terça-feira, 24 de maio de 2022
Companhias
segunda-feira, 23 de maio de 2022
Meia dúzia
1. Estima-se que os grandes capitalistas, de sectores que vão da alimentação à energia, estejam hoje 453 mil milhões de dólares mais ricos do que há dois anos. O fenómeno global tem declinações nacionais: por cá, as Paulas Amorins e os Soares dos Santos deste desgraçado capitalismo têm motivos para sorrir. É que nem um modesto imposto extraordinário à italiana os irá perturbar, quanto mais controlos de margens e de preços.
Rankings, aqui vamos nós outra vez
Saíram os resultados do ranking do Financial Times para a formação executiva em 2022. Nas próximas horas, vamos presenciar o desfilar do orgulho insuflado das insitituições nacionais que integram o ranking e a sua amplificação pela comunicação social, cada vez mais incapaz de ter uma linha editorial com o mínimo de espírito crítico.
A primeira coisa que importa relembrar é que este ranking não avalia as instituições de ensino na sua globalidade. Ou seja, o ranking não está a avaliar a NOVA, a Católica, a FEP ou o ISEG, está apenas a avaliar a formação executiva ministrada nessas faculdades. A formação executiva é uma formação que não confere grau académico. Amiúde, é desenhada em parceria entre empresas e faculdade, sendo o ensino ministrado por um misto de académicos e atores relevantes dos setores. É, na verdade, um produto criado para o mercado.
Depois, é preciso recordar que o mais importante de um ranking é sabermos os seus critérios. Sem isso, estamos completamente cegos quanto ao que está a ser verdadeiramente avaliado.
E que critérios tem o Financial Times? Deixo-vos apenas com quatro deles, para aferirem da escassa utilidade do exercício.
Alguns exemplos:
"Preparação (9.1): nível de interação entre cliente e escola, até que ponto as ideias dos clientes foram integradas no programa e a eficácia da escola em incorporar suas pesquisas mais recentes ao ensino.
Value for money (8,8): avaliação dos clientes do design do programa, ensino e materiais para relação custo-benefício.
Crescimento (5,0): com base no crescimento geral das receitas de programas.
Acompanhamento (9.1): nível de acompanhamento oferecido após o retorno dos participantes aos seus locais de trabalho e oportunidades de networking com colegas participantes."
Traduzindo: parte essencial da avaliação depende de uma relação clientelar e mercantil entre o mundo empresarial e o meio académico (a integração das ideias dos "clientes" melhora a pontuação), a capacidade de gerar receita a partir dos programas é valorizada, bem como a capacidade dos alunos (desculpem, clientes) atribuírem uma boa relação custo-benefício e expandirem a sua network.
O ranking do Financial Times não avalia a qualidade académica. Avalia a capacidade das faculdades de negócios se transformarem no ideal-tipo da universidade neoliberal.
As formações executivas das faculdades estão transformadas em pouco mais do que programas com propinas milionárias, em que a busca de conhecimento substantivo não é o objetivo principal. O que todos desejam é frequentar o mesmo coffee-break que o diretor da empresa que os pode vir a contratar. Pelo preço cobrado, não é bem um programa académico: é uma tentativa de comprar um bilhete dourado para o topo através da partilha de uns croquetes e de umas miniaturas.
A universidade a que aspiramos é outra. A que tem o conhecimento no seu centro, se coloca ao serviço da sociedade e rejeita ser mais um elo das cadeias de reprodução das desigualdades de poder que caracterizam as nossas sociedades.
Essa universidade será construída contra o ranking do Financial Times, ao invés de a ele se submeter.
sábado, 21 de maio de 2022
sexta-feira, 20 de maio de 2022
Do «retorno» do SNS para a economia
Nestes termos, concluiu-se que em 2021/22 os cuidados de saúde prestados pelo SNS permitiram que o número médio de dias faltados por doença fosse aproximadamente de 7 em vez de 10 (o que se traduz num ganho a rondar os 1,1 mil M€), ao mesmo tempo que o número médio de dias perdidos, em termos de produtividade, fosse de 17 e não de 27 (o que se traduz num ganho a rondar os 3,9 mil M€). Aplicando a estes valores um índice de remuneração de trabalho, obtém-se um ganho global de 7,5 mil M€, acima do registado em 2020 (a rondar os 6,8 mil M€).
