do PSD.
(...) O que eles não querem é que o PSD olhe de novo, com uma visão reformista, para os problemas sociais da sociedade portuguesa, para a enorme pobreza que subsiste, para a dignidade do trabalho, para o controlo dos grupos económicos, para uma política de emigração equilibrada e justa, para uma constante preocupação com a existência de um elevador social que precisa do Estado e de impostos progressivos, que garanta direitos mínimos aos portugueses no plano da educação, habitação e da saúde. (...) Por que é que isto afronta a nossa alt-right? Porque, ao diminuir o enorme fosso que separa a riqueza da pobreza e ao dar poder “aos de baixo”, seja sob a forma de direitos sociais, de educação, de trabalho, de viver uma vida digna, põe em causa o direito que os poderosos acham que têm pelo nascimento ou pela natureza à sua liberdade.»
José Pacheco Pereira, O pavor da nossa alt-right com a possibilidade de lhes fugir o PSD
(na foto, sessão no Beato do «Compromisso Portugal», o movimento iniciado em 2004 e que, como oportunamente assinalou o João Ramos de Almeida, regressaria em 2014 sob a forma de «Observador»)
Descaramento e desequilíbrio
O CDS está a perder a face e o equilíbrio. Já nem consulta o seu fiscalista de eleição, António Lobo Xavier, para apresentar as suas propostas fiscais no Orçamento de Estado de 2018.
Depois de se tornar conhecido que o Governo e os seus parceiros parlamentares iriam criar dois novos escalões de IRS e uma subida do limiar de isenção de IRS, o CDS - que sempre defendeu a redução do número de escações de IRS como forma de pôr "as pessoas a trabalhar melhor ou mais" -recusa-se a voltar a defender a sua velha ideia já que pareceria mal estar a defender, sim, a descida do IRS "para todos", leia-se, "para os 11% que pagam 70%". Mas não podia ficar a atrás.
A nova ideia do CDS é a de que as horas de trabalho extraordinário, feitas pelos trabalhadores, fiquem isentas de IRS. E o argumento é dos mais descarados: não é justo que o esforço extraordinário do trabalhador seja apropriado pelo Estado!
Na verdade, o que o CDS está a fazer é colocar o Estado a subsidiar o trabalho extraordinário, já que o rendimento líquido dos trabalhadores se reduziria e se tornaria mais atraente. O CDS que aprovou o pacote laboral de 2012 que - entre muitas medidas - cortou a metade o preço pago pelo patronato pelo trabalho extraordinário - agora quer ajudá-lo de novo pondo o Estado a contribuir, ao mesmo tempo que se afirma muito preocupada pelos trabalhadores votantes...
Ora, se o trabalho extraordinário é pouco atractivo às empresas, que se suba o seu preço, mas nunca se ponha em causa o princípio de que todo o rendimento deve ser tributado.
A nova líder está a ganhar os tiques do seu patrono Portas: é muito criativo nas suas justificações. Já quando o CDS foi o partido que defendeu o fim do imposto sucessório, o argumento foi que não era justo o Estado até tributar a morte, quando na verdade o que se estava era tributar os vivos que recebiam a herança, em nome da igualdade de oportunidades, algo que o CDS sempre defende, mas que apenas aceita quando é o Estado a pagar. E aí obviamente que os atingidos não eram os mais pobres...
O CDS tem destas coisas: inverte a lógica da intenção para ter o apoio dos pequeninos ao benefício dos outros. Eis a verdadeira face do populismo.
Depois de se tornar conhecido que o Governo e os seus parceiros parlamentares iriam criar dois novos escalões de IRS e uma subida do limiar de isenção de IRS, o CDS - que sempre defendeu a redução do número de escações de IRS como forma de pôr "as pessoas a trabalhar melhor ou mais" -recusa-se a voltar a defender a sua velha ideia já que pareceria mal estar a defender, sim, a descida do IRS "para todos", leia-se, "para os 11% que pagam 70%". Mas não podia ficar a atrás.
A nova ideia do CDS é a de que as horas de trabalho extraordinário, feitas pelos trabalhadores, fiquem isentas de IRS. E o argumento é dos mais descarados: não é justo que o esforço extraordinário do trabalhador seja apropriado pelo Estado!
Na verdade, o que o CDS está a fazer é colocar o Estado a subsidiar o trabalho extraordinário, já que o rendimento líquido dos trabalhadores se reduziria e se tornaria mais atraente. O CDS que aprovou o pacote laboral de 2012 que - entre muitas medidas - cortou a metade o preço pago pelo patronato pelo trabalho extraordinário - agora quer ajudá-lo de novo pondo o Estado a contribuir, ao mesmo tempo que se afirma muito preocupada pelos trabalhadores votantes...
Ora, se o trabalho extraordinário é pouco atractivo às empresas, que se suba o seu preço, mas nunca se ponha em causa o princípio de que todo o rendimento deve ser tributado.
A nova líder está a ganhar os tiques do seu patrono Portas: é muito criativo nas suas justificações. Já quando o CDS foi o partido que defendeu o fim do imposto sucessório, o argumento foi que não era justo o Estado até tributar a morte, quando na verdade o que se estava era tributar os vivos que recebiam a herança, em nome da igualdade de oportunidades, algo que o CDS sempre defende, mas que apenas aceita quando é o Estado a pagar. E aí obviamente que os atingidos não eram os mais pobres...
O CDS tem destas coisas: inverte a lógica da intenção para ter o apoio dos pequeninos ao benefício dos outros. Eis a verdadeira face do populismo.
sábado, 7 de outubro de 2017
sexta-feira, 6 de outubro de 2017
A nossa economia política é o trabalho
Há 150 anos atrás, em 1867, saía o primeiro livro de O Capital, da autoria de Karl Marx, que se tornaria uma obra central na história da economia política. A certa altura, Marx exorta o leitor a segui-lo “até ao lugar oculto da produção”, franqueando a porta que diz proibida a entrada a pessoas estranhas ao serviço. Só aí, onde se trabalha e cria valor, se tornaria visível para todos “como o capital produz, mas também como se produz ele próprio, o capital”.
Esta exortação mantém no século XXI uma grande actualidade em termos de método, de possibilidade de conhecimento, e em termos políticos. De facto, as relações laborais continuam a ser o elo central das sociedades capitalistas. Isto não impede, antes pelo contrário, que exista todo um esforço ideológico liberal para as ocultar. Mas de vez em quando, por denúncia de quem trabalha, o leitor tem um vislumbre do que se passa num tempo em que os freios e contrapesos legislativos e sindicais ao poder patronal foram enfraquecidos.
O resto do artigo pode ser lido no Público.
Esta exortação mantém no século XXI uma grande actualidade em termos de método, de possibilidade de conhecimento, e em termos políticos. De facto, as relações laborais continuam a ser o elo central das sociedades capitalistas. Isto não impede, antes pelo contrário, que exista todo um esforço ideológico liberal para as ocultar. Mas de vez em quando, por denúncia de quem trabalha, o leitor tem um vislumbre do que se passa num tempo em que os freios e contrapesos legislativos e sindicais ao poder patronal foram enfraquecidos.
O resto do artigo pode ser lido no Público.
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