quinta-feira, 7 de maio de 2015

Bem-vindos à cidade neoliberal


Ao longo dos últimos três anos, segundo uma investigação do The Independent, mais de 50 mil famílias terão sido compelidas a abandonar as suas casas, localizadas nos bairros do centro de Londres, sendo posteriormente deslocadas para zonas administrativas situadas na periferia da cidade. Um movimento silencioso, quase imperceptível, que o periódico britânico rotula de «limpeza social» (social cleansing) e que traduz fundamentalmente o impacto, nos agregados familiares pobres, da subida das rendas e dos cortes em protecção social, a partir de 2010 (com a fixação de um tecto nos apoios sociais e com a introdução do «imposto de quarto», nos alojamentos sociais).

A informação a que o The Independent teve acesso, e que consta de documentos que as autoridades recusaram inicialmente divulgar, permite constatar a existência de «um número sem precedentes de famílias que deixaram de poder pagar a casa em que viviam, sendo arrancadas dos seus bairros e deslocadas para localidades cada vez mais longe da capital, quebrando-se deste modo os laços com familiares e redes de apoio». No total, entre o início de 2012 e o final de 2014, o êxodo de famílias pobres da capital quase quadruplicou, tendo vindo entretanto a acelerar-se o ritmo das deslocações administrativas (que se estima rondar actualmente as 500 famílias por semana).

Ou seja, está a verificar-se precisamente o contrário do que prometera o Mayor de Londres, Boris Johnson, quando disse em 2010 que as reformas que iria implementar não conduziriam a uma «limpeza social de tipo Kosovo», assegurando que os londrinos jamais veriam «milhares de famílias a serem removidas dos lugares onde vivem». Emma Reynolds, a ministra-sombra do Partido Trabalhista para a Habitação, considera tratar-se de «uma tragédia, o facto de tantas pessoas estarem sem casa ou a lutar por manter um tecto e, como se isso não bastasse, serem ainda confrontadas com o cenário de ficarem a milhas de distância da sua actual casa».

Bem-vindos pois às novas cidades, socialmente desenhadas pelo fomento deliberado das desigualdades, pela recusa do papel do Estado e das políticas sociais públicas na promoção do bem-estar e da igualdade de oportunidades, para não já não falar da consagração das lógicas mais selvagens de mercado. Não configurando, como é óbvio, nenhuma nova etapa interessante nas formas de organização urbana das sociedades, a cidade neoliberal antes reconstitui, e reproduz, as lógicas de segregação e as «muralhas» que caracterizavam a cidade medieval.

12 comentários:

Jose disse...

Se as Câmaras fizerem menos 'obra de mostrar' e subsidiarem menos excursões e actividades de lazer, talvez possam emular a obra que faz da CM do Porto o maior senhorio do país.
Exemplos de não-liberalidade que vêm do passado!

Anónimo disse...

o artigo do João Carlos Espada deixou-me estupefacto. como se pode ser tão intelectualmente desonesto ? o gajo ou é néscio ou sujo

Anónimo disse...

Excelente, Nuno. A gentrificação londrina é pura limpeza étnica e tem passado completamente despercebida.

Luís Lavoura disse...

Não entendo aonde quer o Nuno Serra chegar.
É óbvio que, com o tempo, algumas cidades e alguns bairros se tornam mais atraentes. As rendas nessas cidades e nesses bairros sobem, portanto, pela Lei da Oferta e da Procura. É inelutável. E, naturalmente, algumas pessoas deixam de poder comportar essas rendas.
E depois? Que quer o Nuno Serra que se faça? Acha o Nuno Serra que uma pessoa, qualquer pessoa, deve ter o direito a viver toda a sua vida num determinado local? Mas porque é que deve ter esse direito?

Anónimo disse...

"London population to reach record high next year
City Hall number crunchers are trying to pin down a date to proclaim that the previous high of 8.615 million has been topped." - 2014
http://www.theguardian.com/uk-news/davehillblog/2014/nov/25/london-population-to-reach-record-high-next-year-so-whats-new

Sagres disse...

Outro que confunde socialismo com neoliberalismo (não conheço nenhum liberal ou libertário que se intitule neoliberal).

http://www.ilemone.com/2015/03/a-culpa-e-do-neoliberalismo.html

Anónimo disse...

Ou de como a um texto coerente de Nuno Serra,o das 14 e 11 respone com uma não-resposta,simulada de "não-liberalidade que vem do passado" (????).

Ou seja de como a situação presente em Londres é atribúída a excursões em demasia e outras actividades de lazer (!) em vez de ser consequência directa do neoliberalismo e do estadio actual do capitalismo ,dominado por megaempresas e por monopólios.

A cidade medieval está de volta. Lá está.Ou pomos fim a este estado de coisas ou é o regresso à barbárie (escondida provisoriamente atrás de coisas como excursões e lazeres. Espantoso de facto)

De

Anónimo disse...

cá vai mais um comentário anónimo....atão camaradas, ilustres economistas, já deram um pulinho ao blog Camara Corporativa para verificarem com os vossos olhinhos a "loucura" proposta pelo BE em 2006, na voz da Mariana Aiveca???
não se envergonhem e ouçam bem...e entretanto assumam, de vez, que preferem a governação do País nas mãos do PSD/PP a um governo liderado pelo PS...sempre mereceriam algum respeito da minha parte...

