“Ficar na eurozona, diz
Varoufakis, requereria uma reestruturação radical do modo como funciona todo o sistema da moeda única. Regressar ao Dracma … requeria uma desvalorização da moeda muito difícil que poderia levar a um corte enorme do PIB Grego de um só golpe”.
9 comentários:
Será um dia um dilema português? Ou já o é?
Caro José Castro Caldas,
A 26 de Setembro o seu colega de blog Jorge Bateira publicou um post intitulado "Ficar ou sair" com a seguinte citação de Nouriel Roubini:
"o PIB real denominado em euros diminuirá progressivamente num total de 30%, quer a Grécia saia ou não da Zona Euro."
Este post mostra duas coisas:
- que há efectivamente alternativas a ficar no Euro e aplicar medidas recessivas;
- mas que essas alternativas (nomeadamente sair do Euro) implicam necessariamente quebras da mesma magnitude no PIB real.
Devo dizer-lhe que, não defendendo a saída de Portugal (neste caso) do Euro, admiro Jorge Bateira por tornar claro que mesmo esta alternativa implicaria uma quebra de 30% no PIB.
Por isso confesso-lhe que gostaria que todos os que propõem alternativas à actual política, antes de dicutirem os possíveis méritos dessa alternativa, admitissem também que delas decorrerão necessariamente quebras significativas no PIB e, consequentemente, no nível de vida dos Portugueses. Se não o fizerem, peço desculpa, mas estarão a ser demagógicos e a contribuir para o agravamenbto da situação social do País.
Ou seja, a meu ver podemos e devemos pensar em alternativas, mas não devemos criar a ilusão de que vai surgir um milagre (petróleo na costa, ou eliminação de toda a nossa dívida externa) e que assim podemos evitar o inevitável: os Portugueses vão ter uma quebra significativa do seu nível de vida.
E que tal colocar o BCE ao serviço dos Estados Nacionais em vez de estar ao serviço dos Bancos Privados Comerciais.
Que tal se o BCE «emprestasse» directamente dinheiro aos Estados Nacionais a troco de Obrigações do Tesouro e a juro zero (Não podendo ultrapassar determinados valores para não criar inflação na Zona Euro)?
Porque é que o BCE está proibido, pelos próprios estatutos, de emprestar dinheiro aos Estados Nacionais, mas pode emprestar todo o dinheiro que quiser aos Bancos Comerciais que depois o emprestam aos Estados a juros agiotas?
Quem determinou que isto funcionasse desta maneira?
Thomas Edison:
"Mas pensem nisto: se a nossa nação pode emitir uma obrigação no valor de um dólar, então pode emitir uma nota de um dólar. O que faz a obrigação aceitável faz a nota também aceitável. A diferença entre a obrigação e a nota é que a obrigação possibilita aos comerciantes de dinheiro receberem o dobro do valor da obrigação e um adicional de 20 por cento, enquanto a moeda não paga a ninguém, excepto àqueles que contribuíram directamente de uma forma útil."
"É absurdo afirmar que o nosso país pode emitir 30 milhões em obrigações e não pode emitir 30 milhões em moeda. Ambas são promessas de pagamento; mas uma promete engordar o usurário e a outra ajuda o povo. Se a moeda emitida pelo Governo não fosse boa, então as obrigações emitidas também não prestariam. É uma situação terrível quando o Governo para aumentar a riqueza nacional tem de se endividar e submeter-se à cobrança de juros ruinosos às mãos de homens que controlam os valores fictícios do ouro."
"Vejam a coisa da seguinte forma: se o Governo emite obrigações, os correctores de títulos vão vendê-las. As obrigações serão negociáveis; serão consideradas papéis negociáveis. Porquê? Porque o Governo está por trás delas, mas quem está por trás do Governo? O povo. Portanto é o povo que constitui a base do crédito do Governo. Portanto porque é que então o povo não pode usufruir do benefício de seu próprio crédito em papel negociável não tendo de pagar juros para o Muscle Shoals, em vez dos banqueiros receberem o benefício do crédito do povo em obrigações com juros?"
Caro António Carlos,
Não há milagres. Tem toda a razão. Mas nem todas as alternativas impõem os mesmos “sacrifícios” e nem todos os “sacrifícios” são inúteis. O sacrifício imposto pela austeridade à Grécia é inútil, mas Varoufakis fala numa escolha entre dois caminhos. O primeiro - “reestruturação radical do modo como funciona todo o sistema da moeda única” - seria relativamente benigno. O problema é ser cada vez mais improvável e não depender só da Grécia. O segundo “regressar ao Dracma”, dependendo do quadro em que ocorra, pode ser muito doloroso. Mas o pior de tudo mesmo seria regressar ao Dracma depois da Grécia ter sido arrasada pela alternativa que diz não ter alternativa. Isso é o que se está a desenhar. Continuemos a falar com metáforas helénicas.
Esse dilema posto por Varoufakis é pertinente, mas está muito centrado no plano técnico.
Nesta altura há uma questão maior, não só europeia, é global, que tem a ver com o capitalismo selvagem que vivemos, com a finança a ditar as regras usando todos os truques e mais alguns. Inevitável, porquê? Além disso, a Europa não é só a que a Srª Merkel quer impor.
