Em democracia, existe um consenso explícito (materializado no ordenamento jurídico que a todos rege) quanto ao exercício da violência legítima por parte do Estado. Este consenso, pressupõe regras e, de forma implícita, uma plataforma ética com base na qual construímos sentidos para a cidadania. Pessoalmente, entendo que esse monopólio da violência legítima por parte do Estado só adquire o seu sentido pleno e a sua verdadeira justificação na medida em que seja eficaz na repressão de qualquer forma de violência que ponha em causa a ordem pública, retire ou cerceie direitos aos indivíduos, defendendo os membros de uma sociedade do arbítrios dos infractores e, muito em especial, os mais fracos e indefesos, sempre expostos às vicissitudes do mal que grassa no mundo.
Quando o exercício da violência por parte dos representantes da autoridade do Estado se realiza para contrariar qualquer espécie de comportamento que não ponha em causa a integridade de pessoas ou bens, públicos ou privados, a credibilidade e o sentido de justiça subjacente ao consenso democrático pode vacilar e a democracia fica comprometida. Inversamente, quando bandos de desordeiros, na sua esmagadora maioria ignorantes e mal-educados - senão mesmo mentecaptos – estimulados pelas actividades de empresas a que, apenas por um mero efeito de hysteresis ainda chamamos “clubes desportivos”, se arrogam o direito de fazer da agressão generalizada e da violência a marca da sua reles submissão a ideais de estupidez agonística exacerbada, então, também a democracia fica comprometida, pela perda de direitos de cidadania provocada pela acção desta escumalha. Nesses casos, então, eu pugno por penas de prisão efectiva, mas que sejam verdadeiramente severas. Para estes “adeptos” (a expressão correcta é “ineptos”) a marca distintiva da pena seria, sempre em regime de reclusão, o trabalho compulsivo em prol da comunidade. O que não faltam aí são bibliotecas com livros a precisar de encadernação e formadores a precisar de trabalho.
À legião de psicopatas e de inúteis que medram neste meio – que vale o que vale não por ser desporto, mas por ser negócio - tivemos de pagar dos nossos impostos os faustosos estádios, temos de os aturar em intermináveis demonstrações de cretinismo e abjecta verborreia à abertura dos telejornais, temos de os ouvir a toda a hora nos cafés, nas escolas e nos locais de trabalho, e ainda querem que toleremos como natural a existência de claques que, recorrentemente, se comportam como grupos terroristas, a arruaça, a destruição de bens públicos, a agressão, o fecho de auto-estradas e – pior do que tudo – o espectáculo execrável dado à já de si deficiente socialização democrática das crianças e dos jovens? Queremos leis penais justas para reprimir a violência, ou queremos continuar a assistir a batalhas campais como a do passado fim-de-semana sem que daí resulte qualquer apuramento de responsabilidades individuais ou colectivas? Queremos apostar na educação, na decência, numa verdadeira ética de cidadania, ou no exemplo que continuadamente estes degenerados e quem os cauciona oferecem ao país?
7 comentários:
Subscrevo inteiramente o seu texto e pergunto-me até quando teremos de esperar por uma accção decidida que ponha termo a estes repetidos e execraveis"espectáculos"
Concordo com a sua visão. Nada severa para atitudes primordiais: adequada a estas. E só assim, literalmente, descendo de nível, se consegue assentar a realidade. Os limites no fanatismo não são visíveis para o fanático. Pois o desporto deixa de fazer parte de uma cultura sã para ser uma excedente e ridícula manifestação de ignorância chauvinista podendo, assim, violar qualquer esfera imparcial.
... e o que dizer da cambada de jornalistas e televisões que promovem estes espectáculos até á náusea, e que depois de incendiarem a burgessada até aos limites, fazem figura de putas virgens e ofendidas como se não tivessem nada a ver com a coisa...
Estes tristes espeteculos são em parte responsabilidade do estado que subsidia o futebol como os romanos subsidiavam o circo.
O facto de o nivel de educação da maior parte dos adeptos de futebol ser baixissimo explica o resto.
Porque mais vale tarde...
http://triplom.blogspot.com/2011/05/proposito-do-espectaculo-da.html
Aproveito mais um episódio de fascismo à solta na rua (madrugada de hoje no Marquês de Pombal) para repor o texto que postei no meu blogue entretanto encerrado. Não retiro uma vírgula ao que escrevi aqui há cinco anos atrás. Fica reposta a verdade histórica e o direito ao contraditório. Fascismo nunca mais!
