Na recente conferência promovida pelo Grupo Casais sobre «Aceleração da Construção da Habitação» discutiram-se, como assinalou o Expresso, «possíveis soluções da crise de habitação em Portugal». Como seria de esperar, a redução de impostos no setor (do IVA ao IMI, passando pelo IMT), a opção por novos modelos de construção, a colocação de devolutos no mercado ou a utilização de terrenos vazios, a par da reabilitação, foram colocadas em cima da mesa.
Como pano de fundo, nas intervenções citadas pelo Expresso, o pressuposto adquirido, e não questionado, de que a questão se resume à falta de casas, sendo apenas necessário construir mais e mais rapidamente. Ou seja, referências ao papel central das novas procuras especulativas na génese e agravamento da crise e à necessidade de formas de regulação que as travem, aparentemente nenhumas. Tudo se resume, uma vez mais, à simples escassez de oferta, por mais que o número de famílias e de alojamentos quase não se tenha alterado na última década. Continuamos nisto.
Sendo certo que os oradores no debate, como Ricardo Guimarães (Confidencial Imobiliário) e António Ramalho (ex-CEO do Novo Banco) assinalam a redução do volume de transações nos últimos anos (de cerca de 44 mil para 21 mil entre 2021 e 2023), associando essa redução à subida das taxas de juro - e constatam, igualmente, que os preços continuam a subir (não sendo acompanhados pelos rendimentos) - não retiram dai, contudo, as devidas ilações.
De facto, e ao contrário da tendência para que à diminuição das transações corresponda uma redução dos preços da habitação, como sucede até 2018, observa-se a partir de então, e sobretudo após 2021, que a quebra nas transações não impediu a subida dos preços, atingindo estes em 2024 os seus valores mais elevados. O que sugere, de forma clara, a presença de novas formas de procura solvente de natureza especulativa, internas e externas, que no limite poderão absorver toda a nova construção, por mais que os seus preços baixem e sem que o custo dos alojamentos se altere.
A insistência numa leitura simplista da crise da habitação, resumindo-a a uma mera falta de casas, que ignora o papel das novas procuras e a necessidade de as regular (com o atual governo a agravar a situação, nos recuos que já fez nesta matéria), faz assim lembrar a história de alguém que procurava a chave de casa à noite junto a um candeeiro, não por achar que aí a tinha perdido, mas antes porque o lugar onde suspeitava tê-la deixado cair não estava iluminado.
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2 comentários:
Análises coxas é o que não falta sobre este assunto.
Nunca vi nenhuma que explicasse porque é que praticamente não há construção fora das zonas turísticas.
Não me digam que a construção de luxo e para turismo está a absorver todos os fogos construídos em Rio de Mouro ou em Corroios, p.ex.
O facto de de proibir construção para estrangeiros não garante que vai haver construção para habitação própria para nacionais. Se essa construção tivesse interesse económico estaria a ser feita agora, e não está.
Esse é exatamente o ponto que é defendido numa recente dissertação de mestrado da FEP (insuspeita de tendências de esquerda). Deixo o link para o estudo: https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/159971
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