domingo, 11 de agosto de 2013

Os SWAPs do Citigroup

Ineditamente, a estrutura dos SWAPs que o Citibank queria vender ao Governo de Sócrates, em 2005, foi tornada pública. Esperemos por aquelas que foram, de facto, contratadas pelas empresas públicas e, já agora, por aquelas que o Instituto de Gestão Crédito Público terminou com chorudos ganhos. No entanto, o exemplo destes SWAPs é bem eloquente, conquanto provavelmente não tenham a complexidade e o exotismo das que foram contratadas pelas empresas públicas.

Simplificando, para poder tornar inteligível e ignorando algumas partes do contrato (como a “opção” inserida), tomemos como exemplo um dos SWAPs do Citibank (existem três). O activo subjacente é uma Obrigação do Tesouro no valor de 816 milhões de euros a vencer em 2006 e com um pagamento de juros de 9,5% (altíssimos para os juros praticados nessa altura no mercado). O Citigroup oferece-se para pagar os juros desse ano antes da OT vencer. Uma poupança para o Estado nesse ano de 77,5 milhões de euros. O défice tonar-se-ia mais pequeno. A contrapartida pedida pelo Citigroup é que, durante 30 anos, o Estado pague uma taxa fixa de 3,7% sobre os 816 milhões de euros que entretanto venceram em 2006 e receba a taxa de juro variável equivalente à Euribor a seis meses. É nesta troca de pagamento de juro que encontramos o núcleo do SWAP. Agora imaginem que o contrato tinha sido assinado nestes moldes (simplificados). Em 2013, e ainda não tínhamos chegado a um terço de um contrato que só acabava em 2036, o Estado iria receber 2,85 milhões de euros (0,35%) e pagar 30 milhões de euros (3,7%). A poupança dos 77,5 milhões em 2005 ia sair muito cara.

Dir-me-ão, OK, seria um mau negócio, mas isso deve-se a factores imprevisíveis como a descida histórica da Euribor neste contexto de crise. Podia ter acontecido ao contrário, não é verdade? Não, no contrato do Citigroup há um tecto de 3,75% para o que eventualmente vai pagar. Eventuais perdas seriam sempre muito diminutas em comparação com o risco potencial de perdas incorrido pelo Estado. Vale a pena notar como o produto oferecido foi propositadamente construído pelo Citibank para maquilhar as contas públicas de 2005, já que existem um conjunto de preocupações com a compatibilidade com os critérios estatísticos do Eurostat no que toca a contas públicas. A predação do actual sector financeiro no seu melhor.

Finalmente, há um agradecimento aqui a fazer. Aos funcionários públicos que trabalham no IGCP que não só conseguiram “desmontar” o produto, identificando os riscos, como deram o parecer negativo. Aparentemente, devido ao seu mandato, o IGCP não pode contratar derivados (como são os SWAPs) sobre activos subjacentes com um “tempo de vida” mais curto.

P.S: O texto sobre SWAPs da Sara Rocha no Le Monde Diplomatique deste mês é leitura essencial. Este é, aliás, uma edição a não perder. Da disfuncionalidade da finança dos derivados, ao Euro num artigo de Fredric Lordon, passando pela esclarecedora discussão feita pela Eugénia Pires sobre as modalidades de reestruturação da dívida pública.


3 comentários:

eugpires disse...

Obrigada Nuno por tocares num aspecto sempre ignorado quando se atacam os funcionários públicos. Há muita gente competente, a ganhar abaixo do mercado para responsabilidades idênticas, com espírito de missão que de facto protegem a coisa pública. Percebem o que é a protecção dos interesses dos contribuintes e o papel do estado e não se deslumbram com o mercado. O problema começa de facto a um nível superior, com a nomeação política para determinados cargos...

Carlos disse...

De facto é um "jogo" viciado logo à partida, em que ganham sempre os mesmos... O que eu gostaria de saber é como é possível que pessoas honestas que trabalham para o Estado podem fazer tais contratos desastrosos para a causa pública, pois que todas as consequências destes contractos eram bem conhecidas por eles, não é verdade? A única possibilidade que consigo ver é a corrupção generalizada nesses interlocutores: eles sabiam ao que iam, sabiam as consequências, mas fizeram-no porque eram pagos para isso! Há uma Máfia tentacular em Portugal que liga certas elites políticas a certas elites financeiras e rentistas e cujas vias de comunicação se encontram nos Aparelhos partidários dos três partidos do "arco da governação" e que nos dominam desde o 25 de Abril. Enquanto não se acabar com essa Troika do psd+ps+cds, não há Alternativa que resista...

Anónimo disse...

Mas qual é o interesse de exercer a opção?

Se fosse exercida o Citi recebia Euribor 6M - 100 bps e tinha de pagar Euribor 6M.

Ou seja, basicamente o Citi estaria a pagar um spread de 100 bps à Republica até à maturidade da operação.