segunda-feira, 3 de março de 2014
Ligações de economia política
Streeck é muito claro sobre as razões para a inexistência de uma União Europeia com orçamento redistributivo digno desse nome, em que as regiões ricas financiariam maciçamente as regiões pobres, aguentando-as à tona. Com efeito, a Europa não é um Estado e não o será, até porque os povos não o desejam, o que significa que o federalismo só pode ser furtivo, clientelar e perverso, incapaz de mobilizar lealdades populares. E, mesmo que os povos o desejassem, seria mais do que duvidoso que as transferências pudessem substituir com o mesmo sucesso a mobilização de instrumentos de política à escala nacional. Mas, infelizmente, como Streeck sublinha, nada nos diz que as alianças sociais que sustentam o Euro, e que na periferia incluem elites extrovertidas, as que gostam de moeda forte para viajar e importar bens de consumo mais ou menos conspícuos, não consigam manter um projeto que se aproxima cada vez mais de uma “operacionalização do modelo social hayekiano [anti-social-democrata] da ditadura de uma economia de mercado capitalista acima de qualquer correção democrática” (p. 252).
Excerto da minha recensão ao livro de Wolfgang Streeck. Foi publicada no último número da Revista Crítica de Ciências Sociais, dedicado a perspectivas interdisciplinares sobre consumo e crédito. O Nuno Teles, em coautoria com Ana Cordeiro Santos e Vânia Moreira, publicou aí um artigo sobre economia política do endividamento e do crédito. Neste contexto, chamo também a atenção para o artigo que Ana Cordeiro Santos e Vânia Moreira publicaram na Análise Social sobre a financeirização em Portugal, analisando aí a forma como o Banco que não é de Portugal tenta transferir para os consumidores, através de uma conversa sobre a promoção da literacia financeira, um fardo que deve recair sobre o sistema financeiro. Graças a uma certa economia política, é possível ver que estas coisas - euro, financeirização, endividamento ou poder da banca - estão todas ligadas num tempo em que tudo parece estar à venda.
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4 comentários:
Gostei do excerto!
O federalismo, mesmo pintado, só serve a tal clientela solícita, que gosta de “moeda forte para viajar e importar bens de consumo mais ou menos conspícuos”.
Há por aí muita “mula velha” a pretender reduzir a oposição ao federalismo a uma birra de anti-europeístas, quando do que afinal se trata, é querer uma Europa diferente (o guião convém-lhes...)
Conspícua mesmo é a diferença cultural entre os dependentes do Estado e os organizados em Estado..
A principal razão porque nós estamos atrasados, é devido ao nosso fraco Poder de Compra.
Temos sido muito prejudicados pela velha frase "isso é coisa de comunas".
Como tal, a maioria dos empresários não entende, ainda hoje, que esse não é um Custo de Produção, mas sim um Custo Boomerang.
Ou seja, regressa sempre. Faz crescer as empresas. Etc. É o único Custo de Produção com essa característica, mas é o mais odiado por esse paleio "dos comunas".
Verdade que muita gente, como sindicalistas, não o consegue explicar por vários motivos. Isso é culpa de todos nós.
Sobre a U.E e etc, deixo uma pequena história, baseada em factos reais.
Era uma vez um País, que tinha uma boa industria. Forte, com várias patentes, essas coisas. Muito exportadores. Também um Bom mercado interno, é óbvio. Tinha também uma boa banca. Etc.
Volta e meia ouvia-se , lia-se, que todos os países deviam ter boas industrias, competitivas.
Os empresários desse país, falavam uns com os outros nas CIPs de lá , e ficavam intrigados. Não concordavam de forma alguma.
Diziam " Para quê esses países terem boas industrias, se depois fazem competição connosco?" era costume dizerem... e acrescentavam "Qualquer dia começam a exportar para o nosso país! ".
E continuavam na mesma linha de pensamento "A gente quer é exportar para os países em redor, incluindo esses que querem desenvolver-se, e para isso precisamos que os outros países tenham é Industrias Fracas. " , exclamavam internamente entre eles.
De quem estamos a falar ?
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