quinta-feira, 28 de outubro de 2021

O conforto do governo com o chumbo do orçamento

Objectivamente, o governo fica numa situação bastante confortável no que respeita à gestão das contas públicas com o chumbo do Orçamento para 2022.

Por um lado, as receitas vão ser maiores, pois não vai haver reduções do IRS e do IRC. Por outro lado, os tectos de despesa dão folga suficiente para fazer quase tudo o que estava previsto, com a vantagem de agora o governo poder fazer o que bem entende - e não aquilo que o PCP ou BE exigiam que fizesse. No final vai fazer um brilharete no défice, vangloriar-se das medidas que aprovou sozinho e culpar os outros por não terem permitido fazer o resto.

Daqui a concluir-se que o PS quis esta crise vai um passo. Mas é precipitado. Só seria assim se o resultado das eleições lhe fosse positivo. É possível que muitos dirigentes do PS acreditem nisso. É, no entanto, uma aposta arriscada.

Uma coisa resulta evidente: os partidos à esquerda do PS são os que menos têm a ganhar com a situação. Logo, das três uma: ou são muito irracionais e puxaram a corda para além do aceitável; ou têm uma racionalidade que liga pouco às perdas eleitorais; ou fizeram um esforço muito maior do que o governo sugere para chegar a um acordo. Cada um que escolha a opção que mais o conforta.

2 comentários:

Jaime Santos disse...

Finalmente alguém que escreve alguma coisa que não o conforta, Ricardo Paes Mamede...

Não leio a mente de Costa e não tenho acesso ao inner sanctum do Largo do Rato, pelo que não faço ideia se o PS quis ou não esta crise. Mas duvido.

Convenhamos, vem aí um Inverno difícil, com a epidemia a ressurgir, os problemas do SNS a virem ao de cima e a crise dos combustíveis a espreitar. Para além disso, o eleitorado irá provavelmente punir igualmente o PS pela crise política, não apenas os Partidos da Esquerda.

Se o PS desejou a crise, só se pode dizer que deveria ter cuidado com que deseja...

Realmente, não se compreende o raciocínio que levou as Esquerdas a chumbarem o OE. Votaram como votaram por razões opostas às das Direitas, mas concorreram com elas para chumbar um OE mais à Esquerda que aqueles que no Passado ajudaram a aprovar.

E enquanto as Direitas obtiveram tudo o que queriam, não só as Esquerdas não alcançaram nada do que desejavam, como obtiveram ainda menos do que o que era oferecido, ou seja zero. A ver vamos como justificam perante os seus votantes estas escolhas que os privaram de algumas conquistas que o OE lhes garantiria.

E nem sequer estavam obrigadas a aprovar o OE em votação final, meramente a deixá-lo passar agora, modificando-o mais tarde na especialidade, no limite armadilhando-o para Costa (não digo que o fariam, mas que teria piada, teria), que ou governava com ele, ou teria que ordenar ao PS que o chumbasse e demitir-se a seguir.

(Quase) tudo isso o PM lhes lembrou num discurso final que deve ter sido sentido como uma estocada por Catarina Martins e Jerónimo de Sousa...

A proceder assim, em exclusiva defesa dos seus princípios, sem qualquer manha (que não falta a Costa), esta Esquerda só pode perder...

Filipe Diniz disse...

Jaime Santos, ouviu com muita atenÇão o discurso de A Costa. Não ouviu com a mesma atençâo os discursos das bancadas do PCP e do BE, pelo que recomendo que os visite. Se não, continuará a «não compreender» o raciocínio em causa que (discorde-se ou não dele) é um pouco mais complexo do que a versão que o PS quis fazer passar - com sucesso no seu caso.
A situação resultante é uma considerável alhada, mas é-o para quase todos. A diferença entre política e xadrez é que na política o movimento das peças contêm um elemento subjectivo, que inclui a convicção. O que vem a seguir está em aberto.
Mas já agora, uma coisa concreta: não vai certamente atribuir a derrota do PS em Lisboa ao PCP ou "às Esquerdas", pois não?