domingo, 1 de novembro de 2009

Precariedade como política de educação

De acordo com o secretário-geral da Frenprof, citado hoje pelo Público, nos últimos sete anos terão entrado para os quadros das escolas menos de 400 professores - quando só no ano transacto ter-se-ão reformado mais de cinco mil. Estando o próximo concurso para entrada no quadro previsto só para daqui a quatro anos, no final da presente legislatura mais de metade dos professores das escolas públicas serão professores contratados.

Vê-se assim que a decisão, tomada pelo anterior governo, de dar estabilidade aos professores contratados e às escolas através de concursos plurianuais, é um presente com sabor amargo. Se é verdade que deixámos de ter dezenas de milhares de profissionais a viverem, ano após ano, Verões de angústia pela incerteza da sua próxima colocação, a garantia de que os professores permanecerão nas mesmas escolas durante quatro anos tem como moeda de troca a garantia de que, ao longo desses quatro anos, as portas do acesso ao quadro permanecerão vedadas a qualquer docente contratado - independentemente da sua qualidade e do seu desempenho (e, já agora, do resultado da sua avaliação!), ou das necessidades efectivas e permanentes das escolas onde se encontram a leccionar.

Impedir a entrada dos docentes para os quadros poupa dinheiro, sem dúvida e não é pouco: um professor contratado não tem carreira, logo não progride, logo mantém o mesmo nível salarial ao longo dos anos. As dezenas de milhar de professores que andam a saltar de escola para escola, por vezes durante quase duas décadas (com todos os custos pessoais que isso implica), têm como paga do seu sacrifício e da sua instabilidade a manutenção do mesmo nível salarial. Por outras palavras, tenham começado a leccionar há 15 anos ou há dois, o seu salário é o mesmo.

A injustiça desta precariedade oficial é tão gritante que, francamente, tenho dificuldade em compreender que a situação do ensino em Portugal não seja ainda mais periclitante. Mas não se trata apenas de injustiça, trata-se também da qualidade do ensino. Retirar a perspectiva de progressão de carreira é desincentivar o investimento na formação. Não fazer reflectir nas condições de trabalho oferecidas a qualidade do desempenho dos contratados é desincentivar o esforço e a entrega. Limitar a estabilidade da colocação numa escola a um horizonte temporal limitado é desincentivar a participação na construção de um projecto de escola coerente, harmoniosa e devidamente integrada nos contextos locais. Penalizar sistematicamente - sob a forma de precariedade, de baixos salários e de falta de expectativas de melhoria das condições de trabalho - aqueles que entraram recentemente na profissão é dela afastar os mais competentes e os mais capazes.

A precariedade como política pública de educação pode ser um caminho para a consolidação orçamental. Mas também se revela, cada vez mais, o caminho para para a destruição de uma educação universalista e de qualidade.

3 comentários:

Anónimo disse...

http://ruadopatrocinio.wordpress.com/2009/10/30/carta-aberta-incompreensivel-para-a-novavelha-equipa-da-educacao-e-ps-de-socrates/

Ana Paula Fitas disse...

Vou fazer link no A Nossa Candeia.
Obrigado :)

pois disse...

bom , digamos que esta situação negativa tem um efeito positivo : é dissuassora de milhares de meninos e meninas se licenciarem em letras para seguirem a carreira de prof dado ser uma forma fácil e segura de ganharem a vida sob a asinha do estado ( era).