Apercebemo-nos a cada dia que passa que esta situação não traz nenhuma felicidade a ninguém…Continuo a achar que a democracia e a liberdade são os maiores valores, nem que seja para podermos escolher “o nosso próprio empobrecimento”.
Caro Castro Caldas,
Antes de mais gostaria que ficasse claro que eu acho que existem alternativas. Independentemente disso, o que eu acho é que não há alternativas que não passem por quebras significativas no PIB. E esse é que é, do meu ponto de vista, o pressuposto essencial a partir do qual se podem debater alternativas.
A saída do euro, segundo Varoufakis e Roubini conduzem inevitavelmente a uma quebra considerável do PIB Grego. Espero que isso esteja presente em todas as discussões onde essa alternativa esteja presente.
Quanto à "reestruturação radical do modo como funciona todo o sistema da moeda única", para além de, como reconhece, ser altamente improvável, duvido que fosse aceite sem ter como contrapartida cortes significativos na despesa pública,... (e consequentemente quebra considerável do PIB).
Isto é, por muito que se reestruture o euro nunca se chegará a uma solução em que os países "credores" digam: agora tudo bem, continuem a gastar como até aqui!
Isso para mim é absolutamente impossível. Qualquer reestruturação, ajuda, flexibilização de prazos e montantes, ... terá sempre como contrapartida essa exigência.
Será que estamos de acordo neste ponto?
Partindo então deste pressuposto, penso que podemos divergir na questão se saber se devemos esperar (Quanto tempo? ) ou não pelos cortes na despesa pública.
Dado que estamos numa trajectória de agravamento da dívida (que já vinha de antes da crise) qualquer avaliação de alternativas tem de considerar que com o passar do tempo (necessário para as alcançar) os problemas se vão agravar.
Caro António Carlos,
Não gosto de fazer esta pergunta, mas... afinal, qual é a sua alternativa?
Desculpe lá mas chegou o momento da inversão do ónos da prova.
Caro Castro Caldas,
Começo por reconhecer que qualquer alternativa não evita um quebra significativa do PIB português, com todas as consequências que isso acarreta (desemprego, quebra do consumo, ...). Penso que deixei isso claro nos comentários anteriores.
Também considero que Portugal tem de inverter a tendência de aumento do seu endividamento externo, do seu endividamento público e do seu défice comercial.
A estratégia que defendo passa ainda por fazermos o quanto antes o que está ao nosso alcance directo, sem prejuízo em simultâneo tentarmos influenciar condicionantes exógenas.
Assim, defendo um corte na despesa pública. O consumo privado há muito que se tem vindo a ajustar.
No curto prazo acho que não será melhor que qualquer outras das alternativas: o desemprego vai aumentar, o consumo e o investimento diminuir, ... Mas, como já afirmei, acho que isso será inevitável em qualquer caso.
Reconheço que uma estratégia de corte na despesa pública pode também conduzir a um aumento (percentual) do défice público (pelo menos no curto prazo) uma vez que as receitas diminuirão.
No entanto, essa diminuição da despesa terá impactos desejáveis em alguns indicadores:
- não afecta significativamente as exportações, que queremos aumentar. Pode inclusivamente melhorá-las se baixar os custos dos factores de produção endógenos;
- reduz o consumo interno, penalizando em particular as importações.
Assim, pode contribuir decisivamente para melhorar a nossa balança comercial.
Partindo da afirmação que João Rodrigues publicou num post aqui no Ladrões ("... balanços financeiros sectoriais – onde a soma dos saldos dos sectores externo, público e privado, os três sectores em que se pode dividir a economia, é sempre igual a zero."), resulta ainda que se queremos melhorar o saldo do sector externo (penso que todos queremos) só há uma solução: diminuir o saldo negativo dos sectores público e privado. O privado vai inevitavelmente diminuir. O público não tem financiamento para continuar a aumentar.
Negociar com os credores? Tentar influenciar a alteração da zona euro? Tente-se, mas entretanto não se fique parado e faça-se o que está nas nossas mãos.
Como vê, não escamoteio as consequências (algumas dramáticas) que esta alternativa terá no curto prazo. Penso que quem defende a saída do euro também já não as escamoteia. Também deixei claro que não defendo alternativas que dependem essencialmente da vontade de terceiros. E as outras alternativas, fazem o mesmo?
Peço desde já desculpa por alguma falta de rigor na terminologia que utilizei mas foi a melhor forma que, como engenheiro (que também quer participar na discussão enquanto cidadão), consegui encontrar para exprimir a minha análise.
Concordo com António Carlos quando diz que é preciso ser franco sobre as dificuldades e dilemas apresentados por qualquer dos cenários, nomeadamente continuar ou sair da zona euro. No entanto, mais importante é considerarmos qual das opções nos permite uma saída mais promissora e mais rápida desta tendência iniciada de definhamento progressivo da nossa economia. Aqui, a Argentina dá-nos algumas pistas. O CEPR acaba de publicar um "paper" sobre o assunto: "The Argentine Success Story and its Implication"
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