Há algum tempo que ando a dizer que os discursos optimistas sobre a economia portuguesa têm como prazo de validade o dia das eleições. As notícias recentes sobre as contas públicas e sobre as contas externas permitem perceber bem do que estou a falar.
Ontem ficámos a saber que o défice orçamental em Julho atingiu 4,7% do PIB. Hoje ficámos a saber que Portugal regressou aos défices externos no segundo trimestre de 2015. Nada disto é inesperado nem (na minha perspectiva) completamente negativo.
Em termos simples, a explicação para a evolução registada é esta: o governo resolveu aligeirar a austeridade no início deste ano (e nós sabemos porquê), o que se reflectiu num aumento do défice orçamental e do consumo privado. Por sua vez, o aumento do consumo fez com que as importações crescessem, deteriorando assim o saldo das contas externas.
O motivo pelo qual afirmo que esta evolução não é completamente negativa é que só será possível a economia portuguesa crescer o suficiente para criar emprego em condições nos próximos anos se a pocura interna crescer (é o que tento mostrar no cap. 4 de "O Que Fazer Com Este País"). Para que tal aconteça temos de estar dispostos a aceitar défices públicos e externos maiores do que o actualmente previsto.
Agora vêm as más notícias: mesmo que um aumento dos défices público e externo face ao que está previsto não seja um problema para a economia portuguesa (pelo contrário), são exactamente aquilo que as instituições europeias e o FMI não querem para Portugal. Ora, qualquer um dos partidos que se perfila para governar o país nos próximos tempos mostra muito pouca vontade para pôr em causa o que a tutela externa nos diz para fazer.
Em resumo: com grande probabilidade, a seguir às eleições teremos uma nova vaga de austeridade orçamental e de contenção dos salários, com consequências negativas para o crescimento da economia e do emprego.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
3 comentários:
Mas esse crescimento não é sustentável, isso já foi visto.
É o modelo da década passada que apenas conseguiu acumular défices externos.
O que isto demonstra é que é impossível o país crescer sustentavelmente na zona euro.
É óbvio que o PS vai aplicar austeridade e é óbvio que o PS vai fazer parecido ao que tem feito o PSD. Pensem bem na triste sina dos portugueses, ora são enganados por uns ora são enganados pelos outros. Quem vota nestes partidos é a favor da austeridade e por consequência conivente com a injustiça que ela implica, escusado será dizer que quem vota nestes partidos é obviamente contra a democracia que como é óbvio não existe numa sociedade desigual.
"Em resumo: com grande probabilidade, a seguir às eleições teremos uma nova vaga de austeridade orçamental e de contenção dos salários"
Não é com grande probabilidade: é de certeza. No entanto acho que nestas eleições essa certeza já foi incorporada nas preferências dos eleitores, isto é, já ninguém acredita que não vá ser assim independentemente das promessas. E talvez isso explique o porquê da dificuldade do PS em cativar votos: ninguém gosta de austeridade, muitos julgam-na inevitável, e apesar de tudo a Coligação parece 'enganar menos' neste aspecto.
Enviar um comentário