quinta-feira, 29 de julho de 2010

Constituição e Sistema Político: a (re-)visão do PSD (I)





No capítulo do sistema político, duas das propostas emblemáticas (e também contraditórias, como já foi sublinhado) do projecto de revisão constitucional do PSD são a adopção (apenas parcial) da moção de censura construtiva (MCC) e o reforço dos poderes do presidente (PR), que passaria a poder demitir livremente o governo. Antes de passar à análise das propostas, vale a pena definir o que é a MCC, onde existe, porque foi criada, quais são os seus traços fundamentais e que implicações pode ter no sistema de governo. Para quem quiser saber mais, aproveito para recomendar um pequeno mas muito informativo livro (A Revisão Constitucional e a Moção de Censura Construtiva) editado pela Fundação Friederich Ebert, em 1988, no contexto da revisão constitucional de 1989 (quando o PS propôs esta solução) e que conta com grandes especialistas, designadamente Dieter Nohlen e José Encinar.

A MCC foi inicialmente adoptada na República Federal Alemã, 1949. Mais tarde, viria também a ser adoptada em Espanha, 1978. Quer num caso, quer noutro, esta solução é uma resposta à memória da forte instabilidade política e governativa: na República de Weimar (1919-1933) e na II República Espanhola (1931-1939), respectivamente. Pretende-se combater a instabilidade política associada muitas vezes aos regimes eleitorais proporcionais, mas sem ser através compressão (artificial) da representação parlamentar dos pequenos partidos. Mais, pretende-se responsabilizar as oposições e impedir a formação de maiorias meramente destrutivas: unem-se para fazer cair os executivos mas são incapazes de gerar soluções alternativas de governo (“coligações negativas”). Esta solução pode ser especialmente adequada para favorecer a estabilidade de governos minoritários impendido que as oposições se possam unir só para fazer cair o governo. Para que com a MCC se possa efectivamente fazer cair o governo é preciso que, primeiro, os seus proponentes apresentem um primeiro-ministro alternativo ao que pretendem demitir (e que deverá liderar o novo gabinete) e, segundo, que a moção seja favoravelmente votada pela maioria dos deputados. Caso não se verifiquem ambas as condições, a moção é chumbada. Como sublinha Dieter Nohlen no livro citado (p. 45) e referindo-se ao sistema eleitoral português (uma outra via para promover a estabilidade dos governos) “aumentar a desproporcionalidade entre os votos e os assentos parlamentares significaria acabar com o princípio proporcional”; “perante estas alternativas, seria conveniente optar pela MCC, evitando toda e qualquer intervenção no sistema eleitoral no sentido de uma menor representatividade.”

Publicado originalmente no Público, 26/7/2010.

1 comentário:

Anónimo disse...

Agradecimento:

Deixo aqui uma nota de agradecimento ao «Ladrões de Bicicletas» e em particular ao André Freire por ter escolhido o nosso «banner» para ilustrar este texto.


Tiago Vahía Pessoa,

http://mocaodecensura.blogspot.com/