Público, 18/3/2013 |
Há dez anos, numa altura em que o BES começava a vender as suas obrigações com um perfil nitidamente ilegal, o ministro da Economia do Governo Passos, Coelho Álvaro Santos Pereira, - hoje o economista-chefe da OCDE que defende soluções sociopatas para fazer baixar a inflação - reuniu um grupo de "sábios" para repensar a reindustralização do país.
O grupo, pelas suas opiniões, já era desequilibrado. E o jornalista Manuel Carvalho, presentemente director do jornal Público, ainda o desequilibrou mais ao procurar o comentário de um economista que ... até fez parte do Governo de Passos Coelho, como secretário de Estado adjunto dos responsáveis da Administração Interna, juntamente com Juvenal Silva Peneda e os militantes do CDS Filipe Lobo d'Ávila e João Almeida. Dizia ele:
“Essa ideia da reindustrialização causa-me alguma preocupação”, diz Fernando Alexandre, professor da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho. “É um discurso errado, como é errado o discurso sobre o regresso à agricultura”, porque na maior parte dos casos dos bens produzidos e transaccionados “o valor acrescentado está nos serviços que incorporam e não na sua produção e montagem”. Veja-se um par de sapatos. “O que é, de facto, mais valioso? A parte do fabrico ou o design que incorpora?”.“Em vez de falarmos da reindustrialização, é importante apostar em todos os bens transaccionáveis, sejam eles serviços ou produtos transformados”. Seja a venda de serviços de saúde ou sapatos, o que interessa é criar produtos capazes de gerar valor para a economia”.
Dita assim, a ideia pode - à primeira vista - fazer sentido. Mas pode ser arriscada, como pode ser perigosa a inércia. Porque nem todas as actividades têm o mesmo poder de arrasto ou de criação de valor. E depois porque o essencial será conseguir pensar que papel pode Portugal desempenhar na divisão internacional de trabalho ou, como agora se diz, nas cadeias de criação de valor a nível internacional. E essa tarefa é algo que não pode ser deixada apenas - nem sobretudo - aos agentes económicos. Este tipo de discurso - que se articula com a ideia de que devemos afastar qualquer tipo de planificação a nível central, que devemos esvaziar todas as estruturas públicas de pensamento estratégico (como o fez Cavaco Silva na década de 80/90) - acabou por ser responsável pelo facto de Portugal ter perdido décadas sobre o que poderia fazer e se encontrar numa situação em que está numa situação muito frágil, superdependente das importações de bens e da "exportação" da actividade turística e de acolhimento de estrangeiros, a quem concede benefícios - nomeadamente fiscais - que não se dá aos nacionais, contribuindo para desigualdades sociais no país.
Veja-se o discurso que os "sábios" tinham há dez anos e, por momentos, fechem os olhos e pensem se não é algo que poderia ser dito hoje. E imagine então o que será dito... daqui a dez anos!
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