quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Repetir sempre, as vezes que for necessário


«Mais de metade do IRC em Portugal é pago pelo setor financeiro, pelo setor imobiliário e pelo setor do comércio. E eu pergunto se é com benesses fiscais a estas empresas, que têm estas atividades, com os lucros que devem ter, essa não é a questão… A questão é se é isto que nós achamos vai transformar a nossa economia.
Porque se nós queremos apostar numa transformação da economia baseada em investimento de alto valor acrescentado, tecnologicamente avançada e com grande capacidade de arrastamento do resto da economia nós já temos instrumentos fiscais para o fazer. Já existem e podem ser afinados. Nós temos um regime fiscal de apoio ao investimento que permite negociar – perante investimentos que sejam de interesse para o país – situações que são, praticamente, de isenção fiscal durante uma década. Portanto, o país tem investimentos para utilizar seletivamente a atração do investimento que transforma a economia.
Uma medida destas [descida transversal do IRC] vai fazer duas coisas. Vai apoiar um conjunto de setores que são mais do mesmo, que não transformam a economia. Mais do mesmo, é fazer o mesmo que andámos a fazer… São setores tendencialmente não transacionáveis, que levam a alguma acumulação de dívida externa, que não arrastam o resto da economia atrás de si… E como se não bastasse, são uma perda de receita fiscal de centenas de milhões de euros que nós podíamos estar a utilizar para outros fins, como a qualificação de pessoas. Fala-se por exemplo, no IRS, em manter as pessoas no país, no IRS Jovem. Bom, nós com um décimo da receita que vamos perder com o IRS Jovem conseguíamos universalizar boa parte das creches em Portugal. Há coisa mais importante para as famílias, para ficarem no país, do que terem a garantia de que conseguem ter educação básica para os seus filhos?
»

Ricardo Paes Mamede, Tudo é Economia (a partir do minuto 15)

Hoje de manhã, um ouvinte que participou no Fórum da TSF queixava-se do burburinho mediático em torno do Orçamento, afirmando que o necessário era fazer reformas estruturais. Curiosamente, e apesar de a ideia de «reformas estruturais» ter entrado no espaço público pela mão da direita neoliberal, para abrir caminho a privatizações e ao desmantelamento de serviços públicos, o referido ouvinte apenas dizia que o governo devia pensar em reformar, «à direita ou à esquerda». Talvez por isso me tenha lembrado deste excerto da intervenção de Ricardo Paes Mamede, em debate com Paulo Núncio, no último Tudo é Economia. Reformas estruturais há muitas, de facto.

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