sexta-feira, 17 de abril de 2020

Não há desculpas


Resumo o núcleo central de convicções a isto: as pessoas fazem o que melhor de que são capazes nas circunstâncias que são as suas, sendo que a acção colectiva, que acaba por se cristalizar em instituições, deve desenvolver potencialidades e humanizar circunstâncias.

Há uma tradição humanista na economia política que bem pode ir, por exemplo, de Smith, passando por Marx, até Sen. A teoria bem prática das potencialidades de Sen é filha do conhecimento da história e da melhor economia política.

Aos 86 anos, Amartya Sen escreveu um artigo para o Financial Times. Nele relembra, não por acaso, o Reino Unido na Segunda Guerra Mundial, caso de resto analisado em vários dos seus trabalhos:

“Houve uma redução severa da incidência de subnutrição no país nos anos difíceis de dificuldades de abastecimento durante a Segunda Guerra Mundial. Confrontado com uma redução da disponibilidade alimentar, organizou-se uma partilha de comida, através de racionamento e de apoios sociais. Os subnutridos foram muito mais bem alimentados do que no passado. E o mesmo aconteceu com o acesso melhor partilhado à saúde.

Os resultados foram extraordinários. Durante a década de quarenta a esperança média de vida em Inglaterra e no País de Gales subiu 6,5 anos para os homens, comparando com 1,2 na década precedente, e para as mulheres subiu 7 anos, excedendo em muito os 1,5 anos da década anterior. As lições positivas de prosseguir a igualdade e de prestar mais atenção aos desfavorecidos ajudaram no que ficou conhecido por Estado Providência.” [minha tradução]

O Estado Providência é realmente filho de uma ideia de sacrifício e de segurança comuns, socializados, de uma ideia de igual liberdade positiva, de cuidado e de comunidade, como tem assinalado o Nuno Serra.

A dívida pública maciça herdada da guerra não foi desculpa para nada, como nos indica a melhor história económica. Esta dívida gere-se e reduz-se com adequados instrumentos de política económica. Havia uma dívida maior por pagar a um povo que lutou contra o nazi-fascismo. Uma sociedade civilizada assenta de resto na reciprocidade bem institucionalizada.

Haja esperança, ou seja, acção colectiva, porque não há razões económicas para não se remover a injustiça social.

11 comentários:

Jose disse...

A geringonça e o mecânico.
Esta questão da solidariedade sempre coloca uma questão: solidário em quê?

- Os exemplos apelativos são as necessidades básicas: beber, comer, abrigo, assistência na doença. Neste patamar são símbolos a sopa dos pobres, asilos, obras sociais, misericórdias.
- A riqueza da comunidade expressa-se nos apoios à família, bairro social,hospital público.
- O passo seguinte já envolve o discurso dos direitos e do princípio da igualdade
Aqui a acção da solidariedade da comunidade esbate-se em impostos e em todo o 'já agora' que entroniza a 'doutrina dos coitadinhos'.

É deste último patamar (verbal e não só) que vamos partir para uma grave e provavelmente prolongada crise, que a todos atingirá.
Promover a solidariedade comunitária requer que a 'doutrina dos coitadinhos' perca a histeria militante que nos tem sido servida.

Ml disse...

O que é que o jose disse?

Jose disse...

«A geringonça e o mecânico» veio aqui parar por um qualquer acidente de copy/paste!

PauloRodrigues disse...

A liberdade de insultar.
As elites pagam as dois gajos (ou talvez seja só um, com dois perfis) para denegrir tudo o que aqui é dito.

PauloRodrigues disse...

A liberdade de passar fome.
A liberdade de ser oprimido.
A liberdade de dormir e morrer na rua.

Jose disse...

«A liberdade de dormir e morrer na rua.»

Eis uma liberdade que vem sendo conferida a milhares de 'sem-abrigo' ao longo dos anos.
O PR fez ampla propaganda da sua missão de promover o seu fim; mas a liberdade persiste, ora transformada em direito, ora transformada em falta de meios, pela maior parte ignorada por quem passa, por quem fala, por quem escreve ser solidário.
E é a solidariedade da 'sopa dos pobres' que assume em permanência a missão de ajudar essa gente.