Contas feitas, importa assinalar o que estes ganhos (que são apenas uma parte, mais «material», dos benefícios decorrentes da prestação de cuidados de saúde) representam face ao investimento no SNS. Como mostra o gráfico aqui em cima, em 2021 «compensam» quase 60% da despesa total do SNS inscrita no orçamento do Ministério da Saúde, permitindo considerar que a mesma se reduz, em termos «líquidos», de cerca de 12,4 mil M€ para 4,9 mil M€. Trata-se, aliás, da diferença mais significativa registada nos últimos quatro anos.
Não têm por isso razão os que sugerem, de modo mais ou menos velado, que o investimento em serviços de provisão pública direta, neste caso em saúde, deve ser encarado como simples despesa, como sendo o que a economia produz e que o Estado gasta. Aliás, e percebendo a boa intenção associada ideia de «retorno para a economia» decorrente da prestação universal de cuidados pelo SNS, importa sublinhar que o próprio SNS é, também ele, economia (desde logo pelo emprego que gera, mas também pelos setores de atividade que mobiliza e serviços que presta).
quinta-feira, 19 de maio de 2022
O imperialismo não é um lapso
quarta-feira, 18 de maio de 2022
O que pode correr mal?
Deixem ver se percebo o plano das elites euro-liberais, cada vez mais na sombra dos EUA e da sua aposta na exportação de armas e de gás: insistir na escalada sancionatória, com as respetivas pressões inflacionárias a serem combatidas, de forma ineficiente e injusta, por via da subida das taxas de juro pelo BCE, ou seja, por via da recessão e do desemprego. O que pode correr mal?
terça-feira, 17 de maio de 2022
É proibido proibir?
Alguém me pode explicar a razão para andarmos a dar respeitabilidade às criptomoedas, através da proposta da sua taxação, ao invés de pura e simplesmente proibir tais “ativos” especulativos, literal e metaforicamente tóxicos, até tendo em conta a energia que consomem, como fez por exemplo a China?
Não é um slogan
Estive a trocar umas ideias com Daniel Oliveira sobre o neoliberalismo, que não é mesmo um slogan. Podem ouvir a conversa no podcast Perguntar não ofende.
E aproveito para deixar o convite para a primeira sessão de apresentação de um livro que estará esta semana nas livrarias.
segunda-feira, 16 de maio de 2022
sexta-feira, 13 de maio de 2022
Preços dos combustíveis: a guerra sem cartel dos liberais
Depois de dois meses em que os preços dos combustíveis subiram para máximos históricos, o anúncio da redução do ISP suscitou uma grande expectativa em relação à descida. O Governo garantiu uma redução de 15 cêntimos por litro no preço da gasolina e do gasóleo em resultado desta medida. A direita aplaudiu a medida e a Iniciativa Liberal (IL) chegou mesmo a decretar uma “vitória liberal”. Mas quando as pessoas se dirigiram às bombas para encher o depósito na segunda-feira seguinte descobriram que muitas gasolineiras tinham mantido os preços ou reduzido menos do que o anunciado.
A IL (quem mais?) saiu em defesa do mercado, dizendo que as margens de comercialização das gasolineiras não se têm afastado da média recente. Só que até as próprias empresas são mais honestas em relação à sua atuação. O presidente da Galp, Andy Brown, reconheceu recentemente que a empresa tem registado lucros extraordinários à boleia da crise. “O mercado da energia está num estado de perturbação que nunca vi. Mas sim, estamos a ganhar dinheiro e a guerra fez subir os preços”, explicou.
