Várias grandes empresas como a Ikea ou a Autoeuropa comunicaram que vão requerer o lay-off, mas que os seus trabalhadores vão continuar a receber os seus salários base por inteiro.
Essa decisão, de alguma forma, atenua o esforço da Segurança Social (neste caso do Covid19, será um esforço do Estado) e reparte os custos. Mas apesar disso, as empresas continuam a beneficiar de uma redução significativa dos custos salariais.
Vamos ver um caso concreto, com um trabalhador que recebe 1000 euros brutos. E vamos comparar essa situação (ANTES), com as duas situações de Lay-off: uma em que a empresa não repõe a totalidade do salário (lay-off) e outra em que repõe (lay-off simpático). Veja-se o quadro acima:
LAY-OFF SIMPÁTICO
Agora vejamos a última situação. Neste caso, a empresa compromete-se a não baixar o salário do trabalhador. Ou seja, tem recursos suficientes para cobrir a perda salarial resultante do lay-off. Assim, o trabalhador recebe os mesmos 1000 euros, continua a fazer os descontos sobre esse montante e a empresa continua isenta de descontos sociais. O trabalhador não perde salário líquido. Mas como a Segurança Social continua a pagar os 70% dos 66% do salário, a empresa tem uma redução dessa parte do custo salarial. Ou seja, feitas as contas, a empresa vê esses custos salariais reduzidos em 57%. Já a Segurança Social, como mantém essa comparticipação no pagamento do salário do trabalhador, perde a parte das contribuições da empresa e passa a ter custos. Passa a ter um saldo negativo de 352 euros por trabalhador e, face ao ANTES, um rombo de 699,50 euros.
Dir-se-á: o Lay-off simpático é bem mais simpático para todos do que o lay-off puro e duro. Sim, é verdade. Mas é muito provável que essa empresa estivesse em condições de absorver esse custo que, na realidade, foi passado para o Estado. Sobre a AutoEuropa ler aqui. Trata-se de um julgamento do que deve ser o papel social das empresas e do Estado.
E para quem estará já a afiar o argumento de que, nos bons momentos, as empresas comparticipam já sobejamente (fruto da tal carga fiscal) para poder beneficiar do Estado nos maus momentos, relembra-se que há muito para discutir sobre isso: seja em termos de definição do que é a matéria colectável das empresas - que não é nada comparável aos lucros tributáveis -, como da libertadade concedidas às empresas para reduzir a sua tributação efectiva, ao poderem escolher a zona de tributação mais reduzida (vulgo paraíso fiscal), quando não os fazem sair ilegalmente.
Estarão dispostos a fazer um Excel como este?
2 comentários:
Sim, as empresas utilizam a flexibilidade fiscal, como lhe chamou o João Rodrigues, para pagarem menos impostos. Mas isso é uma questão distinta, até porque a engenharia fiscal só é provavelmente acessível a empresas de grande dimensão e o regime do lay-off é (e deve ser) universal.
O acesso ao lay-off implica que as empresas tenham tido uma baixa significativa na sua actividade durante o período da Covid-19. O que significa que o Estado efectivamente injecta liquidez nas empresas e que o faz porque elas são geradoras de emprego.
Isto é exactamente como a questão do salvamento da banca. Não se salva a banca porque gostamos dos banqueiros e sim porque estes têm a custódia do nosso dinheiro. Há dinheiro para a banca porque de outro modo não haveria dinheiro para nada, como verificaram à custa da economia mundial o Sr. Bush e Cia quando decidiram deixar falir o Lehmann Brothers.
Tome-se outro exemplo. A crise das dívidas soberanas nunca teria atingido a dimensão que atingiu se a Sra Merkel e o Sr. Sarkozy tivessem decidido inundar a Grécia de dinheiro. Era beneficiar o infractor? Pois era, o governo da Nova Democracia usou os bons ofícios da Goldmann Sachs para cozinhar os livros.
Fazer-se julgamentos morais em situações em que o menor custo para todos é obtido por benefício do infractor é francamente míope.
É exactamente aquilo que o lay-off faz neste momento. Provavelmente beneficia algumas empresas (sobretudo as maiores) que poderiam arcar com os custos da manutenção do contrato de trabalho dos seus funcionários. E depois? Protege o emprego e isso é que importa...
Se as empresas falirem (sobretudo as grandes), o Estado perde as receitas dos seus impostos, perde as contribuições para a SS de patrões e empregados e ainda tem que desembolsar o subsídio de desemprego. Gasta-se dinheiro agora para não se ter que gastar depois. Uma espécie de coma induzido da actividade económica...
Parece-me pois que é um no-brainer...
Mau caro Jaime,
Tanta palavra para justificar que empresas com músculo financeiro se declarem em crise - porque é disso que se trata no decreto-lei do lay-off - para receber umas massas do Estado. Não parece bem, nem a neoliberal. Mas pronto.
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