«Só há muito pouco tempo descobri, casualmente, que há um ano atrás o Zé Neves do blogue "Vias de Facto" deu ares de chegar às ditas quando se entreteve a insultar-me, por não ter gostado da incandescência da minha indignação expressa num post que fiz no Ladrões de Bicicletas, e me dedicou um post no dito "Vias de Facto" com o título bufo "Um hooligan nos Ladrões de Bicicletas", chamando-me hooligan, elitista, arruaceiro, etc... Lamentavelmente, não deixou rasto nem pista na caixa de comentários do "Ladrões..." para que eu pudesse responder, e não tendo eu o dom da presciência dificilmente adivinharia que ali se tinha reagido ao meu post daquela forma, como que a pedir um despedimento com justa causa. Com um título bufo, só poderia o dito post exibir uma prosa de tipo denunciante, parecendo alertar os camaradas para o "desvio ideológico" patente no tão indigno estilo das minhas palavras. Confesso que me surpreendeu haver quem à esquerda se pudesse indignar com a minha indignação, ainda por cima referindo-se a mim como um "intelectual de esquerda" - um rótulo bafiento e ridículo que rejeito em absoluto e que me diz quase tudo acerca de quem ainda vê sentido no seu uso. Escreveu ele que o tom das minhas palavras "roça a selvajaria que identifica no outro". A diferença é que a minha indignação, a que ele chamou de selvajaria, não agrediu, não partiu, não prejudicou ninguém nem pôs em causa os fundamentos do Estado de Direito. A minha indignação dirigia-se àqueles que prestam culto à violência e fazem o fascismo sair à rua a cada jogo "importante", iniciando-se o espectáculo da bestialidade logo à entrada para os recintos, com as massas de "adeptos", meros serviçais das empresas chamadas "clubes desportivos", em passo de corrida escoltados pela polícia de choque que os protege da sanha sanguinária dos serviçais do clube inimigo. E lá vão eles, cantando, rindo e arrotando, exibindo triunfalmente os símbolos da imbecilidade colectiva que, pela cor e pela associação a formas específicas de urrar, identificam os seus senhores e deuses; a minha indignação dirigiu-se a todos os promotores e cúmplices da estupidez agonística exacerbada e da servidão voluntária que a alimenta. Indignando-se com a minha indignação e não com o objecto da minha indignação, ficou claro de que lado está o Zé Neves.
Para expressar a minha indignação, contudo, não precisei de usar o dinheiro dos contribuintes para...
(PARTE 2 do post já a seguir)
(CONT.)
...construir faustosos estádios que não servem para nada, e muito menos obrigo os telespectadores à condenação de terem de me ouvir a toda a hora nos principais canais de televisão, nos cafés, nos transportes públicos, nos locais de trabalho, etc. A minha indignação é opinião livre e eu sou o comité central de mim próprio. Se o Zé Neves se sentiu ofendido com a minha indignação, compreendo... sobretudo depois de ter passado os olhos pelos seus posts e constatar que linka artigos de jornais desportivos - esses grandes exemplos de cidadania e cultura que, por acaso, até são os mais lidos em Portugal - e se refere aqui e ali a um ou outro desses milionários imbecis e de nome sonante no meio futebolístico, dando até ares de ser versado em sociologia do desporto, quando distingue a violência das claques e a violência do hooliganismo (primorosa sociologia - não do desporto, claro, que para aqui não devia ser chamado, mas da violência) e sugerindo que eu devia ler mais sobre o assunto. Embora eu pense que a leitura ideal para aprender mais sobre o jogo da bola só pode ser o Mein Kampf, numa coisa, pelo menos, ele tem razão: qualifica as minhas palavras como "vómito". De facto, na minha opinião - que não vale mais nem menos do que a dele - esta esquerda sem sal capaz de arvorar um moralismo bacoco ao indignar-se com a indignação dirigida à bestialidade alienante do jogo da bola, ou de lamentar a morte de um facínora como Bin Laden, tal como a direita dos touros e das santinhas, ou as claques, os hooligans, os controleiros estalinistas e maoistas que parecem ressurgir clonados onde menos se espera, os fanáticos sionistas ou os fascistas barbudos que matam em nome de Deus, ponho-os facilmente a todos, efectivamente, no mesmo saco. Daqueles que se usam nos aviões quando alguém está mal disposto...
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