Vital Moreira, em plena versão ordoliberal da “economia zumbi”, repete pela enésima vez o mesmo erro: pensar que a “crise das finanças públicas” é causa do nosso problema económico, quando é precisamente sua consequência, como já aqui argumentei. Está tudo trocado e por isso Vital tem de recorrer à versão hiper-voluntarista da confiança, que partilha com o governo das direitas, o governo do destrutivo “programa robusto e sistémico de ajustamento” feito a pensar nos mercados, verdadeiro pensamento mágico, sem qualquer base empírica, de que o PS se terá de livrar. O lixo é este consenso político.
Pede-se então um pouco mais de rigor, se faz favor: baseado em inquéritos às empresas, o próprio Banco de Portugal tem indicado que é a perspectiva de evolução da procura que condiciona o investimento e, secundariamente, o acesso ao crédito. A austeridade, em nome de um suposto saneamento das finanças públicas, deprime a procura interna, e não há exportações que a compensem num contexto em que os países com excedentes se mantêm apostados em tentar mantê-los. Assim se promove a quebra de rendimentos, o desemprego e a fragilização financeira dos agentes económicos, gerando, em círculo vicioso, novos problemas nas finanças públicas e cada vez maior relutância na concessão do crédito.
É preciso que sejam os poderes públicos nacionais e europeus a promover a retoma, claro, estimulando a procura e logo a confiança. A fase ascendente do ciclo económico e um pouco de inflação, o sal do crescimento, associadas a um combate ao “Estado fiscal de classe”, permitirão tratar das finanças públicas. A experiência das economias desenvolvidas com as dívidas de guerra, pagas na medida do crescimento que resultou da instituição de economias mistas no pós-guerra, indica isso mesmo. Nos raros casos em que a austeridade resultou nos termos de Vital, as economias dispunham da possibilidade de desvalorização cambial e/ou de reduzir as taxas de juro, o que não está ao nosso alcance. Pelo contrário, os sinais dados pelo BCE nesta matéria são terríveis. Precisamos de tempo. Para ganharmos tempo, precisamos de enfrentar o constrangimento europeu com a arma das periferias, a ameaça de reestruturação da dívida liderada pelos devedores, e obter uma reconfiguração da forma de financiamento dos Estados periféricos: euro-obrigações. Sem reformas deste tipo, estamos condenados a mais uma década perdida em termos de crescimento e a assistir à abertura de fracturas sociais cada vez maiores. As consequências da economia zumbi são selectivamente letais.
quarta-feira, 6 de julho de 2011
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5 comentários:
Gostei de o ler, João:
"A fase ascendente do ciclo económico e um pouco de inflação, o sal do crescimento, associadas a um combate ao “Estado fiscal de classe”, permitirão tratar das finanças públicas."
Apreciei em particular a do "um pouco de inflação, o sal do crescimento"... mas não implica isso uma estratégia (e não apenas uma táctica) de ruptura com o euro enquanto tal, com o "euro qua euro" e tudo o que lhe está implícito desde mesmo a raiz?
Ah, e “Estado fiscal de classe” já nós temos, descanse... mas ao contrário do que o João queria, claro está... Não se esqueça de registar isso, por favor.
Outra importante: "Nos raros casos em que a austeridade resultou nos termos de Vital, as economias dispunham da possibilidade de desvalorização cambial e/ou de reduzir as taxas de juro, o que não está ao nosso alcance. Pelo contrário, os sinais dados pelo BCE nesta matéria são terríveis."
De acordo consigo a 200 por cento, evidentemente. Mas a sua inferência de que "precisamos de tempo" deve ler-se com o corolário de que precisamos de tempo... para sair do euro, desvalorizar e relançar as exportações! Precisamos de tempo, sim, até porque a desvalorização não vai chegar, pelo que precisaremos também de políticas económicas activas de discriminação positiva daquelas. Mas quanto antes nos mexermos, melhor.
Bem, e quanto ao Vital propriamente dito, a verdade, aqui entre nós, é que o acho um bocadito xé-xé... Um caso completamente perdido, digamos. Por aí, de certeza que não se vai a lado nenhum. Por onde ir, às vezes também ainda não sei bem... mas sei de certeza que não é por aí... ah, por aí não, de certeza!
É natural que o Vital fale nesse tom pois ele pertence a uma classe de indivíduos que ainda não sentiu a crise. Eu também poderia defender a tese do Vital e de outros como ele se não estivesse apreensivo com a perspectiva de a curto prazo me tornar insolvente.
Mas alguém liga ás babuseiras do Vital Moreira.?
O Vital é tonto.
Mas insistir na tese da saída do EURO, até o Louçã já disse que não funcionava.
É a batalha da produçãp pá !
Incentivar a produção industrial e agricola.
Colocar os funcionários publicos e equivalentes em funções de apoio às empresas produtivas.
O resto é perder tempo.
Por outras palavras: Ou há aprofundamento da integração europeia, ou há desagregação. Esta situação de pobres a tentarem ser produtivos em fábricas onde o capital variável é enorme, com outras economias ricas sustentadas em monstruoso capital fixo e que onde os trabalhadores "são muito produtivos", é uma aberração sem tamanho! Como comparar a produtividade de um fabricante de electrónica de topo de gama com umas raparigas que fabricam rolhas? Que raio de divisão de trabalho é este que apenas reproduz a pobreza de uns e a riqueza dos outros? E "didvisão de trabalho" traduz-se em rentabilidade dos investimentos, na cobrança de impostos e no valor das trocas. Eu não acredito que esses economistas de topo de gama não tenham entendido estas questões há anos. Estão é a fazer de mortos!
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