quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Notas pouco inflacionadas


Na Zona Euro, a taxa de inflação média, que esconde realidades diferenciadas, atingiu o valor mais elevado dos últimos 25 anos, uns saudáveis 4,9%. A discussão sobre o aumento moderado e provavelmente temporário dos preços ganha em partir das recentes declarações do Governador do Banco de Inglaterra, onde as questões parecem ser tratadas hoje com relativa clareza: 

“A política monetária não nos dá mais gás, mais chips ou mais condutores de camiões.” 

O potencial problema está nos bloqueios na oferta gerados por uma excessiva dependência em relação a cadeias de valor demasiado globalizadas e logo frágeis. Para resolvê-los, a política monetária não tem qualquer serventia directa. 

Aliás, a política monetária só serve eventualmente para jugular de forma rude algumas formas de que os processos inflacionários se revestem, através de mecanismos tão reais quanto evitáveis, dados os grupos sociais atingidos: quebra do investimento e da procura em geral e aumento do desemprego. 

Pode até acontecer que a elevação do custo do crédito, um dos principais fardos para as empresas e que estas podem eventualmente passar para jusante, tenha efeitos perversos ao nível da inflação, como sublinha James Galbraith

Hoje em dia, e seguindo esta linha, no campo da procura, a questão é mais de mudança do seu perfil do que de qualquer pressão macroeconómica, até porque estamos longe de ter recuperado da crise pandémica e dos efeitos globais na capacidade produtiva instalada que está a ser utilizada em demasiados sectores. As respostas têm de ser mais finas. 

No fundo, a mensagem resume-se a isto: deixem as taxas de juro nominais em paz e continuem a controlar bem esse “preço”, garantindo a eutanásia dos rentistas, através de taxas de juro reais negativas, uma bênção para os devedores. 

E se querem atenuar a especulação e os seus impactos deletérios em tantos sectores, então instituam mecanismos regulatórios e fiscais adequados: dos controlos de capitais à direcção do crédito, passando por uma fiscalidade mais assertiva, por exemplo em relação a mais-valias mobiliárias e imobiliárias. É claro que a Zona Euro foi desenhada para desmantelar e bloquear tanto do que funcionou bem no passado e em muito presente por esse mundo afora.

Seja como for, a inflação não é um fenómeno monetário...

2 comentários:

Jaime Santos disse...

Desta vez, até quase que concordo com tudo. Tirando a frase final. É que uma má política monetária, leia-se imprudente, no sentido daquilo que diz o Ricardo Paes Mamede, pode bem fazer disparar a inflação. E a inflação é sobretudo um imposto nos rendimentos de quem trabalha, quem dispõe de propriedade tem menos que se preocupar com ela...

A Esquerda tem um historial pouco auspicioso no que diz respeito ao controle da inflação. Também foi ela que acabou, João Rodrigues, com o Governo Mauroy. O resto é História.

Se a Esquerda não quer a Direita no Poder, governe com o que tem, para que os eleitores não se fartem, chamem a Direita para limpar as contas públicas e esta aplique os seus programas do costume, incluindo os habituais enormes aumentos de impostos. Aconteceu também com Thatcher e o resto é igualmente História...

Anónimo disse...

A propósito de Pierre Mauroy, convém não esquecer que o "Ministre de l'Économie et des Finances" dos seus governos, entre 1981 e 1984, foi sempre Jacques_Delors...

A. Correia