terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Regresso aos mercados - mais algumas notas

Há uma semana escrevi, a propósito do “regresso aos mercados”, o seguinte: dada a recapitalização da banca portuguesa e o bom negócio que tem sido a compra de dívida pública, “é portanto provável que seja a banca portuguesa a ficar com o grosso da emissão agora anunciada”. Estava errado. O Governo, ao contrário do que é normal, prontificou informação sobre a composição dos agentes financeiros compradores desta emissão, vincando a procura estrangeira.

Partindo da minha errada conjectura das garantias do BCE não serem suficientes para atrair investidores estrangeiros, vale a pena olhar com mais cuidado para o que foi este leilão de dívida portuguesa. Foi prontamente assinalado por alguma imprensa que a procura neste leilão tinha vindo sobretudo de fundos de investimento e “hedge funds”, normalmente associados a apostas mais arriscadas no mercado, por contraponto a fundos de pensões ou a própria banca.

Este artigo do Financial Times, onde o caso português nem sequer entra, sublinha e explica este regresso de capital do exterior para a zona euro, sobretudo para a sua periferia. O artigo aponta o papel do BCE como decisivo para estes novos fluxos financeiros. Nada que já não soubéssemos. O risco de desintegração da zona euro foi, pelo menos no curto prazo, diminuído, sendo o suficiente para, num contexto onde activos financeiros com rentabilidades altas escasseiam, os agentes financeiros com um perfil mais especulativo integrarem dívida dos países periféricos nas suas carteiras de investimento (dívida mais arriscada, mas com maiores taxas de juro). Um investimento com chorudos lucros, como aliás verificámos da experiência da banca portuguesa ao longo do último ano. No entanto, como bem assinala um dos analistas citados pelo FT, este (ainda assim) modesto fluxo de capital, tendo a Europa como destino traduz sobretudo as crenças de curto prazo em mercados financeiros caracterizados pela miopia: “Talvez estejamos ainda a mover-nos em terreno negativo. Isso não interessa. Para os investidores o “momentum” é que importa" (tradução livre).

Aqui chegados, vale a pena voltar à minha conjectura inicial. O BCE pode resolver os problemas de curto prazo de liquidez dos Estados, como este lucrativo "regresso" aos mercados demonstra. Porém, com a actual arquitectura institucional, os problemas de solvabilidade manter-se-ão. Com uma dívida em crescimento, contracção do produto e doses consecutivas de austeridade, o serviço da dívida dos estados será sempre um bloqueio ao crescimento económico da periferia europeia. O caminho para o abismo económico e social continua a ser percorrido.

2 comentários:

Luís disse...

1.Os movimentos transitórios da liquidez ainda não dão de facto para o peditório da solvência. E afinal o ECB está à esquerda ou à direita?
2.Um bom modelo de risco é um bom modelo de risco; pesos e contrapesos, mas afinal quem são os donos do dinheiro?
3.Se: 20% são fundos de cobertra, Quem são os restantes? E porquê o UK e o USA? Que é feito do european core?

4.a.Se Gaspar matou a política com o seu fleuma, este foi um "teste ao mercado" com efeitos políticos de propagação. Outros testes se seguirão no seu básico cardápio: percentagem e quantidades. Economia experimental sobre plataformas digitais com dinheiro (real?) anglo-saxónico.

"Ordens no livro", como lhe chamou a Madame.

Dados:
Entre 1999 e 2009 a yield média a 5anos no mercado secundário para o Título da República foi 3,9%. O valor mais baixo foi 2,15% (Maio de 2005 - é o Ciclo Senhores, é o ciclo). Pronto; aqui têm os referencias. Façam favor de fazer passar.

títulos da dívida 1979 juro médio 29,5% disse...

O valor mais alto foi em 1981 ou em 82?
Chama-se especulativo vender os títulos de 2023 a 80% do valor?
Ou chama-se tanso a quem os compra?
A 5% ao ano durante 10 anos, recuperam-se (1+0,05)elevado
à 10ªpotência é só fazer as contas.
Eu fazia-as mas empenhei a calculadora.