quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Quem anda a puxar pelas exportações portuguesas?

Ao que parece, o sector exportador tornou-se a última esperança para a economia nacional. A procura interna encontra-se atrofiada por um desemprego elevado, pela redução do rendimento disponível das classes médias e baixas (redução nos salários, aumento dos impostos, corte nos apoios sociais, etc.), pelas dificuldades de financiamento do investimento privado e pela repressão do consumo e do investimento públicos. O crescimento económico, diz-se, só pode vir das exportações.

Neste contexto, os dados recentes que apontam para um crescimento das exportações portuguesas de 12,6% entre Janeiro e Setembro de 2010 (face a igual período do ano anterior) não tardaram a ser vistos como um sinal de esperança.

Como já aqui defendi, o desempenho exportador de uma economia portuguesa é um aspecto essencial para a sustentabilidade do crescimento económico a prazo. Nesse sentido, as boas notícias são mesmo boas notícias.

Ainda assim, vale a pena tratarmos as coisas na sua devida proporção. Em primeiro lugar, analisar a evolução das exportações sem olhar para o que se passa do lado das importações é um erro: em muitos casos o aumento das exportações reflecte apenas um aumento dos preços internacionais de certos produtos de que o país é também importador, pelo que o impacto do aumento das exportações em termos de balança comercial pode ser mínimo; por outro lado, há muitas actividades de exportação que se baseiam na transformação de componentes importados, por vezes com baixo valor incorporado no país, pelo que o aumento das exportações tem um impacto diminuto no PIB.

Em segundo lugar, há que evitar traduzir imediatamente um bom desempenho exportador em termos de melhoria da capacidade competitiva da economia nacional. Numa economia de pequenas dimensões como a portuguesa, um rápido crescimento das exportações pode reflectir fenómenos essencialmente cíclicos, de duração porventura limitada.

Uma análise mais detalhada dos dados do comércio internacional português não dá, para já, motivos para grandes euforias. Desde logo, o crescimento homólogo das importações no período entre Janeiro e Setembro de 2010 (9,2%) não ficou muito aquém do crescimento das exportações – isto não obstante a fraqueza da procura interna.

Por outro lado, quando olhamos para os produtos que mais contribuíram para o aumento das exportações (o gráfico abaixo é da autoria do GEE) verificamos que eles reflectem essencialmente o aumento dos preços internacionais de matérias-primas – petróleo, minérios, metais, borracha, plásticos, madeira, produtos agro-alimentares. Em todos estes casos, o aumento do preço dos produtos afecta tanto as importações como as exportações portuguesas. No caso do petróleo - que Portugal importa em bruto, exportando parte da refinação realizada - dificilmente se poderá defender que um aumento do seu preço, por muito benéfico que seja para o desempenho exportador, seja positivo para a economia como um todo.




Enfim, nos tempos que correm temos razões para ficar felizes se a balança comercial de países deficitários como Portugal evoluir de forma positiva. Mas os dados do crescimento das exportações portuguesas estão longe de permitir grandes euforias sobre o desenvolvimento económico no futuro mais ou menos longínquo.

3 comentários:

Anónimo disse...

Excelente texto.

rui fonseca disse...

Mais do que a contribuição de cada sector em termos de exportações brutas, é importante saber qual o valor acrescentado nacional exportado por cada um deles.

Sabe quais são esses valores?

O gráfico daí resultante é muito diferente deste. E, sobretudo, muito mais esclarecedor.

Ricardo Paes Mamede disse...

É certamente uma questão importante, mas está para além do tema deste post. Aqui está em causa a natureza dos produtos que mais têm contribuído para o crescimento das exportações, e é isso que está no gráfico.