segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Quem é que ainda confia nos mercados financeiros liberalizados?

«O mercado imobiliário norte-americano continua em crise. Os preços da habitação caem mês após mês e o número de familias em dificuldade nos pagamentos das suas prestações não pára de crescer. Assim, nos últimos dias assistimos à nacionalização de facto - com um custo de alguns milhares de milhões de dólares - das sociedades de crédito hipotecário Fannie Mae e Freddie Mac, duas agências que, em conjunto, asseguram 80% das hipotecas imobiliárias norte-americanas. Entendidas como garantes de todo o sistema de crédito imobiliário, a falência destas agências abriria as portas a uma autêntica catástrofe nos mercados financeiros. Contudo, quando ainda procurávamos perceber as implicações desta decisão do Tesouro norte-americano, logo fomos informados de mais uma grande instituição financeira em risco de colapso: o banco de investimento norte-americano Lehman Brothers». O resto do artigo do Nuno Teles pode ser lido no esquerda. Confirma-se que o banco de investimento Lehman Brothers vai abrir falência. Entretanto, e para tentar evitar o colapso sistémico, a Reserva Federal lá vai facilitando o acesso dos bancos à liquidez, que só os relativamente sólidos e fiáveis títulos do tesouro norte-americano garantem (o Estado, sempre o Estado...), alargando o espectro de lixo tóxico privado que aceita como colateral para estas operações de financiamento. Como dizia o economista keynesiano Paul Davidson tudo se resume a três palavras: «liquidez, liquidez e liquidez!».

23 comentários:

Tiago Moreira Ramalho disse...

E o João não acha que está a manipular um bocadinho os factos? Tem noções suficientes de economia para saber que na realidade no mercado financeiro americano há muito pouco mercado. No seu post até diz que o Freddie e a Fannie juntos têm 80% das hipotecas, o que mostra não haver atomicidade no mercado. E essa dimensão exagerada das instituições vem exactamente do facto de terem tido sempre o apoio do estado e terem sido criadas pelo governo federal. O João sabe perfeitamente que se o policiamento do mercado fosse melhor nada disto teria acontecido. Mas às vezes para que as nossas posições sejam ouvidas temos de omitir alguns factos... é assim...

cumprimentos,

TMR

David R. Oliveira disse...

Quem é que ainda confia nos mercados financeiros liberalizados?
Resposta: Qualquer pessoa, intelectualmente séria, que acredite no mercado liberalizado.A seriedade passa antes por, antes de falar sobre ..., ter noção do que está a dizer.
Já agora é capaz de explicar onde está a responsabilidade do "mercado liberalizado" nesta crise toda? e por favor não esqueça de avaliar a responsabilidade dos Estados e dos reguladores nesta crise toda.
Por cá é capaz de me dizer quem foi responsabilizado pela vergonha do que se passou com o Bcp/Millenium. A responsabilidade do Vitor Constâncio, e do Presidente da CMVM que, à época, era o actual ministro das Finanças ... quando é que foram responsabilizados?

Anónimo disse...

Mas a Freddie e a Fannie não eram empresas privadas? Ou era só fachada!? Ou serviriam apenas de garantia/seguro para a roda livre do mercado financeiro, sob a capa de objectivos benignos?

O problema é do policiamento? Mas então o mercado não se auto-regula!? Precisa de quem assegure que todos se portam bem? E se os polícias não fizeram bem o seu trabalho, é sobre eles que recai todo o odioso da questão e nada sobre quem prevarica!?

Atomicidade do mercado!? Onde existe isso!? Nos livros de economia!? Não será a dimensão exagerada das ditas instituições a consequência de um processo tão "natural" quanto o que origina os mercados! Ou será que é preciso alguém que garanta essa atomicidade para que as consequências do processo sejam tão benignas e perfeitas quanto nos ensinam os livros de economia?

Cumps.

Pedro Ribeiro

Tiago Moreira Ramalho disse...

Bem Pedro Ribeiro, são muitas perguntas... vou tentar.

A atomicidade e o mercado de concorrência perfeita é obviamente uma miragem, é impossível que aconteça, sendo no entanto desejável.

Quando falta policiamento, ou seja, quando alguma coisa no mercado corre mal, ele auto-regula-se sim senhor: a falência destes gigantes todos é a prova disso. Agora o mercado será "limpo" destes vírus e células novas virão.

