1. Andou por aí a circular uma comparação do custo de um aluno no ensino público e no ensino privado. Partindo da divisão simples do orçamento da Educação pelo total de alunos, o resultado levou ao êxtase a direita política e dos interesses (ver por exemplo aqui, aqui, aqui, aqui ou aqui). Por ignorância, má-fé, ausência de escrúpulos ou simples chico-espertismo, desataram a proclamar, em uníssono, que o ensino privado era melhor (baseando-se na fraude dos rankings) e mais barato. Para exigir, logo de seguida, como era de prever, a revisão do valor por aluno nos Contratos de Associação e, salivando como se não houvesse amanhã, a adoção do «cheque-ensino».
2. Sucede que a dita comparação é absurda. Desde logo, porque dividir o orçamento pelo total de alunos não permite comparar o custo no público e no privado. Basta atentar nas principais rubricas para perceber que o orçamento inclui investimentos que nada têm que ver com o financiamento de escolas propriamente dito (Instituto da Juventude, Autoridade Antidopagem e Escolas Portuguesas em países da CPLP, por exemplo). Isto é, um conjunto de encargos que entram no cálculo do custo médio por aluno no ensino público, mas não na mensalidade dos alunos do privado. Mesmo quando - cereja em cima do bolo - estes últimos também deles beneficiam (desporto escolar, exames e provas de aferição, estudos e estatísticas, programas de formação, projetos educativos, etc.).
3. Mas a questão não fica por aqui. Para uma comparação com algum rigor, seria ainda necessário somar ao valor das mensalidades dos privados as despesas dos pais com a aquisição de manuais escolares e outros gastos extra (muito frequentes nestas instituições de ensino), para além de estimar a diferença de encargos com pessoal docente e outro (tendo em conta a «poupança» que os privados em geral conseguem com a precariedade contratual e salarial e com o facto de terem um corpo docente mais jovem, e portanto menos oneroso em termos de «carreira»). Para já não falar nos benefícios comparativos que resultam, também para os privados (com honrosas exceções), das práticas de seleção de alunos, com impacto relevante, desde logo, ao nível dos apoios sociais e do aproveitamento escolar.
4. Apesar de tudo isto, e das diferenças de natureza qualitativa que desaconselham comparações nestes termos (sim, o público e o privado funcionam a partir de princípios e objetivos distintos), o Polígrafo nem pestanejou (ver aqui e aqui), validando a tese, colada com cuspo, de que o custo de um aluno no ensino privado é inferior ao custo de um aluno no ensino público. Isto é, limitando-se a fazer eco da aldrabice iniciada pelo Instituto+Liberdade (diz-que-são-factos) de Carlos Guimarães Pinto, que deitou o barro à parede a ver se pegava. E pegou.
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13 comentários:
As contas www.publico.pt/2021/09/13/sociedade/noticia/aluno-custa-6200-euros-ano-aumento-30-desde-2015-ministro-1977237
1200 milhões de euros em Serviços Gerais de Apoio à Educação?!
E os custos do Min da educação não incluem os, subsídios pagos aos colégios privados?
Já agora, quantos professores estão fora das escolas a exercer funções nos Serviços Gerais de Apoio à Educação?!
Já agora, e procurar respostas antes de lançar questões para o ar?
No privado também pagam aos professores que estão a tempo inteiro nos sindicatos? Como Mário Nogueira, por exemplo.De qualquer modo só não vê quem não quer.O polígrafo é um programa do privado para quem defende o privado com a mão estendida ao público.
A questão que subsiste:
Alguém se dedica a conhecer os custos e a avaliar a eficiência dos serviços públicos?
Algo assim como o dia-a-dia dos operadores no privado?
Mas quem paga ao Mário Nogueira é o próprio sindicato. É por estas e por outras que quando não se sabe não se opina!
Onde é que o Ministério disponibiliza esta informação? Obrigada
Tem a ligação à fonte no texto, caro Anónimo
"Onde é que o Ministério disponibiliza esta informação? Obrigada"
Caro Nuno Serra,
Obrigado mas no meu écran (?!) a minha pergunta era dirigida diretamente a outro anónimo.
Aproveito a sua disponibilidade e pergunto-lhe se é possível saber quantos professores estão fora das escolas a exercer funções nos Serviços Gerais de Apoio à Educação.
E se nos 1200 milhões de euros afetos a Serviços Gerais de Apoio à Educação estão incluídos os salários de todos os professores. É que não percebo a dimensão deste valor ...
Caro Anónimo, não sei se essa informação está disponível (sobretudo pelo seu detalhe), mas sugeria-lhe que consultasse a página da DGEEC (https://www.dgeec.mec.pt/np4/dgeec/).
O Polígrafo tem o seu mérito, como quando expõe as imensas mentiras de André Ventura. Mas em alguns casos que requerem uma análise mais detalhada, mostram não possuir espírito crítico. Um exemplo foi a afirmação de António Costa sobre este ser o maior aumento do salário mínimo. É verdade em valores absolutos (por causa de uma coisa chamada inflação) mas não é verdade em percentagem. O fact check de Outubro a essa afirmação considerou-a verdadeira (https://poligrafo.sapo.pt/fact-check/costa-diz-que-aumento-do-salario-minimo-em-2022-sera-o-maior-de-sempre-confirma-se) mas o fact check de Janeiro considerou-a falsa (https://poligrafo.sapo.pt/politica/artigos/jeronimo-de-sousa-vs-antonio-costa-quem-faltou-mais-a-verdade-no-frente-a-frente).
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