Anónimo disse...

Para um comentário ( posso dize-lo?) idiota de um anónimo das 21 e 21 penso que a melhor resposta é a do texto de João Rodrigues, postado hoje,dia 7 de Maio.

Mas podemos ir mais longe na definição do que é o PS:
"O PS é um partido democrático, porém a sua democracia radica numa "idílica abstração dos antagonismos de classe" (Marx, A Luta de Classes em França ). O PS prossegue a miragem de um "bom capitalismo", uma tese que o arrasta para toda a espécie de conservadorismos. As críticas ao governo PSD-CDS limitam-se ao circunstancial, considerando-se capaz de fazer funcionar melhor o capitalismo. Esquece que a sua miragem dos anos 60, foi o resultado de duras lutas de classe, organizadas na base de sentimentos revolucionários, após a derrota do nazi-fascismo e, claro, também da exploração imperialista e neocolonial sobre os países dependentes. O Syriza é o mais recente exemplo do fracasso da social-democracia na demanda de um "bom capitalismo".

Os partidos ditos socialistas, sociais em palavras, neoliberais na realidade, aliaram-se à direita para entregar a soberania nacional aos ditames da UE e apoiam esse verdadeiro golpe de estado que é a TTIP. Para além das diatribes parlamentares, o PS alheia-se ou mesmo combate as lutas populares. As suas cedências permitiram que a direita avançasse para uma ofensiva fascizante, com que metodicamente procura destruir a Constituição de Abril.

A austeridade foi a forma de colocar os povos a pagar as consequências de um sistema em crise, com a arrogância antidemocrática de que não há alternativa ao aumento das desigualdades e da pobreza, à entrega da riqueza criada à especulação financeira, aos monopólios, às privatizações, etc. Uma moral que se limita a "espoliar a classe trabalhadora e dar alguma coisa aos pobres" (Jane Rockfeller). O resto são remendos orçamentais.

Para manter uma ficção de pluralismo a oligarquia precisa de um partido que nas vésperas eleitorais se exiba como de esquerda. Na realidade, a missão que lhe é confiada é a permanente divisão das camadas trabalhadoras, de forma a impor uma política de direita com o mínimo de sobressaltos. Foi assim que se estabeleceu o conceito de "partidos do arco da governação", eufemismo que designa o partido único neoliberal, prioritariamente ao serviço da oligarquia, em conformidade com a ideologia do grupo de Bildelberg, onde dirigentes e propagandistas do "arco da governação" vão receber o "crisma" da religião neoliberal.

O PS apresentou um "cenário macroeconómico". A palavra "cenário" é adequada à farsa do "arco da governação". Os partidos à esquerda do PS fizeram consistentes análises que não cabe aqui reproduzir. Salientamos contudo alguns aspetos.

Em primeiro lugar, as escolhas que passam por económicas na realidade são políticas e ideológicas. A visão da sociedade, os critérios políticos são os mesmos do PSD-CDS: a aceitação acrítica dos dogmas da UE, do euro, do neoliberalismo. Porém, aceitar os critérios da UE e pretender crescimento económico e justiça social é querer escrever direito por linhas tortas. Claro que a desregulação do mercado financeiro, a recusa do planeamento e da soberania económica e monetária impede que as previsões possam ter qualquer grau de rigor.

O "cenário" do PS ignora completamente o chamado triângulo das impossibilidades em política orçamental. "O Estado português terá de escolher duas das três seguintes opções: (1) cumprir o Tratado Orçamental; (2) pagar a dívida pública nos termos atualmente previstos; (3) preservar um Estado Social típico de uma sociedade desenvolvida."

Daqui:
http://resistir.info/v_carvalho/ser_de_esquerda.html

(De)

Anónimo disse...

Luís Lavoura a pergunta certa é porque é que o cidadão não deve ter o direito de viver toda a sua vida num determinado local, o facto de ter feito a pergunta ao contrário denúncia a sua apetência para a opressão.

Anónimo disse...

Carlos maciel, o link que postou dá-me vontade de pôr as mãos à cabeça.
"...o Estado é o monopólio da violência legalizada."

...

Anónimo disse...

O patarata das 7 de maio de 2015 às 21:21 bem podia ver o que vai realmente na proposta do BE, em vez de vir papaguear os gurus socráticos do partido PPPS, onde vota.

A proposta do BE, que o excelso papagaio não leu, passa pelo baixar algumas TSU, para quem tem mão de obra intensiva, indo buscar a massa aos lucros feitos pelas tecnológocas e pelas finaceiras.

A medida beneficia os necessários produtores da indústria ou da agricultura que precisam de muitos trabalhadores para produzir lucro.

E faz com que contribuam para o sistema aqueles que com meia dúzia de especuladores fazem milhões e milhões em nada contribuindo para a segurança social.

É também o habitual tontinho-fascista que acha que CDU e BE não devem votar de acordo com as convicções próprias mas apenas como espécie de idiotas úteis da manutenção do PS no poder.

Esquecem-se sempre daquele Guterres que fugiu recusando arranjos parlamentares existentes e entregando o poder a Barroso.