Identificar o nacionalismo exclusivamente com a direita política significa não compreender a sua natureza e a forma como moldou quase todas as ideologias políticas modernas, incluindo as liberais e progressistas. O nacionalismo forneceu os fundamentos ideológicos para instituições como a democracia, o Estado-Providência e a educação pública, já que todas foram justificadas em nome de um propósito partilhado e de um ideal de obrigação mútua. O nacionalismo foi uma das forças que ajudou a derrotar a Alemanha nazi e o Japão imperial. E foram os nacionalistas que libertaram a grande maioria da humanidade da dominação colonial.
Andreas Wimmer, Porque é que o nacionalismo funciona e porque é que está para ficar?, Foreign Affairs, Março/Abril de 2019, p. 28, minha tradução.
Apesar da capa ameaçadora, a convencionalíssima Foreign Affairs tem um dossiê sobre “o novo nacionalismo” que é bem mais plural do que os debates públicos neste país sobre o tema. Salvo raras excepções, onde se inclui um ou outro estudioso dos nacionalismos, por cá o termo tende a ser imediatamente associado a tudo o que é politicamente tóxico. É a imaginação do centro a funcionar entre as elites que monopolizam o debate público.
E, no entanto, basta molhar a medo os pés no vasto e revoltoso oceano da literatura histórico-sociológica sobre o assunto para concluir que a posição de Wimmer tem muito a seu favor. E já nem falo no só aparentemente mais calmo mar da história da economia política, onde a posição de um Gunnar Myrdal, só para dar um exemplo, representa o melhor dos estudos do desenvolvimento sobre este tema. Quem disse que um determinado tipo de nacionalismo não pode fomentar o mais consequente internacionalismo? Não se pode é confundir internacionalismo com a neoliberal UE...
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
13 comentários:
«um propósito partilhado e um ideal de obrigação mútua.»…que pressupõe vantagens próprias e interesses adversos. Como qualquer normal egoísmo.
Quem disse que um determinado tipo de nacionalismo não pode fomentar o mais consequente internacionalismo? Como qualquer normal relação de troca.
Termina o Dr. João Rodrigues o seu poste com uma pergunta de uma mais que muita impertinência intelectual. O facto, ainda assim, é saber tudo quanto se possa acerca dos desvios essenciais, uns segundo um percurso sem destino, em outros casos escolhido o destino e adaptado o conteúdo ao preenchimento de um vazio, etc. Do ponto de vista teórico, a riqueza é muita, até quando para contradizer, o problema actual é que o neofascismo em voga ainda não me parece ter a sua síntese teórica concluída, razão pela qual tudo se vai praticando, como convém ao capital multinacional. Todavia, importa separar claramente duas posições ir remediáveis: aquela que estará sempre aberta ao reconhecimento do outro como extensão de uma verdadeira identidade; e a que vê no outro um rascunho incongruente do que quero - não, não é - parecer ser. É assim o mundo, dois lados, duas posições frontalmente contrárias, cada uma com as suas visões, instrumentos teóricos e disponibilidades práticas. Já há muito, reforçadamente depois da morte de Olof Palme, que coloco todo o tipo de social democratas no quadro da choldra neo, seja isso o inicio do que for. Mas temos olhos.....
"Não se pode é confundir internacionalismo com a neoliberal UE..."
Nem mais. É lembrar isto ao Vitorino ovo kinder, e que também não se pode confundir cosmopolitismo com subjugação à neoliberal UE a troco de uma patacas emprestadas que serão devolvidas com juros (ex: o vergonhoso superávit alemão "solidariamente" conseguido).
Mas deveríamos ser consequentes e fazer a pergunta seguinte que é, muito simplesmente, quais as consequências dos nacionalismos, incluindo dos nacionalismos progressistas. E aí, João Rodrigues, a resposta não é, digamos, muito auspiciosa.
De nada adianta falar dos ideais sem discutir os resultados. E se os resultados são o autoritarismo, a pobreza e a corrupção generalizadas, então a pergunta que fica é mesmo o que distingue o nacionalismo de Esquerda do da Direita. As boas intenções?