O resto do artigo pode ser lido no Setenta e Quatro.
quinta-feira, 12 de maio de 2022
Ler mal ou demasiado bem
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Jornal Expresso online, 8/12/2021 |
Em Dezembro de 2021, as autoridades russas alertaram para as "consequências perigosas" e que usariam todos os meios disponíveis para pôr fim a ameaças que consideravam estar a ser feitas com o aumento das actividades militares dos Estados Unidos e dos países da NATO nas fronteiras russas. Perigosas ou não, as movimentações militares não ajudaram a criar um ambiente de paz, propício a um entendimento pacífico entre a NATO e a Rússia. Os Estados Unidos poderiam ter esvaziado a situação, afirmando que a adesão da Ucrânia à NATO nunca seria aceite, que era do interesse da Humanidade que se mantivesse neutra e promovendo uma solução pacífica para a região coberta pelos acordos de Minsk. Mas isso não aconteceu. E sabemos hoje, quais foram "todos os meios disponíveis" - irrazoáveis, ilegais, humanamente condenáveis, que, no nevoeiro da guerra, fizeram emergir forças mortíferas incontroláveis - usados pela Rússia desde 24 de Fevereiro de 2022.
Mas das duas, uma: ou a invasão russa da Ucrânia não foi uma surpresa e então é de concluir que a invasão militar fazia parte dos planos da NATO; ou foi uma surpresa e então isso quer dizer que a NATO e o Ocidente não entendem as preocupações e as palavras do Kremlin, não percebem como lá se pensa e, por isso, não levaram a sério os alertas e protestos russos.
Nenhuma destas hipóteses abona muito a favor da razoabilidade das estruturas da NATO e do que presentemente se passa no Ocidente, com os alertas da Rússia de que está disponível para usar armas nucleares (dispositivos previstos no seu conceito militar) e, nomeadamente, com o pedido da adesão da Finlândia e da Suécia à NATO.
Veja-se a mensagem bélica que é passada pela comunicação social que cobre esses avisos.
quarta-feira, 11 de maio de 2022
Coisa mista
terça-feira, 10 de maio de 2022
Dia 18 de maio: videoconferência Práxis sobre o impacto da negociação coletiva nos salários em Portugal

Estas são algumas das pertinentes questões que a videoconferência da Práxis coloca em debate, partindo de um estudo recente sobre «o contributo do salário convencional no setor privado para a evolução do salário ao longo do ciclo de vida».
A sessão conta com a participação dos autores, David Card («Prémio Nobel da Economia» 2021) e Ana Rute Cardoso (investigadora do ICS), que o apresentam, seguindo-se os comentários de Sérgio Monte (Secretário Geral Adjunto da UGT), Manuel Freitas (Dirigente da FESETE/CGTP-IN) e Diogo Martins (Economista e doutorando na Universidade de Massachussets Amherst). A moderação e o encerramento estão a cargo de Reinhard Naumann (Direção da Práxis).
A videoconferência realiza-se no próximo dia 18 de maio, quarta-feira, a partir das 18h00, devendo a inscrição ser feita aqui. Está assegurada a tradução simultânea e o estudo pode ser descarregado aqui (aos inscritos na sessão será facultado um resumo do mesmo em português).
segunda-feira, 9 de maio de 2022
Pressões políticas
domingo, 8 de maio de 2022
Um jornal do trabalho
O novo ministro das Finanças, Fernando Medina, não podia ter sido mais ofuscador sobre a linha que preside ao Orçamento do Estado (OE): «Ter contas certas é uma política de esquerda». O novo ministro da Economia, António Costa Silva, não podia ter sido mais hesitante em relação a uma proposta fiscal, modesta e defendida por várias organizações internacionais insuspeitas, mas ainda assim destinada a ficar na gaveta governamental: «Não podemos hostilizar as empresas, mas vamos falar com elas e provavelmente vamos considerar um windfall tax [imposto extraordinário] para os lucros aleatórios e inesperados que elas estão a ter». Por sua vez, o primeiro-ministro António Costa foi claro sobre as consequências socioeconómicas de uma maioria absoluta: «Todos os que viveram nos anos 70 e 80 se recordam [das consequências] de responder unicamente com aumento dos rendimentos ao aumento dos preços. Se os preços estão a aumentar porque os custos de produção estão a subir na área da energia, então, por essa via, iríamos só aumentar mais os custos de produção».
sábado, 7 de maio de 2022
O Alojamento Local e a ilusão de um queijo suiço
A análise, que recorre à georreferenciação de dados, permite igualmente detetar, ao inscrever no mapa as unidades de Alojamento Local, as áreas de maior e menor densidade deste tipo de oferta turística - sim, uma oferta que é turística e não residencial - fazendo sobressair os quarteirões mais e menos ocupados, destacando-se novamente a área do centro histórico, como sucede, por exemplo, em quarteirões da Baixa Pombalina e da zona do Castelo.
