terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Espíritos

«O que é bom para nós nos desenvolvermos e tornarmos ricos não serve para vocês. Nós temos a receita. É o liberalismo assimétrico no seu esplendor». Por debaixo do manto diáfano do «Espírito de Lisboa» a realidade do egoísmo comercial dos mais fortes muito bem exposta pelo Pedro Sales. Como o Ricardo já assinalou, a UE aproveita a boleia da Organização Mundial do Comércio para tentar impor «acordos de parceria económica» que representam apenas mais uma peça do esforço para «encolher o espaço de desenvolvimento» dos países mais pobres (Robert Wade). Aqui a UE e os EUA não se distinguem. Procura-se desta forma abrir os mercados africanos nas áreas da indústria e dos serviços, em que os europeus já têm a dianteira, acentuando a destruição da incipiente indústria africana (processo que já vem dos anos oitenta com os desastrosos programas de «ajustamento estrutural» do FMI e do Banco Mundial). «O nosso objectivo é ir para o mercado, mas sem perturbar as indústrias locais africanas» diz de forma inocente Romano Prodi que já se esqueceu dos instrumentos políticos usados na recuperação industrial da Itália do pós-guerra.

Razão tem a jornalista Teresa de Sousa, que nestas alturas costuma ter o distanciamento de um porta-voz da Comissão, quando inadvertidamente fala de Africa como uma «nova fronteira» para a Europa. Nova fronteira para os negócios europeus temerosos em relação ao avanço chinês. Felizmente que os responsáveis políticos de alguns países africanos não se renderam ao «Espírito de Lisboa», uma forma de «falsa consciência» que parece contagiar agora muitos jornalistas e intelectuais públicos portugueses. Vital Moreira, por exemplo, sem um único argumento (a inócua declaração da cimeira não conta), declara que quem não alinha com a propaganda do governo só pode ser sectário e/ou preconceituoso. Felizmente que assim que se passa a fronteira, com o clique de um rato, regressa o princípio da realidade como bem mostra a útil revista de imprensa internacional feita por Miguel Vale de Almeida. O esforço político para abrir mercados continua dentro de momentos. O «Espírito de Lisboa» esse regressa para a assinatura do Tratado Europeu. Habituem-se.

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