quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Desigualdades salariais

«E o que nos dizem a isto os defensores do status quo? Que os gestores, para serem de qualidade, têm de ser bem pagos. E que os gestores portugueses têm de ser bem pagos porque a qualidade não abunda. Sim, é contraditório. Sim, é circular. A conclusão é que os gestores portugueses têm de ser bem pagos porque sim (. . .) Na Alemanha, o governo conservador de Angela Merkel fala em intervir para tabelar os salários dos gestores. Mas em Portugal é melhor nem nos interrogarmos: é insólito». Rui Tavares. O insólito é, em parte, o resultado do domínio de uma opinião medíocre fascinada com o poder do dinheiro: «Temos às vezes a impressão errada de que a maioria da opinião publicada em Portugal é conservadora. Infelizmente, é pior do que isso: limita-se a ser uma reacção instintiva de protecção do status quo».

10 comentários:

Pedro Sá disse...

Tabelar qualquer salário que não o mínimo é uma monstruosidade.

Pedro Sá disse...

Aliás. Presumo que seria inconstitucional por violação da liberdade de empresa.

Nuno disse...

O Pedro Sá demonstra uma opinião! E já agora posso lhe perguntar pq o salário minimo constitui excepção?
Eu acho q pode ser no interesse dos accionistas e restantes stakeholders limitar salários de gestores/administradores, como aliás se viu no caso do BCP (onde os administradores recebiam 3 vezes mais que os seus correspondentes no BPI).
Aliás as gdes empresas têm tabelas salariais para todas as funções. Bastava alargar estas tabelas aos administradores! Não entendo onde está a monstruosidade! A monstruosidade existe agora com o actual status quo q provoca a erosão da classe média! É a minha opinião!

João Rodrigues disse...

Monstruosa é a situação actual Pedro Sá. Vejo que ainda não percebeu que a «liberdade da empresa» é definida pelo Estado e depende dos valores prevalecentes na comunidade. Sempre.

Diogo disse...

A opinião publicada em Portugal é paga. É necessário dizer mais?

João Dias disse...

Acho curioso, ver "teóricos" a falar da falta de produtividade dos portugueses, e que esse será o grande problema estrutural para o não desenvolvimento do país e para os baixos salários.
Ora se os gestores/administradores ganham em média 32 vezes mais que os seus dependentes mais mal pagos, então estou convicto de poder afirmar que são 32 vezes mais produtivos (ironia).

Dando uma vista de olhos pela constituição (relembre-se que a constituição original é de 76 e por isso pode ainda ter alguns traços perigosos de socialismo) encontro artigos que vão no sentido contrário ao que o Pedro Sá disse:


Artigo 80º

A organização económico-social assenta nos seguintes princípios:

a) Subordinação do poder económico ao poder político democrático;

Artigo 81º

Incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social:

a) Promover o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas, no quadro de uma estratégia de desenvolvimento sustentável;

b) Promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal;

(...)

j) Criar os instrumentos jurídicos e técnicos necessários ao planeamento democrático do desenvolvimento económico e social;


Se repararmos na alínea b e j do artigo 81º, temos até excelentes pressupostos para intervir no mercado no sentido de criar tectos ou rácios aceitáveis. Repare-se que se fala em "operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento" e "planeamento democrático
do desenvolvimento económico", ora não há nada menos democrático do que os rácios salariais apresentados e ter orgãos não sujeitos a qualquer escrutínio democrático a deliberar rendimentos miseráveis...para os outros.

Pedro Sá disse...

Tais comentários só confirmam o que digo:

1. A existência do salário mínimo nacional está constitucionalmente consagrada (art. 59º/2 a)). Logo, não afecta a liberdade de empresa também ela constitucionalmente consagrada.

2. Se os accionistas fixam ou não salários é lá com eles. Nós é que não temos nada a ver com isso.

3. Dizer que a liberdade de empresa é definida pelo Estado e depende dos valores prevalecentes na comunidade é ser ainda mais positivista do que eu. Coisa que não julgava possível.
Mas a liberdade de empresa é uma liberdade negativa. Pelo que apenas poderia em qualquer circunstância ser limitada, e de forma proporcional, por previsões constitucionais.