A Fannie e o Freddie eram empresas privadas mas não foram sempre, ao início eram empresas públicas criadas nos anos 30 na altura do New Deal. Por terem sido públicas no início, tiveram sempre o apoio do estado para crescer (o que acontece com a CGD em Portugal).

cumprimentos,

TMR

José M. Sousa disse...

O problema aqui, na minha opinião, não é entre Estado e mercado liberalizado. Obviamente que o Estado - neste caso concreto a Administração norte-americana e, no caso do Millennium bcp, o Estado português (aqui incluído o Banco de Portugal e demais organizações supervisoras) tem responsabilidades. Mas isso resultou do facto do Estado se ter confundido com os interesses que queriam esse mercado desregulado. Ou seja, frequentemente, quem está a dirigir os destinos do sistema financeiro no Tesouro Americano são representantes do próprio sistema financeiro que é suposto ser regulado por uma entidade independente (o Paulson, por exempo, salvo erro, veio da presidência da Goldman Sachs). Acho que os dois primeiros comentários estão mas é a desconversar.
O que aqui se diz é que só o Estado tem os meios para pôr ordem no sistema, mas é evidente que se o Estado é assaltado e destituído desses meios, a coisa acaba mal.

Anónimo disse...

O problema do "trial and error" que sustenta o mercado e o "auto-regula" é que, sendo um método eficaz de aprendizagem em algumas circunstâncias, não o é em outras. Há situações em que o erro é demasiado grande (nas suas consequências) e o preço é pago de uma forma desproporcionada por quem nada tem a ver com as más decisões que geraram esses "erros" e que também é apanhado na "limpeza". E os processos de "regeneração" estão longe de ser automáticos, pagamos todos um preço (demasiado alto) por demasiado tempo - como veremos!

Chutar para canto a questão da dimensão e poder dos intervenientes no mercado (e nem falei em concorrência perfeita!) é demasiado fácil. Pergunto eu, não é esse o corolário "natural" dos processos (auto-)regulados pelo mercado? ou o mercado não funciona muito bem se não lhe impuserem limites? Afinal parece que são necessárias regras e polícias... mas o que acontece quando alguns agentes parecem ter mais poder que os polícias?

Quanto ao estatuto de empresas como a Freddie e a Fannie, conhecendo em traços gerais a sua história, apenas sublinhei o ridículo se terem delas feito empresas privadas, quando afinal as perdas eventuais da sua actividade teriam como destino a sua "socialização". Ficava mal se o estatuto fosse outro, não era?

Tiago Moreira Ramalho disse...

Eu não percebi porque é que desconversei. Eu concordo plenamente que tudo isto foi uma falha do estado, do policiamento do estado, porque se este mesmo estado tivesse sido mais eficaz na sua actividade reguladora, não estaríamos a sofrer esta situação. Que o estado é corrompido todos sabemos, mas se é corrompido em actividades reguladoras não o seria também se controlasse as empresas?

(já agora, leia o título do post para ver como isto é uma questão "entre Estado e mercado liberalizado")

Ao anónimo,

O mercado auto-regula-se sim, tal como escrevi em cima. Mas como os agentes do mercado são pessoas, estas falham, mas a verdade é que o mercado dá resposta, como está a dar...

cumprimentos,

TMR

Anónimo disse...

Peço desculpa, não assinei o meu segundo comentário.

Pedro Ribeiro

Anónimo disse...

Quem segue os media de referência continua a acreditar nos mercados liberalizados (ou capitalismo selvegem).
Porque aqueles que de facto têm o poder não admitem um sistema diferente.

José M. Sousa disse...

Tiago Ramalho

A sua análise peca por achar que existe uma abstracção chamada mercado que actua independentemente da sociedade, da sua estrutura de poder, do controlo democrático, etc. É evidente que o tema do "post" é sobre o papel que o Estado tem na regulamentação ou desregulamentação - porque só o Estado é que pode regulamentar ou desregulamentar.
Eu, pelo menos, não estou a dizer que o Estado deve deter a propriedade de todos os bancos. Regulamentar não é isso. O problema, como disse, é que o Estado se confunde com os interesses do sector financeiro, em vez de reflectir os interesses da generalidade dos cidadãos. Há aqui de facto um problema de controlo democrático.

