"São inúmeros os apelos para que os governos não olhem a esforços no combate aos efeitos económicos da crise sanitária. O apelo é sensato: não é durante as crises que os Estados devem poupar. Mas há um problema: sem financiamento monetário dos défices, ou sem transferências financeiras a partir do exterior, tudo o que gastarmos hoje teremos de pagar amanhã. Quanto mais generosos forem os Estados na protecção das pessoas e das empresas afectadas pelas medidas de combate ao vírus, maior será a restrição orçamental com que terão de viver no futuro.
Seriam necessárias três condições para evitar o colapso das economias mais frágeis: uma resposta rápida das autoridades; um volume de apoios públicos suficientemente elevado para proteger o emprego e a actividade económica; e a garantia de que, passado o período de emergência, as economias em causa teriam condições para pagar as dívidas entretanto contraídas e para respeitar os compromissos internacionais, sem dificuldades de maior.
A cada dia que passa há centenas de empresários em Portugal que optam por declarar falência ou reduzir de forma drástica a sua capacidade produtiva. Milhares de trabalhadores ficam sem emprego e/ou vêem os seus rendimentos cair de forma abrupta. A urgência de uma intervenção rápida e decisiva é evidente.
Mas o problema da UE no atual contexto não é apenas a lentidão das decisões. Nem sequer as mensagens equívocas das lideranças. A questão central é a incapacidade das instituições e das regras europeias em impedir que o aumento das dívidas públicas devido ao covid-19 se torne um problema colossal no futuro próximo para as economias mais frágeis.
As medidas lançadas pelo BCE e a eventual criação de dívida conjunta dos Estados ajudam a conter os custos futuros do combate à crise. Mas, por si só, não asseguram que os países periféricos estarão em condições de pagar essa dívida, cumprindo as regras orçamentais em vigor. Não sem custos económicos, sociais e políticos elevados.
Perante isto, qualquer governo responsável tem de ponderar bem cada euro gasto para proteger o emprego e a capacidade produtiva. O resultado disto são intervenções nacionais tímidas, que alimentam o cepticismo já instalado entre os investidores privados.
Neste momento, o BCE deveria anunciar o financiamento monetário dos défices públicos decorrentes do combate ao vírus. Em alternativa, as autoridades europeias deveriam comprometer-se com: 1) o financiamento dos Estados nacionais a custos muito reduzidos (através da emissão de dívida conjunta ou de outras soluções possíveis); 2) a alteração das regras orçamentais que hoje obrigam os Estados a reduções aceleradas das dívidas públicas; 3) a emissão de dívida pelas próprias instituições europeias, transferindo os fundos assim obtidos em função das necessidades nacionais; e 4) o lançamento de um plano ambicioso de retoma económica após a emergência sanitária.
Nenhuma daquelas alternativas se afigura provável. Cada dia a mais sem decisões convincentes é mais um passo para o desastre."
Excerto do meu texto de hoje no DN. O resto pode ser lido aqui.
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7 comentários:
A UE é um cadáver adiado.
O estretor vai ser demorado e todos vamos sofrer com ele, especialmente os nossos filhos.
E o que se faz aos cadáveres?
Há pelo menos uma boa razão para que se enterrem os cadáveres, é uma questão de saúde pública.
O cadáver União Europeia, por não ter sido enterrado ou cremado há anos, tem vindo a desenvolver doenças naqueles que estejam em contacto com ele.
Mas talvez nós devêssemos esperar mais um pouco para ter a certeza que a União Europeia faleceu de facto, apenas mais uma década, tenho a certeza que conseguem aguentar...
Fazendo sentido o que diz, a pergunta é:
Sendo que todos terão dificuldades, a que propósito devem arriscar-se a dar facilidades à cambada de facilitadores para quem sempre é tempo de facilitar?
Só de pensar em que acharam serem oportunas as 35 horas da função pública, logo se me afigura razoável a atitude do holandês!
A primeira coisa que me ocorre quando penso nos custos económicos do combate à pandemia que aí vêm ou que já aí estão é que já devíamos ter reestruturado a nossa dívida há muito tempo.
Actualmente com a segunda, terceira e quarta economias do euro em jogo alguma solução será encontrada. Mais tarde que cedo também é uma norma da UE. Entre muitas que já aconselhavam o seu fim há muito tempo. Infelizmente é para isso que a UE já caminha, eu diria mesmo imparável há muito tempo. Com os nacionalistas da extrema-direita à espreita por toda a Europa. Uma coisa é certa, não restará pedra sobre pedra do que andamos a "construir" desde meados da década de oitenta do século passado. Ou se preferirmos de tudo o que conseguimos destruir de bom, construído com muito esforço desde o pós guerra. E ainda foram mais de três décadas de verdadeiro progresso civilizacional.
E para terminar, eu julgo que quando se fala do instrumento de divida comum para mutualizar os custos fiscais do combate a esta crise – contra o qual o RPM já se manifestou num post anterior - subentende-se o seu pagamento a lá muito longue. E a zona euro como um todo tem toda a capacidade para o financiar. Basta olhar para a dívida da zona euro em relação ao PIB em contraponto com nações como os EUA, China ou Japão. Portanto, como um bloco, temos mais do que espaço suficiente para o financiar.
Considerava o autor apesar de tudo, academicamente válido, mas nem isso, ora vede: "Mas, para lá do seu simbolismo [dos eurobonds], a emissão de dívida conjunta não chega para resolver os problemas actuais." Simbolismo?! Os eurobonds representariam uma transferência adicional de milhares de milhões de euros do norte para o sul, considerando o diferencial resultante nas taxas de juro. Os do sul passariam a pagar menos e os do norte passariam a pagar mais pelos juros, pois aplicar-se-á provavelmente uma média ponderada. Simbolismo? Pode o caro autor oferecer ao SNS um bocadinho do seu simbolismo, que dá para construir uns tantos hospitais.
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