segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Combater o elitismo


Quando me dizem, sem quaisquer dados e de forma claramente preconceituosa, que “os pobres apoiam a extrema-direita”, porque, já se sabe, os pobres são mais facilmente “enganados”, respondo cada vez mais irritado de duas formas. 

Em primeiro lugar, olhai para o capital que é grande e que financia ativamente a extrema-direita, verdadeira rede social relevante; olhai para a intelectualidade das direitas, com doutoramentos e tudo, tão lesta a preparar o seu discurso (por onde andaram Bonifácio e Nogueira Pinto, sem falar do militante fascista Marchi e do seu Ventura?). 

Em segundo lugar, atentai no Brasil, já que os vendilhões vende-pátrias deste lado se inspiram no bolsonarismo do outro lado do Atlântico: um antigo operário resgatou a democracia brasileira, apoiado maciça e racionalmente por milhões de mulheres, negras e pobres, do Nordeste. 

O elitismo é a doença senil de uma certa aristocracia intelectual e política; e alguma até se diz de esquerda, mas sem saber há muito o que isso seja. Não só inventa, como as suas invenções ajudam a criar uma realidade perversa. O elitismo tem de ser combatido sem transigência, em nome do antifascismo consequente.

5 comentários:

Anónimo disse...

Eu não conheço uma única pessoa pobre que vote na chungaria, só mesmo pessoas relativamente privilegiadas.

José Cristóvão disse...

De certa forma, a frase “os pobres apoiam a extrema-direita” porque "são facilmente errados" está correta. Não digo que todos os pobres caem facilmente na esparrela, mas os pobres estão numa situação que é fácil serem presas de certos e determinados predadores. Estou, claro, a falar da "música" pimba, droga de entrada num mundo em que o anti-intelectualismo e as respostas simplórias são facilmente aceites, e que há mais de 30 anos que deveria pura e simplesmente ter sido erradicada. Estou a falar daqueles programas cheios de sangue que os canais põem de manhã e cuja resposta à criminalidade é o programa do Chega (e promovem personalidades e ideias cheganas). É o comentário da bola, com corrupção à mistura e que promove a violência e muitas das características do Chega como p.ex. a divisão e a distracção (não é por acaso que André Ventura saiu deste submundo). É a "informação" sensacionalista. E, mais importante, é a negação de tudo o que poderia desintoxicar o povo: cultura de qualidade, informação de qualidade, conhecimento.

(Embora, verdade, praticamente todos os portugueses estão em situação de extrema pobreza cultural. Mesmo os que têm canudo, porque a cultura que têm está altamente limitada àquilo que é preciso para tirarem o canudo. Foi isto que Vicente Jorge Silva tentou avisar em 1994 com a infame expressão "geração rasca" e que ninguém percebeu. Nem mesmo este blogue.)

João Martins disse...

Já eu, infelizmente, conheço várias...

Ana disse...

Os pobres com poucas qualificações não querem mais concorrência de imigrantes, o preço que pagam por isso, em salário baixo e escassez de emprego, é para eles gigantesco.
Os pobres com poucas qualificações não são liberais, em termos de costumes, porque não têm como pagar o preço se isso lhes correr mal.
A esquerda dita esclarecida não dá respostas a estes pobres com poucas qualificações. Como se limitam a chamar-lhes nomes, fica fácil votar na direta que faz de conta que lhes vai dar atenção. Não vai dar, mas pelo menos deu-se ao trabalho de fazer de conta, em vez de lhes chamar nomes.
É muito fácil chamar nomes a estes pobres sem qualificações, quando se exercem ocupações que não são afetadas pela concorrência adicional, ou quando se vive num confortável estrato social em que as aventuras que correm mal não custam o dinheiro que nunca se teve.
O primeiro passo para alienar as pessoas é chamar nomes a quem legitimamente se queixa dos seus problemas. A concorrência laboral adicional e a ausência de possibilidades para pagar as consequências de aventuras que correram mal são problemas reais para uma parte significativa da população, não mereciam que lhes chamessem nomes.

Anónimo disse...

Cara Ana,

por favor, pare de falar dos "pobres com poucas qualificações" como se fossem gente sem cabeça para pensar. é a prática - e não a qualificação - que dita, em última instância, as intenções e o pensamento, e de uma maneira que não acontece de uma vez para sempre, mas em desenvolvimento, ao longo do tempo; vai-se moldando, sem parar. Agora, chamar nomes... que conversa é essa? Quem é que chama nomes? pare, por favor, de integrar nesse discurso que os políticos são uma coisa e a população outra; não, não senhora, qualquer popular pode candidatar-se e, caso eleito, se tornar um "político". E é assim que se acaba com a mistificação dos "políticos". A essência do problema, que se faz de e por razões práticas, é outro.

Eis uma matriz prática que é legítima de aqui afirmar, e que é necessária mudar, radicalmente: 1) a chamada comunicação social (CS) está atualmente a funcionar segundo o direito privado, contra o próprio bom funcionamento do jornalismo, e que concedido de forma escandalosa pelo Estado, portanto, a informação NOS MEIOS de CS é uma informação de interesses privados (não os da população, mas dos poderosos interesses privados, claro, economicamente); 2) as grandes empresas nacionais, construídas com o trabalho e o dinheiro públicos, isto é, com o esforço popular dos portugueses, estão neste momento nas mãos de privados que nada fizeram, a não ser coçar o saco, por via de privatizações ruinosas, diria escanadalosas, e que tem dificultado a dotação orçamental para servir a população que criou essas empresas; 3) estamos sempre a eleger políticos de classe, riquíssimos, herdeiros de grandes famílias de traficantes de escravos (que lindo mérito este), ou então elegemos políticos que são muito bem conetados e financiados por essas famílias riquíssimas e que foram traficantes de escravos, e depois nunca elegemos gente do próprio povo, gente realmente trabalhadora, e que nunca escravizou ninguém (mas a culpa é sempre desse espectro estranhíssimo, da "esquerda").

Caro João, o do blog

Tenha paciência: são enganados sim. somos todos enganados, todos os dias, sem exceção. não somos iluminados. Claro, isso não explica tudo, ou a grande parte; de fato, pode não ser muito concreto; mas são enganados, somos engandos, sim. Existe engano, existe mentira excandalosa, todos os dias, nos jornais ditos "de referência", existem sondagens para "primeiro-ministro", informação de guerra, etc, existem patrocínios das redes sociais (também estas, grandes empresas privadas, e sem regulação quase alguma), pagamentos às redes sociais para se ser altamente visualizado; existe censura partidária nas redes sociais e nos MEIOS de CS; etc etc etc. Irrite-se à vontade, mas somos engandos, sim, todos os dias, ou melhor, a toda a hora. Embora seja um problema a falta de democracia no acesso ao conhecimento formativo, intelectual, não é preciso um doutorado para perceber isto. Tenha paciência...