terça-feira, 5 de junho de 2007

A esquerda gramsciana

«O que temos pela nossa frente já não é um país com a memória das conquistas do período pós revolucionário. O que temos pela frente é um consenso neo-liberal que se torna, a cada dia que passa, cada vez mais hegemónico e que começa a ser interiorizado com amargura até pelas suas principais vítimas (. . .) Se há à esquerda quem se presta ao papel de carrasco das conquistas sociais dos século XX, teremos de ser nós a ganhar o espaço político que o PS deixou vazio». Daniel Oliveira, na sua intervenção no congresso do Bloco de Esquerda.

Combinar o pessimismo da inteligência com o optimismo da vontade é a essência da intervenção política. Como afirmou António Gramsci, uma das mais interessantes figuras do pensamento marxista do século XX. Foi precisamente Gramsci, também um dos mais denodados adversários do determinismo economicista, que defendeu a ideia de que «não é a estrutura económica que determina directamente a acção política, mas a interpretação que dela se faz».

A partir daqui, Gramsci desenvolveu e aplicou todo um leque de conceitos (hegemonia, consenso, intelectual orgânico, senso comum, bloco social) que apontam para a importância decisiva da luta das ideias e da construção de um novo senso comum ético-político capaz de confrontar globalmente as representações dominantes. Passo determinante na necessária construção de um amplo bloco contra-hegemónico que quebre o consenso neoliberal e a sua aceitação passiva pelos grupos sociais que hoje são subalternos. Tarefa exigente, mas mais do que nunca necessária.

14 comentários:

Anónimo disse...

LOL quem é agora este ilustre desconhecido que querem fazer herói?

Filipe Melo Sousa disse...

sorry.. esqueci de fazer login. era eu no comentário anterior.

Diogo disse...

O consenso neo-liberal vai desabar por si próprio, o que não impede que lhe demos um empurrão.

O desemprego crescente no «primeiro mundo» aliado ao trabalho escravo do «terceiro mundo» vai criar um exército imenso de não-consumidores – que não têm dinheiro para consumir.

Ora, sem consumidores não há vendas. Sem vendas não há lucros. E sem lucros não há empresas privadas.

O paradigma económico está a mudar. Ajudemo-lo nessa conversão radical. Evitemos todo este sofrimento inútil.

João Rodrigues disse...

Ilustre descohecido? É um pensador bastante discutido nos estudos culturais, na economia política internacional ou em certas áreas da ciência política. E é um pensador útil para nos ajudar a pensar as relações entre a estrutura económica, as ideologias e a acção política. E depois há a tradição política que ele fundou que é do mehor que a esquerda produziu. Uma fonte de inspiração. Veja em:

http://soc.qc.cuny.edu/gramsci/

Foi contra estas teses catastrofistas que Gramsci lutou. O consenso neoliberal não desaba por si próprio. Ou melhor pode desabar e gerar soluções ainda mais autoritárias. É preciso alternativa e é preciso persuadir as pessoas de que essa alternativa é virtuosa.

baldassare disse...

Marx preveu a queda da sociedade capitalista, apresentando mais ou menos os mesmos argumentos que o diogo.

Muitos capitalistas dizem que Marx falhou, porque ainda existem sociedades capitalistas.
Na verdade, Marx tinha razão.

A sociedade capitalista do século XIX e início do século XX desabaria, concerteza.
O capitalismo só sobrviveu porque transformou-se e "social-democratizou-se" (para usar a expressão de Miguel Portas).
Se tivesse continuado tão liberal como era, teria caído, pelas azões apontadas pelo diogo.

Hoje, o caminho das sociedades ocidentais está a ser o regresso a esse extremo-liberalismo de mercado (vulgo neo-liberalismo). Existe um consenso, da "esquerda moderna" à direita, que aponta para o neo-liberalismo.

Se isso acontecer, o colapso capitalista que Marx preveu, provavelmente acontecerá. Porque o capitalismo puro é como o oxigénio puro: explode.

L. Rodrigues disse...

É curioso pensar que o capitalismo foi salvo pelo socialismo. E no entanto foi exactamente isso que aconteceu. O problema de deixar que o capitalismo chegue às suas ultimas consequências. Aí, pode ser tarde demais.
É certamente para demasiada gente.