Anónimo disse...

Mas entao atira-se a boia para salvar os naufragos financeiros? Ou deixam-se os tipos afogar?

E quem deve lancar a boia? O Fed que tem uma legitimidade e mandato publico turvo? Ou deve o Treasury em vesperas de eleicoes assumir a responsabilidade?

Tiago

alexandre disse...

Eu nao percebo nada de economia. Tirei uma cadeira de Economia e Gestao no 4o ano no Tecnico. Na minha opiniao, o mercado livre como os libertarios e os neo-liberais europeus entendem nao existe. Nao acredito na mao invisivel, a historia e a realidade actual contradiz a existencia de uma mao invisivel ou de um mundo plano. Ou antes, o mercado livre so existe quando regulado pelo Estado segundo regras transparentes e fiscalizado nessa sua tarefa. Caso contrario, o mercado e' regulado por quem a lei de selva decidir. E pessoalmente, prefiro que o mercado seja regulado por quem e' eleito pela vontade popular do que por uma oligarquia financeira que representa quem mais pode e que por feed-back positivo aumenta as diferencas entre os mais ricos e os mais pobres. O problema nos EUA e em Portugal e' a falta de transparencia e o modelo de desenvolvimento economico que se baseia na delapidacao do bem publico para dar lucros aos grandes grupos economicos vigentes. Num modelo Japones ou Nordico (Europa) isto nao acontece e existe mais justica no mercado, na sociedade, no mundo empresarial, e' um mundo melhor.
Este e' o mundo que eu vejo, mas eu nao passo de um iletrado que pensa que a atomicidade e' a capacidade de se gerar materia.

macedo disse...

mas n é a falência a consequência de maus investimentos!?

quem fez os maus investimentos?

quem serão os mais afectados, directamente, por esta falênca!?

Se não mercados financeiros liberalizados, q mercados financeiros prefere!?
(e n me responda regulação...ela existe. Pode ter sido mal executada, mas quem no seu perfeito juizo exige perfeição de humanos ou de suas execuções!?)

Anónimo disse...

"...ele auto-regula-se sim senhor: a falência destes gigantes todos é a prova disso. Agora o mercado será "limpo" destes vírus e células novas virão."

É impressionante a ligeireza com que se fala da situação de pessoas que ficaram sem sustento ou sem as poupanças, e que numa situação mais agravada (como é previsivel que o seja) poderá levar a uma onda de suicidios.

Tratar de situações humanas desesperantes como "virus" que será limpo é de um mau gosto exasperante.

Anónimo disse...

"Se não mercados financeiros liberalizados, q mercados financeiros prefere!?
(e n me responda regulação"


Creio que liberalização se opõe à regulação...

Nuno disse...

O problema foi o facto de não haver regulação para a banca de investimento ao contrário da banca comercial!
E agora a banca de investimento está a beneficiar do último recurso disponibilizado pelo FED "o last resort lender" se não me engano e em última análise estão a ser nacionalizados(Bear Sterns)!
Qdo lucraram, esses lucros não foram nacionalizados! É a velha máxima "lucros privados e prejuizos públicos".

O facto de não haver regulação é responsabilidade:
Do sistema financeiro e dos seus poderosos interesses e intervenientes e de sua ganância sem fim, q nunca aceitaram regulação pq acreditaram q o mercado se auto regula;
De uma administração central q pactuou com estas loucuras de falta de regulação e q permitiu a venda produtos "estragados" (cocktails de subprimes com outro nome e com ratings q não reflectiam o seu risco) e que ainda acredita na auto regulação ou numa qq mão invisivel;
Da irresponsabilidade na cedência de crédito sem garantias reais e a quem se sabia não ter capacidade de pagar;

Dizer q isto é auto regulação a funcionar não sei se ria ou se chore! É a mm coisa q dizer q os acidentes são a regulação do trânsito! E assim que se quer por semáforos os vendedores de carros dizem q não é preciso, que isso é uma ingerência do estado e é pouco liberal!

Anónimo disse...

Quem é que ainda confia nos mercados financeiros liberalizados?
Resposta: Qualquer pessoa, intelectualmente séria, que acredite no mercado liberalizado.A seriedade passa antes por, antes de falar sobre ..., ter noção do que está a dizer.