Óscar Pereira disse...

Caro Jose,

«Aqui a acção da solidariedade da comunidade esbate-se em impostos e em todo o 'já agora' que entroniza a 'doutrina dos coitadinhos'.»

Tradução: redistribuir umas migalhas, para evitar a pobreza mais abjecta, sim senhor. Mas tudo o que seja a mais do que isso,mesmo que ainda insuficiente para um mínimo de dignidade, já não pode ser, porque senão cria-se uma classe de "subsídio-dependentes" vulgo "coitadinhos", e isso já não é bom para ninguém! (E ainda por cima são precisos mais impostos para financiar isso!)

De tanto erro contido nesta passagem, assinalo apenas este: alguma vez reparou que os países onde há menos "coitadinhos", são precisamente aqueles em que se redistribui mais? (Ie têm estados sociais mais generosos) Coincidência... ou talvez não!

Jaime Santos disse...

Bem escrito. Só não se pode exigir que uma estratégia para combater as desigualdades passe por ficarmos todos mais pobres. A Venezuela antes de Chavéz era um País corrupto e desigual, hoje é um País corrupto e falido em que 80% da população está reduzida à pobreza.

Sermos todos iguais na pobreza não me parece nada tentador...

Melhor é como aquele caso, logo após o 25 de Abril, quando uns convidados, perante o conforto da casa do seu anfitrião lhe perguntaram 'Com que então Socialista?' e ele muito naturalmente lhes respondeu 'Nunca defendi o Socialismo de Miséria...'

E também não faz sentido comparar épocas da História distintas. A luta contra a doença não é nenhuma Guerra, muito embora exija do Estado e dos cidadãos uma capacidade de organização que se assemelha à da de períodos de Guerra. O discurso guerreiro pode ser necessário para apelar ao sentido de sacrifício, mas a prazo revela-se tão contraproducente como o Estado de Emergência.

O combate à pandemia tem corrido genericamente bem, mas há muitas questões que poderão e deverão ser colocadas, até para que o País esteja melhor preparado se e quando a próxima onda chegar.

Por último, quando fala em alívio de dívida, o João Rodrigues esquece-se que o Reino Unido foi dos Países que mais beneficiou com o Plano Marshall, sendo que os EUA lhe permitiram igualmente uma reestruturação significativa da sua dívida para com eles. Ou seja, o alívio de dívida, a acontecer, terá sempre que ser negociado com os credores e implicará certamente condições da parte deles.

O que é requerido neste caso é uma capacidade negocial adicional por parte das partes envolvidas, não uma qualquer atitude 'va t'en Guerre' que não traria mais do que a nossa miséria colectiva...

Jose disse...

Caro Óscar

A 'doutrina dos coitadinhos' é sustentada por um bando de tradutores da realidade que fazem o que é comum em tradutores - pervertem a realidade.
Uma suspeita, que traduz uma realidade omnipresente, é a de que o que se transfere de cima para baixo funciona como um elevador em proveito dos que não estão nos extremos, e esse é o estímulo à 'solidariedade' dessa grande massa que ambiciona sempre mais invocando os coitadinhos.
Num comentário (não publicado à hora que escrevo) o caso dos sem-abrigo deverá ajudá-lo a compreender o que digo.

João Pimentel Ferreira disse...

Em relação ao conteúdo do texto, não há nenhum liberal europeu que não defenda que o estado deva apoiar as pessoas extremamente carenciadas. Sim, devem ser apoiadas confiscando os rendimentos de quem mais tem. Daí a ser o estado o único prestador de serviços de educação ou saúde, vai um grande passo.

Anónimo disse...

pobre Jose pidesco
ainda andas a infestar este sítio com o teu hálito fétido ?
se não gostas porque andas aqui há anos ?
apanha lá o vírus que como essa carcaça já deve estar podre fica menos um que só sabe dar fel ao mundo