«António Hespanha não usava da oratória típica do professor grandiloquente. Era mesmo o contrário disso. As suas intuições mais fulgurantes ou alegações mais radicais ele apresentava-as com aquele tom de voz de quem estivesse a falar de alguma coisa simplicíssima, com enorme delicadeza mas também como se não desse enorme importância ao que acabara de expor — nem que fosse uma daquelas teorias novas ou interpretações originais por que outros dariam uma carreira inteira. Por outro lado, era aos pormenores supostamente insignificantes que ele era capaz de dar enorme importância, como se nos estivesse a passar (e estava) uma lição metodológica que era ao mesmo tempo uma mensagem ética: conheçam e estudem os temas a que toda a gente atribui imensa importância, mas não se deixem encandear por eles; acima de tudo, não se esqueçam de olhar atentamente para aquilo a que os outros não ligam. (...) Mais do que qualquer tema em particular, o que aprendíamos com Hespanha era a treinar o olhar: olhar de novo para o que pensávamos já conhecer, olhar para aquilo que outros desconsideraram, olhar de longe, olhar de perto, olhar de outra maneira. (...) Aprendemos contigo o que é aprender. Aprender não é só acumular informação: é ter afeto pelas pessoas, pelas coisas e pelas ideias. E etcetera. É isso. Não um adeus, mas um etcetera.»
Rui Tavares, Não um adeus, mas um etcetera (para António Manuel Hespanha)
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