Mesmo olhando para trás, indo até à Revolução Francesa, não é difícil perceber que os homens fizeram a guerra de 1789 até aos suicídios coletivos de 1914 e 1939, culminando no aparecimento de estruturas internacionais como a ONU e pois, pois, a CEE.
Como bem diz, os nacionalismos foram a causa dos movimentos de luta contra a dominação colonial (quando os nacionalismos europeus tinham tido uma grande influência no movimento inverso durante o sec. XIX), com o triste resultado de terem na maioria dos casos dado lugar a Países que se tornaram satélites da URSS ou dos EUA e que se afogaram até hoje, na violência, na pobreza generalizada e no autoritarismo.
O Nacionalismo é a Guerra e é todo preto como o Ás de Espadas e não vale a pena dizer o contrário só porque ele se torna de novo popular. Claro, o João Rodrigues será incapaz de reconhecer isto e limita-se a repetir os chavões de sempre...
Quer dizer, segundo Jaime Santos, visto grande parte dos novos países saídos de processos de luta contra o colonialismo terem passado a sofrer as influências da política dos blocos, mais valia terem continuado a ser colónias.
Chama-se a isso atirar fora o bébé com a água do banho.
Por muito difícil que seja a qualquer país, com todas as suas fragilidades, singrar num contexto de atrito de blocos ou da influência de poderes hegemónicos, sempre há-de ser preferível à sua abjecta sujeição a poderes ostensivamente coloniais que mais não cuidam que de os explorar.
E não é demais lembrar os princípios da Conferência de Bandung de 1955 que estiveram na génese do movimento dos não-alinhados.
A violência contra a opressão sempre foi legitimada até pelas ideologias liberais. Está mesmo na sua génese, e ainda bem!
Recomenda-se a leitura dos textos dos pais fundadores dos USA.
Ao afirmar que "O Nacionalismo é a Guerra" Jaime Santos usa o maior dos chavões e ainda por cima, hipocritamente, acusa os outros de "repetir chavões".
S.T.
Jaime, diga aos Indianos, Irlandeses, Americanos e Polacos que deviam ter ficado como estavam, que estavam muito bem.
Ou, sei lá, aos ex-satélites Americanos e Soviéticos que estavam bem era durante a guerra-fria.
Jaime Santos,
1) Qual foi o resultado do nacionalismo Norte-americano?
2) Qual foi o resultado do nacionalismo irlandes?
3) Qual foi o resultado do nacionalismo portugues e espanhol durante a ocupacao francesa?
4) Qual foi o resultado do nacionalismo portugues durante o periodo da uniao de coroas ibericas?
Isto para so mencionar assim de memoria apenas alguns exemplos presumivelmente mais proximos do seu ideario de algibeira.
Que tal estudar um pouco?
O livro recente do João Ferreira, que se afirma, como o seu partido, patriótico e internacionalista, dá um contributo para esta discussão, ao debater a integração europeia e a relação de Portugal com essa integração.
Para o caso do link ter falhado:
http://editorial-avante.pcp.pt/eventos/abrir-caminho-a-uma-outra-europa
Discutir o Nacionalismo, a partir do conteúdo, em 99,9999%, deste artigo do João Rodrigues (JR) é um perfeito exemplo de uma discussão sobre o sexo dos anjos... restam, felizmente para mim, 0,0001% dele (as suas duas últimas frases...), onde ele volta à carga com uma das suas obsessões: UE... sair dela!
Sobre ambos os assuntos, estou à vontade: com 13 anos tornei-me num nacionalista angolano que, tal como muitos dos meus amigos, me ofereci para frequentar um CIR mas que em 27 de Maio de 1977 descobri que não era propriamente um nacionalista mas sim um revolucionário, o que me levou em finais de 1979 a fugir de Angola e a tornar-me, por necessidade, num cidadão português. E é em Portugal, passados poucos anos, que descubro a questão da entrada de Portugal na CEE, contra a qual sempre fui contra.
