Fica o excelente discurso de Mariana Avelãs no encerramento do Congresso Democrático das Alternativas, a 5 de Outubro, na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa. A intervenção pode ser vista ou lida, na íntegra, aqui ou aqui.
«(...) Quando se fala em democracia, o evento que me vem à cabeça, obviamente, não é a implantação da República, mas o 25 de Abril. Com a importância acrescida de eu ter nascido em 1974, e portanto pertencer à primeira geração que viveu sempre em liberdade e democracia. Mas não é preciso ter vivido o fascismo para saber que se respirei todos os segundos da minha vida em liberdade, foi porque muita gente se uniu, lutou por uma ideia, recusou a inevitabilidade do sistema em que vivia. Crescer em liberdade significa, é verdade, e ainda bem, digo eu, dar por garantidas muitas das coisas que Abril nos trouxe: o Sistema Nacional de Saúde, a escola pública, o emprego e com direitos, o Estado Social e a confiança num futuro que podia ser cada vez melhor.
Mas nascer em 1974 tem também um peso tremendo: o peso do "E agora?" O que é que se faz depois de uma revolução? O que é que se pode fazer que se compare a uma revolução? Nada. Mas a resposta é simples: o legado tremendo com que viemos ao mundo não foi uma caixa fechada chamada "democracia", para nós agradecermos e irmos fazer outra coisa qualquer. O nosso legado é a responsabilidade de construir a democracia, e esta é umas das poucas alturas em que direi "porque não há alternativa". Quando optamos por abdicar dos mecanismos de participação na democracia também estamos a construir a democracia: é uma democracia mais débil e cada vez mais em perigo, mas é uma democracia pela qual somos todos responsáveis.
(...) Sejamos claros, mais uma vez: a minha geração é a primeira da história recente a viver pior do que a anterior em muitos aspetos. Os nossos vínculos laborais são cada vez mais precários, e é quando existe sequer situação laboral para adjetivar; o acesso às coisas que demos por garantidas, como a saúde e uma educação de qualidade, está a ser-nos negado, a nós e aos nossos filhos. A ideia de que o futuro vai ser melhor desapareceu por completo. Mas recuso em absoluto que me digam que a minha geração vive pior do que dos meus pais — precisamente porque a minha geração viveu sempre em liberdade e em democracia.
O que me preocupa mais é que a geração dos nossos filhos tem tudo para viver muito pior do que a nossa, e em todos os aspetos, e não apenas materiais. O modelo neoliberal que nos está a ser imposto (também por um grupo de pessoas que se uniu para implementar a sua ideologia a nível internacional) traz consigo, porque caso contrário nunca poderá ser implementado em pleno, a destruição lenta dos mecanismos da democracia. Mas cabe-nos a nós, agora, sermos o grupo de pessoas que se une para lutar por valores e rejeitar a inevitabilidade desta ideia tremenda: a de que o futuro passa pela destruição de tudo aquilo que nos permite viver uma vida digna. E ainda bem que o podemos fazer em democracia.»
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2 comentários:
É um bom discurso... válido, para além da importância de ficar registado em memória.
Só há democracia a sério quando houver: " A paz, o pão, saúde, educação ... " e isto, todos os dias os partidos do "arco do poder" tiram-nos isto tudo.
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