(Na sequência do primeiro artigo sobre a distribuição de rendimento nas últimas décadas, este é o segundo em que abordo o tema. Ver o terceiro)
O termo financeirização tem sido utilizado para descrever o aumento do poder económico, social e político do setor financeiro nas últimas décadas. Podemos confirmar a ascensão da finança ao observar, por exemplo, a evolução do valor registado dos ativos financeiros.
Por trás deste processo de financeirização esteve a vaga de desregulação do setor financeiro (que inclui a redução do controlo sobre a atividade dos bancos, tanto ao nível do tipo de operações efetuadas, como do tipo de produtos financeiros criados) e de liberalização dos movimentos internacionais de capitais iniciada durante os anos 80. Entre os seus promotores, destacam-se Ronald Reagan, nos EUA, e Margaret Thatcher, no Reino Unido, seguidos nas décadas posteriores por sucessivos governos. Outros intervenientes importantes foram Paul Volcker ou Alan Greenspan (na Reserva Federal norte-americana). Exemplo da sua atitude em relação à regulação é a frase proferida por Greenspan em 1997: “Ao entrarmos num novo século, os mecanismos privados de auto-regulação do mercado devem substituir gradualmente as várias estruturas e normas do governo, pouco eficientes.” Foi esse o caminho que seguiram.
Desregular foi, como vemos, a palavra de ordem. É neste contexto histórico que devemos enquadrar a financeirização. Embora este seja um processo complexo e se tenha desenvolvido de forma diferente em diferentes países, podemos destacar duas consequências importantes do crescimento da finança sem travões.
Por um lado, observamos a crescente orientação das empresas para gerar retornos aos seus acionistas. Pressionadas pela concorrência dos mercados de capitais (fonte cada vez mais importante de financiamento), as empresas têm de procurar formas de aumentar o seu valor na bolsa, seja através de pressões sobre os salários, aumento da intensidade do trabalho, ou até mecanismos especulativos (como as operações de recompra das próprias ações, para aumentar artificialmente o seu valor). Por outro, o aumento dos ganhos com dividendos, juros e lucros financeiros, reforça a posição do topo da pirâmide social. O aumento da desigualdade, referido no primeiro artigo desta série, é um dos traços principais dos últimos quarenta anos.
A ascensão da finança foi acompanhada pela intensificação da integração das economias no mercado mundial, marcada pelo aumento do grau de abertura da maioria dos países ao comércio, e consequentemente das transações entre países. A circulação sem entraves do capital foi determinante para a integração económica e social.
Percebem-se os efeitos deste processo. A deslocalização da produção, ou a sua mera ameaça, reduzem de forma significativa o poder negocial dos trabalhadores. Além disso, a competição internacional, motivada pelo comércio entre países com estruturas produtivas e remunerações da mão-de-obra profundamente heterogéneas, incentiva os países a entrarem numa espiral descendente no que diz respeito aos salários que pagam, procurando com isso fornecer produtos mais baratos e obter vantagens nas trocas (o argumento da competitividade da economia, de má memória no nosso país). Todos estes fatores contribuem para explicar porque tem diminuído a parte dos salários no rendimento total, e porque têm aumentado as desigualdades.
A evolução do capitalismo contemporâneo e a proliferação do capital financeiro são, assim, parte importante de uma explicação sobre a estagnação dos salários. No entanto, precisamos ainda de olhar para outro fator determinante – as alterações da legislação laboral. Serão o tema do artigo que se segue.
9 comentários:
Bom artigo. Acrescento que a famosa desregulação levou, de algum modo, à crise de 2008 e a um "discurso" institucional da necessidade de uma muito maior regulação, que como é óbvio, era apenas uma farsa, não tendo sido acompanhado por medidas efectivas e duradouras, transformadoras da situação. Não é que os representantes do grande capital não tenham capacidade de aprender, é apenas que não têm vontade de ver a sua parte da riqueza diminuir, antes pelo contrário, como se vê pelos diferentes relatórios sobre o aumento da desigualdade e a acumulação do rendimento no topo da pirâmide, cada vez mais estreito. A revolução é cada vez mais necessária, se se quiser alterar de facto esta espiral de acumulação e de salários estagnados.
