O primeiro ano da presidência Obama traduziu-se numa enorme desilusão para a esquerda. Mesmo para quem não tinha grandes ilusões, impressiona a forma como o actual presidente não marcou qualquer ruptura com a anterior administração. A continuação da guerra infinita, o não encerramento de Guantanamo ou a inacção em relação ao poderoso sistema financeiro são bons exemplos da continuidade das políticas. Todavia, é numa das mais promovidas promessas eleitorais que o falhanço é mais claro: a reforma dos sistema de saúde. Neste caso, aparentemente já não há volta a dar.
Obama partiu com um claro mandato de reforma do sistema, com o apoio maioritário da população. As suas propostas eram tímidas. A provisão de serviços de saúde continuaria a ser privada, mas o cartel das seguradoras estaria sujeito a novos controlos e enfrentaria a concorrência de um sistema público de seguros que englobaria a parte da população sem protecção. A reforma saída agora do Congresso é uma caricatura das propostas iniciais e uma vitória contundente das seguradoras. Se, por um lado, o complexo privado de saúde urdiu toda um campanha de medo contra a reforma (onde fantasias como os famosos "painéis da morte" pareciam realidades), gastando 425 milhões de dólares só em grupos de pressão que trabalharam na influência do Congresso, por outro lado, Obama e o Partido Democrata adoptaram um abordagem de não interferência com o processo legislativo, deixando o acordo nas mãos dos senadores democratas mais à direita. O resultado é uma lei onde já não existe qualquer opção pública ou redução da idade mínima (actualmente, 65 anos) de acesso ao programa público Medicare, como chegou a ser anunciado. A actual lei prevê seguros obrigatórios, altamente subsidiados pelo Estado de forma a diminuir os presentes obstáculos aos doentes crónicos. Jackpot para as seguradoras.
O único sinal positivo de todo este escandoloso processo é a revolta de alguns sectores da esquerda norte-americana. Abaixo deixo um vídeo de Howard Dean (ex-presidente do Partido Democrata) em que este apela ao voto contra a actual lei. Infelizmente, não tem legendas, mas vale bem a pena.
Adenda: Ainda sobre os EUA do Presidente Obama, confesso que fiquei chocado com um breve artigo da The Economist sobre as carências alimentares na cidade de Nova Iorque. Segundo a revista, mais de metade das famílias com crianças da cidade tem dificuldade em comprar bens alimentares suficientes, sendo que 20% das crianças (400 mil) dependem da "sopa dos pobres". Como dizia o João Rodrigues numa crónica no i, as sociedades devem ser avaliadas através da forma como tratam as suas crianças...
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3 comentários:
como se diz "pai tomáz" em americano? :(
Terá o Obama o poder supremo nos EUA?
Obviamente que não e obviamente que consensos são necessários como foi notório na reforma na saúde.
Não se pode esperar que tudo mude da noite para o dia, e parece-me inequívoco que algo está a mudar nos EUA. Quanto mais não seja na forma como vêm o mundo e como o mundo os vê a eles.
Parece-me que o balanço de 1 ano de Obama é positivo, agora não lhe peçamos demais, nem (nos esquerdas) tenhamos o complexo do Peter Pan.
Serão os "reformadores" de esquerda um bando fracos que se rendem aos lobbies instalados, ou será a constante "moderação" das suas ideologias sempre que chegam ao poder um reflexo de que não passava tudo de propaganda e quando chega à altura de fazer, realmente, algo percebem que só iriam tornar as coisas piores do que elas são? Ou será um misto de ambas?
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