sábado, 6 de dezembro de 2008

Reformas: começar por escutar (IV)

[Conclusão da série com o mesmo título iniciada aqui e continuada em II e III ]

“O que se pede a um dirigente num mundo em movimento como o nosso ?
Não é apresentar a melhor solução racional para problemas bem definidos, mas ser capaz de, confrontado com uma imensidão de problemas potenciais, identificar atempadamente os que vão afectar o decurso das actividades por que é responsável, e ao mesmo tempo, as oportunidades de desenvolvimento que as respectivas soluções podem trazer. Talvez mesmo ser inovador, na medida em que for capaz de construir problemas que ainda não surgiram. …

Mas o que é que acontece quando o dirigente está num nível demasiado elevado para ver os problemas ? A nossa visão das coisas corresponde a uma tradição hierárquica há muito ultrapassada. Não são apenas os quadros técnicos e dirigentes intermédios, mas também os trabalhadores na base, que podem e devem inovar, isto é, apresentar os problemas correspondentes ao respectivo nível de responsabilidades; o modo como o dirigente compreenderá a realidade depende antes de mais dos problemas que lhe são transmitidos pelos executantes no terreno. Os problemas a resolver, além de serem problemas construídos, também só encontram solução através das interacções entre os diferentes participantes.

E o que é válido para grupos relativamente bem delimitados, caso das empresas industriais, ainda é mais marcante nas situações complexas que cada vez mais dominam a vida económica e social, como é o caso do sistema administrativo e político. Aprender a resolver racionalmente os problemas não constitui, nestas condições, uma boa preparação para o exercício de responsabilidades de direcção e mesmo de enquadramento. Não é inútil mas não chega e, se não for compensado por outras aprendizagens, é mesmo perigoso.”

1 comentário:

Anónimo disse...

Acho este debate muitissimo oportuno. Nao restringiria tanto esta ideia 'as relacoes governo-sindicatos, mas de um modo geral a toda a politica real feita em Portugal. O escutar e debater tem sido menosprezado em tomadas de decisao como sendo um atraso injustificavel na tomada de decisoes. Isso ve-se nas discussoes publicas de obras publicas e municipais, onde poucos cidadaos comparecem e tomam parte na discussao. Muitos podem apontar facilmente o culpado: os cidadaos nao se interessam em geral pelas decisoes tomadas nas camaras municipais ou pelo governo. Mas nao sera' exactamente do interesse dos agentes decisorios ouvir todas as partes interessadas? E' tambem uma forma de proteccao contra criticas posteriores. Resumindo, e' de uso corrente ter discussoes publicas sobre os mais variados assuntos, mas sao raras aquelas discussoes em que o decisor mostra realmente interesse em escutar e discutir com as outras partes interessadas. E' nesta falta de interesse que julgo estar a falha no processo.