Dada a análise fina que esta abordagem permite, compreende-se que Manuel Banza proponha que a suspensão de novas licenças de AL seja aplicada à escala do quarteirão e não da freguesia. De facto, há freguesias abrangidas pela suspensão (quando o número de unidades de AL excede os 2,5% do total de fogos) que têm quarteirões abaixo desse valor, tal como há freguesias que não atingem os 2,5% mas que têm quarteirões com valor superior.
Importa contudo não esquecer que os impactos da oferta de Alojamento Local têm uma lógica de contexto, de mancha, que torna irrelevante a existência de «zonas ocas» (abaixo de 2,5%) em freguesias onde existe um claro excesso de AL. Ou seja, se faz sentido aplicar a restrição a quarteirões contíguos a uma freguesia com elevada incidência (mesmo que a freguesia a que esses quarteirões pertencem esteja abaixo da média), já o levantameto da restrição em quarteirões de freguesias acima da média tem um efeito contraproducente face ao objetivo de limitar o Alojamento Local. Na prática, seria o mesmo que encher os buracos de um queijo suiço apenas para dar a ilusão de que se está a comer um pedaço menor.
sexta-feira, 6 de maio de 2022
Uma jangada ibérica para a transição energética
Perante as consequências dramáticas da guerra na Ucrânia para o sector energético, e de modo a evitar que a escalada de preço do gás natural contagie o preço da eletricidade, os governos ibéricos lançaram uma discussão no Conselho Europeu que viria a redundar num estatuto de exceção para a Península Ibérica.
quinta-feira, 5 de maio de 2022
Eles estão por todo o lado
Prolongando os argumentos de alguns intelectuais que se dizem de esquerda, apostados, por exemplo, em “democratizar” a NATO, uma contradição nos termos tão ou mais absurda do que a da democratização da UE, Lula não passaria de um “putinista”, à imagem e semelhança dos comunistas portugueses:
“Ele [Zelensky] quis a guerra. Se ele [não] quisesse a guerra, ele teria negociado um pouco mais. É assim. Eu fiz uma crítica ao Putin quando estava na Cidade do México, dizendo que foi errado invadir. Mas eu acho que ninguém está procurando contribuir para ter paz. As pessoas estão estimulando o ódio contra o Putin. Isso não vai resolver. É preciso estimular um acordo.”
E o próprio Papa Francisco parece vagamente suspeito na sua contextualização em torno da expansão da imperial NATO.
Em ambos os casos, aposto que é da influência maligna da teologia da libertação.
Dêem uma farda a Von der Leyen
Foi há dias e mais ou menos na mesma altura.
Primeiro. A presidente da Comissão Europeia dirigiu-se ao parlamento europeu para apresentar mais um pacote de sanções à Russia, incluindo mais limites à informação, depois da suspensão dos canais Russia Today (RT) e Sputnik (procurar "sanções contra os autores da desinformação"):
Terceiro, estamos banindo três grandes emissoras estatais russas de nossas ondas de rádio. Eles não poderão mais distribuir seu conteúdo na UE, seja qual for o formato, seja por cabo, satélite, internet ou aplicativos para smartphones. Identificamos esses canais de TV como porta-vozes que amplificam agressivamente as mentiras e a propaganda de Putin. Não devemos mais dar-lhes um palco para espalhar essas mentiras.
Este tipo de sanções não representam apenas o fecho às emissões destes canais. De acordo com a informação prestada pela Comissão Europeia sobre os casos RT e Sputnik, limita-se o próprio exercício da liberdade de informaçao (procurar E.Others filelds - Media):
(...) Ao mesmo tempo, a liberdade de expressão pode ser restringida de forma proporcional por interesses públicos legítimos. A liberdade de expressão não pode ser invocada por outros meios de comunicação para contornar o regulamento. A não evasão aplica-se igualmente aos jornalistas. Assim, se outro meio de comunicação ou jornalista pretender informar os seus leitores/espectadores, mas na realidade a sua conduta visar transmitir ao público o conteúdo do Russia Today ou Sputnik ou tem esse efeito, estará a violar a proibição estabelecida no Regulamento.
