segunda-feira, 5 de julho de 2010
Salvar o euro? III -Um ajustamento imposto
Uma das causas estruturais da actual crise foi o acumular de desequilíbrios macroeconómicos dentro da moeda única. Os países periféricos entraram na moeda única com taxas de câmbio sobrevalorizadas e sujeitaram-se a uma política monetária ortodoxa, obcecada pela inflação, e determinada pela economia dominante da zona euro, a Alemanha. Face aos constrangimentos fiscais (do Pacto de Estabilidade) e monetários, o único mecanismo de competição e ajustamento das diferentes economias fez-se através do mercado de trabalho, comprimindo os trabalhadores nos seus salários e retirando progressivamente o enquadramento legal da protecção do trabalho conquistado no pós-guerra.
Nesta corrida para o fundo, onde todos os países competiram, a economia alemã foi campeã, com os seus salários reais a crescerem consecutivamente menos do que a produtividade. Se tal processo resultou na estagnação da sua procura interna e consequente crescimento medíocre, o seu sector exportador ganhou competitividade em relação aos parceiros europeus, agora impedidos de desvalorizar as suas moedas como mecanismo de ajustamento. Esta política monetária e salarial, orientada para a geração de excedentes comerciais que são reciclados como fluxos de capitais externos, resultou em crescentes défices externos (públicos e/ou privados) dos países periféricos do Sul, financiados pelos bancos alemães e franceses. Estes desequilíbrios não provêm pois de uma qualquer superior eficiência da economia alemã face a aumentos salariais excessivos das economias periféricas, mas da compressão das condições dos trabalhadores europeus, processo promovido pelas próprias instituições europeias em que o resultado foi a perda generalizada de peso dos rendimentos do trabalho face aos do capital.
Devido à perda de competitividade dos países periféricos, muitos têm sido por isso os economistas portugueses que propõem um corte generalizado dos salários nominais em 10% ou 20% (conforme as estimativas), de forma a recuperarmos competitividade externa. Esta seria a receita perfeita para a depressão. Uma contracção desta magnitude conduziria a uma brutal contracção da procura interna e consequente aumento do número de falências, aumento do desemprego e do crédito mal parado. Contudo, este é o caminho seguido pelo governo, ainda que numa versão moderada, onde o empobrecimento dos trabalhadores se faz lentamente, mas a integração nacional no euro e a posição das elites nacionais, na sua actual configuração, fica preservada. Os salários reduzem-se na vã esperança de que o aumento da competitividade externa resulte em crescimento económico sustentável.
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