Com esta conferência, o PCP deu um importante contributo para o necessário debate sobre o futuro de Portugal na zona euro.
O PCP parte para este debate com a vantagem de ter sido o único partido que nos anos 90 alertou, de forma sistemática e coerente, para as implicações do projecto de União Económica e Monetária (UEM) sobre o modelo de desenvolvimento económico e social europeu e para os riscos da participação de Portugal neste projecto – muitos dos quais são hoje dramaticamente visíveis.
A posição do PCP contrastou, na altura, com o europeísmo pueril e propagandístico adoptado pelo Partido Socialista (que então se esquivou ao debate substantivo), com a adesão ideológica inequívoca (ainda que assente em pressupostos errados, como mostramos na parte 5 deste texto) do PSD ao projecto da UEM, com a nunca justificada transformação do CDS de partido eurocéptico em partido filoeuropeu, ou ainda com o europeísmo crítico mal definido do então recém-criado Bloco de Esquerda.
Os comunistas tomam, novamente, a dianteira do debate, num momento em que as fragilidades da UEM estão à vista de todos e em que se colocam dúvidas crescentes sobre a sustentabilidade das regras e dos arranjos institucionais sobre os quais assenta o projecto de integração económica e monetária da UE.
Correndo riscos de simplificação, a posição transmitida pelos dirigentes do PCP nesta conferência (e vale a pena ouvir todas as intervenções) pode ser resumida em dois pontos:
i) a permanência de Portugal na zona euro é económica, política e socialmente insustentável, pelo que a saída de Portugal do euro – seja por iniciativa própria, seja por pressão dos restantes Estados Membros, ou num cenário de implosão da moeda única – é apenas uma questão de tempo;
ii) Portugal só deve sair do euro por iniciativa própria se e quando estiverem reunidas as condições para que tal processo seja liderado por um governo que garanta a minimização dos custos para as populações, num processo que será necessariamente difícil.
Ao assumir explicitamente que considera a permanência no euro insustentável e as suas consequências inaceitáveis, o PCP faz algo que nenhum outro partido do arco parlamentar fez até ao momento em Portugal.
Todos nós, eleitores, deveríamos exigir aos partidos que se apresentam a eleições que clarifiquem a sua posição relativamente às seguintes questões:
1º) Consideram ou não que a permanência do euro, de acordo com as regras vigentes, é compatível com um modelo de desenvolvimento aceitável para Portugal?
2º) Em caso afirmativo, qual o modelo de desenvolvimento que vislumbram como possível e desejável no quadro da UEM?
3º) Em caso negativo, que alternativa defendem à participação de Portugal na UEM, nos termos em que se verifica actualmente? Que estratégia pretendem prosseguir para a construção dessa alternativa? Quais os riscos, limitações e potencialidades dessa estratégia?
Neste debate, tanto o PCP e como os partidos da direita já responderam à primeira questão – o PCP negativamente, os segundos positivamente. Ainda estamos à espera que PS e BE clarifiquem a sua posição sobre qualquer uma das três questões.
Mas a direita assume a dianteira daqui para a frente, pois o modelo que consideram possível e desejável no quadro da UEM é claro e está definido no Memorando de Entendimento com a Troika. Trata-se de uma economia que aposta na desregulação das relações laborais, nos baixos salários, na minimização das responsabilidades sociais do Estado e na exploração dos recursos naturais como meio de atrair investimento e promover a competitividade, estimulando a mobilidade internacional da mão-de-obra (leia-se, emigração em larga escala) como variável adicional de ajustamento macroeconómico.
Quanto ao PCP, continua a não ser clara a alternativa que defende, nem a estratégia para a construir. Em particular, continua a não ser claro se o PCP considera necessário o país preparar-se para sair do euro por iniciativa própria e, nesse caso, como pretende o PCP contribuir para reunir as condições necessárias a um processo que garanta a minimização dos custos para as populações.
Embora estejam por clarificar as suas respostas a questões fundamentais, o PCP parte para este debate com avanço face aos outros partidos de esquerda, assumindo a coragem de colocar as questões que precisam de ser colocadas. Qualquer que seja o resultado deste debate, começa a ser insustentável que os partidos assobiem para o lado, como se não estivesse em causa o nosso futuro colectivo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
4 comentários:
De não assunto está na ordem do dia. O post chamou-me atenção e não faltam palavras e ideias mais que avisadas.
Acompanhei atentamente os registos das intervenções do João Ferreira do Amaral, do Octávio Teixeira e do José Lourenço.
Sobretudo a parte final da comunicação do Octávio Teixeira é um claro e urgente acordem para a vida...
O PS, PSD e CDS não são partidos de direita, são de extrema direita. É preciso ver qual é o caminho em termos de ideais políticos que o CDS e o PSD estão a levar o país com a absoluta cumplicidade do PS. A diferença entre a gorda e o Hitler é que o Hitler matava com armas, e agora não é com armas. Mas os ideais são os mesmos.
Eu discordo do Provoca-me.
Acho que de todos os partidos do Parlamento não há nenhum que não seja socialista.
Caro Ricardo
Post muito pertinente.
A tomada de posição do PCP é muito importante porque, embora este partido tenha obviamente a seu crédito a tomada de posição nos anos 90, contra a caminhada que culminou no Euro, a verdade é que tomadas de posição na década de 90 não podem ser consideradas respostas satisfatórias para os problemas dos dias que correm.
Aliás, houve mais quem tivesse sido contrário à entrada (refiro-me evidentemente ao caso "classico" de João Ferreira do Amaral), mas entretanto tenha optado por ficar calado durante algum período subsequente, ou tenha adoptado uma conduta mais "low profile", porque, uma vez consumada a entrada, há/havia depois também inevitáveis "custos de saída".
E isso era/foi perfeitamente compreensível (e não era, já então, culpa nem de JFA nem do PCP).
Desde 2008, porém, e mais ainda desde o Memorando, que se tornou evidente que os custos de permanência são muito maiores ainda do que os custos de saída.
Assim, face à questão: mais do que simplesmente prepararmo-nos para sair, devemos defender isso como "parte da solução", sim ou não, o PCP responde já, e com clareza, que sim.
Acrescenta que isso não chega, naturalmente, que isso é "condição necessária mas não suficiente", e que há várias medidas prudenciais que ainda precisam de ser pensadas em maior detalhe. Tudo ressalvas das quais é difícil discordar, note-se.
Mas enfim: o PCP já está.
Falta pelo menos, e no curtíssimo prazo, o Bloco...
Todavia, o tempo não pára e os acontecimentos precipitam-se. Onde é que isto tudo nos levará, estamos cá para ver.
Em todo o caso, o PCP distingue-se para já, e pela positiva, por estar minimamente à altura dos acontecimentos.
Quanto a TODOS os outros: claramente, NÃO estão.
Enviar um comentário