Q6. A proibição inclui responsabilidades para os operadores para garantir que a proibição seja aplicada. “Operadores” não é um termo definido; como esse termo deve ser entendido?
O regulamento estabelece uma proibição ampla e abrangente. O Regulamento proíbe tanto a radiodifusão (lato sensu) como o facto de os operadores “permitirem, facilitarem ou de qualquer outra forma contribuirem para a radiodifusão”. Assim, a proibição aplica-se a qualquer pessoa física ou jurídica que exerça uma atividade comercial ou profissional que transmita ou permita, facilite ou contribua de outra forma para difundir o conteúdo em questão. Além disso, por força da cláusula geral e ampla de não evasão do artigo 12.º do Regulamento n.º 833/2014, é proibida a participação, consciente e intencionalmente, em atividades que tenham por objeto ou efeito contornar a proibição em causa, incluindo agindo em substituição de uma pessoa singular ou colectiva, entidade ou organismo sujeito à proibição prevista no artigo 2.º-F do regulamento. Os operadores não podem proteger-se das obrigações decorrentes do Regulamento n.º 833/2014 invocando outras disposições do direito derivado da UE, como o artigo 15.º da Diretiva de comércio eletrónico.
Trata-se, portanto, de censura.
Censura para evitar que informação - segundo a Comissão Europeia, mentirosa e propagandística - chegue aos cidadãos europeus desinformados. Mas ao mesmo tempo, a Comissão lança-se num trabalho bélico de propaganda contra a Rússia. E pior: nada impede a que a mentira e a propaganda possam ser exercidas sobre os cidadãos europeus, pelos canais dos "amigos" da Ucrânia, alinhando com o esforço de guerra, de forma a manter os europeus unidos na guerra ainda não declarada à Rússia.
Segundo. Mais ou menos na mesma altura que Ursula Von der Leyen se dirigia aos
eurodeputados, tornou-se conhecido que as múltiplas "notícias"
veiculadas desde os primeiros dias da guerra na Ucrânia referindo a
existência de um piloto ucraniano que derrubara dezenas de aviões
russos, tratando-o como herói ou mito, eram na verdade... uma mentira de relações públicas... para levantar o moral.
quarta-feira, 4 de maio de 2022
Serge Halimi em Lisboa
A crise internacional resultante da guerra na Ucrânia acrescenta-se às várias crises que já assolavam o mundo (sanitária, económica, ambiental, etc.) e acentua a responsabilidade dos meios de comunicação social na disponibilização de informação e de análises fiáveis, aprofundadas, verificáveis, contextualizadas. Como mostram as recentes eleições francesas, as esquerdas europeias que se opõem ao neoliberalismo e à extrema-direita estão há vários anos em perda. Que desafios se colocam à sua influência social e política? Como recolocar a esperança?
Poderão assistir à sessão pelo Youtube.
Da verdadeira liberdade
«O "meu" Abril não é apenas a instituição de uma democracia política e formal. O meu Abril implicava haver também uma democracia económica. Não no sentido de haver liberdade de empreendedorismo, mas no de assegurar o bem-estar para toda a gente.
Só quando estão asseguradas as liberdades básicas - o pão, a habitação... - é que as pessoas podem ter liberdade de pensar, de escolher, de se instruírem. Se o básico não estiver assegurado, estarão concentradas na sua sobrevivência e são facilmente manipuladas. Falta assegurar o básico a todos e a cada um.»
Adolfo Luxúria Canibal (Blitz)
terça-feira, 3 de maio de 2022
O liberalismo "funciona".. e dá dinheiro às gasolineiras
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Site Correio da Manhã, 2/5/2022 |
Até parece o lado negro das ideias da Iniciativa Liberal.
Para fazer baixar os preços dos combustíveis, parecia suficiente baixar a "carga fiscal" que incidisse sobre esses produtos que, imediatamente, por artes fluidas da economia de mercado, os preços se ajustariam, o consumo aumentaria e todos lucraríamos, felizes. Só que alguém se apropriou da felicidade colectiva.
