quarta-feira, 21 de abril de 2010

Que futuro para os países da periferia da UE?

Perante a nomeação de Portugal por parte de alguns economistas estrangeiros mais mediáticos como constituindo o “país-problema” que vem a seguir à Grécia, o secretário de Estado do Orçamento terá pedido “aos economistas portugueses para refutarem as avaliações que têm vindo a ser feitas (ver Público). Evidentemente que não haverá desmentidos ou declarações optimistas que nos possam valer.

Quem até agora aceitou a liberdade de circulação dos capitais especulativos não pode vir agora queixar-se dos especuladores. Estes apenas fazem o que deles se espera que façam. Coragem política para submeter a finança a uma estratégia de desenvolvimento nacional é coisa que não tenho visto, quer no Governo quer no Partido Socialista.

Quem até agora aceitou a abertura comercial da UE sem eficazmente defender a nossa frágil indústria exportadora da concorrência de países onde a mão-de-obra vive no limiar da sobrevivência e sem direitos laborais, dando-a em moeda de troca pela abertura dos mercados desses países aos equipamentos industriais alemães, não pode vir agora convencer-nos com um PEC que baseia o crescimento dos próximos anos nas exportações.

Quem até agora aceitou a ideia de que receber (muito) dinheiro da UE e distribuí-lo pelas empresas resolveria o grave problema da baixa qualificação da esmagadora maioria dos empresários portugueses, e da sua persistente recusa em recrutar licenciados, não pode agora esperar por um milagre de competitividade pela inovação que faça dos exportadores a locomotiva do crescimento económico do País.

Quem até agora aceitou a ideia de que com o dinheiro da UE poderíamos tornar-nos competitivos pela inovação comprando equipamento à Alemanha com o dinheiro que ela própria nos dava é responsável pelo beco sem saída em que nos encontramos. Começa a desfazer-se a ilusão de que o desenvolvimento é possível sem um processo de aprendizagem que leva tempo, precisa de ser protegido e requer uma grande convergência estratégica entre o Estado e os empresários. Em vez disso tivemos negociatas e imitação tosca do modelo anglo-saxónico. Na Irlanda e na Islândia a ilusão já acabou. A Grécia vai a caminho. "Os mercados" vão tratar agora de Portugal.

Quem nada faz para construir uma coligação de países que faça frente às políticas recessivas que a UE quer generalizar, mergulhando assim todo o continente europeu numa nova recessão, não pode esperar credibilidade quando diz que Portugal não é comparável à Grécia. Para ser credível deveria, por exemplo, explicar quais são os mercados que estão em condições de substituir as actuais exportações para a UE no imediato.

Os governos da Grécia, Espanha e Portugal dizem-se socialistas. Serão eles que vão administrar a prescrição do FMI às respectivas classes médias, e mesmo aos seus pobres. E sem qualquer vantagem porque as regras da Eurozona continuarão inalteradas e não permitirão a execução de qualquer estratégia de desenvolvimento. Nestas condições, os países menos desenvolvidos da UE vão cristalizar a sua condição de periferia, à semelhança dos estados mais pobres dos EUA.

Não seria mais vantajoso para estes países organizarem-se e apresentar à Alemanha uma proposta de saída do euro, em bloco e na mesma data? Só o facto de o fazerem obrigaria a Alemanha a pensar duas vezes se seria do seu interesse manter a actual arquitectura do euro. É que não faltam ideias sobre o que deve ser mudado. Em vez de ridiculamente apelarem aos economistas portugueses para darem uma boa imagem do País, mais lhes valia lerem o Financial Times.

4 comentários:

Patrick disse...

Daqui do Brasil a impressão que temos é que Portugal, Espanha e Grécia estão na mesma situação da Argentina em 2001: presos pela armadilha da ausência de autonomia monetária. A Argentina conseguiu se livrar dessa amarra. Mas, pelo que vejo, parece que na Europa o exemplo a ser seguido é o da Letônia, cuja população está pagando um preço muito elevado em troca de participar da zona do Euro.

Nuno disse...

Os ladrões bem avisaram para o que vinha por aí.O que dantes pareciam teorias de economistas pessimistas(sem ofensa)está agora a concretizar-se todos os dias.Até já nos chamam os Pig´s,já nos ameaçam de expulsão da zona Euro!Mas afinal onde está a Europa solidária que tantos nos prometeram?

Nuno disse...

E só para acrescentar,ainda me lembro do debate na Sic do JR com o Pina Moura e o Braga de Macedo e o cenário côr de rosa que esses 2 economistam fizeram da zona Euro.Enfim...

João Aleluia disse...

1."... não pode vir agora convencer-nos com um PEC que baseia o crescimento dos próximos anos nas exportações."

O PEC não convence ninguém, não é facto um PEC de crescimento, mas também não é um PEC de austeridade, nem sequer de estabilidade. A não ser que por estabilidade se entenda não fazer nada.

2."Quem nada faz para construir uma coligação de países que faça frente às políticas recessivas que a UE quer generalizar, mergulhando assim todo o continente europeu numa nova recessão"

O continente Europeu vai mergulhar numa recessão brutal, isso é inevitável, e deve-se não só a perda de competitividade das maior parte das economias europeias, mas também, e sobretudo, aos baixissimos niveis de poupança e elevadissimos niveis de endividamento da maior parte dos paises. Muitos paises europeus, dos quais Portugal é um bom exemplo, andaram durante decadas a gastar muitissimo mais do que a riqueza que produzem, e isto levou a uma falsa e insustentavel melhoria das condições de vida. É portanto inevitavel que ao sermos obrigados a voltar a ter padrões de consumo de acordo com as nossas possibilidades que haja uma recessão. Mas esta recessão será tanto maior quanto mais tempo se prolongar o consumo insustentavel.
Concluindo, uma politica que gera uma recessão não é neste caso algo de mau, uma vez que a recessão em causa é inevitavel, e procurar adia-la só a tornará mais grave.

3. Não haverá crescimento economico em Portugal nos proximos anos, nem nas proximas decadas, que suportem os stocks actuais de divida e ritmo crescente de endividamento. Para mais, a actual situação de endividamente até dificulta o pouco crescimento economico que venha a existir, uma vez que canaliza somas absurdas para serviço da divida, que deste modo não podem ser utilizadas na melhoria dos serviços publicos, na redução dos custos de transação e em eventuais politicas industriais.

4. "Não seria mais vantajoso para estes países organizarem-se e apresentar à Alemanha uma proposta de saída do euro, em bloco e na mesma data?"

Ena, isto seria divertido de assistir. Em primeiro lugar os alemães sabem que ajudar os PIIGS apenas significa adiar o problema, os alemães poderão acabar por dar alguma ajuda á Grecia mas apenas porque fica bem na fotografia, pois sabem que não resolverão problema nenhum, uma vez que a Grecia continuara a gastar muito acima das suas possibilidades. Em segundo lugar, uma vez que sabem isto, perante uma ameaça destas, os alemães diriam (e com todo o apoio da sua opinião publica) "então meus caros, saiam do euro". Consequentemente, os PIIGS tinham duas opções, ou saíam de facto do euro e faziam os seus povos pagar o preço brutal da hyper-inflação, ou então não saíam e perdiam o resto da pouca credibilidade que já têm.
O preço para a Alemanha de ajudar sustentadamente todos os PIIGS é vastamente superior a deixá-los sair do euro, portanto para a Alemanha é sempre uma estratégia dominante deixar sair os PIIGS do euro, e só não pressionam mais para isso porque não querem parecer os maus da fita e estão convencidos de que os PIIGS, mais tarde ou mais cedo, saírão pelo seu próprio pé.