quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Profecias que vêm de fora?

Em relação ao muito interessante artigo de Martin Wolf no Financial Times sobre as desgraçadas periferias europeias e à indevida apropriação que dele fez Vítor Bento em apoio das suas teses, é ler João Pinto e Castro. Também eu tenho lido Vítor Bento com atenção – é o mais interessante do grupo que eu e o Nuno Teles chamamos, em artigo no Le Monde diplomatique deste mês, a economia-2012. Gostaria de fazer um sublinhado e acrescentar duas coisas. Sublinhado: Wolf coloca os problemas de economias como a portuguesa no quadro mais geral dos desequilíbrios institucionais da zona euro, tema que Vítor Bento, como os outros economistas-2012, têm relutância em abordar: “a crise na periferia da zona euro não é uma acidente: é inerente ao sistema”; “a zona euro não tem um comprador de último recurso”; (ver o que eu e o Ricardo escrevemos sobre isto na revista Finisterra).

Neste momento, há dois grupos de economistas em Portugal: os que discutem os problemas da economia portuguesa no quadro da zona euro e dos seus disfuncionamentos e os que fingem que o nosso país pode ser pensado de forma isolada, ou seja, no quadro de regras que não querem questionar porque sabem que estas favorecem o seu discurso neoliberal. Isto para já não falar do problema da Alemanha que seguiu a via não-cooperativa de assentar o seu crescimento nas exportações: os excessivos excedentes de uns são os excessivos défices de outros.

Wolf aponta, tal como Carlos Santos já tinha feito com a mestria habitual, para a relação entre o endividamento privado, onde a componente empresarial pesa muito, e o endividamento externo. Num contexto de crise, como Wolf assinala, o esforço para reequilibrar balanços privados tem como contrapartida a existência de défices públicos. Vamos então à questão que obceca Bento e que Cavaco não tem a coragem de enunciar: os cortes nos salários nominais. Wolf indica que eles poderão resultar da recessão prolongada e do desemprego engendrado, no quadro de uma espiral de deflação.

Um cenário a evitar a todo o custo não é uma recomendação de política. De qualquer forma, na ausência de instituições centralizadas de negociação que determinem as normas salariais, tal como existem nos países escandinavos, o capitalismo sem freios políticos adequados só tem a crise profunda e o desemprego elevado como terríveis mecanismos disciplinares. Sem esquecer a falácia da composição que aguarda o sucesso em toda a linha das burguesias nas lutas de classes, mais ou menos institucionalizadas, nos vários países europeus, isto para atalhar de forma realista: procura europeia atrofiada e saída pelas exportações eternamente adiada.

Aproveitar que estou a falar de Wolf para fazer uma pergunta a Pedro Lains: onde é que leu que João Ferreira do Amaral defende a saída do euro? Aqui não foi de certeza. Uma coisa é ter alertado a tempo para os efeitos perversos da forma como o euro foi instituído, outra diferente é defender agora a saída. João Ferreira do Amaral defende claramente uma reconfiguração da forma de funcionamento da zona euro e até acho que Lains não anda a pensar sobre coisas muito diferentes. Lains fá-lo, parece-me, é de forma menos clara e não é, decididamente, por não o conseguir fazer de forma mais clara.

2 comentários:

Anónimo disse...

Corrijo o que disse sobre JFA, com as devidas desculpas (e satisfação...).
PL

Anónimo disse...

Independentemente de se concordar ou não com as sugestões de Ferreira do Amaral, não é crivel que a União Europeia alguma vez as adopte.
Por outro lado é óbvio que Portugal, com este Euro não irá longe.
Assim é necessário saber como ultrapassar a seguinte situação:

-Com este Euro a economia portuguesa, no minímo estagna. Isto é, com este Euro entregaremos aos nossos filhos e netos não um país, nem sequer uma região de um país mais vasto, mas sim um pântano de águas estagnadas.

-A probabilidade de fazer grandes alterações a este Euro é praticamente nula.

Salvo melhor opinião, parece-me qur a única solução para as equações acima, é sair do Euro, custe isto o que custar.