domingo, 27 de abril de 2014
Os jogos do poder
No dia 4 de Abril de 2011, pelas 10.30 da manhã, Carlos Costa, que fora chefe de gabinete de João de Deus Pinheiro, em Bruxelas, e director do Millenium BCP, aconselha os banqueiros: ‘Vocês não podem continuar a financiar [as emissões de dívida pública portuguesa]. O risco é afundarem-se os bancos, parte sã, e a República, que é parte que criou o problema.’
Excerto do livro de Paulo Pena sobre a “bancocracia”, regime político dominado pelo sistema financeiro, onde o poder do crédito privatizado tudo subverte: o problema é a República e os bancos são a parte sã, reparem. A função de um jornalista é dizer a verdade e denunciar esta e outras mentiras do poder. Paulo Pena faz isso e por isso deve ser saudado. Fá-lo num relato jornalístico detalhado, competente e, mais extraordinário de tudo, dado que é de finanças que estamos a falar, envolvente e empolgante.
Aviso-vos, no entanto: a verdade que Pena expõe sobre estes anos de chumbo não é para estômagos frágeis. Afinal de contas, estamos a falar de Doutores Honoris Causa como Ricardo Salgado, Eduardo Catroga ou António Mexia e de outra gente, também muito respeitável e a quem muito devemos, como João Rendeiro, Duarte Lima, Oliveira e Costa, Paulo Teixeira Pinto, Jardim Gonçalves ou Cavaco Silva. A parte sã, no fundo. A verdade não é para estômagos frágeis porque estamos também falar de “refúgios fiscais” (a boa tradução para haven, e não heaven, como assinala Pena), de uma opacidade metodicamente cultivada pela finança cuja trela foi solta pelos governos, os que organizaram a sua, a nossa, submissão à banca, os que tornaram o Estado num agente sem soberania monetária. Pena mostra bem o que é o mercado e a inovação na finança: especulação financeira e fundiária, sopas de letras para gerar lucros à custa da dissimulação e do engano, destruição de um bem público como o crédito em crises financeiras sem fim.
Não julguem, no entanto, que Pena cai no moralismo que reduz a bancocracia ao carácter mais ou menos cúpido dos personagens. Pena deixa bem claro que o problema está na imoralidade das estruturas: “a crise foi e é motivada por uma cultura, uma visão política e um modelo económico que permanecem inalterados”. No caso nacional, isto foi preparada pelo cavaquismo, pela liberalização financeira e pela privatização dos bancos, sobredeterminadas externamente, como temos insistido, pela integração europeia de cunho neoliberal. O caso nacional não está isolado. Da Islândia à Hungria, Pena indica-nos como uma crise financeira pode ter diferentes saídas políticas. As estruturas não são destino.
Os valores de Abril passados quarenta anos exigem conhecer a fundo a finança, diz-nos implicitamente um jornalista comprometido com esse conhecimento. Não sendo essa a conclusão de Pena, devo dizer que saí deste livro a pensar, com mais razões, que se queremos democracia, desenvolvimento e descolonização, esta última agora entendida como a efectiva libertação nacional da tutela externa por via financeira e monetária, então temos mesmo de apostar no controlo público do sector financeiro, recuperando o espírito de um decreto-lei (estão a ver, sempre a autoridade política...) que ainda hoje deve fazer suar os banqueiros deste país: estou a falar de um decreto-lei de Março de 1975.
Em suma, um bom livro para ler em Abril ou em Maio.
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4 comentários:
O neo-liberalismo e o domínio da finança é que levou os Estados a promover bolhas imobiliárias com bonificação de juros, isenções e benefícios fiscais?!?!?!?!?
Ou são os Estados, pela mão de dos dealers de votos que os dominam, que arruínam as finanças?
Jose não desiste de defender os responsáveis pela presente situação.
É ver esta persistente defesa de tão "ilustres personagens" e o seu proverbial ódio a tudo o que trabalhe, seja funcionário público, sindicalista,subscritor de manifestos ou emigrante forçado.
E não são os "estados" nem os "dealers dos votos" e outras patacoadas com que josé tenta fazer a cortina de fumo habitual.Os governos estão reféns do poder económico e a chusma de criminosos que grita por menos estado o que pretende é precisamente que sejam os interesses privados a dominar os estados...como se tem visto.
Mas isto já foi aqui falado para aí um milhão de vezes...E os factos narrados pelo João Rodrigues mais uma vez sublinham o carácter mafioso do Capital.
De
Eis um dealer dos votos, neoliberal extremo, dominado pela finança e cumprindo as ordens dessa mesma finança.
http://www.youtube.com/watch?v=86BZjm0yU78
De
Chiça que este José é uma encomenda de todo o tamanho.
Deve ser um daqueles rapazes do PSD ou do CDS que andam por aí a asneirar a toda á força.
Com malta desta não há dúvida que a Direita trilha bom caminho.
Ou muito me engano ou tendo em conta a qualidade do PM(o Passos Coelho) este José e se o governo se mantiver um dia deste é secretário de estado duma coisa qualquer.
Talvez duma das novas secretarias de estado que estão na calha, quais sejam, a "secretaria de estado da defesa da austeridade á fartasana" ou da "secretaria de estado dos mortos vitimas da crise".
Assim á semelhança do tal Maçães( que raio de nome este...)o José já poderá aplicar o que tanto defende.
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