quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Vítor Gaspar, o radical
O Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, é um homem inteligente e qualificado, mas também obcecado e, por isso mesmo, perigoso. Tem uma agenda de desvalorização interna e privatização do Estado Social. É um técnico, politicamente muito hábil, que procurou no encerramento do debate orçamental transferir para os seus adversários políticos as características que melhor o definem a si próprio: radical e aventureiro.
Só alguém assim pode pretender impor ao país, pela segunda vez consecutiva e numa dose reforçada, uma receita que já falhou. Só um radical se dispõe a retirar 5,3 mil milhões de euros à economia portuguesa em 2013, em cima dos mais de 10 mil milhões que retirará durante o ano de 2012. Só um aventureiro se predispõe a fazer experiências numa economia complexa com base em cenários delirantes que nenhum economista subscreve. É exemplo disso a tentativa frustrada de, através de alterações na TSU, transferir rendimento diretamente de trabalhadores para patrões. Só um conservador radical aproveita a crise presente para transformar o Estado Social português numa versão minimalista e assistencialista.
No entanto, não demonstrou qualquer vergonha quando acusou de radicalismo e aventureirismo aqueles que, no PS, defendem o financiamento da dívida pública pelo BCE. Não há nada de mais bom senso que defender que o BCE tenha os mesmos instrumentos dos Bancos Centrais dos Estados Unidos da América, Inglaterra ou Japão. Basta para isso ler o seu “amigo” e conselheiro económico de Durão Barroso, Paul De Grauwe, na defesa de que não pode existir uma moeda única sem este mecanismo. Se há lição a tirar desta crise europeia é a de que o euro não pode sobreviver sem um Estado europeu digno desse nome. Pelo contrário, de Vítor Gaspar nunca ouvimos uma ideia, uma proposta que vise solucionar o carácter europeu desta crise.
Radical é um Ministro das Finanças que tenta excluir, pela via da retórica, todos os que querem participar no debate político com propostas praticadas no mundo real. São homens assim que perigam a nossa democracia.
(Artigo publicado no jornal i)
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4 comentários:
O confronto entre política e tecnocracia,
que o poder capitalista coloca em cima da mesa
( como quem não quer a coisa mas, frequentemente a querer! ),
está viciado á partida e, torna-se perigoso no contexto presente.
Com a imparável descredibilização da política em Democracia,
fruto do exercício "democrático", de sujeitos bandalhos e sem palavra,
é relativamente fácil,vender competência tecnocrata.
O Vitor Gaspar, burro certamente não é mas, as suas qualidades, não estão ao serviço do POVO...
que ainda por cima, foi quem lhe pagou a "caríssima formação", de que usufruiu!!!
Mesmo o financiamento da dívida pública pelo BCE!
Caro Nuno, o que é o BCE? Deixo-o com as palavras de Edison sobre o FED:
Thomas Edison: "Se a nossa nação pode emitir uma obrigação de um dólar, também pode emitir uma nota de um dólar. O que torna a obrigação válida, também torna a nota válida. A diferença entre a obrigação e a nota é que a obrigação permite ao corretor arrecadar o dobro do valor da obrigação mais 20%, enquanto a nota não dá dinheiro a ganhar a ninguém excepto àqueles que contribuem de alguma forma útil para a sociedade. É absurdo afirmar que o nosso país pode emitir 30 milhões de obrigações e não pode emitir 30 milhões de notas. Ambas são promessas de pagamento, mas uma engorda os usurários e a outra ajuda as pessoas."
O dinheiro que o governo português está a pedir "emprestado" ao cartel bancário internacional, a que eufemisticamente chamam "mercados", e sobre o qual o povo terá de pagar juros usurários durante anos, não é mais nem menos do que o crédito da nação (a produção de riqueza da nação somada ao poder do governo de cobrar impostos), crédito que, obviamente, a nação já possuía à partida ou as obrigações não teriam valor nenhum.
E, coisa espantosa, o Banco Central Europeu, que está proibido pelos próprios estatutos de emprestar aos Estados da Zona Euro, empresta dinheiro a 1% de juros ao cartel bancário internacional (os famosos "mercados") que, por sua vez, empresta esse dinheiro aos Estados Nacionais a 6, 7 e 8% de juros.
Afinal, os Estados andam a pagar juros de quê e a quem?
Meu caro Pedro Nuno Santos o ministro das finanças - que Pedro Passos Coelho acaba – na entrevista da TVI - de promover a número dois do Governo, mostrando ignorar que ele já é, desde à muito, o verdadeiro número um – não será, certamente, tão brilhante quanto o pinta mas, do ponto de vista político, é alguém muito determinado e com uma agenda muito pessoal. Que tenha aceitado ser ministro neste Governo e na situação concreta em que o país se encontrava releva de um agudo sentido da oportunidade. Gaspar nunca quis outra coisa que não isto: poder aplicar a um país concreto um tratamento de choque, um compacto de toda a parafernália neoliberal, e esperar no outro lado para analisar o resultado e tirar as conclusões que ele antecipava antes de iniciar o tratamento. De seguida irá para Bruxelas ou para um daqueles lugares no sistema financeiro internacional onde lhe pagarão para ajudar a replicar a sua ciência noutras vítimas. E escolheu este momento porque tinha uma consciência aguda de que o maior partido da oposição estava fragilizado pela sua governação anterior e pelo seu comprometimento com o memorando de entendimento. Sabia que estava a pegar num país fragilizado por uma chocante desigualdade social, com um descrédito total da classe política, minado pela corrupção. Acertou na estratégia, como se percebe olhando para o último ano e meio. Num momento em que a legitimidade política do Governo é indefensável – o Governo não se candidatou com este projecto político nem com a maior parte destas políticas concretas que está a executar, antes pelo contrário – Gaspar sabe, como ninguém no Governo, que só uma convergência à esquerda pode fazer implodir a governação e colocar um ponto final na “sua experiência”. Por isso falou como falou na Assembleia da República. Quis colocar a pressão política, toda a pressão possível, sobre António José Seguro de forma a evitar que ele caísse na tentação de suscitar a verificação da inconstitucionalidade do Orçamento. Convidou-o a ser sensato, a ser ponderado, a recusar o aventureirismo e a honrar as tradições do Partido Socialista. Bajulou a pulsão institucionalista que adivinha em Seguro. Quis traçar uma linha divisória e convidou- o a colocar-se no lado direito dessa linha. Julgo que tem muitas possibilidades de ser bem sucedido.
Há em Vítor Gaspar uma enorme radicalidade, concordo consigo. Quando deseja implodir - é disso que se trata – o Estado Social, paupérrimo no contexto europeu, que fomos capazes de construir desde o 25 de Abril, ele não quer que fique uma única pedra do que o falecido tenha sido. Talvez por isso, rigoroso na escolha das palavras, tenha falado em investimento social como condição sine qua nom para a sustentabilidade do dito. Onde existirem oportunidades de negócio para as empresas haverá políticas sociais. Quando os negócios não forem rentáveis cada um que se desenrasque porque no limite todos terá pelo menos uma campa rasa. No contexto da pura luta política parlamentar estou quase convencido que a radicalidade do ministro Gaspar será bem sucedida. Mas, os portugueses já, mais do que uma vez, fizeram implodir as certezas de que se alimentavam os seus opressores.
Se é radical ou não, não sei.
Agora que ele e o Passos Coelho e todos os que os acompanham na sua sanha contra o povo português, são criminosos, lá isso são.
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