Sara Falcão Casaca, hoje no Público:
"Há uma corrente de pensamento que evoca a passagem à sociedade pós-salarial para escrever os tempos presentes, anunciando a progressiva morte do trabalho assalariado e a generalização da iniciativa empresarial. Inspirada nos ideais do neoliberalismo, esta tese – muito em voga – transfere a empregabilidade para o foro da responsabilidade de cada um e de cada uma, a quem cabe, ao longo da vida, investir na respectiva carreira profissional, dotar-se de espírito empreendedor e fazer-se vencer.
Embora valorize muito o esforço e a iniciativa individual, não posso seguir uma perspectiva que faz tábua-rasa dos constrangimentos ideológicos e materiais, das desiguais oportunidades na esfera económica e na sociedade em geral, onde, como sabemos, as desigualdades de género se colocam de uma forma ainda muito saliente. As mulheres são sub-remuneradas em relação aos homens e ocupam os postos de trabalho mais precários, mesmo quando exercem funções idênticas e detêm os mesmos (ou superiores) níveis de qualificação escolar. É comum depararem-se com barreiras, nem sempre visíveis (os designados “tectos e paredes de vidro”), mas que as impedem de aceder aos lugares estratégicos de poder e decisão. Possuem menos recursos económicos e financeiros ao longo de toda a trajectória de vida, além de disporem de menos tempo – realidade que remete para a necessidade de renegociação das relações de género no espaço doméstico/privado. (…)
As mulheres são detentoras de elevadas qualificações, de saberes formais e informais que importa orientar para bem da reabilitação do tecido empresarial, da economia e do desenvolvimento sustentado do país. Este só se constrói de mãos dadas com a promoção do trabalho digno, que inclui protecção laboral, qualidade de vida, diálogo social e oportunidades iguais e justas. Mas onde está a referência ao trabalho digno no instrumento de política em vigor? Por que não mereceu acolhimento esse conceito tão nobre, referenciado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), no Plano Nacional para a Igualdade – Género, Cidadania e Não Discriminação (2011-2013)? Diria que expirou como se não tivesse validade, mesmo antes de vir à luz dos dias… Apesar de serem estes os dias que lhe deveriam conferir centralidade. É que há temas fáceis, superficiais, ofuscantes... Outros nem tanto. Paradoxos do poder que esmorecem a igualdade…"
Professora do ISEG-UTL, Departamento de Ciências Sociais. Ex-presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG).
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