Ricardo G. Francisco disse...

Pode esclarecer uma dúvida para evitar gaffes futuras.

É João Rodrigues como em Maria João Rodrigues, a socióloga?

Obrigado pelo esclarecimento.

Unknown disse...

Fale com o seu amigo e diga-lhe que eu peço desculpa...por caridade!

http://absolutamenteninguem.blogspot.com/2007/06/falar-com-deus.html

Carim disse...

Tenho apenas uma questão. Regularmente visito este blog (que muito aprecio, diga-se) e obviamente reparei que vocês têm formação em economia. Ora deixem-me então perguntar-vos uma coisa: tenho ouvido ultimamente falar de uma nova tendência/ ideologia económica que tem sido desenvolvida como reacção (penso eu) ao neoliberalismo: o neokeynesianismo. Acontece que tenho encontrado pouca informação sobre o tema. Em que se baseia esta... teoria? Como é que contraria paradigmas neoliberais como as expectativas racionais e a chamada taxa de desemprego natural?
Supostamente pelo nome dir-se-ia que se trata de um "repescar" da velha teoria keynesiana, mas quais são as inovações propostas?

Bem, era "só" isto.... Continuem o bom trabalho.

João Dias disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
João Dias disse...

Apesar de desejar o declínio do neoliberalismo não estou tão optimista quanto à sua queda natural. Isto porque actualmente já chegamos a um ponto bastante crítico desta visão económica e no entanto nunca os seus percussores tiveram tanto apoio político.

Grave nesta visão económica é que ela entra-nos pela tv como sendo economia e não uma visão sobre a mesma.
Temos assistido a um fenómeno em que, em momentos de crise, assitimos a um círculo de economia restrito, isto é, os proprietários dos meios de produção enriquecem, os sectores de bens de luxo enriquecem, a especulação exonómica cresce. Apesar desta escabrosa situação o "mercado político" da direita está em grande, se virmos bem Espanha é mesmo um oásis. As políticas de agravação da situação económica são corroboradas há 33 anos em Portugal, portanto estou..."bálá"...um pouco pessimista.

As soluções são simples, "num mundo globalizado" (como diz um bom neoliberal antes de nos presentear com a sua verdade irrefutável) o Estado tem de ser regulador, ou vivemos num mundo liberal em que o Estado regula e faz ajustes no mercado sempre com a perspectiva de PLENO EMPREGO e EQUIDADE...ou continuamos como actualmente a viver na selva social onde a competência vale pouco e a cunha dá milhões.

joaozinho disse...

opá, "neste mundo globalizado" (gosto sempre de começar com esta) o capitalismo neo-liberal é auto-suficiente: aguenta-se enquanto houver gente pobre para ser explorada... e nao estou a ver que num futuro próximo deixem de existir pessoas pobres. Se isto mudar, não vai ser por implosão, terá de ser através da educação das pessoas.

João Rodrigues disse...

Cara Carim,

Isto das designações de escolas é sempre uma questão complicada. Depois de Keynes temos duas escolas: os keynesianos da síntese neoclássica que inserem os contributos de Keynes no modelo convencional recuperando a ideia do papel da política económica e os pós-keynesianos que recusam o enquadramento neoclássico e desenvolvem os aspectos mais radicais da teoria geral. Depois da perniciosa revolução das expectativas racionais (que ancorou a macroeconomia no modelo microeconómico do agente optimizador), e que defendeu que a melhor política económica é a ausência de política económica, os keynesianos neoclássicos passaram a cuidar dos seus fundamentos micro. Introduzindo variações nos modelos (salários ou preços rigidos) para reabilitar as conclusões keynesianas. Ainda há que referir os contributos da informação assimétrica e de outras ideias sobre as falhas de mercado que, por exemplo com Stiglitz, também justificam uma política económica de correcção dos mercados. Enfim, para mim, a escola mais interessante ainda continua a ser a pós-keynesiana. Na neokeynesiana julgo que os trabalhos do Stiglitz ainda são o melhor em termos de divulgação. Alguém dá mais contributos?

GÊ OITO disse...

Acho que o ilustre desconhecido não era para o Gramsci.