sexta-feira, 4 de março de 2011

Rumo à tempestade perfeita

1. O BCE mostra a intenção de subir a taxa de juro. Demonstração de uma zona euro disfuncional por dois motivos. O primeiro é a confiança que tal medida pressupõe no andamento da economia europeia, focando-se nos frágeis resultados da Alemanha e ignorando a recessão na periferia. Mais uma vez se prova que a mesma receita monetária numa zona muito heterogénea é inaplicável sem mecanismos (orçamentais) de compensação. O segundo motivo é a velha e estatutária obsessão com a inflação. Face a um modesto aumento da inflação, claramente exógeno à zona euro (preços do petróleo e outras matérias-primas), o BCE decide sacrificar a economia europeia através de um aumento da taxa de juro.

2. Os bancos franceses e alemães, principais detentores da dívida pública portuguesa, lá vão continuando a sua estratégia de se livrarem dos títulos portugueses junto do BCE. Os bancos portugueses, financiados pelo mesmo BCE, tomam o seu lugar. O Estado português vai assim perdendo a sua principal arma negocial junto da UE: ameaça de reestruturação da sua dívida e consequente efeito no frágil sistema bancário europeu. A inevitável reestruturação fica adiada até 2013, quando não existir risco de maior para os bancos do centro. Entretanto, dois anos de austeridade a marcar passo.

3. Os bancos nacionais estão cada vez mais nervosos. Dependentes do financiamento do BCE e com as taxas de incumprimento a aumentar no próximo ano, criticam o governo pelas novas exigências de capital e pedem “rentabilidade garantida para o accionista”, semelhante à existente no sector eléctrico. Relembrem-me: por que é que os bancos devem ser privados?

5 comentários:

Bilder disse...

Devem ser privados para manter o status dos senhores do mundo e escravizar os povos e os países enganados pela ilusão da soberania e da democracia!
Que outra resposta pode fazer sentido??

Anónimo disse...

A tese dos bancos franceses e alemães faz parte da cantilena propagandistíca. Se considerar a dimensão dos países, em valores relativos são os belgas e holadeses estão à frente. No caso da dívida soberana de Portugal lideram os espanhóis. Em Espanha da França e dos EUA. no caso de haver uma reestruturação, os bancos com maiores prejuízos seriam espanhóis e gregos. Não convém dizer isto. E os portugueses?
A ladainha francesa e alemã é uma peça necessária. Se os franceses e alemães falissem o que aconteceria a Portugal?


Jorge Rocha

João Carlos Graça disse...

Seja, Jorge Rocha, you've got a point: "o capital não tem pátria". Isso deixa-o satisfeito?
E todavia, permanece o facto de que, dado o desenho institucional "europeu", a necessidade, do ponto de vista das as elites, de responder face aos eleitores, se aplica quanto aos alemães, mas não quanto aos portugueses et al. (pigs). Democracia? Nem por isso quanto aos alemães; decididamente não quanto a nós, outros. Soberania? Idem, idem.
Porque é que os bancos devem ser nacionalizados?

tempus fugit à pressa disse...

face a um potencial aumento de várias matérias primas a longo prazo

com as inundações australianas

300mil tones de cereal foram a nadar

meio-milhão nos incêndios russos

aumento de consumo de bens alimentares pelo pessoal asiático

não ver as reservas a descer

e as ameaças de instabilidade a subir

e sem receitas

a crise instala-se e tenderá a agravar-se

1,25% 0u 1,5% não será significativo

uma vez que o financiamento médio da europa já superou essa bitola
nicht wahr?

Anónimo disse...

João Carlos Graça, tem razão. Simplesmente, os Piigs têm de manter um nível de endividamento que lhes permita manter a soberania, perdida temporariamente. Temporariamente e recuperável.
Outra solução é sair dir do euro. Sucede que os portugueses apreciam mais o pópó e o portátil do que a independência.


Jorge Rocha