4. As alíneas b) e j) do art. 81º da Constituição em nada invalidam o que digo:

a) antes de mais a alínea b) deveria ser alterada para algo como "promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e garantir a progressividade do sistema fiscal". Porque considerar que é mau existirem desigualdades na distribuição da riqueza é mesquinhice, é inveja. O que é negativo é que da distribuição de rendimentos decorra a impossibilidade do exercício de direitos. Isso sim.

b) Consequente nesse sentido seria defender um novo escalão de IRS. Não limitar os salários, o que aliás seria uma medida muito pouco justa, que teria como consequência desvalorizar o trabalho prestado por conta de outrem e o aumento dos dividendos dos detentores do capital - isso não seria justo nem admissível à luz de qualquer visão que se considere de esquerda.

c) O planeamento democrático do desenvolvimento económico do país não tem rigorosamente nada a ver com montantes salariais. Mas esse preceito deveria ser pura e simplesmente eliminado, porque o desenvolvimento económico não depende do Estado. Logo, tal alínea é logicamente absurda.

Nuno disse...

"Porque considerar que é mau existirem desigualdades na distribuição da riqueza é mesquinhice, é inveja."

Lamento, mas é uma constatação de um facto. Eu posso é constatar este facto por ter inveja, concedo! Mas decerto tb concederá que não é essa a motivação do PR!

Se vivessemos todos bem, se existisse uma classe média representativa e grande (qt maior e mais representativa for, maior a qualidade de vida dos países, veja-se os nórdicos por ex. e o Brasil por oposição) haver quem ganhe muito mais do que o que produz não me choca!
Choca-me pq as empresas portuguesas não são competitivas e os seus gestores não se inibem de ganhar ao nivel europeu, ao nivel das empresas competitivas!
Choca-me tb haver pessoas achar q se trata de inveja! Acho que isso é querer tapar o sol com a peneira, mantendo o status quo!

João Dias disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
João Dias disse...

Pedro Sá:

a)
Sejamos claros, falamos da constituição vigente, não sobre uma qualquer que o Pedro acharia mais conveniente. A constitucionalidade ou inscontitucionalidade de algo avalia-se pela constituição vigente, e essa claramente não inibe a intervenção estatal ao nível dos rendimentos, para essa intervenção ser inconstitucional tinha isso mesmo de estar expresso de forma mais directa ou indirecta...mas não está. Constituição exemplifica as medidas fiscais como mecanismo de combate à desigualdade, no entanto não limita a intervenção do Estado a esse capítulo.

" Porque considerar que é mau existirem desigualdades na distribuição da riqueza é mesquinhice, é inveja."

Esse tipo de argumentação não enaltece nada o debate, sejamos sérios, porque combater a desigualdade é exigir direitos para todos, logo revela-se um exercício de cidadania e altruismo salutar, o que é antagónico da inveja mencionada.

b)
Balizar os ordenados não penaliza o trabalho, balizar os ordenados serve em concreto para que o trabalho de alguns não seja demasiadamente desvalorizado em relação a outros.
Se intervimos para que um gestor não ganhe em média 32 vezes mais que os seus dependentes, não o estamos a fazer para penalizar o gestor, fazemos isso porque o facto de este ganhar 32 vezes mais está directamente relacionado com o facto de outros ganharem 32 vezes menos, que isso fique bem claro. O dinheiro é finito, logo é lógico que o que é auferido por uns influencie o que é auferido por outros, isto é óbvio mas às vezes até parece não ser.

Os detentores de capital não assalariados (e só se pode estar a referir a estes quando diz que a intervenção sobre salários os beneficia) não podem ser justificação para manter desigualdades gritantes entre assalariados. Se vivem da especulação, do crime fiscal, do "capital" etc (só assim podem ser assalariados), isso requer outro tipo de intervenção, e essa intervenção será mais eficaz quando se acabar com o sigilo bancário, mas não aniquila a necessidade de criar justiça entre assalariados através de intervenção nos salários.

b)
As empresas pagam impostos (ao Estado), as empresas têm benefícios fiscais (dadas pelo Estado), as empresas tem assalariados formados (na sua maioria pelo Estado), as relações laborais estão, deficientemente, reguladas (pelo Estado), as empresas privadas realizam obras públicas (concedidas pelo Estado)...e você quer me dizer que o desenvolvimento económico não depende do Estado. Isso não é ideologia, isso é estar totalmente desfasado da realidade. Uma coisa é você achar que o Estado não devia estar envolvido no desenvolvimento económico, outro é afirmar que não está, aí não há discussão possível, está mesmo envolvido quer se goste ou não goste.