sábado, 29 de junho de 2013

Se a má-fé pagasse imposto


Perante o estrondoso falhanço da austeridade e a depressão económica em que vivemos, a má-fé tornou-se o último reduto dos nossos propagandistas de serviço. Um excelente exemplo é este editorial publicado no i por Luís Rosa. O jornalista recupera a ideia da curva da Laffer - conceito sem qualquer aderência empírica que defende que a arrecadação fiscal diminui a partir de um determinado nível de impostos - para defender que o único problema do actual programa de governo foi o aumento brutal dos impostos (que, aparentemente, torna o governo numa cambada de intervencionistas, senão mesmo socialistas). Se o artigo já é inacreditável por se basear numa teoria que o próprio autor reconhece não se verificar em Portugal, o chocante é a forma como se entende o Estado como mero aspirador de recursos. Pois bem, infelizmente o Estado também obedece ao sistema de contabilidade de dupla entrada. O Estado tem receitas (impostos) e tem despesas. Os impostos são perda de rendimento para quem os paga, a despesa é fonte de receita para quem a recebe. Como é que se pode escrever um texto sobre impostos em Portugal e ignorar que o que está a ser tentado é aumentar a receita (perda de rendimento) e diminuir a despesa (novamente perda de rendimento), vulgo austeridade. Talvez seja isso que esteja a destruir a economia e não tanto o nível de impostos em si. Isto para não referir o impacto do polémico “multiplicador”, cujo valor é claramente superior a 1, resultando que um corte no défice tem um efeito recessivo mais do que proporcional no produto e vice-versa.

Pode uma diminuição de impostos servir de estímulo à economia? Claro que pode, mas neste contexto não é tão eficaz como um aumento da despesa pública que se traduz directamente em aumento da procura. Não são os defensores da baixa dos impostos (para o capital, diga-se) os mesmos que pregaram o défice público como o problema da nossa economia? O único bom sinal deste tipo de argumento (liberal?, não me atrevo) é o do enterro final da ideia de “austeridade expansionista" . No entanto, como assinala, também no i, Pedro Braz Teixeira, o que não falta são ideias zombie por aí. Mesmo as elaboradas em guardanapos, como foi a de Laffer.

Finalmente, isto quer dizer que o nosso sistema fiscal é adequado? De todo. Existem impostos claramente demasiado elevados, como IVA, e outros demasiado baixos como o IRC (aquele que o governo quer descer, na premissa que o investimento directo estrangeiro é guiado unicamente pela taxação do capital). Há ainda outros que não existem e devem ser introduzidos (taxação sobre as transacções financeiras, novo modelo de imposto sucessório, etc).

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