Num post sobre a financeirização, parece-me de uma grande falta de rigor meter no mesmo saco o Deng Xiaoping, que sempre defendeu um sistema financeiro público e um controlo férreo do movimento de capitais, e o Reagan e a Thatcher, grandes defensores da privatização dos bancos e da completa liberalização da circulação de capitais. Além do mais, o Volcker não se seguiu ao Reagan, antecedeu-lhe; este presidente renomeou-o para o seu segundo mandato à frente da reserva federal, mas nessa altura já estava completado o célebre “choque de Volcker” (a nova política monetária com a deliberada e acentuada subida da taxa de juro diretora).
Fico à espera do artigo em que contemple a legislação fiscal e a consequente acção do Estado Social, para que se possa conhecer os benefícios que não chegam pelos salários: reformas, assistência na doença, educação gratuita, habitação,...
Lembremos também os impostos sobre a propriedade (IMI, IMIT, Mais valias,...taxas e taxinhas…)
Quanto à financeirização, ficava bem uma referência ao papel dos fundos de pensões nesse processo.
Fica à espera este jose pelo artigo que contempla o que jose quer que contemple
Aqui passa a impotência deste sujeito, que noutro post se transmudou num registo insultuoso incompatível com um mínimo de dignidade e seriedade
Vejamos.A incapacidade de se abordar o que está em discussão, leva à fuga. Ora a abordagem da financeirização incomoda muita gente, sobretudo porque demonstra a trampa do que é o capitalismo.
Registe-se todavia que o processo de fuga está cheio de coisas assim para o gratuito e que mereciam o seu desmontar. Talvez a intenção seja mesmo esta, afastar o centro do debate para pequenas ( ou grandes) aldrabices. Interessava assim sublinhar que os ditos benefícios como reformas, assistência na doença,educação também chegam pelos salários,espantando a ignorância ( ou a falsificação) desta gente
Também não se percebem estes queixumes sobre as taxas e as taxinhas sobre a propriedade, mais os impostos sobre as mais-valias. O Capital engorda e acumula-se no topo. Este jose quer isentar as mais valias? Os impostos são só para o trabalho? É por isso que defende os bordéis tributários? É por isso que andou a defender um governante de passos coelho que auxiliava o transbordo do capital para os offshores? É por isso que andou a insultar quem denunciou os processos mafiosos dos grandes "empresários"...mafiosos?
Quanto aos fundos de pensões... a estorieta de se escudarem atrás das velhinhas dos fundos de pensões já fede. Outras histórias se escondem. Ficará para uma próxima oportunidade. Por agora registem-se os processos e as manhas.
Não é bonito de ver, mas são tão elucidativas estas formas de actuar tão pouco honestas e transparentes
Caro Jose
1. Em vez de pedir um outro artigo (com outras questões, temas, aborgdagens, etc.), escreva-o você, se para tal tiver capacidade. "Ficar à espera" é típico dos preguiçosos, que não sabem nem gostam de trabalhar mas apenas de criticar. A crítica é bem vinda, quando pertinente e acompanhada por substância.
2. Quanto ao artigo em causa, do Vicente Ferreira, se não concorda com ele demonstre, fundamentadamente, que a financeirização não contribui para os salários baixos. Isso é que é trabalho sério. Isso é que seria a atitude de uma pessoa crescida intelectualmente.
3. Se não é capaz de nenhum dos dois pontos anteriores, não se percebe porque perde tempo a vir aqui comentar? Será que não tem nada para fazer? Será que é pago para fazer isto? será apenas um fetiche contra o blog Ladrões de Bicicletas. Se for o último caso, existe tratamento psiquiátrico para isso. Se forem as duas primeiras razões, gaste o seu tempo com coisas mais produtivas e saudáveis.
