sexta-feira, 6 de março de 2009

Simplex para uns, complicadex para outros?


Já experimentou estar doente, ir ao médico privado (por ser beneficiário da ADSE) e pedir um atestado médico para não ter falta e ser pago no emprego? Agora os atestados dos médicos têm de ser levados ao médico de família do Centro de Saúde e ele é quem tem de passar outro atestado. Deve ir pessoalmente, não pode pedir a ninguém para ir por si.

Havia médicos que passavam atestados falsos. Solução: agora temos de faltar mais uma manhã para ir ao Centro e Saúde onde está outro médico que supostamente não passa atestados falsos. O que é que mudou? Diminuiu em alguma coisa a probabilidade de serem passados atestados falsos (e verdadeiros), aumentaram os ‘custos de transacção’ dos atestados em geral. É provável que o número de baixas, fraudulentas e não fraudulentas, tenha diminuído. Entretanto, complicadex – a vida tornou-se mais difícil.

Agora é assim: desconfiança nas pessoas, complicadex para cima. Avaliação, papelada, controlo, duplo controlo, triplo controlo. Por outro lado, simplex: registe a empresa num minuto, faça contratos instantâneos torne expedito isto e aquilo, acelere. Para certas coisas a suposta propensão humana para a aldrabice já não conta.

Haveria que ver em mais detalhe o que está a ser tornado simplex e o que está ser feito complicadex? Haverá uma lógica na distribuição do simplex e do complicadex?

8 comentários:

cicuta disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
cicuta disse...

não sei explicar bem, mas segundo o meu serviço, que é bem legalista, pois até acrescentava a essa complicação toda a obrigatoriedade de os atestados terem que ser enviados por email (que era imprimido e arquivado), desde Janeiro que esta situação não existe voltou a ser possível qualquer médico passar atestado. Mas isto é até que esteja regulamentada a nova lei já promulgada e publicada que equipara com a privada ou seja não vão pagar os 3 primeiros dias as faltas não tem direito a pagamento, sendo atribuido um subsidio de doença npo valor de determinada % a fixar.
http://cicuta-fresca.blogspot.com/2009/01/convergir-para-seguranca-social-chinesa.html
http://cicuta-fresca.blogspot.com/2007/11/firmeza-do-bastonrio-da-ordem-dos.html

Anónimo disse...

Nem mais. A função pública está um caos devido a isto. É impossível fazer o que quer que seja, é impossível gastar mesmo o pouco dinheiro que há. O pior é que se ocupa praí 50 % dos funcionários em funções burocráticas que poderiam ser fácilmente eliminadas, com benefícios para todos. Depois digam que a produtividade e baixa.

JPT

Porfirio Silva disse...

Caro JMCC:
O uso generalizado de documentos falsos é uma forma bem conhecida de distorcer mecanismos de protecção social, designadamente, tornando-os ainda menos capazes de cumprir a sua missão. Ignorar esse facto, mesmo em nome do combate à burocracia, sem tratar de pesar convenientemente todos os aspectos da questão, parece-me simplista - apesar de ser "popular". Não te parece?
Abraço.

Anónimo disse...

Caro Porfírio Silva:

Não se trata de um problema de veracidade dos documentos. Trata-se de um problema de burocracia e de respeito pela classe médica.

Ou será menos necessária a formalização na compra de um imóvel do que na falta ao trabalho por doença?

André Moz Caldas

Porfirio Silva disse...

Caro André:
Não está em causa "classe" nenhuma. Há médicos que vendem atestados, como há médicos que vendem órgãos. São casos, não são "uma classe". Suponho que se não distinguirmos isso inquinamos o debate sem necessidade.
O que eu queria (e quero) dizer é que há vários valores em presença e que não devemos subestimar um desses valores por causa de valorarmos também outro aspecto. O que quero dizer é que a irritação contra uma injustiça, ou às vezes até mesmo simplesmente contra uma parvoíce, não nos deve fazer acreditar que o equilíbrio entre múltiplos valores é fácil. Penso que esse é um ponto que o trabalho científico do JMCC, que de certeza tanto tu como eu apreciamos muito, nos faz compreender. Se não fosse por eu lhe dever (ao JMCC) isso, se calhar nem me tinha dado ao trabalho de escrever um comentário. Faço entender o meu ponto?
Abraço.
(não sei se te lembras que nos encontrámos fugazmente por aí)

José M. Castro Caldas disse...

Caros Porfirio e André

Só agora acordei para a vossa troca de ideias. O que me preocupa mesmo é uma tendência para o reforço do controlo sobre as pessoas, sob multiplas formas, que parece estar a proliferar em todas as organizações. É fruta da época, desconfiança, não é surpreendente. Parece-me ainda que esse controlo anda mal distribuido. Facilidades para umas coisas, complicações para outras. E não me agrada nada a lógica que me parece existir no enviezamento da distribuição.

Porfirio Silva disse...

Caro José Maria:
Até és capaz de ter razão em certa medida. Mas tb se pode acrescentar que os alvos privilegiados de certos comportamentos não são determinados por azar, mas devido a certas razões.
Por exemplo, quase ninguém duvida de que seja condenável falsificar, digamos, cheques: sacar dinheiro com um cheque falso. Mas muita gente acha normal usar um atestado falso para obter uma situação a que não teria direito. Porque? Se calhar por haver uma representação distorcida do valor relativo dos mecanismos em questão.
Ora, como o afinamento da forma de funcionar de certos "macanismos" sociais não é coisa que se faça com régua e esquadro, "racionalmente", "geometricamente", tendo antes que ter em conta o impulso dinâmico que empurra certas tendências mais do que outras, pode acontecer que a correcção de certas "ligeirezas" tenha de se fazer com "excesso". Os sistemas dinâmicos têm de contar com a história, e não apenas com comparações estáticas. É esse o problema, ou mesmo o erro, que vejo na forma como abordaste esta questão. O facto de a tua crítica ser "popular" (no sentido de ter receptividade) pode dificultar que se vejam estes aspectos - mas não os faz desaparecer.
Abraço.