A verdade é que não só há vários nacionalismos como eles podem ser utilizados, pelos seus manobradores para as finalidades que eles pretendem atingir: os que, por exemplo, nos EUA, em 1939 evocavam o nacionalismo para defender a sua posição isolacionista, apenas sabiam que «A poll taken in 1939, after the outbreak of war, showed 94% as being against going to war». Claro, depois do ataque "imperialista" a Pearl Harbour (vão ao Google Maps e vejam onde fica a sua localização!), os tais 94% desapareceram gradualmente: no final de 1941, não a vasta maioria era a favor de ir para a guerra, como a minoria que insistia que não, eram considerados como traidores. Foi esse nacionalismo que levou a maioria dos estado-unidenses a apoiar, 5 anos depois, a intervenção na Coreia.
JR cita Andreas Wimmer em "Porque é que o nacionalismo funciona e porque é que está para ficar?": «O nacionalismo foi uma das forças que ajudou a derrotar a Alemanha nazi e o Japão imperial.» E Wimmer não deixa de ter razão... seria interessante era saber o que ele pensa sobre a utilização do nacionalismo para, para além da bandeirinha em cada casa do subúrbio, ter levado muitos jovens a alistarem-se para supostamente, prevenirem um "novo Pearl Harbour"?
(continua)
(continuação)
Comparar o nacionalismo anti-colonialista, ou o que levou meio mundo a enfrentar o chamado "Eixo", com o nacionalismo anti-UE, é uma afronta: o JR (e os seus seguidores) até pode(m) delirar que Portugal é uma espécie de colónia o que não pode(m) é querer convencer os portugueses que por, ora votarem PS, ora votarem PSD, são uma espécie de escravos da casa grande que não conseguem ultrapassar a sua condição social e, caso isso até seja verdade, o que ele(s) pretende(m)? Uma ditadura que os esclareça da ignorância da sua posição?
A verdade que ele(s) não querem reconhecer é a verdade que ficou evidente na Grécia: eles, os gregos, não queriam a austeridade mas entre ela e a saída da "Zona Euro" (não, nem era da UE!), eles resolveram apertar o cinto e votar no Tsipras...
Mas tudo bem, consideremos a hipótese JR de saírmos da UE: o que ganhavam os portugueses com isso? Novas políticas económicas? Por quem? Pelo PSD ou pelo PS? Ou será que o JR está esperançado num milagre?
Poderei estar enganado mas a vasta maioria dos portugueses, limita o seu nacionalismo ao apoio à selecção do CR: quando vai de férias, a Paris ou a Praga e até mesmo a Cuba, definitivamente, não quererá estar na bicha dos "outros" e muito menos ter de andar a cambiar escudos por euros - e só JR parece não ter percebido isso (mesmo não deixando de "isso" usufruir!)... é que mesmo que ele junte todos os votos nos "nacionalistas", dos da Esquerda aos da Direita, eles nunca deixarão de ser como os artolas de Charlottesville: os culpados eram os judeus (e, claro, para eles, até havia os "pretos" mas enfim...!), JR até estaria disposto a carregar uma tocha contra a UE!
Gostaria de chamar a vossa atenção para um outro artigo da mesma edição da FP a que o João Rodrigues alude.
É este:
https://www.foreignaffairs.com/articles/world/2019-02-12/why-nationalism-works?
Gostaria também de fazer algumas correcções ao comentário de António Vaz, que se prendem sobretudo com a suposta escolha que o povo grego teria feito de "apertar o cinto e ficar no Euro".
Acontece que as coisas não se passaram assim. Recorde-se que o "Oxi" (Não) ganhou claramente no referendo grego. E a pesar de o referendo não ser específicamente sobre a permanencia ou não no euro, as decisões do governo de Tsipras na altura foram completamente contrárias à vontade popular.
Foi a impreparação de Varoufakis e pode-se mesmo dizer, a traição de Tsipras que mantiveram a Grécia amarrada ao euro. E a maior parte dos analistas é muito clara em considerar que, apesar do caos e das dificuldades iniciais, neste momento a Grécia já teria resolvido a maior parte dos seus problemas. Convém ler os relatos de Varoufakis no seu livro e de Lapavitsas em múltiplas entrevistas para se perceber como os acontecimentos se desenrolaram.
O voto posterior em Tsipras é fácilmente explicado pela falta de alternativas e pelo efeito de desencanto do eleitorado.
Há ainda um artigo de Peter Turchin, em que discute e contesta as teses de um economista que eu também considero interessante: Branko Milanovic.