Afinal, há interesses que conflituam entre si e o mercado, afinal, não é uma entidade etérea, onde os agentes económicos competem entre si através da baixa de preços, mas sim uma organização dominada por um número muito limitado de grandes operadores, sob suspeita permanente - às vezes provada - de cartelização de preços. E - como era de esperar - a baixa dos impostos foi apropriada por quem reina no mercado e por quem determina o preço e a quantidade a vender.
A receita fiscal - que poderia ser usada pelo Estado em proveito dos cidadãos, na educação, saúde, etc. - passou a ser um "subsídio" aos donos das empresas gasolineiras, pago directamente pelos consumidores.
Mas por que razão não era isto evidente para o Governo? Lembram-se da criação do "IVA da restauração" (criação da taxa intermédia de IVA em 1996, em vez da taxa normal) que, como foi alegado, era suposto baixar os preços praticados e que apenas fez aumentar a margem dos restaurantes?
Há coisa de um ano, em meados de Julho de 2021, o Governo deu sinais de querer intervir no mercado.
Porno-riquismo energético
A última edição da Visão, revista pródiga na glamourização do chamado porno-riquismo, inclui um artigo intitulado “Paraíso em risco: costa alentejana varrida por turismo e construção”.
Nem de propósito, há poucos dias soube-se que a Energia Unida, uma empresa centrada na dinamização de comunidades de energia renovável (CERs), e a Vanguard Properties, um promotor imobiliário que atua no segmento de luxo, estabeleceram uma parceria para criar a “maior comunidade energética da Europa na Comporta”. Esta CER insere-se no projeto imobiliário “Terras da Comporta”, um empreendimento de luxo de 11 milhões de euros.
Na legislação portuguesa, uma CER consiste numa pessoa coletiva, cujos membros, sócios ou acionistas “podem ser pessoas singulares ou coletivas, de natureza pública ou privada, incluindo, nomeadamente, pequenas e médias empresas ou autarquias locais” e tem a faculdade de “produzir, consumir, armazenar, comprar e vender energia renovável com os seus membros ou com terceiros”. Note-se que a CER deve ter por “objetivo principal propiciar aos membros ou às localidades onde opera a comunidade benefícios ambientais, económicos e sociais em vez de lucros financeiros”.
De acordo com o Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030, as CERs, ao disseminarem a produção descentralizada de energia, potenciariam a “participação ativa” dos cidadãos na transição energética, contribuindo para a mitigação da pobreza energética.
Contudo, as CERs, virtualmente inexistentes em Portugal, e desconhecidas da maioria dos cidadãos, são já um nicho apetecível para as comercializadoras de energia elétrica, que começam assim a oferecer soluções “chave na mão“ aos consumidores, desvirtuando a missão das prórpias CER - a democratização da energia - e ditando a sua mercadorização.
Eis, pois, o primeiro exemplo do cruzamento perverso entre porno-riquismo e transição energética. Certamente, muitos outros virão. Tudo em nome do combate às alterações climáticas, claro, produzidas por sociedades capitalistas crescentemente desiguais, não o esqueçamos.
Revista Manifesto nº 6 - Apresentação em Loulé
O nº 6 da Revista Manifesto será apresentado no próximo sábado, dia 7 de maio, a partir das 16h00, na Biblioteca Municipal de Loulé. Intervém na sessão João Rodrigues, Nuno Serra e Vítor Aleixo, seguindo-se um período de debate.
Esta edição da revista, disponível em várias papelarias e livrarias do país, pode ser adquirida aqui. O editorial deste número e a lista de artigos estão também acessíveis, gratuitamente, na página da Fórum Manifesto.
segunda-feira, 2 de maio de 2022
Razões neste tempo
Apelidar de putinistas aqueles que acham que a NATO não é uma pomba da paz e que alertam para os perigos de envolver a Europa numa guerra contra a Rússia que pode ter consequências devastadoras é de uma insensatez quase suicida. Achar que a guerra não é solução não é apoiar nenhum invasor. Achar que os dirigentes europeus, em vez de alimentar a ilusão de uma vitória militar impossível, com custos humanos inimagináveis, e de se envolver (nos envolver) numa guerra com consequências económicas e sociais imprevisíveis, se deveriam empenhar em encontrar uma solução que permita conciliar as pretensões de segurança de russos e ucranianos, não é apoiar nenhum invasor. Em 1924, milhões de mortos depois de ter sido assassinado por defender a paz, Jean Jaurès foi homenageado em França e trasladado para o Panteão Nacional. Teve razão antes de tempo.
