Como já argumentei, não creio que seja repetindo os mesmos apelos euro-keynesianos de sempre, numa União feita para os tornar sinónimo de impotência política, que sectores intelectuais das esquerdas europeias irão acordar o “gigante adormecido”, de que fala André Freire, ou seja, a capacidade de mobilizar a crescente polarização em torno das questões europeias e o crescente, e justificado, eurocepticismo, particularmente presente nas classes populares de muitos países, acrescento eu. Nós já propusemos outro caminho que ainda tem muito caminho a fazer. Apesar de tudo, creio que em Portugal ainda vamos politicamente a tempo. Em França, por exemplo, já é muito mais difícil, dado que é a Frente Nacional que desgraçadamente parece monopolizar partidariamente a questão nacional que é popular e que inclui a soberania monetária.
Paradoxalmente, do que eu conheço, é em França onde são mais e melhores os intelectuais de esquerda que têm trabalhado a questão da soberania democrática, da desobediência a Bruxelas, do protecionismo, da ruptura com o euro, inserindo alguns destes temas na “astúcia da razão internacionalista”, de que fala Cédric Durand, aquela que não vê antagonismo necessário entre o regresso às pátrias, a cooperação europeia e a solidariedade internacional.
Veja-se a este propósito o recente artigo de Kouvelakis, Durand e Keucheyan, respectivamente, filósofo, economista e sociólogo marxistas, ou seja, economistas políticos críticos. Para uma síntese do debate em torno desta linha intelectual e política, também presente em sectores social-democratas, que me parece destinada a ser crescente influente, veja-se este artigo com várias reflexões estimulantes, particularmente aquela que se refere à ameçadora clivagem para a esquerda entre classes profissionais intelectuais e classes populares na questão nacional mais importante que é a europeia.
6 comentários:
Muito interessantes os artigos partilhados. Infelizmente, no contexto das eleições europeias não acrescentam muito. Aliás, pode ser do meu francês ferrujento, fiquei um pouco com a impressão que quase que subconscientemente apelam ao não-voto nas próximas eleições.
Estes artigos que pululam agora partem também do pressuposto que qualquer mudança europeia apenas pode ser feita em sede de eleições europeias. Pelo que li, qualquer um destes artigos serão muito relevantes nas legislativas do ano que vem.
Van Rompuy pode até ser uma besta, mas quando diz que as decisões se tomam em sede do Conselho, tem razão. Toda a gestão da UE na crise foi feita pelo Conselho, tendo a Comissão, no pouco que pode fazer (e no muito que pode deixar que não se faça) simplesmente abanado o rabo com a língua de fora.
Nesse sentido, as próximas eleições podem ajudar a limitar uma comissão de comissários nomeados por governos nacionais (vai ajudar, certo?), mas serão as legislativas do próximo ano que realmente ditarão onde e como Portugal está na Europa.
Caro João Rodrigues,
Julgo que nesta altura não se pode dizer que há falta de reflexão académica sobre caminhos alternativos. Apesar de tudo, também me parece que essas alternativas têm feito o seu caminho no debate público, como se pode ver pelos inúmeros manifestos e congressos.
Onde me parece haver falta de reflexão é sobre o porquê de essas alternativas, bem fundamentadas do ponto de vista académico, não terem expressão político-partidária clara que pudesse efectivamente influenciar a decisão política. Porque é que não existe essa expressão inequívoca nem mesmo (eu diria, em particular) por parte de partidos como o BE ou o PCP? Quando a generalidade dos partidos se "queixa" da falta de recursos internos para aprofundar os assuntos, porque não "aproveitam" a reflexão fundamentada que se faz na academia?
Um postal com vários links e muito material. Saliento dois tópicos chave:
Também vejo idealismo no pensar que agora é que o “gigante adormecido” pode acordar, o que só vai adiar a acção, enquanto vamos definhando – novos e velhos (este idealismo acaba por ser extensível àquele sector de uma esquerda minoritária, que perdida na utopia mas sem proposta de acção, não “lê a astúcia da razão internacionalista”;
É importante falar-se abertamente e não ter medo das palavras: desobediência a Bruxelas, proteccionismo, ruptura com o euro, moratória no serviço da dívida.
Em Portugal só os partidos da esquerda afloram a mudança radical, mas ainda de forma cautelosa. Talvez porque, tal como a ideia da reestruturação da dívida, outras há que levam tempo a fazer escola; e a chegar ao comum dos cidadãos, mais ainda…
Caro Anónimo,
Posso ser levado a concordar consigo na questão do debate académico, mas a verdade é que os eventos que vão contra a corrente tendem a ter grandes difciculdades em terem tempo de exposição.
Olhe em seu redor e desligue-se por um bocadinho da net. Tente passar em frente a uma banca de jornais e ver algo que chame a atenção para esses eventos. Tente-se informar a respeito dessas correntes alternativas através da televisão.
Infelizmente, para se poder influenciar a decisão é preciso ter-se exposição. Sabe quantos meios de comunicação portugueses dedicaram um bocadinho a dar visibilidade ao debate entre os quatro principais candidatos à presidência da próxima Comissão Europeia?
Vale também a pena ver, a propósito, a entrevista de ontem à noite de João Ferreira, principal candidato da CDU às próximas eleições para o Parlamento Europeu. Claríssima. Um enorme contributo para despertar o gigante.
http://www.tvi24.iol.pt/videos/video/14135628/3
Apesar de tudo, parece-me que o PCP tem um posição clara sobre o Euro. O Bloco, de facto, tem uma posição muito inconsistente!
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