Ahhhh a seriedade intelectual. Que belo ! Da forma que o diz até parece um padre a dar missa numa igreja qualquer. A despejar um dogma... Algo que se não for aceite por alguém, todos ficam a olhar em espanto.

É ridículo como se hipoteca a vida de milhares ou milhões de pessoas neste "testes" de mercado, na esperança que tudo na economia se "auto-regula". Devem andar muito bem montados e estar muito bem na vida para falar como falam. Não têm vergonha pois não ? Onde é que isto já chegou ... Este tipo de gente só tem uma descrição: hipócritas insensíveis!

Não percebo muito de economia, mas até percebo umas coisas de sociologia. Uma das razões - a principal - porque que este mercado "auto regulado" nunca funcionará e mais tarde ou mais cedo se afundará, é a própria natureza do Homem.

Neste momento da história o Homem não tem valores intrínsecos na sua cultura que lhe permita racionalizar um sistema onde o poder, o capital, seja gerido e manipulado de forma a funcionar para o "bem-comum". A natureza do Homem é avarenta e facilmente se deslumbra com o poder e o capital - que lhe confere poder.

Sendo assim, desengane-se quem pensa que com "policiamento" se vai conseguir alcançar o quer que seja. Todos os intervenientes são incorruptíveis: o Estado, os bancos centrais, as autoridades ditas independentes etc.

Dentro deste "mal" mais vale a pena que seja o Estado, como já foi dito, a controlar o próprio sistema. Pois, em princípio, ele representa a vontade dos clientes do capital - nós - através do que é chamado um serviço público, de todos nós.

Esta trapalhada neoliberal não tem uma ponta por onde se lhe pegue. A única maneira de conseguir vencer é através da escravização do povo e da submissão à religião do capital. Se o Homem for reduzido a isto, então terá sido reduzido à sua insignificância.

Anónimo disse...

Todos os intervenientes são incorruptíveis: o Estado, os bancos centrais, as autoridades ditas independentes etc.

... um engano. É claro que queria dizer corruptíveis

Filipe Melo Sousa disse...

Eu não confio de certeza na regulamentação dos mercados. O FED quintuplica as taxas, provoca uma crise de crédito e falências por involvência. Conclusão: os reguladores precisam de ainda mais poderes para poderem reparar os disparates que fazem.

Wyrm disse...

ó filipe melo e sousa,

que disparates fizeram os "reguladores", esses malandros, na falência do Lehman Brothers?

já agora gostava mesmo de saber de que forma é que o estado é responsável por essa falência.

os neoconeiros/liberaleiros já viraram o bico ao prego no caso da fannie e do freddie, e no caso do Lehamn? e no que está a acontecer na AIG? e porque é que quem sofre são os milhares, quando não milhões de individuos que confiaram nessas "sólidas" instituições liberais?

fizeram tudo para acabar com a regulamentação e mecanismos de vigilância, agora, como um bando de garotos, dizem que tudo aconteceu porque o "estado", esse malandro, não regulou nem monitorizou como deve ser.

só consigo conceber esse tipo de raciocínio em quem tem a fortuna de possuir uma série de contas bancárias bem recheadas. de preferência num país onde não exista imposto sucessório.

Filipe Melo Sousa disse...

Os reguladores têm toda a culpa. Obviamente que quintuplicando os juros o incumprimento dos privados habituados a 1% dispara. Os bancos promovem a irresponsavilidade. Forneceram basileias e falsas garantias de cumprimento. E agora pedem mais poderes para poderem penalizar os contribuintes responsaveis em detrimento dos devedores irresponsaveis.

L. Rodrigues disse...

O meu sobrinho de 5 anos costumava fazer um jogo a que chamava o "mundo ao contrário". Dizia não quando queria dizer sim, chamava preto ao que era branco, etc. O Filipe lembra-me o meu sobrinho, às vezes.

Filipe Melo Sousa disse...

É simples: se não gosta do mundo ao contrário dos seus valores, se o mercado não lhe agrada, não intervenha nele. Deixe-o ao critério de quem quer participar no jogo apenas. Acredite que os participantes lhe agradecem. Ninguém o obriga a entrar nesse jogo que tanto repudia.