domingo, 1 de maio de 2022
Desinformação
A este respeito, hoje, dia 1 de Maio, dia dos trabalhadores, que informação divulga a conta Twitter do primeiro-ministro António Costa?
Se fossemos uma democracia que se dá ao respeito
O senhor da imagem, dirigente da Associação dos Ucranianos em Portugal, pergunta "Como é que Portugal continua a ter o PCP?".
A resposta à pergunta do senhor é simples: porque somos uma democracia com direitos de liberdade política constitucionalmente consagrados. O PCP existe porque centenas de milhares de portugueses militam nesse partido e outras centenas de milhares votam nele. Ao contrário do que sucedia na "democracia" ucraniana, em Portugal não há partidos políticos proibidos. Muito menos aquele que deu um contributo fundamental para a existência de democracia em Portugal.
Se fossemos uma democracia que se dá ao respeito, afirmações como a deste senhor e semelhantes, como a da embaixadora ucraniana, deveriam merecer repúdio público dos órgãos democráticos nacionais, nomeadamente do Primeiro-Ministro e do Presidente da República. Os titulares desses órgãos deveriam declarar em público ser inaceitável que associações de cidadãos estrangeiros ou representes diplomáticos procurem limitar as liberdades democráticas portuguesas. Como não o fazem, deixam claro que Portugal é uma democracia que se dá pouco ao respeito.
Este é o milésimo alerta que a existência de uma atitude condenável de uma das partes não transforma a outra numa representante virtuosa de bons valores. Sobre a Ucrânia, basta-nos condenar a invasão russa (tal como fizemos com o Iraque) sem no entanto criar heróis que não o devem ser. Isto é, podemos ser solidários com o povo ucraniano contra a invasão sem nos colocarmos ao lado das autoridades ucranianas e dos seus representantes. Tal como foi possível colocarmo-nos ao lado do povo iraquiano invadido sem estar ao lado de Saddam. O amarelo e o azul não são símbolos de liberdade, assim como a bandeira do Iraque não o era.
Os tempos são perigosos. E é neles que se definem os verdadeiros democratas. De um lado, estão os que consideram intolerável a campanha que está a ser movida contra um partido central da democracia portuguesa e se colocam ao seu lado, mesmo que nele não militem ou não sejam seus votantes. Do outro, os que participam ativamente dessa campanha ou se refugiam num silêncio conivente com o objetivo de colher ganhos políticos. Os últimos não respeitam o património democrático que lhes foi legado.
sábado, 30 de abril de 2022
A Revolução dos Cravos segundo a Pordata
Diz-nos a Pordata que somos hoje mais 1,6 milhões face a 1974, ignorando que a tendência nunca deixou de ser, durante o Estado Novo, de crescimento demográfico (apesar das elevadas taxas mortalidade e emigração, durante a ditadura). E destaca também que hoje casamos menos, quando um dado bem mais relevante - deste ponto de vista - seria o da evolução dos divórcios (interditos até 1975 a casais que tivessem optado pelo casamento católico). Tal como nos diz que hoje votamos menos, passando ao lado da farsa que eram os processos eleitorais antes do 25 de Abril.
Exceptuando a referência ao número de doutoramentos, que indicia a progressiva democratização do ensino em Portugal - sendo contudo, para esse efeito, bem mais significativa a análise da evolução das taxas de escolarização, ou do abandono escolar precoce (que em 1992 ainda se situava em 50%, rondando hoje os 6%) - os indicadores escolhidos pela Pordata para assinalar o 25 de Abril parecem, de facto, pretender passar ao lado do ponto de viragem que a data instituiu, nomeadamente em termos de conquistas sociais.
