domingo, 1 de março de 2020

Sopravvive


Ao saber que foram três investigadoras, precárias e relativamente mal remuneradas num hospital universitário público de Milão,  a isolar a estirpe de coronavírus em Itália, lembrei-me, vá-se lá perceber porquê, de uma hipótese antiga, desenvolvida por Thorstein Veblen no ano em que começou a Primeira Guerra Mundial: o instinto do trabalho bem feito, ao serviço dos outros, sobrevive, apesar de muito militar institucionalmente contra a sua transformação num hábito mais generalizado, apesar de quase tudo promover no capitalismo, pelo contrário, a activação do instinto predador. E que só esta sobrevivência e a sua generalização institucional nos podem resgatar da barbárie.

6 comentários:

Geringonço disse...

Mas como é possível a generalização da cooperação no sistema capitalista?

Democratizou-se (assim-assim...) o Estado, não se democratizaram as empresas...

Entretanto, as ditas "elites", os ditos "sociais democratas", os ditos "socialistas" criaram a União Europeia/ Euro para tornar permanente a transferência de riqueza/ poder da base para o topo como para neutralizar qualquer manifestação da democracia popular...

Para os Europeístas parece mesmo não haver alternativa à barbárie!

Jaime Santos disse...

O João Rodrigues até tem razão, mas deixe-me contar-lhe a história de um jovem seminarista que no ano de 1957 ou 58, não sei bem, contraiu a gripe asiática e posteriormente uma tuberculose das glândulas linfáticas. Foi tratado em Lisboa, sobreviveu, acabou os estudos e abandonou o seminário, foi mobilizado e tornou-se um herói de guerra, regressou, teve dois filhos, andou nas lutas pelo sindicalismo livre antes do 25 de Abril e contra a unicidade sindical e a tentativa de tomada de poder pelo PCP em 1975 e pelo caminho ainda teve filhos, um dos quais este seu criado e também netos...

E o que isto tem que ver com o capitalismo? Muito. Ele salvo pela estreptomicina, descoberta nos EUA por Schatz e Waksman (o primeiro um socialista), num projecto financiado pela Merck & Co.

Não foi seguramente salvo graças aos disparates de Trofim Lysenko que queria plantar trigo no gelo. Ver aqui: https://en.wikipedia.org/wiki/Trofim_Lysenko.

O capitalismo tem destas contradições. Já o socialismo real dá origem a disparates como os de Lysenko que fez a genética soviética recuar décadas... Tão só e apenas...

E a sua crítica do capitalismo só terá consistência quando assumir tal coisa. Porque quando alguém critica alguma coisa, deveremos sempre perguntar, pois qual é a alternativa que propõe?

Jose disse...

Todo aquele em que «o instinto do trabalho bem feito» se pergunta se «ao serviço dos outros», pode ficar seguro que tem um outro qualquer instinto, que não o do trabalho bem feito.

Do mesmo modo, todo o patrão sabe que a quem lhe diz «pague-me mais que eu trabalho melhor» mais vale pagar-lhe para que vá trabalhar para outro lado.

E sempre vamos parar à luta contra a precaridade e à sua pior consequência: eternizam-se maus trabalhadores em boas empresas e bons trabalhadores em más empresas; e a soma é negativa.

Anónimo disse...

Sobrevive mas o prognóstico é muito mau.

Ashoka Mody não é o Doctor Doom, mas também ele prevê que o coronavirus é a gota de água que fez transbordar o copo ou a palha que quebrou a espinha ao camelo. Soa melhor em inglês "The straw that broke the camel's back".

Ver o artigo na Spiked:

https://www.spiked-online.com/2020/02/28/italy-the-crisis-that-could-go-viral/

Entretanto o Sr Jaime Santos revisita Lysenko na sua incansável cruzada contra o comunismo. LOL

O homem parece o coelhinho da Duracel fechado numa lógica de guerra fria. E dura... e dura... LOL

Anónimo disse...

Entretanto o turismo começa a dar sinais evidentes de declínio, como seria ululantemente óbvio:

https://www.bloomberg.com/news/articles/2020-03-04/coronavirus-latest-travel-industry-could-lose-tens-of-billions

E em Macau o casino sofre quebras de 89%

Lisboa contou 312 acostagens de navios de cruzeiro em 2019. Quantas acostagens receberá em 2020 com o exemplo do Diamond Princess?

https://www.nytimes.com/2020/02/22/world/asia/coronavirus-japan-cruise-ship.html

Anónimo disse...

E um artigo da Jacobin que, embora focado no caso americano é extrapolável para o caso europeu. Escusado será dizer que elabora de forma porventura mais clara, fruto da maturação do tempo ideias neste blog expressas acerca da redundância das cadeias de abastecimento, da sua fragilidade, das desvantagens da concentração, etc.. Quem tenha lido um pouco de Taleb encontrará material familiar.

https://jacobinmag.com/2020/03/monopoly-coronavirus-antitrust-supply-chain-disaster-preparedness