domingo, 28 de junho de 2009

“Pequeno destaque em caixa com fundo...” ou a moral insólita do Público e de José Manuel Fernandes


Um dos pontos cruciais para apreciar a forma como uma sociedade está capacitada para o debate e para o exercício do pluralismo é o modo como faz a recepção do próprio debate, isto é, das controvérsias em que ele se baseia. Para além do fundamento das ideias em diálogo, está em causa saber que “tecnologias” de discussão é que se convocam. Por vezes convocam-se as piores. Entre elas estão a da “credibilidade”: uma ideia é “credível” mas a ideia que se lhe opõe não o é, independentemente dos seus conteúdos ou fundamentos. Outra das más “tecnologias” é a da reserva de legitimidade: mesmo que a questão seja colectiva, só alguns são legítimos intervenientes, em vista de um saber “imperialista” que possam deter. Os outros saberes (e as razões que formulam) são coisas marginais, irrelevantes, fora do assunto. O direito à delimitação do campo da discussão é outra das arrogâncias que mina o debate. Albert Hirschman, um economista exemplar, abordou de forma original questões desta natureza em The Rhetoric of Reaction, um livro de 1991.

Mas há questões mais insidiosas. Uma deles é a do exercício prepotente do poder que se tenha para introduzir a batota no jogo. O que o Público ontem fez é exemplar, neste domínio. Recebeu de forma privilegiada o texto, não recusou esse privilégio, não o publicou ou referenciou mas o Director, em Editorial, atacou-o, assumindo uma resposta a algo que os seus leitores não conhecem. Esta moral é tão amoral que nem precisa de ser qualificada.

Entretanto, hoje, o texto teve uma singela referência no jornal. Ironia das ironias, por baixo do texto, na edição online, vinha uma daqueles frases “técnicas” que, de forma espúria, ficam à disposição dos leitores. Dizia assim: “Pequeno destaque em caixa com fundo que também pode servir de legenda para a fotografia do lado esquerdo”. Se calhar nem tinha a ver com a notícia a que me refiro. Mas a vontade está lá: pequeno destaque...

7 comentários:

Nuno Gaspar disse...

Ingrato. Querer maior destaque do que um editorial..

Anónimo disse...

e que tal inundar de reclamações o provedor do leitor do público?

José Manuel Fernandes disse...

José Reis enviou o seguinte mail, na sexta-feira, a um director do Público que não eu:

Envio-lhes o texto de que falei ao ..., a propósito do debate sobre o investimento público. O que temos combinado com os jornais a quem o estamos a dar é que o publicarão amanhã e não antes online. É isso que gostaríamos igualmente de fazer com o Público, até por ser um dos jornais que mais atenção tem dado a este debate.
Como não estamos a fazer uma difusão generalizada, pressupomos que isso possibilita que cada jornal lhe dê mais atenção.

No sábado, às 00h09, no link http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1388944&idCanal=57, o manifesto estava disponível na Internet, com chamada à Homepage, tal como se pedia no mail.

Sabe porquê? Porque fui lá eu colocá-lo. O meu colega e o editor a quem enviou o texto não tinham tratado de nada e só quando estava a escrever o editorial e quis fazer uma remissão me apercebi dessa sua falha. Pude corrigir na web, já não consegui fazê-lo na edição papel.

No mínimo acho que me deve um pedido de desculpas pelo que escreveu neste seu post, até porque sei que, neste momento, o meu colega da direcção também já o esclareceu sobre o que se passou.

José Manuel Fernandes

José Reis disse...

Se bem entendo, José Manuel Fernandes vem dizer que eu pedi a publicação do texto online. E apenas isso. E que, portanto, ao colocá-lo online o Público agiu exemplarmente. Pôde, portanto, publicar o seu editorial na edição impressa, sem o texto que tratava tão acidamente. Ora, acontece que eu estava apenas a dizer que fazia parte do acordo não antecipar a edição impressa de uma notícia online, questão que me tinha sido levantada por um dos jornais com quem falei, invocando uma caso semelhante anterior. Como é óbvio. Seria absolutamente insólito que alguém se dirigisse a um jornal pedindo uma publicação que não incluísse a edição em papel.
Acha José Manuel Fernandes que isto faz sentido? Faz o mesmo sentido que faria se ele publicasse o editorial online e apenas online! Coisa obviamente descabida a que só uma tortuosa interpretação pode conduzir.
O Expresso e o i não tiveram nenhuma dificuldade em entender isto. Mas José Manuel Fernandes sim.
Não serei eu a invocar terceiros para aqui demonstrar que esta absurda visão do que se passou só existe na sua cabeça.
O que continua a ser incontornável é que José Manuel Fernandes publicou um editorial sobre um texto a que os seus leitores não tiveram acesso na mesma edição e pelo mesmo meio que ele usou. Não estaríamos aqui a discutir se o Público tivesse tratado o texto em termos noticiosos, ouvido os seus autores e dando conhecimento do essencial aos leitores. Então, a publicação online do texto integral tinha sentido. E não seria eu que discutiria que espaço tinha ou não havido na primeira página, se foi manchete, se tinha 28 fotografais na capa...
Teria toda a disponibilidade para pedir desculpas por um erro que tivesse cometido. Mas como encontrar razões para isso? Só com deturpações de uma história simples.

Anónimo disse...

José Manuel Fernandes tem obviamente uma agenda que o levou a ter as mãos manchadas do sangue de saddam hussein, em cuja captura foi cúmplice, só é pena que acredite tanto no valor das suas ideias que se recuse a vê-las confrontadas com as dele. Ética e deontologia farão parte da maneira como vê a profissão - a dele e a minha?

Mário Moniz disse...

O facto de José Manuel Fernandes "acusar o toque" já diz tudo. Para bom entendedor, 1/2 palavra basta.
Houve realmente má fé no editorial de JMF.

Anónimo disse...

Pelos vistos, o probo José Manuel teve resposta à altura pela mão de Rui Tavares, na edição de ontem do Público.

Mas não se conteve. Consciente da bondade da sua posição - que noutras ocasiões também apoia penas de morte, ao menos por omissão - tratou de responder ao cronista logo na mesma edição, não fossem os leitores achar que o historiador tinha razão.