É pois com perplexidade que se constatam as opções da base de dados do Pingo Doce para assinalar a Revolução dos Cravos. Mas depois lembramo-nos que foi também a Pordata que decidiu assinalar o 1º de Maio, Dia do Trabalhador - e a par das repugnantes campanhas de compras nessa data (iniciadas em 2012) - com uma infografia miserável, onde se sugere (por ignorância ou sonsice reiteradas) que a produtividade depende do «desempenho do trabalhador». E então, afinal, tudo começa a fazer sentido.
sexta-feira, 29 de abril de 2022
O Estado a que Vítor Bento chegou
«A tese de Vítor Bento para a direita ter dificuldade em regressar ao poder baseia-se no número de cidadãos que "dependem" do Estado. É pena que não tenha aplicado o seu exercício à escala europeia. Se o fizesse, veria que esta relação de "dependência" do Estado, com alegados determinismos eleitorais, não só não é uma originalidade portuguesa como nos situamos ligeiramente abaixo da média europeia.»
O resto da crónica pode ser lido no Setenta e Quatro.
quinta-feira, 28 de abril de 2022
Um livro
quarta-feira, 27 de abril de 2022
Prioridades geopolíticas
Que dizer de uma política orçamental que, perante as incertezas redobradas do presente, planeia dedicar o equivalente a 0,6% do PIB ao que o Orçamento de Estado para 2022 designa por «medidas de mitigação do choque geopolítico»?
terça-feira, 26 de abril de 2022
Cuidado com os interesses
Depois de nos ter informado em rodapé que um porta-aviões chinês estava a sobrevoar Taiwan, a CNN Portugal garantia-nos na semana passada que “eurocéticos promovem interesses russos”. É preciso ter todo o cuidado com o que se lê e vê nesta comunicação nada social.
segunda-feira, 25 de abril de 2022
Debater
Amanhã, dia 26 de Abril, pelas 18h, participarei num debate com Ilda Figueiredo, Presidente do Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC), na Casa da Cultura, em Coimbra: a situação internacional e urgência da paz. O debate é organizado pelo CPPC. Pela minha parte, desenvolverei estes dez telegramas.
Patti Smith - People have the power
Ou, como dizia há uns tempos o Ricardo Paes Mamede, a propósito desta interpretação (a que cheguei via Paulo Areosa Feio), esta é a versão em inglês de «o povo é quem mais ordena». 25 de Abril Sempre!
domingo, 24 de abril de 2022
«A PIDE e a polícia batiam nos corpos. A censura moldava as cabeças»
«A PIDE e a polícia batiam nos corpos. A censura moldava as cabeças. E deixou um rasto que ainda hoje é vivo. Por exemplo, a desvalorização da democracia; a desvalorização da política como não sendo uma atividade nobre; a desvalorização dos partidos, como sendo apenas organizações de carreiristas e organizações destinadas a garantir aos seus membros melhores condições. A obsessão pelo consenso, ou seja, no fundo, um penalização da ideia de conflito. Há uma frase do professor Cavaco Silva que traduz muito bem este tipo de mundividência da censura que ainda é vivo hoje. É uma frase em que ele diz o seguinte: "Duas pessoas com a mesma informação chegam às mesmas conclusões". Nada mais falso. Duas pessoas com a mesma informação têm interesses diferentes, têm visões do mundo diferentes, têm ideologias diferentes, têm experiências diferentes. E, portanto, não chegam necessariamente à mesma afirmação. E esta obsessão pelo consenso, pelo entendimento, esta desvalorização daquilo que carateriza a democracia é, sem sombra de dúvida, um rasto da censura.»
José Pacheco Pereira, na recente «Grande Entrevista» (RTP3), a propósito da exposição «Proibido por inconveniente - Materiais das Censuras no Arquivo Ephemera», patente até 27 de abril no edifício do Diário de Notícias, em Lisboa.
A inflação e mexilhão
O argumento de o aumento dos salários, acompanhando a inflação e os aumentos de produtividade, gerar uma espiral inflacionista é equivocado e com escassa evidência empírica. O Governo considera que a tributação extraordinária de lucros extraordinários "hostiliza as empresas", mas não considera que o corte de salários hostilize os trabalhadores.
O resto da crónica pode ser lido no setenta e quatro.