Sobre o artigo do Vicente Ferreira, só posso dizer que está muito bom e que identificou bem um dos principais aspectos para a estagnação dos salários. Veja-se, por exemplo, https://www.econstor.eu/bitstream/10419/105902/1/imk-wp_2008-04.pdf
"Financialization is a process whereby financial markets, financial institutions and financial elites gain greater influence over economic policy and economic outcomes. Financialization transforms the functioning of economic system at both the macro and micro levels.
Its principal impacts are to (1) elevate the significance of the financial sector relative to the real sector; (2) transfer income from the real sector to the financial sector; and (3) increase income inequality and contribute to wage stagnation. Additionally, there are reasons to believe that financialization may render the economy prone to risk of debt-deflation and prolonged recession."
Ou, outro exemplo, https://seekingalpha.com/article/4105507-real-reason-wages-stagnated-economy-optimized-financialization
Parabéns pelo artigo. Venham mais.
Contemplando a possibilidade que o anonimato das 11:44 abrigar quem possa ter alguma responsabilidade no post ou no LdB:
1 - Fico à espera porque não tenho competências como macro economista, ou estatístico, que são actividades normalmente sustentadas por instituições públicas ou grandes empresas; não teria a paciência de me dedicar a essas 'abstrações'.
2 - Quanto ao artigo em causa, aceito que descreva uma parte da realidade, uma parcela para ser mais rigoroso.
3 - Faço do meu tempo o que bem entendo. Quanto à sua especulação sobre os meus motivos, informo-o da sua total falta de originalidade; são hipóteses ad nauseam aventadas pelos mantrólogos que povoam os comentários do LdB, incomodados com a dissonância às suas ladainhas.
Um dissonante este José
Confesso imcompetente, mas dissonante
Ah mais a falta de originalidade Mas uma dissonante falta de originalidade
O que quererá este José dizer com esta rabulazinha da dissonância? Quer receber uma medalhazinha ou quer vir justificar o seu modus faciendi?
Não tem paciência para abstracções. Só a tem para fugir ao que se debate. E para nos interstícios pregar a fé nos da sua classe. Ideológica. Ad nauseam
E é confrangedor quando jose, incomodado por afrontarem de forma dissonante as suas ladainhas ideológicas, vem queixar-se das ladainhas alheias
Francamente. Ao menos respeite o legado daquele tipo que era um génio, um tal Coelho, que crismava como “coitadinho” quem se lamuriava deste modo
Será que ainda não reparou que mais do que dissonante, a sua forma de propagandear o seu ideário udeologico é uma boa oportunidade para desmontar peça a peça esse ideário neoliberal/ neocon ?
Não é que tenha grande interesse...
Mas a forma de intervenção cívica de herr jose varia na razão directa do local onde actua. E da data em que pontifica. Por exemplo, quando em família, o seu vocabulário é este:
"Cambada de cabrões a defender a nomenclatura a que pertencem ou a que aspiram!!!!
deixado a 30/8/13 às 00:59
"Só te venho falar de uns cabrões duns socialistas"
deixado a 21/10/13 às 17:13
"São fdp encartados em tonalidade de rosado a vermelho".
MAIO 2, 2017 AT 11:14
Também nos mesmos blogs onde pontifica com o aplauso dos da casa, é ele que estabelece as tarefas para os confrades e incentiva-os assim deste modo:
-"são precisos golpes na cretinice esquerdalha"
-"Tolerância zero à treta de uma ‘bondade’ que sempre é caminho de domínio e de condicionamento a uma doutrina feita de mantras construídos a olhar para os umbigos..."
E ele próprio dá-se como exemplo, enquanto incentiva a turba nos blogs do zé manel e da lena matos
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