A um certo ponto escreve-se lá [num sítio do PSD] que o Estado "consome" mais de metade do PIB, quando isso é um erro de interpretação que, apesar de repetido amiúde, não se torna verdade. A verdade é que o Estado distribuí um valor do PIB que andará à volta dos 40%, sendo os consumidores disso todos nós ou, pelo menos, aqueles que vão a hospitais públicos, que têm os filhos nas escolas públicas (e privadas, que também são subvencionadas), que andam nas estradas sem portagem, nas ruas à noite com luz e sem muitos assaltos, ou que fazem piqueniques nas florestas.
Pedro Lains, Negócios.
O Estado produz bens e serviços úteis. As actividades de produção do sector público, tendencialmente muito intensivas em trabalho, somam-se às dos outros sectores, criam, e ajudam a criar, valor e contribuem para a riqueza de um país. Tudo isto é relativamente simples, mas pode ser ofuscado pela percepção selectiva gerada por certas ideologias. A produção do “monstro devorador”, a provisão pública, gera rendimentos. Os impostos, pagos pelo sectores público e privado, não são mais do que um “pagamento socializado” por um conjunto de actividades com valor, mas não necessariamente com valor de troca, dada a sua natureza geralmente não-mercantil, e que têm várias dimensões, incluindo a “distributiva” a que alude Lains. Leia-se sobre isto o esclarecedor artigo do economista Jean-Marie Harribey.
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2 comentários:
De facto, tão verdadeira é a afirmação de que "o Estado consome 40 por cento que que se produz", como a de que "o Estado cria 40 por cento da riqueza que se consome".
Por detrás disso está uma realidade estatística insofismável: os gastos públicos são 40 por cento do PIB. O resto são "maneiras de dizer" contabilisticamente válidas ambas, porque correspondentes a duas perspectivas válidas (mas entre si diferentes) da mesma "coisa".
Analogamente, e por hipótese, também posso dizer que "a Sonae produz 10 por cento da riqueza criada em Portugal", ou que "a Sonae fica com 10 por cento do que se produz em Portugal". Também são, ambas as afirmações, duas perspectivas diferentes da mesma realidade (embora neste caso apenas hipotética): ambas contabilisticamente defensáveis e compreensíveis.
Claro está, para consumo político, a propósito do Estado diz-se que ele "consome" muito. Já a respeito da Sonae se opta por afirmar que "cria" muito...
Mas uma e outra afirmações são sobretudo questão de retórica. A diferença fundamental está aqui: o Estado tem capacidade para exigir pagamente sem uma contrapartida directa, isto é, para lançar "impostos". A Sonae não, pelo menos explicitamente. O Estado, por outro lado, educa estudantes, trata enfermos e guarda inocentes de borla, ou quase... a Sonae evidentemente não.
Escolher uma coisa ou outra é assunto eminentemente político, isto é, assunto de todos nós, enquanto cidadãos. Assunto demasiado importante, por isso mesmo, para ser deixado a cargo... dos economistas.
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