O interesse do artigo é contestar que a soma dos egoísmos da sociedade capitalista seja um factor de optimização dos resultados globais.
http://evonomics.com/capitalism-cooperation-turchin/
Começa assim:
"One of the chief reasons I became an advocate of the Cultural Multilevel Selection (CMLS) theory is that it wonderfully clarifies the relationship between competition and cooperation.
Competition between groups (up to whole societies) fosters within-group cooperation.
Competition within groups (between their members) destroys cooperation."
Ora isto assenta como uma luva à questão do nacionalismo, em que se observa que é o confronto com o inimigo externo que caldeia e uniformiza internamente as nações.
Há quem diga cínicamente, baseado em pressupostos semelhantes, que a união política da Europa só se faria se a URSS não tivesse caído e o muro de Berlim se tivesse mantido de pé.
Baseado na segunda frase, "Competition within groups (between their members) destroys cooperation." eu afirmo que a EU é um cadáver adiado e que a única forma sob a qual pode sobreviver é a do império neo-colonial porque está estruturada em moldes que maximizam a competição, fiscal, industrial, comercial e política entre os seus membros.
Nessas condições não é possível manter uma base de cooperação que gere sinergias. E sobretudo os seus países mais poderosos praticam políticas agressivamente mercantilistas que matam qualquer possibilidade de acção colectiva.
S.T.
Resposta ao S.T., a propósito do seu comentário de 29 de Março de 2019 às 23:06:
Eu cá sou como o outro: “prognósticos só no final do jogo”! E isto vem a propósito do seu «E a maior parte dos analistas é muito clara em considerar que, apesar do caos e das dificuldades iniciais, neste momento a Grécia já teria resolvido a maior parte dos seus problemas.» (Quais? Quantos? Seria interessante sabê-lo…) e já agora, também a propósito da ida ao “jogo” da dupla Tsipras/Varoufakis que acabaram, mesmo apesar daquela espécie de tentativa de chantagem política, encostados entre a espada do Schäuble e a parede do eleitorado grego que, como eles sabiam – até porque foi isso que eles prometeram – não queriam sequer pensar numa saída da UE e/ou da Zona Euro (https://www.noticiasaominuto.com/mundo/414336/tsipras-garante-que-referendo-se-mantem-e-reitera-apelo-a-voto-no-nao). A jogada do referendo foi de uma ingenuidade que nunca pensei ser possível ver em políticos: a dupla acreditava que, se uma maioria (no caso, os tais 3 558 450/61,3%) de gregos dissessem “Não” ao plano de acordo submetido pela CE, BCE e FMI, haveria alguém na “troika” que eventualmente se comoveria e, quem sabe, em nome da Democracia («O 'não' de hoje é um grande sim à democracia» - Varoufakis, vitorioso), não iria contra a vontade expressa de um povo num referendo democrático… infelizmente para eles, tal não aconteceu e acabou com eles a terem que levar com as ameaças do Schäuble (o “plano de Schäuble” – Varoufakis, derrotado) de que ou assinavam ou saíam. Eram essas as opções de Tsipras… Mas afinal quem é que o Tsipas traiu? Os 1 926 526/35,5% que votaram no traidor passado poucos meses depois da “sua” traição?... que há falta de melhor argumento, para si, fizeram-no porque não tinham outra alternativa (e porque não a tinham? Sempre poderiam ter votado na Unidade Popular… ou até no Partido Comunista…) e por causa do “efeito de desencanto do eleitorado” (os desencantados não votam, meu caro, ou se votam, fazem-no no sentido oposto – Obama Vs Trump, Rousseff Vs Bolsonaro… só para ficar nos mais conhecidos exemplos). Os 110 dos 149 deputados do Syriza que apoiaram o traidor? Sabe quantos gregos votaram na Unidade Popular, o partido dos “traídos pelo Tsipras”? 155 320/2,9% votantes!!! E sim, passaram de 39 deputados para 0…
É evidente que V. pode querer ver as “coisas” à sua maneira… continuar a extrair frases soltas para as adaptar à realidade até porque quem sou eu para o contrariar nessa investida contra moinhos de vento?!?
Enviar um comentário