Público, 7/3/2013 |
Foi há dez anos. O então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho era intimado pelo líder do PS, António José Seguro a fazer subir o salário mínimo nacional (SMN).
"O senhor não quer mudar porque está politicamente teimoso e está enfeudado numa política que nos está a levar para o empobrecimento e para o desastre, mas o senhor está cada vez mais sozinho e mais isolado em Portugal". E lembrou que o PM nem uma política tinha trazido para combater o desemprego.
Na verdade, Passos Coelho já tinha perdido todos os seus trunfos.
Como delineara um diagnóstico errado da situação do país - "torna-se (...) obrigatório o regresso, tão breve quanto possível, a uma trajectória sustentável das contas públicas que dê lastro a uma economia próspera e criadora de emprego a médio prazo" (Programa do XIX Governo) - as políticas traçadas foram desadequadas.
Primeiro, foi uma política de austeridade no Estado, como forma de libertar recursos para o sector privado. Na verdade, a política traduziu-se numa rarefacção dos incentivos ao investimento e consumo. Em segundo lugar, alterou-se a política laboral, forçando os salários a descer. Na verdade, apenas se gerou uma política para a expansão do desemprego e para a contenção dos salários médios (contribuindo a prazo para que se aproximassem do SMN). As contas externas foram equilibradas apenas à custa da asfixia da economia e não da competitividade empresarial (como hoje se nota). Depois, foi a política de desvalorização fiscal - reduzir contribuições patronais para a Segurança Social para libertar recursos para as empresas. Na verdade, tornou-se impossível porque era demasiado cara para ser compensada por receitas de IVA. Em quarto, tentou-se que os trabalhadores sofressem um corte dos salários nominais disponíveis como forma de financiar as empresas. Na verdade, o Governo foi forçado a recuar pelas maciças manifestações de rua.
E no entretanto, a economia entrara em recessão, o desemprego explodira, atingindo níveis nunca vistos, e forçou-se dezenas de milhares de trabalhadores cujas vidas ficaram sem prespectivas, a uma emigração igualmente histórica. Muitos já não pensam em regressar.
E nessa mesma sessão parlamentar, quando confrontado com a ideia de aumentar o SMN, Passos Coelho defendeu... o contrário: cortá-lo!
"A Irlanda fez o oposto, cortou 10%. Nós rejeitamos essa possibilidade, não tínhamos condições para isso. Mas aumentá-lo geraria mais desemprego", sustentou.
Nas eleições legislativas de 2015, Passos Coelho não conseguiu formar Governo e o Governo PS com apoio à esquerda no Parlamento fixou uma trajectória de subida do SMN ao longo da legislatura que, com a reversão das medidas de austeridade, impulsionou a economia a respirar de novo. Consumo e investimento regressaram. Mas os problemas de fundo mentiveram-se
Passados dez anos, é perigosamente estranho ver como novos políticos com velhas ideias (agora partilhadas pela extrema-direita) têm tanta saída junto da comunicação social, que já se esqueceu do passado. Prepara-se o regresso da direita (neo)liberal do poder, com políticas muito semelhantes. Até se promove Passos Coelho (com a cumplicidade de Marcelo Rebelo de Sousa).
Errar é humano; insistir no erro parece ser... jornalismo político. O problema é que será à custa da vida de milhões de pessoas.
Público, 7/3/2013 |
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